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Processo n.º 59/2019. Recurso jurisdicional em matéria Administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura.
Assunto: Suspensão da eficácia do acto. Interesse de terceiro.
Data da Sessão: 3 de Julho de 2019.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
O requerente da suspensão da eficácia de acto administrativo não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do mesmo Código.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A requereu a suspensão da eficácia do despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, de 14 de Dezembro de 2018, que lhe aplicou a multa de MOP$7.613.500,00 por violação dos deveres contratuais previstos no Contrato de Prestação de Serviços de Gestão das Piscinas situadas nas Ilhas afectas ao Instituto do Desporto.
Por acórdão de 4 de Abril de 2019, o Tribunal de Segunda Instância, (TSI) indeferiu o pedido de suspensão da eficácia do despacho, por entender que não se verificava o requisito de que a execução do acto causasse previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente, dado que este apenas se referiu a interesses de terceiros que poderiam ser afectados pela cessação de actividade por falta de meios financeiros para pagar a multa dos autos e uma outra, no montante de MOP$4.098.000,00, e, por outro lado, não demonstrou o requerente a falta dos mencionados meios para pagamento das multas.
Inconformado, interpõe o requerente A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), defendendo que pode-se prever razoavelmente que se o acto administrativo não é suspenso, o recorrente vai falir porque não consegue pagar a multa de valor elevado, a “SURF HONG” vai quebrar, todos os trabalhadores vão ser expedidos, a autorização de contratação de trabalhadores não residentes vai ser cancelada, vão aparecer mais de cem desempregados na sociedade, o contrato de serviço adjudicado vai ser resolvido, vai ser parada a abertura ao público das piscinas, das praias e das instalações aquárias, nas quais o recorrente presta serviço, a reputação do recorrente e o prestígio comercial da “SURF HONG” vão ser gravemente prejudicados e completamente quebrados, os esforços do recorrente por metade da vida vão ser destruídos e não recuperáveis, o que leva sem dúvida prejuízo de difícil reparação ao recorrente.
O Ex.mo Procurador Adjunto emitiu parecer em que se pronuncia pela improcedência do recurso.

II - Os Factos
Estão provados os seguintes factos:
O requerente explora a empresa comercial “SURF HONG”.
Por despacho de 14 de Dezembro de 2018, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura decidiu aplicar à empresa “SURF HONG” uma multa de MOP$7.613.500,00, por violação dos deveres contratuais previstos no “Contrato de Prestação de Serviços de Gestão das Piscinas situadas nas Ilhas afectas ao Instituto do Desporto”.
O requerente já interpôs, no dia 22 de Fevereiro de 2019, recurso contencioso do referido despacho para o TSI.
Além disso, por despacho de 14 de Dezembro de 2018, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura ainda decidiu aplicar à empresa “SURF HONG” uma multa de MOP$4.098.000,00, por violação dos deveres contratuais previstos no “Contrato de Prestação de Serviços de Gestão das Piscinas situadas em Macau afectas ao Instituto do Desporto” (vide o anexo 1).
No dia 8 de Março de 2019, encontrou-se nas contas bancárias n.º XXXXXXXXXX e n.º XXXXXXXXXXXXX da empresa “SURF HONG” um depósito no valor global de MOP$716.414,32 (vide os anexos 2 e 3).
O requerente criou a empresa “SURF HONG” em 2002, e actualmente, a empresa exerce as actividades de prestação de serviços a companhias (excepto a locação de máquinas e equipamentos), venda a retalho de artigos de desporto, gestão de piscinas, comércio, serviços de limpeza, gestão de instalações balneares, e prestação dos serviços de salvamento (vide o anexo 4).
Até ao 4º trimestre de 2018, o requerente contratou, em total, 57 trabalhadores locais e 48 trabalhadores não residentes (vide o anexo 5).
Em 29 de Março de 2018, o Fundo do Desporto celebrou com o requerente o contrato de “Prestação de Serviços de Gestão das Piscinas situadas nas Ilhas afectas ao Instituto do Desporto”, para a prestação dos serviços de gestão na Piscina do Parque Central da Taipa, na Piscina de Cheoc Van e na Piscina do Parque de Hác-Sá, afectas ao Instituto do Desporto, desde 1 de Janeiro de 2018 até 28 de Fevereiro de 2019.
Além disso, o requerente também é adjudicatário dos serviços de gestão e salvamento de todas as piscinas, praias e instalações aquáticas públicas em Macau, e celebrou os seguintes contratos:
(1) Em 28 de Dezembro de 2017, o Fundo do Desporto da RAEM celebrou com o requerente o contrato para a prestação dos “Serviços de salvamento nas piscinas situadas na Taipa afectas ao Instituto do Desporto”, para a prestação dos serviços nas Piscinas do Carmo e na Piscina Olímpica do Centro Desportivo Olímpico, afectas ao Instituto do Desporto, desde 16 de Outubro de 2017 até 15 de Outubro de 2019;
(2) Em 28 de Dezembro de 2017, o Fundo do Desporto da RAEM celebrou com o requerente o contrato para a prestação dos “Serviços de salvamento nas piscinas situadas em Macau afectas ao Instituto do Desporto”, para a prestação dos serviços na Piscina do Centro Desportivo do Colégio D. Bosco e na Piscina do Cento Desportivo Tamagnini Barbosa, afectas ao Instituto do Desporto, desde 16 de Outubro de 2017 até 15 de Outubro de 2019;
(3) Em 29 de Março de 2018, o Fundo do Desporto da RAEM celebrou com o requerente o contrato para a prestação dos “Serviços de gestão das gaivotas a pedais no espaço Anim’ Arte Nam Van”, para a prestação dos serviços de gestão das gaivotas a pedais no espaço Anim’ Arte Nam Van, afectas ao Instituto do Desporto, desde 1 de Janeiro de 2018 até 30 de Junho de 2020;
(4) A RAEM celebrou com o requerente o contrato de “Prestação de serviços de gestão e salvamento nas praias de Hac Sá e de Cheoc Van” para a Direcção dos Serviços de Assuntos Marítimos e de Água, para a prestação dos serviços de gestão e salvamento nas praias de Hac Sá e de Cheoc Van, afectas à DSAMA, desde 1 de Maio de 2017 até 30 de Abril de 2020;
(5) A Universidade de Macau da RAEM celebrou com o requerente o contrato de “Prestação de serviços de nadador-salvador e de manutenção da piscina da Universidade de Macau”, para a prestação dos serviços de nadador-salvador e de manutenção na piscina da UM, desde 1 de Julho de 2018 até 30 de Junho de 2020.
O requerente atribui mensalmente aos trabalhadores os vencimentos (vide o anexo 8).


III – O Direito
1. As questões a apreciar
O Acórdão recorrido entendeu que, para que a providência cautelar de suspensão de eficácia de actos administrativos pudesse ser decretada seria necessária a verificação cumulativa dos três requisitos previstos no artigo 121.º, n.º 1, do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC). E que não se verificava o requisito segundo o qual a execução do acto causaria ao requerente previsivelmente prejuízo de difícil reparação, pelo que indeferiu o requerido.

2. Prejuízos de difícil reparação
No caso dos autos é requisito da concessão da suspensão de eficácia dos actos administrativos que a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso [artigo 121.º, n.º 1, alínea a), do CPAC].
O recorrente alegou dois tipos de prejuízos de difícil reparação:
- Os da empresa Surf Hong, cujo único activo são depósitos bancários no valor global de MOP$716.414,32, que falirá se tiver de pagar a multa dos autos e a outra, no valor total superior a MOP11.000.000,00;
- Todos os trabalhadores vão ser expedidos, a autorização de contratação de trabalhadores não residentes vai ser cancelada, vão aparecer mais de cem desempregados na sociedade, o contrato de serviço adjudicado vai ser resolvido, vai ser parada a abertura ao público das piscinas, das praias e das instalações aquárias, nas quais o recorrente presta serviço, a reputação do recorrente e o prestígio comercial da “SURF HONG” vão ser gravemente prejudicados e completamente quebrados.
Quanto ao primeiro dos prejuízos, há que salientar que quem foi multada não foi a empresa Surf Hong, que não tem personalidade jurídica, mas o requerente, que é o concessionário das piscinas.
Ora, o requerente, que é quem vai ter de suportar as multas com o seu património, nada alegou quanto a este, pelo que os depósitos afectos à mencionada empresa, são escassos para indiciar a sua própria incapacidade para pagar, que não foi, aliás, alegada.
O outro tipo de interesses, os dos trabalhadores, para além de serem de terceiros, que não cabe serem defendidos pelo requerente, também não se provam, já que o requerente não demonstrou, nem sequer alegou que ele pode falir, já que a Surf Hong não pode falir dado que não tem personalidade jurídica.
Como decidimos no acórdão de 28 de Outubro de 2011, no Processo n.º 56/2011, “os prejuízos de que fala a lei são os prejuízos do próprio requerente ou relativos a interesses seus, que possa vir a defender no recurso contencioso. Estes últimos, serão o caso dos interesses em que um residente de Macau pode actuar como actor popular: os relativos à saúde pública, a habitação, a educação, o património cultural, o ambiente, o ordenamento do território, a qualidade de vida e, em geral, qualquer bem do domínio público (artigo 36.º, n.º 1, do CPAC).
O requerente não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33.º do CPAC, pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC”.
Impõe-se, assim, negar provimento ao recurso.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 6 UC.
Macau, 3 de Julho de 2019.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai
 
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Chan Tsz King




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