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Processo n.º 2/2019
Recurso jurisdicional em matéria administrativa
Recorrentes: Sociedade de Investimento Imobiliário Fu Keng Van, S.A. e Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S. A.
Recorrido: Secretário para os Transportes e Obras Públicas
Data da conferência: 4 de Abril de 2019
Juízes: Song Man Lei (Relatora), Sam Hou Fai e Viriato Manuel Pinheiro de Lima

Assuntos: - Caducidade-preclusão
- Princípio da boa fé
- Causa impeditiva da caducidade, art.º 323.º n.º 2 do CC
- Lei Básica da RAEM

SUMÁRIO
1. Não é essencial a questão de culpa no não aproveitamento dos terrenos no prazo fixado para o efeito, já que com o decurso do prazo máximo da concessão provisória sem a conclusão do aproveitamento do terreno, a concessão não pode ser renovada, desde que não se verifique a excepção prevista na lei, e deve ser declarada a sua caducidade. Trata-se duma caducidade-preclusão.
2. No âmbito da actividade vinculada não se releva a invocação da violação do princípio da boa fé (e ainda dos princípios da justiça, da proporcionalidade, da tutela da confiança e da igualdade).
3. As comunicações de serviço interno da DSSOPT, bem como a atitude da DSSOPT revelada nos ofícios, com os quais as recorrentes foram notificadas que os projectos apresentados eram passíveis de aprovação pela DSSOPT, mas que o procedimento administrativo ficava suspenso provisoriamente até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística da zona onde se encontram os terrenos concedidos, nunca poderiam constituir reconhecimento de nenhum direito das recorrentes por parte da RAEM, uma vez que as informações ou opiniões nelas contidas não representam nem obrigam a RAEM, muito menos depois do termo do prazo de arrendamento dos terrenos.
4. Não se verifica a causa impeditiva prevista no n.º 2 do art.º 323.º do Código Civil.
5. A protecção do direito da propriedade consagrada no art.º 103.º da Lei Básica deve ser operada “em conformidade com a lei”.
6. Há de chamar atenção para a natureza das concessões por arrendamento em causa, dadas a título provisória, natureza que se mantém antes de as concessões se tornarem em definitivas, daí que o direito de uso dos terrenos concedidos reveste também a natureza provisória.
7. Não é de aceitar que, com a protecção consagrada na Lei Básica, os direitos decorrentes dos contratos de concessão mereçam protecção para além do prazo de arrendamento dos terrenos, independentemente da renovação, ou não, das concessões, já que, como é lógico e legal, a protecção desses direitos para além do prazo inicial de arrendamento depende sempre da renovação dos respectivas concessões, efectuada em conformidade com as leis vigentes na altura de renovação, tal como prevê a segunda parte do art.º 120.º da Lei Básica, segundo a qual as concessões de terras renovadas após o estabelecimento da RAEM devem ser tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da RAEM.
8. Se não se verificar alguma das situações previstas no art.º 55.º da Lei n.º 10/2013 em que é permitida a dispensa do concurso público, não é legalmente possível a concessão directa dos terrenos, uma vez que, nos termos do art.º 54.º da mesma Lei de Terras, a concessão provisória é em regra precedida de concurso público.

A Relatora,
Song Man Lei
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
Sociedade de Investimento Imobiliário Fu Keng Van, S.A. e Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A., melhor identificadas nos autos, interpuseram o recurso contencioso de anulação do despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 21 de Setembro de 2016 que:
- indeferiu o pedido de suspensão do prazo da concessão por arrendamento dos terrenos denominados lotes C5 e C6, situados no Fecho da Baía da Praia Grande, Zona C, com as áreas de 501m2 e de 3131m2, respectivamente;
- indeferiu o pedido de novos prazos de aproveitamento dos referidos terrenos;
- indeferiu o peido de novas concessões dos mesmos terrenos ou de outros terrenos com as mesmas áreas de construção e capacidade aedificandi.
Por acórdão proferido em 13 de Setembro de 2018, o Tribunal de Segunda Instância julgou improcedente o recurso contencioso, confirmando o acto administrativo impugnado.
Inconformadas com o acórdão, recorrem Sociedade de Investimento Imobiliário Fu Keng Van, S.A. e Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A. para o Tribunal de Última Instância, suscitando as seguintes questões:
- O Acórdão recorrido incorre em violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade das partes e do disposto nos artigos 63.º, n.º 1 e 65.º, n.º 3 do CPAC, e numa errada apreciação da lei, nomeadamente do artigo 8.º do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), que estipula o princípio da boa fé, do artigo 323.º do Código Civil, relativo à invocada existência de uma causa impeditiva da caducidade; do artigo 103.º da Lei Básica e do artigo 1427.º do Código Civil, por referência ao direito do uso de superfície;
- Há violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade das partes, bem como do princípio que se extraí das disposições conjugadas dos artigos 63.º, n.º 1 e 65.º, n.º 3 do CPAC, quando o Tribunal considera provados factos controvertidos, não cobertos por prova plena, sem permitir que as partes produzam a prova a que se propõem;
- Existe manifesta contradição entre os actos da Administração, por um lado reconhecendo o direito de aproveitamento das concessionárias, por outro lado, praticando um acto que extingue o direito delas, o que constitui violação manifesta de Princípio de Boa Fé na vertente da proibição de venire contra factum proprium;
- Com o reconhecimento expresso dos direitos que assistem às concessionárias, a Administração provocou o efeito jurídico impeditivo da caducidade, previsto no artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil;
- Existe uma errada interpretação do artigo 103.º da Lei Básica e do artigo 1427.º do Código Civil, pois a Administração, com o seu comportamento, usa o instituto jurídico da caducidade como uma punição sem merecimento, desembocando num efeito jurídico próximo do da expropriação sem compensação, em clara violação do espírito do artigo 103.º da Lei Básica e do artigo 1427.º do Código Civil.

Contra-alegou a entidade recorrida, entendendo que deve ser negado provimento ao recurso.
E o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o douto parecer, no sentido de não merecer censura o acórdão recorrido, que deve ser mantido, negando-se provimento ao recurso jurisdicional.
Foram corridos os vistos.
Cumpre decidir.

2. Factos
Foi considerada provada a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão do recurso:
- As recorrentes são sociedades comerciais sediadas em Macau.
- Pelo Despacho n.º 83/2001, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 37, de 12 de Setembro de 2001, foi autorizada a transmissão onerosa, a favor da Sociedade de Investimento Imobiliário Fu Keng Van, S.A., dos direitos resultantes da concessão por arrendamento do terreno denominado lote C5, situado em Macau, no Fecho da Baía da Praia Grande, Zona C, com a área de 501 m².
- Pelo Despacho n.º 84/2001, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 37, de 12 de Setembro de 2001, foi autorizada a transmissão onerosa, a favor da Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A., dos direitos resultantes da concessão por arrendamento do terreno denominado lote C6, situado em Macau, no Fecho da Baía da Praia Grande, Zona C, com a área de 3131 m².
- Segundo a cláusula segunda dos contratos de transmissão onerosa, os referidos arrendamentos são válidos até 30.7.2016.
- De acordo com o estipulado na cláusula terceira dos contratos, os terrenos seriam aproveitados com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, destinado às finalidades de habitação e estacionamento (para o lote C5), e às finalidades de comércio, habitação e estacionamento (para o lote C6).
- De acordo com n.º 1 da cláusula quinta dos contratos, o aproveitamento do terreno deveria operar-se no prazo global de 72 meses, contados a partir de 18.8.1999.
- Ainda nos termos daquela mesma cláusula, ficou acordado que aquele prazo de 72 meses incluiria os prazos necessários para a apresentação e apreciação de todos os projectos relativos ao aproveitamento dos lotes.
- Segundo a cláusula 10.ª dos contratos, estes regem-se, nos casos omissos, pelo estipulado no contrato de concessão titulado pelo Despacho n.º 73/SATOP/92, com as alterações introduzidas pelos Despachos n.º 57/SATOP/93, 56/SATOP/94, 71/SATOP/99 e pela Lei n.º 6/80/M.
- Em 23.12.2005, as recorrentes apresentaram um requerimento acompanhado de um estudo prévio de aproveitamento conjunto para os lotes C5 e C6.
- Pelo ofício n.º 2277/DURDEP/2006, de 20.2.2006, foram as recorrentes informadas que o estudo prévio apresentado deveria ser rectificado, tendo em conta os pareceres emitidos pelas várias entidades envolvidas na apreciação dos projectos.
- Por despacho do STOP, de 23.1.2006, foi aprovado o Estudo de Alinhamento e Condicionamentos Urbanísticos e o Estudo preliminar de arquitectura relativo ao aproveitamento dos lotes C5 e C6 do Fecho da Baía da Praia Grande.
- Em 13.10.2006, as concessionárias apresentaram um requerimento de alteração do projecto de arquitectura, que foi considerado passível de aprovação pela DSSOPT.
- Em 17.10.2006, a DSSOPT emitiu a licença de obra n.º 600/2006 para o projecto de alteração da rede de drenagem pública nos lotes C5 e C6, depois, em 22.11.2006, foi revalidada a mesma licença com o n.º 675/2006, em 7.3.2007, foi prorrogada a licença e, em 16.7.2007, emitida nova revalidação da mesma licença de obra.
- Em 17.10.2006, foi emitida a licença de obra de vedação dos lotes C5 e C6 n.º 602/2006 e, em 29.11.2006, revalidada a referida licença de obra com o n.º 692/2006.
- Mais tarde, em 23.3.2007, foi emitida a licença de obra de estacas experimentais n.º 171/2007 e, em 29.5.2007, foi emitida a prorrogação da respectiva licença.
- Por requerimento de 1.6.2007, as recorrentes requereram conjuntamente a prorrogação do prazo de aproveitamento dos lotes C5 e C6.
- Em resposta, a DSSOPT notificou as recorrentes, pelo ofício de 9.7.2007, que os projectos apresentados eram passíveis de aprovação, mas que o procedimento administrativo ficava suspenso provisoriamente até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande.
- As recorrentes dos lotes C5 e C6 requereram várias vezes, nomeadamente em 18.4.2007, 7.5.2008 e em 30.6.2008, a emissão de certidões que informassem sobre a existência de obstáculos, constrangimentos ou impedimentos de ordem administrativa que afectassem ou pudessem afectar negativamente os imoveis, bem como os próprios contratos de concessão e, em caso afirmativo, qual a natureza dos referidos efeitos negativos.
- Pelo ofício de 18.9.2007, a DSSOPT notificou as recorrentes que os projectos de especialidade apresentados, pelas concessionárias, em 20.7.2007, em 28 e em 30 de Agosto de 2007, foram considerados passíveis de aprovação.
- Pelo ofício de 5.10.2007, a DSSOPT notificou as recorrentes que o projecto de alteração das obras de fundações apresentado pelas concessionárias, em 19.7.2006, foi considerado passível de aprovação e o pedido de emissão da respectiva licença de obra, de 21.9.2007, ficou condicionado ao cumprimento das condições tituladas no ofício n.º 14506/DURDEP/2007.
- O projecto de alteração da obra de construção apresentado, em 18.10.2007, foi considerado passível de aprovação.
- A Administração mandou proceder a uma consulta pública, entre Julho e Setembro de 2010, sobre o plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande.
- O plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande foi concluído pela DSSOPT em Novembro de 2014.
- Por requerimento de 22.6.2016, as concessionárias solicitaram ao Chefe do Executivo que ponderasse os motivos alegados pelas mesmas e que autorizasse: a suspensão do prazo da concessão por arrendamento dos dois terrenos em causa; a atribuição às concessionárias de novos prazos de aproveitamento dos dois terrenos; e a atribuição de novas concessões, por arrendamento, dos mesmos terrenos ou de outros com as mesmas áreas de construção e capacidade aedificandi.
- Em resposta ao requerimento, foi elaborada pela DSSOPT a seguinte proposta:
“Antecedentes:
1. Através do requerimento de 22 de Junho de 2016, as requerentes referiram que sem deixar os pedidos anteriormente apresentados, solicitando ao Chefe do Executivo que tenha em consideração os motivos alegados pelas requerentes que não são imputáveis às mesmas, e autorize o seguinte: (Anexo 1)
1) Suspensão do prazo de arrendamento dos dois terrenos em causa;
2) Atribuição à requerente um novo prazo de aproveitamento dos dois terrenos, que deve ser, pelo menos, equivalente ao período a contar desde 30 de Novembro de 2007 até à presente data, tempo em que a requerente foi ordenada para a suspensão do aproveitamento dos dois terrenos; e
3) Prorrogação, por uma nova concessão ou de outra forma aplicável, do prazo de arrendamento dos dois terrenos em causa conforme o novo prazo de aproveitamento acima solicitado.
Segundo o despacho do STOP, de 20 de Julho de 2016, exarado na proposta n.º 289/DSODEP/2016, foi autorizado o início do procedimento da audiência escrita. Pelo ofício de 26 de Julho de 2016, a requerente foi comunicada o despacho acima referido, tendo sido fixado um prazo de 10 dias, contados a partir da data da recepção do ofício, para dizer, por escrito, o que se lhes oferecer sobre a referida decisão de intenção. Através do aviso de recepção de Correios, verifica-se que o ofício foi recebido no dia 29 de Julho de 2016.
2. Em 08 de Agosto de 2016, as requerentes apresentaram a estes Serviços a resposta relativa à audiência escrita, aqui se dá por integralmente reproduzido, nela solicitaram à Administração para (1) considerar verificado o facto impeditivo da caducidade das concessões dos lotes C5 e C6 da Zona C e, em consequência prorrogar os prazos daquelas concessões, ou (2) negociar com as ora requerentes sobre novas concessões dos mesmos lotes de terrenos ou de outros dois terrenos nas Zonas B, C ou D do Plano da Baía Grande ou em zona com uma área de construção e capacidade aedificandi equivalentes (nomeadamente em aterros novos), em qualquer dos casos com dispensa de concurso público, o extracto do respectivo teor é o seguinte: (Anexo 2)
“16. Quanto aos fundamentos jurídicos apresentados importa chamar à colação o Relatório, de 15 de Dezembro de 2015, do comissariado Contra a Corrupção, sobre os 16 terrenos cuja caducidade de concessão não foi declarada, onde é mencionado que, caso o aproveitamento do terreno não seja concluído no prazo estipulado por razões imputáveis ao concessionário, a Administração pode a) aplicar multa ao concessionário, e prorrogar o prazo de aproveitamento ou b) declarar a caducidade da concessão e exigir a devolução do terreno, conclusão que demonstra que a declaração de caducidade não é a única via para as situações de terrenos sem aproveitamento nos prazos estipulados.
17. Por outro lado, o Comissariado Contra a Corrupção acrescenta que, quando a falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo estipulado seja imputável à Administração, pode esta não declarar a caducidade da concessão.
18. No cenário ora em análise, é indubitável que a falta de aproveitamento é exclusivamente imputável à Administração, que suspendeu o procedimento do aproveitamento dos terrenos.
19. Como tal, em obediência ao princípio da boa-fé, o Chefe do Executivo devia ter suspendido o prazo de aproveitamento com efeitos a partir da data da decisão que ordenou a dita suspensão provisória.
20. Isto porque o Governo deve respeitar e proteger, como referiu o Chefe do Executivo na sua alocução na Assembleia Legislativa, de 27 de Julho de 2016, os direitos dos concessionários e as expectativas que lhes foram criadas durante os procedimentos de aproveitamento dos terrenos, e um Governo responsável, como pessoa de bem que assume as promessas que faz, deve esforçar-se por interpretar e executar, de acordo com os ditames da boa-fé e com critérios de justiça e razoabilidade, as leis em vigor.
21. A falta de aproveitamento dos lotes de terreno tem origem na decisão do Governo de proteger o Centro Histórico de Macau, facto que originou a suspensão do procedimento de aproveitamento. Como foi notificado às ora requerentes, o reinício do procedimento e a prorrogação do respectivo prazo só se podiam verificar quando fosse aprovada a nova divisão dos lotes de terreno e as condições de planeamento urbanístico das Zonas C e D da Baía da Praia Grande.
22. A este propósito, o artigo 55º da Lei do Planeamento Urbanístico determina que, quando a execução de um plano urbanístico colida finalidade da concessão ou com o aproveitamento de um terreno concedido, o concessionário tem direito, nos termos da Lei de Terras, a requerer a revisão do contrato de concessão ou, tratando-se de concessão onerosa, a transmissão das situações resultantes da concessão, sem prejuízo de ser indemnizado pelos danos que tenha sofrido.
23. No que toca às concessões provisórias a Lei de Terras prevê, nos artigos 139º e 140º, a alteração da finalidade das concessões decorrentes de novos planos urbanísticos e aqui cabe sublinhar que apesar de ainda não existir um novo plano urbanístico, o Governo revogou, em 21 de Agosto de 2006, o Regulamento dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande, tendo informado as concessionárias que, em consequência, iria aprovar um novo plano urbanístico.
24. Assim, o Governo devia, em respeito pelos princípios da justiça, da boa-fé, na sua vertente da tutela da confiança (que se destina a salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações imprevisíveis que abalam a segurança do comércio jurídico), e da eficiência da administração (previstos nos artigos 7º, 8º e 12º do Código do Procedimento Administração), ter imediatamente assumido a responsabilidade pela falta de aproveitamento e ter considerado verificados os requisitos para a alteração da finalidade das concessões.
26. Douto passo, o artigo 48º, n.º 1 da Lei de Terras só proíbe a renovação da concessão provisória, não existindo nenhum obstáculo legal à possibilidade de prorrogação do prazo da concessão.
27. No que respeita à invocada caducidade das concessões, é importante recordar que o Governo se comprometeu perante as ora requerentes, no supra citado Ofício da DSSOPT de 9 de Julho de 2007, a prorrogar o prazo de aproveitamento e a proceder à revisão dos contratos de concessão quando autorizasse o reinício do procedimento administrativo de aproveitamento dos lotes de terreno.
28. Dessa forma, com o reconhecimento expresso dos direitos que assistem às concessionárias, ora requerentes, a Administração provocou o efeito jurídico impeditivo da caducidade, previsto no artigo 323º, n.º 2 do Código Civil.
29. Este preceito determina que quando se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal, impede a caducidade, o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido.
31. Finalmente, faz-se notar que as concessionárias no requerimento de 22 de Junho de 2016 (na sequência dos anteriores requerimentos de 20 de Janeiro, 29 de Abril e 16 de Junho de 2016, que ainda não obtiveram resposta), apresentaram pedidos subsidiários, na legítima expectativa de ser encontrada uma solução que assegure os direitos que a administração lhe tem, desde sempre, reconhecido, como tal formularam os pedidos de novas concessões dos mesmos lotes de terrenos ou de outros dois terrenos nas Zonas B, C ou D do Plano da Baía da Praia Grande ou em zona com uma área de construção e capacidade aedificandi equivalente (nomeadamente em aterros novos), em qualquer dos casos com dispensa de concurso público.
32. A este respeito, permite o artigo 55º, n.º 2, 1), (3) ii) e (4) da Lei de Terras a dispensa de concurso público, quando a concessão se funde no interesse público que favoreça o desenvolvimento da RAEM, designadamente, empreendimentos que se articulem com as políticas do Governo já tornadas públicas na Assembleia Legislativa (recorde-se, novamente, o compromisso assumido publicamente pelo Chefe do Executivo na Assembleia Legislativa), bem como de concessões que se devem enquadrar nos planos urbanísticos promovidos pela Administração (acreditando-se que o Governo irá futuramente aprovar os novos planos urbanísticos para a Baía da Praia Grande).”
Análise:
Respeitante do pedido do verificado o facto impeditivo da caducidade das concessões dos lotes C5 e C6 da Zona C da Baia da Praia Grande e, em consequência prorrogar os prazos daquelas concessões
3. Conforme a disposição no art.º 320º do Código Civil, “o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.” Portanto, o prazo de arrendamento não pode ser suspenso ou prorrogado.
4. Sobre a caducidade da concessão, encontra-se exarado um acórdão do Tribunal de Segunda Instância, do qual refere o seguinte: A nova Lei de Terra prevê duas situações da caducidade da concessão dos terrenos urbanos, a saber: (vide sumário do acórdão n.º 434/2015 do TSI)
1) A falta de aproveitamento dentro do prazo fixado (cfr. art.º 166º da Lei n.º 10/2013); e
2) O termo do prazo da concessão provisória sem que a concessão convertida em definitiva (cfr. art.ºs 48º, n.º 1 e 52º, todos da Lei n.º 10/2013).
- Para a primeira situação, a Lei de Terra permite, a requerimento do concessionário, a suspensão ou prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno sob autorização do Chefe do Executivo, por motivo não imputável ao concessionário e que o Chefe do Executivo considere justificativo (n.º 5 do art.º 104º da Lei n.º 10/2013).
- O que já não acontece para a segunda situação, pois o legislador não prevê outra alternativa para além da caducidade da concessão provisória.
- Uma vez decorrido o prazo da concessão provisória do terreno sem esta ter sido convertida em definitiva, independentemente havendo ou não culpa do concessionário ou prévia declaração da caducidade com fundamento na falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo fixado, verifica-se sempre a caducidade da concessão provisória.
5. Em caso ora análise, uma vez que o prazo de arrendamento já terminou em 30 de Julho de 2016, não pertencendo o caso especial de renovação de concessões provisórias. Assim sendo, nos termos do n.º 2 do artigo 48, as ora concessões provisórias não podem ser renovadas.
Isto é, o caso vertente trata-se de uma situação de caducidade preclusiva, ou seja, uma vez decorrido o prazo da concessão provisória do terreno sem esta ter sido convertida em definitiva, independentemente havendo ou não culpa do concessionário ou prévia declaração da caducidade com fundamento na falta de aproveitamento do terreno dentro do prazo fixado, verifica-se sempre a caducidade da concessão provisória.
6. Quanto ao relatório do CCAC mencionado nos pontos 16 e 17, deve-se salientar que o exemplo citado se aplica a falta de aproveitamento dentro do prazo fixado, nos termos do artigo 166 do Lei de Terras, o qual é diferente do caso em análise, que se aplica “caducidade preclusiva”.
De facto, quanto à “caducidade preclusiva”, segundo a análise do relatório do CCAC, “Quer nos termos da nova ou antiga Lei de Terras, a concessão provisória por arrendamento caduca se no seu termo o aproveitamento do terreno não for concluído, devendo neste caso a Administração Pública declarar a caducidade da concessão nos termos da Lei de Terras. Nos termos da nova Lei de Terras, trata-se de uma norma imperativa que a concessão provisória será declarada caduca no seu termo, a Administração pública deve observá-la rigorosamente. Se ao termo da concessão provisória o aproveitamento do terreno não for concluído, deve a Administração Pública declarar a caducidade da concessão nos termos legais, independentemente de que a não conclusão do aproveitamento do terreno dentro do prazo seja ou não imputável ao concessionário. Nesta situação, não há margem de poder discricionário “para declarar ou não a caducidade.” (pontos 3 e 10, exarados nas páginas 13 e 14 do relatório do CCAC)
7. Quanto à prorrogação do prazo de aproveitamento mencionado nos pontos 26 e 27 do requerimento, o prazo de concessão por arrendamento não pode exceder 25 anos, nos termos do n.º 1 do artigo 47. Como se encontra estipulado no contrato de concessão o prazo máximo de arrendamento de 25 anos, não há margem para prorrogação do prazo de aproveitamento.
Dispensa de concurso público
8. Quanto à dispensa de concurso público mencionado no ponto n.º 32, considerando que os lotes em epígrafe apenas se destinam à construção de edifício com a finalidade de habitação, comércio e estacionamento, afigura-se que não corresponde à situação de dispensa de concurso público prevista n.º 2 do artigo 55º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras».
Conclusão:
9. Em face do exposto, mesmo que os projectos dos lotes tivessem sido considerados passíveis de aprovação e tivessem sido emitidas as licenças de obra de tapume, de ensaio de estacas, e de alteração da rede de drenagem em 2006 e 2007, foram posteriormente suspensos todos os processos de apreciação e aprovação em relação aos projectos de desenvolvimento das zonas C e D da Baía da Praia Grande devido ao “Centro Histórico de Macau”. Ademais, não foi concluído o procedimento de revisão de contrato. Nestes as circunstâncias, tendo em conta que nos termos dos artigos 48º e 167º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras», decorrido o prazo da concessão provisória sem que o aproveitamento do terreno tenha sido concluído, caduca a concessão, assim se submete a presente proposta à consideração superior, a fim de:
9.1 Indeferir o pedido da suspensão do prazo de concessão por arrendamento dos dois terrenos, situados na Zona C da Baía da Praia Grande, designados por C5 e C6, nos termos do n.º 1 do artigo 47º da “Lei de Terras” e do artigo 320º do Código Civil;
9.2 Indeferir, nos termos do n.º 1 do artigo 42º e do n.º 1 do artigo 48º da “Lei de Terras”, o pedido de um novo prazo de aproveitamento dos dois terrenos, que deve ser, pelo menos, equivalente ao período a contar desde 30 de Novembro de 2007 até à presente data, tempo em que as requerentes foram ordenadas para a suspensão do aproveitamento dos dois terrenos, visto que o prazo de concessão já terminou em 30 de Julho de 2016;
9.3 Indeferir o pedido de uma nova concessão dos terrenos em causa ou dos outros terrenos, considerando que não corresponde à situação de dispensa de concurso público prevista no n.º 2 do artigo 55º da “Lei de Terras”;
9.4 Comunicar o despacho desta proposta às requerentes.
À consideração superior.”
- Posteriormente, o Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu, em 21 de Setembro de 2016, o seguinte despacho:
“Concordo.”

3. Direito
Constata-se nos presentes autos que, conforme a estipulação nos contratos de concessão, as concessões dos terrenos em causa são válidos até 30.7.2016, sendo que o aproveitamento dos terrenos deveria operar-se no prazo global de 72 meses, contados a partir de 18.8.1999.
Por requerimento de 22.6.2016, as ora recorrentes solicitaram à Administração para autorizar: a suspensão do prazo da concessão por arrendamento dos dois terrenos em causa; a atribuição de novos prazos de aproveitamento dos dois terrenos; e a atribuição de novas concessões, por arrendamento, dos mesmos terrenos ou de outros com as mesmas áreas de construção e capacidade aedificandi.
Foram indeferidos os pedidos, tendo a Administração fundamentado a sua decisão na disposição dos art.ºs 42.º n.º 1, 47.º n.º 1, 48.º, 55.º e 167.º da Lei n.º 10/2013, considerando a caducidade (preclusiva) das concessões provisórias em causa pelo decurso do prazo das concessões, que terminou em 30 de Julho de 2016, sem que o aproveitamento dos terrenos tenha sido concluído, e a não verificação da situação de dispensa de concurso público prevista no n.º 2 do art.º 55.º da Lei de Terras.
No presente recurso há de apreciar as seguintes questões suscitadas pelas recorrentes:
- Violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade das partes e do disposto nos art.ºs 63.º n.º 1 e 65.º n.º 3 do CPAC;
- Errada interpretação do princípio da boa fé;
- Errada interpretação do art.º 323.º do Código Civil, relativo à invocada existência de uma causa impeditiva da caducidade; e
- Errada interpretação do art.º 103.º da Lei Básica e do art.º 1427.º do Código Civil, por referência ao direito do uso de superfície.

3.1. Violação do princípio do contraditório e do princípio da igualdade das partes e do disposto nos art.ºs 63.º n.º 1 e 65.º n.º 3 do CPAC
Alegam as recorrentes que há violação dos princípios e das normas em causa, quando o Tribunal considera provados factos controvertidos, não cobertos por prova plena, sem permitir que as partes produzam a prova a que se propõem.
Pretendem as recorrentes colocar a questão da produção de prova testemunhal.
Ora, constata-se nos autos que na petição do recurso contencioso foi apresentada a prova testemunhal, com o rol de testemunhas que as recorrentes queriam ser ouvidas.
Sobre a requerida inquirição de testemunhas, o Exmo. Juiz Relator do processo proferiu o despacho no sentido de indeferir a realização da diligência solicitada (fls. 622 e verso dos autos).
Contra tal despacho não reagiram as recorrentes, de modo a apresentar reclamação para a conferência.
Uma vez que não impugnaram oportunamente a decisão de não inquirição de testemunhas, motivo porque o Tribunal Colectivo não chegou a apreciar a questão, que não foi decidida no acórdão ora recorrido, não podem as recorrentes voltar agora a suscitar a apreciação da mesma questão, ainda que a título da violação do princípio do contraditório e do disposto nos art.ºs 63.º n.º 1 e 65.º n.º 3 do CPAC.
E não se vê como foi violado o princípio da igualdade das partes, nem as recorrentes chegaram a explicitar concretamente tal violação.
Dizem ainda as recorrentes que o Tribunal recorrido considera provados factos controvertidos, sem que no entanto tenha indicado quais são.
Na realidade, não se vislumbra, a nosso ver, nenhuma controvérsia entre os factos provados.
Quanto à culpa no não aproveitamento dos terrenos, é verdade que o Tribunal recorrido considera as recorrentes culposas na falta de aproveitamento dos terrenos dentro do prazo de aproveitamento fixado nos contratos de concessão, conclusão esta que tem suporte nos factos provados.
É de frisar que não é essencial a questão de culpa no não aproveitamento dos terrenos no prazo fixado para o efeito, já que com o decurso do prazo máximo das concessões provisórias sem a conclusão do aproveitamento dos terrenos, as mesmas concessões não podem ser renovadas, desde que não se verifique a excepção prevista na lei (art.º 48.º n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 10/2013).
E as concessões caducam no termo do prazo inicial da concessão, que é inicialmente dada a título provisória (art.ºs 52.º e 44.º da Lei n.º 10/2013).
Trata-se duma caducidade-preclusão, como já vimos em acórdãos anteriores proferidos pelo TUI1, caso em que é irrelevante a questão de culpa no não aproveitamento do terreno concedido.
Improcede o argumento das recorrentes.

3.2. Errada interpretação do princípio da boa fé
Na óptica das recorrentes, existe manifesta contradição entre os actos da Administração, por um lado reconhecendo o direito de aproveitamento das concessionárias, por outro lado, praticando um acto que extingue o direito delas, o que constitui violação manifesta de Princípio de Boa Fé na vertente da proibição de venire contra factum proprium.
Invocam uma série de actos praticados pela Administração, face aos requerimentos apresentados pelas recorrentes desde 23 de Dezembro de 2005, bem como as comunicações de serviço interno da DSSOPT, que consideram consubstanciar um reconhecimento de direitos das concessionárias, para demonstrar que a Administração revelou o não aproveitamento dos terrenos no prazo referido nos contratos de concessão e comprometeu-se a aprovar os projectos apresentados para o desenvolvimento dos terrenos em causa.
Alegam ainda que o princípio da boa fé não se aplica só aos casos de exercício de poderes discricionários por parte da Administração mas também nos casos de exercício de poderes vinculados.
Desde logo, salienta-se que é de entendimento uniforme deste TUI que no âmbito da actividade vinculada não se releva a alegada violação do princípio da boa fé (e ainda dos princípios da justiça, da proporcionalidade, da tutela da confiança e da igualdade).2
É ainda de recordar que, no que concerne à declaração de caducidade, por decurso do prazo, da concessão do terreno, é aplicável a nova Lei de Terras (Lei n.º 10/2013), e não a antiga Lei (Lei n.º 6/80/M).3
Face à falta de aproveitamento por parte da concessionária no prazo de concessão, a Administração está vinculada a praticar o acto administrativo, cabendo ao Chefe do Executivo declarar a caducidade de concessão.
É de manter aqui a posição deste TUI, já anunciada em vários acórdãos em que se discute a questão sobre a natureza discricionária ou vinculativa do acto de declaração de caducidade.4
Daí que, nos presentes autos, tem a Administração o dever de declarar a caducidade das concessões dos terrenos em causa, pelo que não há lugar à aplicação do princípio da boa fé.
Por outro lado, quanto às comunicações de serviço interno invocadas pelas recorrentes, nunca poderiam constituir reconhecimento de nenhum direito das recorrentes por parte da RAEM, uma vez que as informações ou opiniões nelas contidas não representam nem obrigam a RAEM, muito menos depois do termo do prazo de arrendamento dos terrenos.
Mesmo os actos praticados pela DSSOPT também nunca poderiam obrigar a RAEM a permitir o aproveitamento dos terrenos depois de ter decorrido o prazo de concessão.

3.3. Errada interpretação do art.º 323.º do Código Civil, relativo à invocada existência de uma causa impeditiva da caducidade
Alegam as recorrentes que, por via dos ofícios n.º 411/DURDEP/2007, de 15 de Março de 2007 e n.º 289/2351 e 2316/DSODEP/2007, de 9 de Julho de 2007, a Administração veio reconhecer o direito de desenvolvimento dos terrenos para além do prazo de aproveitamento estatuído nos contractos de concessão e, com o reconhecimento expresso dos direitos que lhes assistem, a Administração provocou o efeito jurídico impeditivo da caducidade, previsto no art.º 323.º n.º 2 do Código Civil.
E quando a Administração reconhece que o concessionário tem o direito de utilizar o terreno, é impedida de declarar a caducidade do direito de utilização de terreno.
Dispõe o art.º 323.º do Código Civil o seguinte:
Artigo 323.º
(Causas impeditivas da caducidade)
1. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.
2. Quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido.

Constata-se nos autos que, com os ofícios acima indicados, emitidos em consequência dos requerimentos apresentados, as recorrentes foram notificadas que os projectos apresentados eram passíveis de aprovação pela DSSOPT, mas que o procedimento administrativo ficava suspenso provisoriamente até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande.
Ora, também não se nos afigura que a atitude da DSSOPT revelada nos ofícios indicados pelas recorrentes configure, de algum modo, o reconhecimento do direito das recorrentes.
Por outro lado, coloca-se ainda a questão de saber se os direitos da RAEM em causa são ou não disponíveis, pois só há lugar à aplicação do disposto no n.º 2 do art.º 323.º do Código Civil quando estão em jogo direitos disponíveis.5
Improcede o recurso, nesta parte.

3.4. Errada interpretação do art.º 103.º da Lei Básica e do art.º 1427.º do Código Civil, por referência ao direito do uso de superfície.
É verdade que, nos termos do art.º 103.º da Lei Básica, a RAEM “protege, em conformidade com a lei, o direito das pessoas singulares e colectivas à aquisição, uso, disposição e sucessão por herança da propriedade e o direito à sua compensação em caso de expropriação legal”.
No presente caso, há de chamar atenção para a natureza das concessões por arrendamento em causa, dadas a título provisória, natureza que se mantém antes de as concessões se tornarem definitivas, daí que o direito de uso dos terrenos concedidos reveste também a natureza provisória.
Ora, a protecção dos direitos deve ser operada “em conformidade com a lei”.
Os direitos dos concessionários de terrenos previstos nos contratos de concessão devem ser reconhecidos e protegidos no âmbito legal.
Não é de aceitar que, com a protecção consagrada na Lei Básica, os direitos decorrentes dos contratos de concessão mereçam protecção para além do prazo de arrendamento dos terrenos, independentemente da renovação, ou não, das concessões, já que, como é lógico e legal, a protecção desses direitos para além do prazo inicial de arrendamento depende sempre da renovação dos respectivas concessões, efectuada em conformidade com as leis vigentes na altura de renovação, tal como prevê a segunda parte do art.º 120.º da Lei Básica, segundo a qual as concessões de terras renovadas após o estabelecimento da RAEM devem ser tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da RAEM.
Tendo em consideração as disposições nos art.ºs 47.º n.º 1, 48.º n.º 1, 52.º e 166.º da Lei n.º 10/2013, sobre o prazo de validade dos contratos de concessão, sobre a não renovação das concessões provisórias e sobre a consequência legal (de caducidade das concessões provisórias) do não aproveitamento do terreno concedido nos prazos e termos contratuais, bem como a jurisprudência consolidada dos tribunais da RAEM, é de crer que não resta nenhuma dúvida para a declaração da caducidade das concessões dos terrenos em causa, que se opera com o decurso do prazo de arrendamento dos terrenos estabelecidos nos respectivos contratos.
Em consequência, não merece censura a decisão que indeferiu os pedidos de suspensão do prazo de concessão e de atribuição de novo prazo de aproveitamento.
Não se vislumbra a imputada violação do art.º 103.º da Lei Básica nem do art.º 1427.º do Código Civil.

Finalmente e em relação ao pedido de novas concessões dos mesmos terrenos ou de outros terrenos com as mesmas áreas de construção e capacidade aedificandi, é de chamar à colação as normas contidas nos art.ºs 54.º e 55.º da Lei n.º 10/2013, segundo as quais a concessão provisória é precedida de concurso público, salvo casos excepcionais em que este pode ser dispensado.
Ora, não alegam as recorrentes a verificação de alguma das situações previstas no art.º 55.º em que é permitida a dispensa do concurso público.
Daí que não é legalmente possível a concessão directa dos terrenos, pelo que há de ser indeferido o pedido apresentado pelas recorrentes.

4. Decisão
Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso.
Custas pelas recorrentes, com taxa de justiça fixada em 18 UC.

                 Macau, 4 de Abril de 2019
                 
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa
                 
1 Cfr. Ac.s do TUI, de 23 de Maio de 2018, de 6 de Junho de 2018 e de 12 de Dezembro de 2018, nos Processos n.ºs 7/2018, 43/2018 e 90/2018.
2 Cfr. Ac.s do TUI, de 3 de Maio de 2000, Proc. n.º 9/2000, de 11 de Abril de 2018, Proc. n.º 38/2017, de 23 de Maio de 2018, Proc. n.º 7/2018, de 5 de Dezembro de 2018, Proc. n.º 88/2018 e de 12 de Dezembro de 2018, Proc. n.º 90/2018.
3 Cfr. Ac.s do TUI, de 23 de Maio de 2018, Proc. n.º 7/2018 e de 6 de Junho de 2018, Proc. n.º 43/2018.
4 Cfr. Ac.s do TUI, de 11 de Outubro de 2017, Proc. n.o 28/2017, de 23 de Maio de 2018, Proc. n.o 7/2018 e de 6 de Junho de 2018, Proc. n.o 43/2018.
5 Cfr. Ac. do TUI, de 13 de Março de 2019, Proc. n.º 16/2019.
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1
Processo n.º 2/2019