打印全文
Processo n.º 62/2018. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para a Segurança.
Assunto: Processo disciplinar. Nova acusação. Artigo 281.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau.
Data do Acórdão: 28 de Novembro de 2018.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
A 2.ª acusação a que se refere o artigo 281.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau destina-se, fundamentalmente, a permitir o contraditório do arguido, pelo que se as diligências que potenciariam tal nova acusação foram requeridas pelo arguido e confirmaram o que ele alegava, era inútil esta nova acusação.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A, Chefe de Primeira do Corpo de Bombeiros, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho de 9 de Setembro de 2016, do Secretário para a Segurança, que indeferiu recurso hierárquico do despacho de 1 de Agosto de 2016, do Director da Escola de Bombeiros, lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão por 30 dias.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 12 de Abril de 2018, negou provimento ao recurso.
Inconformado, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), tendo imputado ao acórdão recorrido as seguintes violações legais:
- Do disposto no n.º 1 do artigo 262.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau (EMFSM), por ter entendido não ter havido nulidade insuprível do processo por não ter sido deduzida uma 2.ª acusação após o recorrente ter esclarecido certos factos da 1.ª acusação e por existir uma acta falsa;
- Do disposto no artigo 289.º do EMFSM, por ter entendido que devia ter sido instaurado processo especial e não processo comum, em virtude de ter entendido que a conduta do recorrente não constitui apenas falta injustificada mas também violação de outros deveres funcionais, designadamente o dever de disponibilidade;
- Do disposto na alínea d) do artigo 202.º do EMFSM, ao não ter considerado que a conduta do recorrente tinha uma circunstância dirimente que excluía a responsabilidade disciplinar.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II – Os factos
O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
1. O recorrente é chefe de primeira do Corpo de Bombeiros, e exerceu funções na Unidade de Apoio da Escola de Bombeiros desde 1 de Março de 2011.
2. O recorrente preencheu, no dia 9 de Novembro de 2015, a “participação de faltas e férias”, requerendo o gozo de férias de 8 dias úteis, no período entre 12 e 29 de Dezembro de 2015.
3. O director da Escola de Bombeiros B emitiu o seu parecer no verso da referida participação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
4. A entidade competente proferiu o seguinte despacho na participação apresentada pelo recorrente: “Concordo com o parecer do director da Escola de Bombeiros, e deve o gozo de férias ser em conformidade com o aprovado no Mapa original, para evitar que seja afectado o trabalho normal”.
5. No Mapa de Férias do ano 2015, o recorrente marcou os dia 9 a 18 de Dezembro de 2015 para o gozo de férias.
6. Em 19 de Novembro de 2015, o recorrente assinou a referida participação declarando que ficou ciente do seu teor.
7. Em 19 de Novembro de 2015, o recorrente preencheu, de novo, a “participação de faltas e férias”, requerendo o gozo de férias no período entre 9 e 20 de Dezembro de 2015.
8. Depois de ter conhecimento da situação do recorrente, o segundo-comandante substituto do CB C exigiu que o recorrente declarasse, por escrito, os motivos e apresentasse o bilhete de avião como prova. Se fossem suficientes os motivos, iria considerar se autorizaria ou não o gozo de férias do recorrente nos dias 19 e 20 de Dezembro de 2015.
9. Em 25 de Novembro de 2015, o recorrente apresentou uma declaração, mas C entendeu que o seu conteúdo teve problema, exigindo que o recorrente prestasse, de novo, uma declaração. C também procedeu à modificação na declaração para efeitos de referência do recorrente.
10. O recorrente acabou por não apresentar o bilhete de avião.
11. O director da Escola de Bombeiros emitiu, em anexo, o seu parecer, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
12. A entidade competente proferiu o seguinte despacho na participação do recorrente: “Concordo com o parecer do director da Escola de Bombeiros e autorizo o gozo de férias do requerente nos dias 9 a 18 de Dezembro de 2015. Os dias 19 e 20 de Dezembro são dias comemorativos do estabelecimento da RAEM, e é necessário colaborar com trabalho dos departamentos de actuação”.
13. Em 7 de Dezembro de 2015, o recorrente assinou a referida participação declarando que ficou ciente do seu teor.
14. O recorrente não é pessoal de piquete, e não precisa trabalhar nos sábados, domingos e feriados, salvo distribuição de trabalho em contrário.
15. De acordo com a Ordem de Operações n.º XX/XX/2015, foram distribuídas missões especiais ao CB para os dias 19 e 20 de Dezembro de 2015.
16. Segundo a supracitada Ordem, cumpriu à Escola de Bombeiros prestar apoio de recursos humanos, caso fosse necessário, ao Departamento Operacional de Macau e ao Departamento Operacional das Ilhas.
17. O recorrente sabia bem que não foi autorizada a sua dispensa de disponibilidade nos dias 19 e 20 de Dezembro de 2015.
18. O recorrente notificou o superior de que tinha comprado bilhetes de avião para viajar, com a família, para o exterior nos dias 19 e 20 de Dezembro de 2015.
19. O recorrente começou a gozar as férias desde 9 de Dezembro de 2015.
20. No período entre 18 e 21 de Dezembro de 2015, o recorrente viajou com a família para a Coreia do Sul.
21. Em 17 de Dezembro de 2015, o comandante do CB aprovou o plano de trabalho de segurança para o desfile de 20 de Dezembro de 2015.
22. Segundo o aludido plano, o recorrente tem de comparecer ao Posto Operacional da Areia Preta às 13h00 do dia 20 de Dezembro de 2015, e apresentar-se ao coordenador da Escola de Bombeiros.
23. Em 18 de Dezembro de 2015, pelas 16h34, a bombeira principal D recebeu instruções para notificar o recorrente do plano de segurança para o desfile, e a seguir, usou o seu telemóvel para ligar para o telemóvel do recorrente, mas não teve sucesso em contactar com o mesmo. D informou a situação ao director da Escola de Bombeiros, e segundo a ordem dada pelo mesmo, registou o tempo e elaborou o respectivo relatório.
24. No período entre 18 e 21 de Dezembro de 2015, os funcionários do Centro de Controlo do CB ligaram, por várias vezes, para o telemóvel do recorrente (XXXXXXXX), mas não tiveram sucesso em contactar com o recorrente.
25. Em 20 de Dezembro de 2015, pelas 13h00, o chefe de primeira E descobriu que o recorrente não compareceu no local para que estava designado, pelo que participou ao comandante no local, o chefe principal F, e ligou para o telemóvel do recorrente, mas não teve sucesso em contactar com o mesmo.
26. Em 21 de Dezembro de 2015, pelas 19h17, os funcionários do Centro de Controlo do CB ligaram para o telemóvel do recorrente (XXXXXXXX) e tiveram sucesso em contactar e conversar com o recorrente, dizendo-lhe que sob instruções do superior, vieram notificá-lo do trabalho de segurança do dia 20 de Dezembro.
27. Em 21 de Dezembro de 2015, pelas 19h21, os funcionários do Centro de Controlo do CB ligaram, mais uma vez, para o telemóvel do recorrente (XXXXXXXX), e tiveram sucesso em contactar e conversar com o recorrente.
28. Dos elementos constantes da resposta dada pela Companhia de Telecomunicações de Macau resulta que no período entre 18 e 21 de Dezembro de 2015, o telemóvel do recorrente (XXXXXXXX) não utilizou o serviço de roaming, e todas as conversas tiveram lugar no dia 21 de Dezembro.
29. Em 28 de Dezembro de 2015, o director substituto da Escola de Bombeiros proferiu despacho ordenando a instauração do processo disciplinar contra o recorrente.
30. Em 22 de Março de 2016, o instrutor deduziu acusação disciplinar contra o recorrente.
31. Em 1 de Abril de 2016, o recorrente apresentou a contestação escrita.
32. Em 7 de Julho de 2016, o instrutor elaborou o relatório final da instrução.
33. Em 1 de Agosto de 2016, o comandante do CB proferiu o seguinte despacho:
“…Em relação à falta, por parte do arguido, ao serviço de segurança na Escola de Bombeiros às 13h00 do dia 20 de Dezembro de 2015.
Através da análise dos elementos constantes do presente processo, descobre-se que parte dos documentos anexos à contestação não foram adquiridos de forma legal, existem dúvidas sobre a sua genuinidade e não devem ser admitidos. Porém, mesmo que sejam verdadeiros os documentos em anexo, não se verifica qualquer fundamento de facto ou de direito susceptível de alterar a acusação.
Ficou provado que o arguido, sabendo bem da obrigatoriedade de prestar apoio ao trabalho de segurança dos departamentos de actuação no dia comemorativo do estabelecimento da RAEM, e que não foi autorizado a gozar as férias nos dias 19 e 20 de Dezembro de 2015 nem requereu a dispensa de disponibilidade, ainda agiu com uma atitude indiferente e viajou para a Coreia do Sul no referido período, não colocou o seu telemóvel em modo de roaming, nem comunicou ao seu superior um outro modo ou local de contacto, o que resultou na impossibilidade de entrar em contacto com ele através de chamadas telefónicas a partir das 16h14 do dia 18 de Dezembro de 2015.
O assunto revela, fortemente, que o arguido adoptou uma atitude muito negativa perante a distribuição dos trabalhos de segurança para o dia comemorativo, e acabou por não cumprir o plano de trabalho para o desfile de 20 de Dezembro de 2015 e faltar ao serviço de segurança na Escola de Bombeiros às 13h00, o que demonstra a maldade subjectiva, a indiferença e a ignorância do arguido, bem como a sua fuga à notificação e à distribuição de trabalho.
As condutas do arguido violam, de forma evidente, os art.ºs 6.º, n.º 1 e n.º 2, al. a), 8.º, n.º 2, al. e), 15.º, n.º 1 e 16.º, al. g) do EMFSM.
O arguido tem circunstâncias atenuantes da responsabilidade disciplinar previstas pelo art.º 200.º, n.º 2, al.s b) e h) do EMFSM.
O arguido tem circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar previstas pelo art.º 201.º, n.º 2, al.s h) e f), e n.º 4 do EMFSM.
Com base nisso, concordo com o relatório e a proposta do instrutor, e com o parecer do seu superior. Nos termos dos art.ºs 232.º e 236.º do EMFSM, decido aplicar ao arguido a pena de suspensão de 30 dias…”.
34. Em 9 de Agosto de 2016, o recorrente interpôs recurso hierárquico.
35. Em 9 de Setembro de 2016, a entidade recorrida rejeitou o respectivo recurso hierárquico através do seguinte despacho:
“…O recorrente A, chefe de primeira do CB, n.º XXXXXX, interpôs recurso hierárquico do despacho de 1 de Agosto de 2016 do comandante do CB, que lhe aplicou a pena de suspensão de 30 dias.
Através da leitura do processo em epígrafe, sabe-se que o recorrente requereu o gozo de férias no período entre 9 e 20 de Dezembro de 2015 (de 8 dias úteis), mas por despacho proferido pela entidade competente na respectiva participação, foi apenas autorizado o gozo de férias no período entre 9 e 18 de Dezembro de 2015 (de 8 dias úteis), e foi notificado, ao mesmo tempo, ao recorrente que os dias 19 e 20 de Dezembro são dias comemorativos do estabelecimento da RAEM, e é necessário colaborar com trabalho dos departamentos de actuação. Porém, o recorrente viajou para a Coreia do Sul no período entre 18 e 21 de Dezembro de 2015. O recorrente, sabendo bem que não foi dispensado de estar disponível e que seriam distribuídos trabalhos ao seu departamento, só voltou para Macau no dia 21 de Dezembro de 2015, não comunicou ao superior o seu modo de contacto durante a viagem, nem manteve a disponibilidade de contacto do seu telemóvel habitualmente utilizado, causando que os funcionários do departamento não conseguiram notifica-lo da distribuição dos trabalhos de segurança para o dia 20 de Dezembro de 2015. Considerou-se que as condutas do recorrente violaram o dever de obediência previsto pelo art.º 6.º, n.º 1 e n.º 2, al. a), o dever de zelo previsto pelo art.º 8.º, n.º 2, al. e), o dever de disponibilidade previsto pelo art.º 15.º, n.º 1, e outros deveres constantes do art.º 16.º, al. g) do EMFSM. Após a leitura e análise do processo em epígrafe, pode-se ver que a instrução foi realizada em conformidade com as disposições legais e provou, de forma suficiente, que o recorrente tinha praticado a infracção disciplinar lhe imputada. Ao mesmo tempo, o acto recorrido já atendeu à natureza e gravidade da infracção, à categoria do recorrente, ao grau de culpa, à sua personalidade, ao seu nível cultural e às circunstâncias atenuantes e agravantes da responsabilidade disciplinar. Por isso, revela-se adequada e proporcional a pena aplicada ao recorrente.
Tendo efectuado, a pedido do recorrente, as respectivas diligências instrutórias, e após a apreciação e análise da petição de recurso hierárquico e do processo disciplinar, não se verifica qualquer vício material ou de forma do processo disciplinar em epígrafe.
Nesta conformidade, no uso das competências conferidas na Ordem Executiva n.º 111/2014, e nos termos do art.º 292.º, n.º 3 e n.º 9 do EMFSM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/94/M de 30 de Dezembro, e do art.º 161.º do CPA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M de 11 de Outubro, decido rejeitar o presente recurso hierárquico e manter o despacho recorrido.
Notifique de imediato o recorrente do presente despacho e para interpor recurso contencioso para o TSI no prazo de 30 dias…”.

III – O Direito
1. As questões a resolver
Trata-se de saber se o acórdão recorrido incorreu nas violações legais imputadas pelo recorrente.

2. 2.ª Acusação e acta falsa. Violação do disposto no n.º 1 do artigo 262.º do EMFSM
O recorrente começa por dizer que a acusação lhe havia imputado o não atendimento das chamadas que lhe foram dirigidas para o telemóvel, com vista a notificá-lo de que estava escalado para trabalhar no dia 20 de Dezembro de 2015. E acrescenta que, tendo ele refutado esse facto e esclarecido que estava no estrangeiro e que não tinha serviço de roaming, o que foi confirmado no âmbito do processo disciplinar, deveria o instrutor ter deduzido nova acusação, com esse esclarecimento, a fim de garantir nova audiência do arguido e a possibilidade de exercitação do contraditório.
Vejamos.
Concluída a instrução o instrutor deduz acusação, sendo caso disso (artigo 274.º do EMFSM).
O arguido pode apresentar resposta bem como o rol de testemunhas e juntar documentos, requerendo também quaisquer diligências (artigo 277.º do EMFSM).
Dispõe, seguidamente o artigo 281.º:
Artigo 281.º
(Diligências complementares de prova)
 1. Finda a produção da prova oferecida pelo arguido, podem ainda ordenar-se, em despacho fundamentado, novas diligências que se tornem indispensáveis para o completo esclarecimento da verdade.
 2. Se das diligências efectuadas resultarem factos novos, o processo deve ser facultado outra vez ao arguido, ainda que não exista matéria nova de acusação, a fim de o mesmo se pronunciar, querendo, sobre o valor probatório desses elementos.
 3. Quando essas diligências revelem novos factos puníveis praticados pelo arguido ou circunstâncias diferentes da sua comissão ou que possam influir na respectiva qualificação e avaliação, deverá o instrutor deduzir novos artigos de acusação no prazo e nos termos previstos no n.º 2 do artigo 274.º, seguindo-se os demais termos do processo disciplinar.

A requerimento do arguido e no âmbito das diligências previstas no preceito transcrito, o Comandante do Corpo de Bombeiros perguntou à CEM acerca do roaming do telemóvel do arguido, que confirmou que não estava activo entre 18 e 21 de Dezembro de 2015.
Deveria ter sido alterada a acusação, prevendo esta situação?
A acusação refere que foram feitos contactos telefónicos para o arguido de 18 a 21 de Dezembro de 2015, sem sucesso. Não refere se o arguido tinha ou não tinha o roaming activo porque não era essencial dizê-lo. Esse era um problema do arguido, já que se ausentou de Macau em férias sem estar autorizado. Se não tinha roaming, devia ter, já que é dever do militarizado o dever de disponibilidade, de acordo com a alínea j) do n.º 4 do artigo 5.º do EMFSM. Os órgãos do Corpo de Bombeiros não têm dever de usar redes sociais para contactarem o recorrente pela internet.
Por outro lado, a 2.ª acusação destina-se, fundamentalmente, a permitir o contraditório do arguido, porque normalmente desfavorável a este. Não era o caso, já que a diligência visou provar um facto por ele alegado. Não estava em causa a necessidade de qualquer contraditório. A nova acusação seria irrelevante.
Ainda quanto à nulidade prevista naquele artigo 262.º, n.º 1, o recorrente afirma que o instrutor não curou de averiguar a falsidade de uma acta que previa, originalmente, a possibilidade de o pessoal civil e aquele que não efectuava serviço de piquete - caso do recorrente - poder gozar os sábados, domingos e feriados antecedentes ou subsequentes aos dias úteis de férias, mas que foi entretanto abusivamente alterada.
Como referiu o acórdão recorrido a averiguação deste facto não era essencial.
Uma coisa é a prática anterior de permitir o gozo dos feriados consecutivamente a seguir às férias, que tal acta documentaria. Outra coisa é o gozo concreto de um sábado e um feriado (19 e 20 de Dezembro de 2015) a seguir a férias, que, no caso, foi expressamente indeferido e notificado ao recorrente em 7 de Dezembro de 2015.
Ou seja, independentemente da acta, que fornece uma orientação geral, a apreciação concreta do gozo de férias e de feriado imediatamente a seguir foi expressamente feita, indeferindo a pretensão do interessado, pelo que tal orientação geral era irrelevante.

3. Processo comum. Processo especial
Trata-se de saber se o acórdão recorrido incorreu em violação do disposto no artigo 289.º do EMFSM, por ter entendido que devia ter sido instaurado processo especial e não processo comum, em virtude de ter entendido que a conduta do recorrente não constitui apenas falta injustificada mas também violação de outros deveres funcionais, designadamente o dever de disponibilidade.
O EMFSM prevê um processo disciplinar comum e processos especiais para situações específicas, um pouco à semelhança da aplicação do processo comum e dos processos especiais em processos civil.
O processo especial previsto no artigo 289.º (processo por ausência ilegítima) aplica-se apenas a situações de ausência ilegítima, o que não foi o caso dos autos, em que também foi imputada ao recorrente violação de outros deveres funcionais, pelo que foi bem utilizado o processo comum, já que:
Artigo 254.º
(Formas de processo)
 1. O processo disciplinar pode ser comum ou especial.
 2. O processo especial aplica-se nos casos expressamente designados neste Estatuto e o comum a todos os casos a que não corresponda processo especial.
 3. Os processos especiais regulam-se pelas disposições que lhes são próprias e, na parte nelas não prevista, pelas disposições respeitantes ao processo comum.

Aliás, a única especialidade do processo especial em causa é a notificação da decisão por edital quando é desconhecido o paradeiro do arguido (no resto segue os trâmites do processo comum), pelo que a utilização do processo comum, mesmo a ter sido mal utilizada, o que não foi o caso, seria, de todo, irrelevante, dado que o erro na forma de processo importa unicamente a anulação dos actos que não possam ser aproveitados (n.º 1 do artigo 145.º do Código de Processo Civil). Ora, o recorrente, cujo paradeiro era conhecido, não explica que actos processuais foram praticados no processo comum que não serviriam no processo especial em causa.

4. Exclusão de responsabilidade disciplinar
Para o recorrente o acórdão recorrido violou o disposto na alínea d) do artigo 202.º do EMFSM, ao não ter considerado que a conduta do recorrente tinha uma circunstância dirimente que excluía a responsabilidade disciplinar, já que, não pertencendo ao pessoal de piquete, não precisa de trabalhar aos sábados, domingos e feriados, salvo distribuição de trabalho em contrário.
Ora, tal distribuição de trabalho em contrário existiu e levou ao indeferimento expresso do pedido de férias para os dias 19 e 20 de Dezembro de 2015.
O recorrente não ligou ao despacho de indeferimento e preferiu gozar o sábado e o feriado, viajando com a família. Não pode agora invocar qualquer exclusão de responsabilidade disciplinar, que não existe.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso jurisdicional.
Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 4 UC.
Macau, 28 de Novembro de 2018.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa




1
Processo n.º 62/2018

18
Processo n.º 62/2018