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Processo n.º 123/2019. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrentes: Chefe do Executivo e A.
Recorrido: Consórcio B – C – D.
Assunto: Comissão do acto público do concurso. Contrato relativo à aquisição de bens e serviços para a Administração. Recurso hierárquico necessário.  
Data da Sessão: 29 de Novembro de 2019.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
O recurso hierárquico das decisões da Comissão do acto público do concurso  no procedimento de formação do contrato relativo à aquisição de bens e serviços para a Administração, a que se refere o Decreto-Lei n.º 63/85/M, de 6 de Julho, é necessário, isto é, constitui pressuposto da interposição de recurso contencioso com fundamento nas questões de forma e de procedimento.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
O Consórcio B – C – D, formado pelas empresas B, C e D, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho de 11 de Dezembro de 2017, do Chefe do Executivo, que adjudicou ao consórcio A a prestação dos Serviços de Operação e Manutenção para as Estações de Tratamento de Águas Residuais da Taipa e do Aeroporto Internacional de Macau.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 12 de Setembro de 2019, anulou o despacho recorrido.
Interpõem recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI) o Chefe do Executivo e A, suscitando as seguintes questões:
- Nulidade do acórdão recorrido por oposição entre os fundamentos e a decisão, por se referir ao 5.º concorrente como tendo sido aquele que veio a obter a adjudicação, quando foi o 3.º concorrente; mas o acórdão recorrido anulou a adjudicação ao 3.º concorrente;
- Irrecorribilidade do acto administrativo, visto que das deliberações da Comissão do acto público do concurso cabe reclamação necessária para a própria Comissão, de cuja deliberação caberia recurso hierárquico necessário para a entidade adjudicante e o recorrente não intentou o mencionado recurso hierárquico;
- Não houve violação do ponto 10.1 do Programa do Concurso.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência da nulidade e procedência das restantes questões suscitadas pelos recorrentes.

II – Os factos
O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
 Por despacho do Chefe do Executivo proferido em 10/03/2017, lançado na proposta n.º 53/077/CGIA/2017 (fls. 1 a 3 do PA) – cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais –, foi autorizada a abertura do concurso para Serviços de Operação e Manutenção para as Estações de Tratamento de Águas Residuais da Taipa e do Aeroporto Internacional de Macau;
- Foram superiormente aprovados o Programa do Concurso e o Caderno de Encargos do mesmo – constante de fls. 13 a 320, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais;
- A Comissão de Abertura de propostas do concurso em causa, no âmbito da sua competência, praticou um conjunto de actos, devidamente documentados nas suas actas, constantes de fls. 45 a 52, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais;
- Reproduz-se aqui também o teor das actas e dos relatórios da Comissão da Avaliação de propostas do concurso, constantes de fls. 19 a 36, 54 a 76, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais.

III – O Direito
1. Questões a apreciar
Há que apreciar as questões suscitadas pelos recorrentes.

2. Nulidade do acórdão recorrido
Suscita-se a nulidade do acórdão recorrido por oposição entre os fundamentos e a decisão, por se referir ao 5.º concorrente como tendo sido aquele que veio a obter a adjudicação, quando foi o 3.º concorrente; mas anulou a adjudicação ao 3.º concorrente.
A referência do acórdão recorrido, a fls. 1015, ao 5.º concorrente, como sendo o vencedor do concurso, foi mero lapso material, sem influência na decisão final.
Improcede a questão suscitada.

3. Irrecorribilidade do acto administrativo
No recurso contencioso foram suscitadas questões atinentes às deliberações da Comissão do acto público do concurso, relativas à admissão das propostas dos 3.º e 5.º concorrentes, sendo o primeiro o vencedor do concurso e ora recorrente.
O Consórcio B – C – D, que interpôs o recurso contencioso, reclamou de algumas deliberações da Comissão, designadamente da admissão do 3.º concorrente A, com fundamento em que o programa de serviços apresentado tinha mais de 100 folhas, o que violaria o ponto 10.1 do Programa de Concurso.
A Comissão indeferiu a reclamação.
O Consórcio B – C – D, não interpôs recurso hierárquico do indeferimento da reclamação.
Vejamos.
No acto público do Concurso, para admissão das propostas dos concorrentes, estes poderão reclamar das decisões da Comissão do acto público do concurso, relativas â admissão dos outros concorrentes e a outras questões atinentes ao Programa do Concurso e respectivo anúncio (artigos 27.º e 30.º do Decreto-Lei n.º 63/85/M, de 6 de Julho), que decidirá.
Dispõe o artigo 35.º do mesmo diploma legal:
Artigo 35.º
(Recurso hierárquico)
 1. Das deliberações da comissão sobre as reclamações deduzidas poderá qualquer interessado recorrer para a entidade adjudicante, no próprio acto do concurso, ditando para a acta o requerimento do recurso.
 2. No prazo de dez dias, o recorrente apresentará no Serviço por onde correr o processo do concurso as alegações do recurso.
 3. O recurso deverá ser decidido pela entidade competente no prazo de dez dias a contar da data da entrega das alegações, não podendo proceder-se a adjudicação antes de decorrer esse prazo.
 4. Se for atendido o recurso, praticar-se-ão os actos necessários para sanar os vícios arguidos e satisfazer os legítimos interesses do recorrente, ou anular-se-á o concurso.
Por sua vez, estatui o artigo 6.º:
Artigo 6.º
(Recurso contencioso)
 1. Do acto que resolva a final o concurso cabe recurso contencioso para o Tribunal Administrativo, sem prejuízo do disposto nos n.os 4 e 5 do artigo 18.º do Estatuto Orgânico de Macau.
 2. No recurso contencioso poderão ser discutidos os vícios de forma contra os quais se haja reclamado ou recorrido hierarquicamente sem êxito, desde que a observância da formalidade fosse susceptível de influir na decisão tomada.
Da conjugação destes preceitos resulta claro que o recurso hierárquico das decisões da Comissão do acto público do concurso  no procedimento de formação do contrato relativo à aquisição de bens e serviços para a Administração, a que se refere o Decreto-Lei n.º 63/85/M, de 6 de Julho, é necessário, isto é, constitui pressuposto da interposição de recurso contencioso com fundamento nas questões de forma e de procedimento, dado que, por um lado, não pode decidir-se a adjudicação sem estar decidido o recurso hierárquico, e, por outro, no recurso contencioso só poderão ser discutidos os vícios de forma contra os quais se haja reclamado ou recorrido hierarquicamente sem êxito.
O candidato preterido interpôs recurso contencioso, pretendendo discutir as questões decididas pela Comissão do acto público do concurso, sem que tenha interposto recurso hierárquico das decisões destas, que assim se consolidaram, impedindo o recurso contencioso do acto de adjudicação.
Daí a irrecorribilidade do acto administrativo.


IV – Decisão
Face ao expendido, concedem provimento ao recurso, revogam o acórdão recorrido, decidindo ser irrecorrível contenciosamente o acto administrativo.
Custas pelo recorrente do recurso contencioso, com taxas de justiça nos recursos contencioso e jurisdicional, fixadas, respectivamente em 12 UC e 7 UC.
Macau, 29 de Novembro de 2019.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa




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