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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 20/06/2019 ---------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------------

Processo nº 540/2019
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. d) do C.P.P.M.)

Relatório

1. Por Acórdão datado de 15.03.2019 do Colectivo do T.J.B. decidiu-se condenar A (A), arguido com os sinais dos autos, como autor material da prática em concurso real de 1 crime de “reentrada ilegal”, p. e p. pelos art°s 21° da Lei n.° 6/2004, na pena de 3 meses de prisão, e 1 outro de “resistência e coacção”, p. e p. pelo art. 311° do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 10 meses de prisão, suspendendo-se, porém, a sua execução por 2 anos; (cfr., fls. 116 a 120-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Do assim decidido, vem o Ministério Público recorrer, pedindo – apenas – a revogação da decretada suspensão da execução da dita pena de 10 meses de prisão; (cfr., fls. 129 a 134).

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Respondendo, diz o arguido que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 137 a 139).

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Admitido o recurso com efeito e modo de subida adequadamente fixados, vieram os autos a este T.S.I., onde, em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando pela procedência do recurso; (cfr., fls. 149 a 150).

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Atenta a “questão” a decidir, e tendo presente o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. d) do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de se decidir por “decisão sumária” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” e “não provados” os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 117 a 118-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem o Ministério Público recorrer do Acórdão que condenou o arguido como autor da prática em concurso real de 1 crime de “reentrada ilegal”, p. e p. pelos art°s 21° da Lei n.° 6/2004, na pena de 3 meses de prisão, e 1 outro de “resistência e coacção”, p. e p. pelo art. 311° do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos.

Coloca apenas uma questão, pois que não concorda com a decretada “suspensão da execução da pena”.

Vejamos.

Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Em relação ao transcrito comando legal tem este T.S.I. entendido que “O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 26.04.2018, Proc. n.° 228/2018, de 25.10.2018, Proc. n.° 570/2018 e a Decisão Sumária de 24.04.2019, Proc. n.° 364/2019).

O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo, posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 18.01.2018, Proc. n.° 1/2018, de 12.07.2018, Proc. n.° 534/2018 e de 28.02.2019, Proc. n.° 61/2019).

E, no caso, apresenta-se-nos claro que tem o Exmo. Recorrente razão.

Como pelo Ilustre Procurador Adjunto vem judiciosamente salientado, “No vertente caso, importa realçar que o arguido foi condenado em três processos sucessivamente n.ºCR3-14-0094-PSM, n.ºCR4-14-0229-PSM e o presente n.ºCR1-18-0038-PCC, e a suspensão da execução da pena aplicada a ele no processo n.ºCR3-14-0094-PSM veio ser revogada nos termos da alínea b) do n.º1 do art.54º do CPM (doc. de fls.108 dos autos).
Os factos provados 3º e 4º mostram indubitavelmente que a terceira reentrada ilegal ocorreu em 19/04/2017, e praticou o crime de resistência em 26/04/2017, de outro lado, o consecutivo cumprimento das duas penas aplicadas naqueles dois anteriores processos terminou definitivamente em 28/07/2015 (docs. de fls.111 e 112 dos autos). O que constata que num período menos a dois anos, o arguido voltou a cometer crimes”, notando ainda que, como dos autos se colhe, (cfr., fls. 68), “positiva” não foi a “postura processual do arguido”, que negou os factos.

Nesta conformidade, e certo sendo que lhe assiste todo o “direito” de negar os factos que lhe são imputados – e até de mentir – sem que deva ser prejudicado, importa ter presente que nada obsta a que tal facto seja ponderado em sede de apreciação da “personalidade do arguido”; (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 08.06.2017, Proc. n.° 310/2017, onde se consignou que “Não se nega que lhe assiste, (totalmente), o legítimo direito de “negar os factos pelos quais está acusado”, (e até de mentir em julgamento), porém, e como se mostra evidente, tal postura processual inviabiliza uma eventual consideração quanto à sua consciencialização e reconhecimento do desvalor e do “mal” cometido com o crime e quanto a um arrependimento em relação à sua conduta, tornando, também desta forma, inadequada uma decisão favorável à pretendida suspensão da execução da pena”).

Dest’arte, resultando-nos evidente possuir o arguido uma personalidade com tendência para a delinquência, vista está a solução.

Como decidiu o T.R. de Guimarães:

“I) As razões que estão na base do instituto da suspensão da execução da pena radicam, essencialmente, no objectivo de afastamento das penas de prisão efectiva de curta duração e da prossecução da ressocialização em liberdade.
II) Por isso, se conclui sempre que, desde que seja aconselhável à luz de exigências de socialização, a pena de substituição só não deverá ser aplicada se a opção pela execução efectiva de prisão se revelar indispensável para garantir a tutela do ordenamento jurídico ou para responder a exigências mínimas de estabilização das expectativas comunitárias”; (cfr., o Ac. de 11.05.2015, Proc. n.° 2234/13).

Considerava também Jescheck que: “o tribunal deve dispor-se a correr um risco aceitável, porém se houver sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para aproveitar a oportunidade ressocializadora que se lhe oferece, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico”; (in, “Tratado de Derecho Penal”– Parte General – Granada 1993, pág. 760, e, no mesmo sentido, o Ac. da Rel. de Lisboa de 05.05.2015, Proc. n.° 242/13, e, mais recentemente, da Rel. de Coimbra de 27.09.2017, Proc. n.° 147/15, onde se consignou que “Na formulação deste juízo [de prognose] o tribunal deve correr um risco prudente pois a prognose é uma previsão, uma conjectura, e não uma certeza. Quando existam dúvidas sérias e fundadas sobre a capacidade do agente para entender a oportunidade de ressocialização que a suspensão significa, a prognose deve ser negativa e a suspensão negada”, in “www.dgsi.pt”).

Com efeito, perante a (repetida) insistência na prática de ilícitos criminais por parte de um arguido, (como é o caso), revelando, claramente, não ser merecedor de um “juízo de prognose favorável”, outra solução não existe que não seja uma “medida detentiva”, sob pena de manifestação de falência do sistema penal para a protecção de bens jurídicos e autêntico “convite” à reincidência, (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. de Guimarães de 13.04.2015, Proc. n.° 1/12), impondo-se uma reafirmação social mais “intensa” da validade da norma jurídica violada; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. do Porto de 10.01.2018, Proc. n.° 417/15).

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Em face do exposto, concede-se provimento ao presente recurso, e revoga-se a decisão recorrida na parte em questão.

Custas pelo arguido com a taxa de justiça de 4 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, devolvam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 20 de Junho de 2019

José Maria Dias Azedo
Proc. 540/2019 Pág. 10

Proc. 540/2019 Pág. 11