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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013).-----------------
--- Data: 19/07/2019 --------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Chan Kuong Seng.--------------------------------------------------------------------------

Processo n.º 345/2019
(Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público





DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Inconformada com o despacho judicial proferido em 26 de Julho de 2018 a fls. 358 a 361 do Processo Comum Colectivo n.o CR4-11-0178-PCC do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, na parte em que, diversamente da promoção feita pelo Ministério Público no sentido de emissão de mandados de detenção contra o arguido condenado A para este cumprir a pena de um ano de prisão por que tinha sido condenado inicialmente em primeira instância nesse processo ora em causa, mas com suspensão, por três anos, da sua execução como tal ulteriormente decretada no acórdão de recurso (interposto, pelo arguido, do acórdão condenatório em primeira instância) de 31 de Maio de 2012 do Processo n.o 260/2012, “sob a condição de o arguido, pagar, no prazo de 1 mês, uma indemnização no valor de MOP$5.000,00 a favor da R.A.E.M.”, foi decidido continuarem esses autos a aguardar até ao dia 14 de Junho de 2019 pelo cumprimento dos mandados de detenção outrora já emitidos contra o mesmo arguido para efeitos de ser o mesmo ouvido em juízo acerca da questão de falta do cumprimento, por ele, daquela obrigação de prestação pecuniária, veio a Digna Delegada do Procurador recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), invocando a ainda subsistência da suspensão da prescrição da pena do arguido, e insistindo na necessidade de emissão de mandados de detenção contra o arguido para este cumprir a sua pena de prisão, por o arguido não ter cumprido a condição da suspensão da pena, e a condição da suspensão em causa não poder ser entendida como um dever imposto ao arguido no período da suspensão da pena, aludido mormente no art.o 49.o, n.o 1, alínea c), do Código Penal (CP) (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 364 a 370 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, não foi apresentada resposta em nome do arguido recorrido.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista, parecer a fls. 379 a 380, opinando pela subsistência da suspensão da prescrição da pena do arguido, pelo que deveria o Tribunal a quo notificar o arguido para o ouvir acerca da questão da falta de pagamento da prestação pecuniária em causa ou o mesmo Tribunal, perante a eventual impossibilidade de audição do arguido, tomar decisão sobre a revogação ou não da pena suspensa.
Cabe decidir sumariamente do recurso, nos termos do art.o 621.o, n.o 2, do Código de Processo Civil, ex vi do art.o 4.o do Código de Processo Penal.
2. Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
– o arguido A ficou condenado inicialmente em um ano de prisão efectiva (cfr. o acórdão condenatório em primeira instância, de fls. 189 a 196v dos presentes autos correspondentes);
– o TSI, no acórdão de recurso de 31 de Maio de 2012 de fls. 299 a 305v dos autos, transitado em julgado em 14 de Junho de 2012 (cfr. a nota do trânsito em julgado lavrada a fl. 316), decretou ao mesmo arguido a suspensão da execução da pena, “sob a condição de o arguido, pagar, no prazo de 1 mês, uma indemnização no valor de MOP$5.000,00 a favor da R.A.E.M.”;
– em 18 de Julho de 2012, o Ministério Público promoveu (a fl. 332v) que se passasse mandados de detenção contra o mesmo arguido, para efeitos da audição dele acerca da questão de não prestação pecuniária por ele, promoção essa que foi acolhida por despacho judicial exarado nesse mesmo dia (a fl. 332v);
– passados os mandados de detenção em causa no dia 20 de Julho de 2012 e entregues os mesmos em 24 de Julho de 2012 ao Ministério Público para serem entregues às Polícias para cumprimento (cfr. o processado a fls. 333 a 334), o mesmo arguido ainda não foi detido até 23 de Maio de 2017;
– portanto, o Ministério Público, em 2 de Junho de 2017, promoveu (a fl. 356 a 357) o seguinte a respeito desse arguido: como este nunca chegou a cumprir a condição da suspensão da execução da pena de prisão, isto implicou a que o benefício da suspensão da pena nunca foi concedido, pelo que subsistindo ainda (nos termos dos art.os 114.o, n.o 2, e 117.o, n.o 1, alínea a), do CP, devido à inexistência ainda de decisão judicial que declarasse a necessidade do cumprimento da pena efectiva de prisão por falta da prestação pecuniária por parte do arguido) a suspensão do prazo de quatro anos de prescrição da pena de um ano de prisão em causa, fica sugerida que se dê judicialmente por não feita, pelo arguido, a prestação pecuniária em causa, e como tal se declare a necessidade da execução da pena de prisão, com consequente passagem de mandados de detenção contra o arguido para o efeito;
– sobre essa promoção do Ministério Público, foi exarado despacho judicial de 26 de Julho de 2018 (a fls. 358 a 361), a determinar que os autos continuassem a aguardar até ao dia 14 de Junho de 2019 pelo cumprimento dos mandados de detenção anteriormente passados contra o arguido, porquanto a M.ma Juíza autora desse despacho entendeu que não sendo indispensável proferir decisão por ora para efeitos de determinação do cumprimento da pena de prisão por falta da prestação precuniária por parte do arguido, era de aguardar ainda pelo cumprimento dos mandados de detenção anteriormente emitidos, mas só até ao dia 14 de Junho de 2019, porque nos termos dos art.os 114.o, n.o 1, alínea e), e n.o 2, e 117.o, n.o 1, alínea a), do CP, o prazo da prescrição da pena de um ano de prisão outrora aplicada ao arguido era de quatro anos, contado da data do trânsito em julgado, em 14 de Junho de 2012, da respectiva decisão condenatória, e era de três anos o prazo de suspensão da execução da pena;
– sobre essa decisão judicial, veio recorrer o Ministério Público.
3. De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Segundo o disposto no art.o 49.o, n.o 1, alínea c), do CP, a suspensão da execução da pena de prisão pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente: entregar à Região Administrativa Especial de Macau uma contribuição monetária.
Nos termos do n.o 3 desse artigo, os deveres impostos podem ser modificados até ao termo do período de suspensão sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver conhecimento.
E o art.o 53.o do mesmo Código, sob a epígrafe de “Falta de cumprimento das condições da suspensão”, determina que “Se, durante o período de suspensão, o condenado, culposamente, deixar de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta impostos ou não corresponder ao plano de readaptação social, pode o tribunal: […]” (tudo com sublinhado agora posto).
Atento o teor conjugado dessas disposições legais, a frase “sob a condição de o arguido, pagar, no prazo de 1 mês, uma indemnização no valor de MOP$5.000,00 a favor da R.A.E.M.” então empregue no acórdão de recurso do TSI de 31 de Maio de 2012 de fls. 299 a 305v dos autos, pode ser interpretada como estando a impor (à luz do art.o 49.o, n.o 1, alínea c), do CP) um dever ao arguido durante o período de suspensão da pena de prisão (dever esse que aliás é entendido pelo legislador do CP na epígrafe do art.o 53.o deste próprio diploma como sendo “condição da suspensão”), daí que é de entender que a suspensão da pena já foi decretada por aquela decisão do TSI, já transitada em julgado em 14 de Junho de 2012.
E no tocante à questão do prazo de prescrição da pena:
O prazo de prescrição da pena de um ano de prisão então aplicada ao mesmo arguido ora recorrido é de quatro anos (cfr. o art.º 114.º, n.º 1, alínea e), do CP), contado a partir do trânsito em julgado da decisão aplicadora da pena, ou seja, no caso, a partir do dia 14 de Junho de 2012.
Contudo, o curso deste prazo de prescrição ficou ab initio suspenso, devido à impossibilidade legal de se executar imediatamente a pena de prisão como tal (i.e., de se executar imediatamente a privação efectiva da liberdade do arguido para efeitos de cumprimento da pena de prisão como tal), impossibilidade legal essa que é causada pelas regras próprias do instituto de suspensão da pena de prisão, plasmadas maxime nos art.os 55.º e 54.º do CP. Daí que essa impossibilidade legal de execução da pena de prisão suspensa na execução só verá cessada com o surgimento da decisão judicial determinadora da revogação da suspensão de execução da pena de prisão (cfr. os art.os 117.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 54.º, n.º 1, do CP), sendo de frisar que todo o período de tempo de subsistência dessa causa da suspensão da prescrição (i.e., dessa impossibilidade legal de execução imediata da privação efectiva da liberdade do arguido para efeitos de cumprimento da pena de prisão) não pode ser computado no prazo total máximo da prescrição da pena (cfr. o art.º 118.º, n.º 3, do CP).
In casu, como ainda não há uma decisão judicial revogatória da suspensão de execução da pena de prisão do arguido, a acima analisada impossibilidade legal de execução imediata da pena de prisão ainda subsiste, subsistência esta que naturalmente faz adiar inclusivamente a vinda do termo final do prazo total máximo da prescrição da pena (a que alude o art.º 118.º, n.º 3, do CP).
É, pois, em suma, de revogar o despacho judicial recorrido na parte em que colocou o limite temporal de 14 de Junho de 2019 para o cumprimento dos mandados de detenção outrora emitidos contra o mesmo arguido, devendo os autos prosseguir os seus termos para efeitos de decisão da questão da falta de prestação pecuniária por parte desse arguido.
4. Dest’arte, julga-se parcialmente provido o recurso do Ministério Público, revogando o despacho judicial recorrido na parte em que colocou o limite temporal de 14 de Junho de 2019 para o cumprimento dos mandados de detenção outrora emitidos contra o arguido A, devendo os autos prosseguir os seus termos para efeitos de decisão da questão da falta de prestação pecuniária por parte desse arguido.
Sem custas pelo presente recurso.
Macau, 19 de Julho de 2019.
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Chan Kuong Seng
(Relator)



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