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Processo nº 80/2018 Data: 22.01.2020
(Autos de recurso jurisdicional)

Assuntos : Empreitada.
Multa por atraso na conclusão das obras.
Acção sobre contrato administrativo.
Recurso contencioso.
Prazo.


SUMÁRIO

1. A decisão administrativa que aplica uma multa à empreiteira por atraso na conclusão da obra é passível de ser impugnada através de uma “acção sobre contrato administrativo” ou por “recurso contencioso”, podendo este, (verificadas certas circunstâncias), ser deduzido – enxertado – na referida acção.

2. Optando-se por esta forma para reagir à decisão – propondo uma “acção administrativa” na qual deduz também o “recurso contencioso” – ter-se-á de observar os prazos para a apresentação de cada um dos respectivos meios processuais.

3. Sendo, no caso, de 30 dias o prazo para a interposição do “recurso contencioso”, este, ainda que deduzido em “acção administrativa” tempestivamente proposta, é extemporâneo se decorrido estiver o aludido prazo.

O relator,

José Maria Dias Azedo

Processo nº 80/2018
(Autos de recurso jurisdicional)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância datado de 24.05.2018, (Proc. n.° 2/2016), rejeitou-se o recurso contencioso pela “A”, (“甲”), interposto do acto administrativo praticado pelo CHEFE DO EXECUTIVO, datado de 29.03.2010, que apreciando uma reclamação pela recorrente apresentada, manteve a aplicação da multa por atraso na conclusão das obras na “Empreitada de Remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto”; (cfr., fls. 1480 a 1491 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Inconformada com o decidido, traz a mesma recorrente o presente recurso, e, nas suas – extensas – alegações, produz as seguintes conclusões:

“1. Relativamente à “omissão de pronúncia”, no acórdão do TSI refere:
“Ora, é de verificar que a Recorrente foi notificada do acto em 09/04/2010, mas só veio impugná-lo contenciosamente em 04/10/2010, fazendo-o em cumulação com uma acção sobre contrato instaurado no TA, da qual veio extrair certidão para autonomizar o recurso contencioso na sequência do acórdão uniformizador de jurisprudência de 01/07/2015”.
2. Isto não corresponde a verdade, quanto à intempestividade do recurso interposto após o prazo legal, a recorrente já por várias vezes referiu que foi a entidade administrativa (IDM), na sua notificação constante nas fls. 616 dos autos, forneceu informação errada, que por sua vez originou a presente situação.
3. Em 09/04/2010, a recorrente recebeu a notificação do IDM sobre a multa por atraso na “Obra de Remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto”, com o seguinte conteúdo fundamental:
“Comunicamos a V. Exas. que por despacho de S. Exª o Chefe do Executivo de 29/03/2010, na proposta analisada por este Instituto, para cujo conteúdo se remete, foi indeferida a reclamação apresentada contra o anterior despacho de 12/02/2010.
Assim, mantém-se a multa aplicada nos precisos termos que constam do referido despacho de 12/02/2010.
Mais se informa que o presente indeferimento não inibe V. Exªs de discutir a matéria da reclamação em acção própria a intentar no Tribunal Administrativo no prazo de cento e oitenta (180) dias, nos termos das disposições conjugadas nos artºs 29º do DL nº 74/99/M de 8 de Novembro, 113º e seguintes do CPAC e 30º da Lei nº 9/1999 de 20 de Dezembro” (vide fls. 616 dos autos)
4. Nessa notificação indica que não inibe a recorrente de discutir a matéria da reclamação em acção própria a intentar no Tribunal Administrativo no prazo de cento e oitenta (180) dias, mas não refere se admite ou não recurso contencioso, nos termos do artº 70º, al. d) do CPAC, contra o acto administrativo. Segundo a notificação emitida pela entidade administrativa que padece de erro, foi suficiente para a recorrente julgar que tinha apenas 180 dias para intentar acção específica ao tribunal (acção sobre contrato administrativo) e que podia sobre toda a matéria constante na notificação proporcionar suficientemente meio de deduzir defesa.
5. A recorrente em 04/10/2010 intentou acção sobre contrato administrativo ao TA, na altura solicitou para:
1. Declarar a não violação pela recorrente do “contrato para a execução da empreitada da obra de remodelação do edifício administrativo da ala oeste do Instituto do Desporto celebrado entre A e a RAEM”, bem como declarar nula ou anulável a multa aplicada à recorrente;
2. Condenar a entidade recorrida no pagamento da quantia de MOP$6.928.817,00, incluindo:
(1) As despesas da obra de remodelação do edifício administrativo da ala oeste do Instituto do Desporto no valor: MOP$6.289.628.60;
(2) Despesas devido às obras adicionais no valor: MOP639,189.00;
3. Pagar razoavelmente as custas de procuradoria, calculadas nos termos do artº187º, nº 1 da Lei nº 74/99/M, acrescidas de juros de mora até integral pagamento.
Pedido subsidiário
Caso os Mmº Juízes consideram que o atraso foi por culpa da recorrente, requeira que decretam o seguinte:
1. De acordo com o princípio da equidade reduzir a multa aplicada por causa das obras adicionais e de alteração exigidas pelo IDM à recorrente e que devido a razões imprevisíveis e por força maior causaram o adiamento e atrasos das obras, determinando o seu valor posterior a essas datas; e
2. Pagamento da multa pela B, na qualidade da entidade recorrida chamada a intervir no processo, uma vez que a responsabilidade de pagamento lhe foi transferida por apólice de seguro nela adquirida. (Vide fls. 43 a 44 dos autos)
6. Após terminada a fase dos articulados, o Exmo. Juiz do TA proferiu despacho constante nas fls. 789 a 791 dos autos, declarou incompetência do TA para apreciar os pedidos principal e subsidiário formulados pela recorrente. A recorrente inconformada com a respectiva decisão, interpôs recurso ao TSI em 27/02/2012 (vide fls. 795 a 812 dos autos), recurso nº 410/2012
7. O venerando colectivo do TSI proferiu acórdão no dia 22/02/2012, decretou que a jurisdição para julgamento de todos os pedidos constantes nos autos deve ser exercida pelo TA que lhe compete apreciar o pedido principal da acção sobre o contrato administrativo. (vide fls. 840 a 847 dos autos).
8. Depois de baixado o processo, o Mmº Juiz do TA proferiu despacho nas fls. 851v dos autos:
“Com todo o devido respeito pelo entendimento jurídico da recorrente, acredita-se que os factos e os pedidos formulados pela recorrente na sua petição inicial, tem evidentemente a ver com a decisão da multa aplicada pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo, de acordo com o artº 113º do CPAC, esta parte tem de necessariamente ser impugnada através de recurso contencioso, ou em cumulação a acção sobre contrato administrativo e o recurso contencioso (já foi solicitado a anulação ou declaração de nulidade ou inexistência jurídica da decisão tomada pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo, face à aplicação da multa – vide nº 3 do artigo supracitado e fls. 14 do acórdão do TSI n.º 410/2012).
Assim sendo, entendo que a petição inicial há necessidade de sanação, isto é, na parte especialmente envolvida com a decisão do Exmº Senhor Chefe do Executivo proceder à sanação conforme o procedimento formal do recurso contencioso, a fim de corresponder com o alegado pelo venerando TSI, a citação do autor para sua melhor defesa.
Notifique a recorrente para no prazo de 10 dias proceder à sanação, caso contrário poderá eventualmente decretar que surgiu no presente caso, erro na forma de processo.”
9. Tal despacho fez com que a recorrente tivesse que interpor recurso contencioso fora do prazo, porque senão poderia eventualmente decretar erro na forma de processo. Ao mesmo tempo também compreende que talvez o TA não tenha competência para julgar o acto administrativo impugnado sobre a parte da decisão da multa aplicada pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo, contudo, para que a acção possa continuar com sucesso, a recorrente teve de proceder à sanação conforme alegado no despacho, e em 21/01/2013 apresentou ao TA nova petição com a seguinte cumulação de pedido:
1. Declarar que a recorrente não violou o “contrato para a execução da empreitada da obra de remodelação do edifício administrativo da ala oeste do Instituto do Desporto celebrado com a entidade recorrida”.
2. Declarar a anulação ou declaração de nulidade do despacho proferido pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo em 29 de Março de 2010 que indeferiu a reclamação por si apresentada, mantendo o despacho que aplicou à recorrente a multa diária de MOP$ 30.000,00.
3. Condenar a entidade recorrida no pagamento da quantia de MOP$6.928.817,00, incluindo:
(1) As despesas da obra de remodelação do edifício administrativo da ala oeste do Instituto do Desporto no valor: MOP$6.289.628.60;
(2) Despesas devido às obras adicionais no valor: MOP639,189.00;
4. Pagar razoavelmente as custas de procuradoria, calculadas nos termos do artº187º, nº 1 da Lei nº 74/99/M, acrescidas de juros de mora até integral pagamento.
Pedido subsidiário
Caso os Mmº Juízes consideram que o atraso foi por culpa da recorrente, requeira que decretam o seguinte:
1 De acordo com o princípio da equidade reduzir a multa aplicada por causa das obras adicionais e de alteração exigidas pelo IDM à recorrente e que devido a razões imprevisíveis e por força maior causaram o adiamento e atrasos das obras, determinando o seu valor posterior a essas datas; e
2 Pagamento da multa pela B, na qualidade da entidade recorrida chamada a intervir no processo, uma vez que a responsabilidade de pagamento lhe foi transferida por apólice de seguro nela adquirida. (vide fls. 915 a 916, pedido de recurso contencioso cumulado com acção)
10. Em 03/05/2013, o Mmº Juiz do TA proferiu despacho de saneador, alegando que “com base no fundamento supracitado, quer seja “acção” ou “recurso contencioso” por cumulação, deve continuar com o procedimento”, que se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos. (vide fls. 1031 a 1036)
11. A recorrente inconformada com a decisão do despacho saneador de que “o TA não tem competência para julgar o pedido apresentado pela B”, pelo que interpôs recurso ao venerando TSI em 21/05/2013 (vide fls. 1068 a 1085 dos autos, processo de recurso nº 601/2013).
12. A entidade recorrida Exmº Senhor Chefe do Executivo inconformado com o despacho saneador sobre a parte da competência, interpôs recurso ao TSI em 27/06/2013, com o mesmo número de processo de recurso.
13. Em 25/09/2014, o TSI proferiu acórdão, negou provimento ao recurso da recorrente e da entidade recorrida, mantendo o acórdão recorrido, a entidade recorrida, o Exmº Senhor Chefe do Executivo inconformado com a decisão do TSI, veio dela interpor recurso em 13/10/2014 ao TUI, com “fundamento de haver oposição entre os acórdãos colectivos”, processo de recurso nº 126/2014.
14. O TUI proferiu acórdão em 01/07/2015, uniformizou a seguinte jurisprudência:
“Não é possível a cumulação de pedidos prevista no art.º 113.º n.º 3 do CPAC, se para os respectivos pedidos forem competentes tribunais de grau hierárquico diverso, pelo que o TA não tem competência para conhecer do pedido deduzido em acção sobre contractos administrativos de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato, cujo julgamento em primeira instância cabe ao TSI.”
15. Depois de baixado o processo, em 16/11/2015, a recorrente recebeu por via postal a notificação do despacho proferido pelo Mmº Juiz constante nas fls. 1139 dos autos do TA, com conteúdo seguinte:
“Tendo em conta a uniformização de jurisprudência pelos Mmºs Juízes do TUI no processo nº 126/2014 (vide fls. 480 a 517, processo em anexo nº 138/10-CA/A): “Não é possível a cumulação de pedidos prevista no art.º 113.º n.º 3 do CPAC, se para os respectivos pedidos forem competentes tribunais de grau hierárquico diverso, pelo que o TA não tem competência para conhecer do pedido deduzido em acção sobre contractos administrativos de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato, cujo julgamento em primeira instância cabe ao TSI”, assim sendo, o presente Tribunal não tem competência para julgar o pedido formulado pela recorrente na petição inicial (vide fls. 854 a 912 dos autos) sobre “anulação ou declaração de nulidade do despacho proferido pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo em 29 de Março de 2010 que indeferiu a reclamação por si apresentada, mantendo o despacho que aplicou à recorrente a multa diária de MOP$ 30.000,00 desde 6 de Março de 2009 até à conclusão das obras, pedindo que fosse declarado nulo ou anulável o acto administrativo em causa”, nos termos do artº 1º CPAC, com remissão para o artº 33º, nº 1 do CPC, extrai-se certidão e remete juntamente com o processo administrativo ao TSI para julgamento.
Ao mesmo tempo, atendendo que no despacho de fls. 1121 dos autos, pronunciou-se a existência de relação prévia face ao primeiro e segundo pedidos da recorrente, (segundo pedido compete ao TSI julgar), pelo que foram notificadas as partes da acção para opinar se devem ou não continuar com o seguimento do presente processo.”
16. A recorrente depois da questão de opinar se deve ou não continuar com o seguimento do presente processo, recebeu em 02/12/2015 por via postal a notificação do despacho do processo de recurso sobre o contrato administrativo nº 138-10.CA de fls. 1145 proferido pelo TA, com conteúdo seguinte:
“O presente tribunal decide suspender o processo até o Tribunal competente tomar decisão definitiva do recurso contencioso sobre a multa aplicada pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo.”
17. Entende a recorrente que tanto o aspecto de direito como doutrina e jurisprudência, o direito da recorrente interpor recurso contencioso ainda não foi caducado.
18. Conforme consta na notificação nº 1866/DFED/2010 emitida pelo IDM em 09/04/2010, sobre meio de deduzir defesa indica: “pode, nos termos do art.º 219.º do D.L n.º 74/99/M, de 8 de Novembro, conjugado com o art.º 113.º e seguintes do CPAC, bem como o art.º 30.º da Lei n.º 9/1999 de 20 de Dezembro, dentro do prazo de 180 dias, intentar acção específica para argumentar a matéria quanto à reclamação”, na qual não refere outros meios de deduzir defesa (como por exemplo recurso contencioso).
19. Na verdade, a recorrente cumpriu o prazo indicado na respectiva notificação e em 04/10/2010 intentou acção sobre contrato administrativo ao TA.
20. Tal como foi referido, sobre a questão da competência foi apreciada por tribunais de grau hierárquico diverso, enfim, o TUI proferiu acórdão uniformizador de jurisprudência em 01/07/2015 e publicou no BO nº 30 da 1ª série de 27/07/2015, afirmando que o TA não tem competência para conhecer do pedido, deduzido em acção sobre contractos administrativos, de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos a formação e execução do contrato, cujo julgamento em primeira instância cabe TSI.
21. Nos termos do artº 2º do CPAC, a todo o direito subjectivo público ou interesse legalmente protegido corresponde um ou mais meios processuais destinados à sua tutela jurisdicional efectiva, bem como os procedimentos preventivos e conservatórios necessários para acautelar o efeito útil de tais meios. Caso entender que foi extinta o direito de recurso contencioso do presente processo, bem como, não é possível fazer a cumulação da acção sobre contrato administrativo com o recurso contencioso, então a recorrente não tem quaisquer meios de deduzir defesa contenciosa, isto certamente é privar o direito processual que um particular devia ter, estando assim a violar o princípio da tutela judicial efectiva.
22. Além disso, nos termos do artº 9º, nº 2 do CPA, a Administração Pública “é responsável” pelas informações prestadas por escrito aos particulares, ainda que não obrigatórias.
23. Esta situação ocorreu-se por informação errónea dada pela entidade administrativa, pelo que a recorrente não deve ficar lesada por causa do erro cometido pela entidade administrativa. Assim como, o Mmº Juiz do TA face ao proc. nº 138/10-CA de acção sobre contrato administrativo proferiu despacho saneador em 03/05/2013, relativamente à questão “se houve ou não intempestividade do recurso contencioso” alegada no presente processo, tomou a seguinte decisão:
“(…) Salvo melhor opinião e sempre respeitando, o presente tribunal embora concorda que o particular também tem a obrigação de garantir que a acção seja intentada antes da caducidade do prazo, mas a notificação supracitada, de facto, foi explicita em indicar que o direito de intentar acção é no prazo de 180 dias, isto foi suficiente para que o interessado pensasse que tinha certamente 180 dias de intentar acção específica para argumentar a matéria quanto à reclamação.
O presente Tribunal entende que o particular não agiu com culpa indesculpável, porque foi por influência do teor da notificação que intentou acção fora do prazo. Nestes termos, segundo o princípio da tutela judicial efectiva, o presente tribunal considera que o particular não deve ficar lesado por causa da informação errónea dada pela entidade administrativa, nem deve decretar intempestividade da acção judicial no prazo indicado pela entidade administrativa.
Face a isto, este tribunal julga improcedente a excepção."
(vide fls. 1034 e 1035, o sublinhado é nosso)
24. Devido à informação errónea constante na notificação emitida pela entidade administrativa, causou a que o interessado exercesse o seu direito de intentar acção fora do prazo legal, ora sobre a questão se o tribunal deve ou não aceitar, na obra do Sr. Fong Man Chong, Manual de Direito Processual Administrativo de Macau I – Recurso Contencioso e Suspensão da Eficácia do Acto Administrativo, é da opinião seguinte:
“Da nossa posição entendemos que sim, porque a informação dada pela entidade administrativa induziu o interessado em erro, segundo o princípio da boa-fé, não há razão alguma para o interessado ou pessoa normal duvidar errónea ou incorrecta a informação dada pela entidade administrativa.”
25. No acórdão de recurso do TUI nº26/2004, face às questões de existência de erro de notificação da entidade Administrativa e se deve ou não contar de novo o prazo para recurso contencioso, citou a seguinte opinião preciosa:
“Se a notificação da Administração Pública induzir o particular, que não agiu com culpa indesculpável, no erro de que do acto ainda não cabia recurso contencioso, deve permitir a contagem do novo prazo para a sua interposição com fundamento na anulabilidade do acto.” (o sublinhado é nosso)
“(…)
De facto, na notificação não referiu se da decisão cabia ou não recurso contencioso. Mas, ao indicar nela a possibilidade de recorrer administrativamente, parece dar a entender que do acto ainda não cabia recurso contencioso.
A Administração deve dar informação correcta aos particulares nas actividades mantidas com estes. Conforme o art.º 9.º, n.º 2 do CPA de 1999, “a Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos particulares, ainda que não obrigatórias.”
A propósito da informação errada sobre recursos administrativos:
“Da identificação errónea, na notificação, do órgão competente para apreciar a impugnação administrativa que se queria deduzir contra o acto notificado, resultam necessariamente consequências jurídicas.
Por um lado, abre-se novo prazo de impugnação a partir do momento em que o interessado tomou conhecimento oficial de se ter dirigido ao órgão incompetente (ou, então, reporta-se a impugnação que se faça perante o órgão competente, à data da entrada da impugnação errada); por outro lado, a Administração constitui-se, perante os interessados, em responsabilidade pelos prejuízos que para eles daí derivem.”
No presente caso, face ao erro induzido pela Administração, não é de exigir aos recorridos a tomar iniciativa de saltar logo para a fase contenciosa de impugnação.
Assim, se os recorridos pretenderem ainda interpor recurso contencioso contra o acto do Director dos Serviços de Saúde com fundamento na sua anulabilidade, o respectivo prazo deve começar a correr só a partir do trânsito do presente acórdão.”
26. O mais importante foi que o Director do IDM aquando emitiu a notificação, entendeu que o acto administrativo notificado, praticado pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo em 29/03/2010 era insusceptível de recurso contencioso, vide declarações por escrito prestadas pelo director do IDM nas fls. 1334 a 1340 dos autos:
“(…) acresce que, salvo melhor opinião, o despacho do Exmº Senhor Chefe do Executivo de 29/03/2010, trata-se de um acto confirmativo do acto administrativo praticado pelo mesmo em 12/02/2010 (vide ofício nº 1866/DPED/2010 – Doc. 69 junto com a p.i fls. 610). Pelo que o signatário entende que este acto não era susceptível de recurso contencioso e, como tal, não havia fundamento ou motivo para indicar qualquer recorribilidade do acto que, no caso, inexistia.”
(vide fls. 1338, o sublinhado é nosso)
27. Na verdade, tanto o despacho do Exmº Senhor Chefe do Executivo proferido em 12/02/2010 como em 29/03/2010, ambos não cumpriram o disposto no artº 70º, al. d) do CPA, indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso, ora vamos ver o despacho proferido pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo em 12/02/2010:
“Notifica a V. Ex.ª que junto se remete o conteúdo do despacho de 12 de Fevereiro de 2010 da Sua Ex.ª o Chefe do Executivo: Devido ao atraso na conclusão da obra, determina-se a multa estipulada no n.º 2 do art.º 4º do contrato de empreitada. Face ao período de 6 de Março de 2009 a 26 de Novembro de 2009, aplica-se uma multa de sete milhões e novecentas e oitenta mil patacas (MOP7.980.000,00), à multa diária de trinta mil patacas (MOP30.000,00), mas não prejudica o cálculo das multas por atraso ulteriores à data supracitada.
Mais se notifica V. Ex.ª que pode, dentro do prazo de 15 dias contado a partir da data de notificação, apresentar reclamação ao autor do despacho e pode por via judicial nos termos do art.º 219.º e seguintes do DLn.º74/99/M submeter ao TA.”
(vide fls. 372 dos autos, anexo 54)
28. Tanto o despacho do Exmº Senhor Chefe do Executivo proferido em 12/02/2010 como em 29/03/2010, ambos não cumpriram o disposto no artº 70º, al. d) do CPA, indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso, evidentemente que essas duas notificações violaram a lei. Além do mais, os pedidos/pareceres nº 03/GP/2010 e nº 033/DPED/2010 autorizados nos dois despachos, quer sejam os fundamentos sobre o período da multa, de fato e de direito são diferentes, não houve relação jurídica de acto confirmativo entre eles. (vide fls. 372 a 376 e 617 a 620 do autos). Ao invés, o acto administrativo posterior é continuação do acto anterior, ao mesmo tempo, padece do vício de não ter concedido à recorrente oportunidade de deduzir a sua defesa, designadamente sobre “a data da conclusão da obra”. (artº 207º do DL nº 77/99/M)
29. O acórdão recorrido não considerou que foi por informação errónea dada pela entidade administrativa recorrida conduziu a que a recorrente não interpôs tempestivamente o recurso contencioso; ao mesmo tempo na petição inicial e alegações constantes no presente processo, foram julgados por várias vezes os fundamentos de facto e de direito sobre a tal situação. Nos termos do artº 1º do CPA com remissão para o artº 571º, nº 1, al. d) do CPC, o Mmº Juiz não pronunciou sobre a questão que devia apreciar, em termos de direito contencioso designa por omissão de pronúncia (vide acórdão do TUI nº 24/2007), trata-se de nulidade da sentença.
30. Devendo declarar nulidade do acórdão recorrido por ter violado o previsto no artº 571º, nº 1, al. d) do CPC, julgar procedente o presente recurso, substituindo-o pelo acórdão da 1ª instância que julgou procedente o recurso contencioso da recorrente, ordenando para que o TSI recorrido continue com o julgamento do presente processo até final, ou declarar a contagem do prazo para este recurso contencioso seja a partir do trânsito em julgado do acórdão deste colectivo.
31. Aquando da notificação do acto punitivo, para além de não ter referido o valor concreto da multa, ao mesmo tempo, foi alterada a contagem do prazo da multa sem ter concedido à recorrente oportunidade de deduzir a sua defesa, no pedido da recorrente constante na petição inicial de fls. 860 a 919 dos autos, na resposta do Tribunal de fls. 1231 a 1242 e nas alegações de caracter facultativo de fls. 1401 a 1449, foram ditas várias vezes para declarar a “nulidade” do acto administrativo exercido pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo (123º, nº 2 do CPA, o conhecimento oficioso da nulidade pelo tribunal), nos termos do artº 25º, nº 1 do CPAC, o direito de recurso de actos nulos ou juridicamente inexistentes não caduca, podendo ser exercido a todo o tempo.
32. A recorrente empreitou a obra em causa pelo preço de MOP$31,448,143.00 (não incluía as obras adicionais no valor de MOP$639,189.00), na qual ainda não foi pago à recorrente o valor de MOP$6,928,817.60, isto é, a recorrente apenas recebeu a quantia de MOP$25,158,515.00, mas “ainda não foi confirmado o valor da multa”.
33. Segundo a notificação de fls. 372 a 373 e o despacho de concordância de fls. 373 dos autos, a multa contada desde 06/03/2009 a 26/11/2009, é no valor de MOP$7,980,000.00, não excluindo a continuação do cálculo das multas por atraso ulteriores à data supracitada; “a recorrente aquando apresentou a reclamação não sabia de facto o valor concreto da multa que lhe iria aplicar.”
34. Isto é, o cálculo da multa diária de MOP$30,000.00 aplicada na altura, é uma “multa de valor incerto” (acto administrativo punitivo), isto evidentemente violou o direito fundamental do arguido e o artº 122º, nº 2, al. d) do CPAC.
35. O acórdão recorrido reconheceu erradamente que a entidade recorrida já tinha referido claramente que a partir da data da conclusão da obra podia fazer mera liquidação definitiva do valor da multa, mas de facto, na data em que a recorrente apresentou a reclamação (10/03/2010), o IDM ainda não considerou concluída a obra.
36. Se for de acordo com o entendimento do Tribunal recorrido, tal decisão de punição inclui reconhecimento “tácito” do valor da multa, nos termos do artº 113º, nº 2 do CPAC, aquando da indicação do acto administrativo disposto no nº 1, devem ser enunciadas de forma clara, precisa e completa de modo a poderem determinar-se inequivocamente o seu sentido e alcance e os efeitos jurídicos do acto administrativo. Nos termos do artº 122º, nº 1 do CPA, são nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais.
37. Além do mais, a decisão da multa diária de MOP$30,000.00 contada desde 06/03/2009 a 14/03/2010, foi tomada por despacho de 12/02/2010, sendo manifestamente uma “alteração substancial” e tal decisão só foi notificada a recorrente através do ofício datado em 9/04/2010, pois tal “alteração substancial” não concedeu ao defensor oportunidade de deduzir defesa. Nos termos do artº 122º, nº 2, al. d) do CPA, são nulos os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental.
38. Requeira ao venerando TUI para nos termos do artº 123º, nº 2, al. d) do CPA, declarar oficiosamente a nulidade ou inexistência jurídica do acto punitivo.
39. Reconheceu erradamente o acto recorrido como sendo irrecorrível, no acórdão recorrido refere:
“Vistas as coisas noutra perspectiva, ainda que se toma como decisão final o teor da última notificação (para notificar a decisão de 29/03/2010), que foi feita mediante o ofício de 09/04/2010 (fls. 616), para efeitos da contagem do prazo da interposição do recurso, este só veio a ser interposto em 04/10/2010, obviamente já passaram muito mais do que 30 dias, prazo estipulado no artº 25º/2 do CPAC. Acresce ainda uma outra particularidade nesta parte, que é a de que este último acto é um acto confirmativo de um outro anterior, como tal é irrecorrível.”
(fls.1489 v, o sublinhado é nosso)
40. Sobre “acto meramente confirmativo”, nos termos do artº 31º do CPAC:
1. O recurso é rejeitado com fundamento na natureza meramente confirmativa do acto recorrido quando o acto confirmado tenha sido objecto de notificação ao recorrente, de publicação imposta por lei ou de impugnação administrativa ou contenciosa interposta por aquele.
2. O acto que decida impugnação administrativa necessária não tem, para os efeitos do disposto no presente Código, natureza meramente confirmativa.
41. Sobre se é recorrível, o despacho proferido pelo Senhor Chefe do Executivo em 29/03/2010, o Mmº Juiz do TA, no despacho saneador do proc. nº 138/10-CA de acção sobre o contrato administrativo, face à excepção apresentada pela entidade administrativa chegou decretar:
“Dos elementos constantes nos autos, o Exmº Senhor Chefe do Executivo proferiu despacho respectivamente em 12/02/2010 e 29/03/2010.
Dado que envolve a qualificação de um acto posterior se pode ou não ser meramente confirmativo e como tal irrecorrível, pelo que o presente Tribunal através do despacho constante nas fls. 998 e verso dos autos solicitou à recorrente do recurso contencioso para se pronunciar.
De facto, o despacho do Exmº Senhor Chefe do Executivo proferido em 29/03/2010 surgiu em virtude de a recorrente do recurso contencioso ter apresentado reclamação (alegações de caracter facultativo) face ao despacho de 12/02/2010.
No despacho de 29/03/2010, procedeu-se à análise de 10 impugnações apresentadas pela recorrente na sua reclamação, na qual foi analisada uma por uma, indicando o ponto de vista da rejeição de tais fundamentos.
Como o despacho de 29/03/2010 em relação ao anterior, não só rejeitou a reclamação, assim como surgiu factos novos e opinião jurídica, pelo que conclui o presente Tribunal que não se trata de acto meramente confirmativo.
Com base nisso, é recorrível.
(vide fls. 1035, o sublinhado é nosso, dando-se aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais)
42. Mais ainda, o venerando TSI no processo de recurso nº 15/2002 citou a seguinte opinião preciosa do professor Marcello Caetano e Feitas do Amaral sobre definição do acto meramente confirmativo:
“O acto administrativo meramente confirmativo é o que se limita a confirmar outro acto anterior que seja impugnável, sem nada acrescentar ou tirar ao seu conteúdo, de modo a que o acto meramente confirmativo não tira nem põe nas situações criadas pelo acto confirmado.”
Nas palavras de Freitas do Amaral, para que um acto administrativo possa ser qualificado como meramente confirmativo, é necessários que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
- Que o acto confirmado seja definitivo;
- Que o acto confirmado fosse do conhecimento do interessado, de modo a poder recorrer-se dele; e
- Que entre o acto confirmado e o acto confirmativo haja identidade de sujeitos, de objecto e de decisão.
E “para haver identidade de decisão importa não apenas a existência de identidade da resolução dada ao caso concreto, mas também identidade da fundamentação da decisão e identidade das circunstâncias ou pressupostos da decisão. Se estas várias identidades se não verificarem, o segundo acto já não será simples confirmação do primeiro”.
43. Na verdade, em 22/02/2010 o IDM emitiu ofício nº 842/DPED/2010 apenas consta o conteúdo seguinte:
“Notifica a V. Ex.ª que junto se remete o conteúdo do despacho de 12 de Fevereiro de 2010 da Sua Ex.ª o Chefe do Executivo: Devido ao atraso na conclusão da obra, determina-se a multa estipulada no n.º 2 do art.º 4º do contrato de empreitada. Face ao período de 6 de Março de 2009 a 26 de Novembro de 2009, aplica-se uma multa de sete milhões e novecentas e oitenta mil patacas (MOP7.980.000,00), à multa diária de trinta mil patacas (MOP30.000,00), mas não prejudica o cálculo das multas por atraso ulteriores à data supracitada.
Mais se notifica V. Ex.ª que pode, dentro do prazo de 15 dias contado a partir da data de notificação, apresentar reclamação ao autor do despacho e pode por via judicial nos termos do art.º 219.º e seguintes do DLn.º74/99/M submeter ao TA.”
44. Nos termos do artº 207º, nº 3 do DL nº 74/99/M “contrato das empreitadas de obras públicas”:
“Nenhuma sanção se considera definitivamente aplicada sem que o empreiteiro tenha conhecimento dos motivos da aplicação e oportunidade de deduzir a sua defesa. (o sublinhado é nosso) assim sendo, o despacho proferido pelo Exmº Senhor Chefe do executivo em 12/02/2010 não é definitivo, como tal é irrecorrível. (artº 28º do CPAC)
45. Em 25/02/2010, a recorrente veio nos termos do artº 207º, nº 3 do DL nº 74/99/M apresentar defesa à multa autuada em 25/02/2010 face à “Obra de Remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto”. (vide fls. 377 a 383 dos autos) e em 09/04/2010, o IDM através do ofício nº 1866/DPED/2010 notificou o seguinte:
“Comunicamos a V. Exas. que por despacho de S. Exª o Chefe do Executivo de 29/03/2010, na proposta analisada por este Instituto, para cujo conteúdo se remete, foi indeferida a reclamação apresentada contra o anterior despacho de 12/02/2010.
Assim, mantém-se a multa aplicada nos precisos termos que constam do referido despacho de 12/02/2010.
Mais se informa que o presente indeferimento não inibe V. Exªs de discutir a matéria da reclamação em acção própria a intentar no Tribunal Administrativo no prazo de cento e oitenta (180) dias, nos termos das disposições conjugadas nos artºs 29º do DL nº 74/99/M de 8 de Novembro, 113º e seguintes do CPAC e 30º da Lei nº 9/1999 de 20 de Dezembro” (vide fls. 616 e anexo 69 recurso contencioso, o sublinhado é nosso)
46. Feito a comparação dos despachos proferidos pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo, respectivamente em 12/02/2010 e 29/03/2010, o cálculo das multas por atraso ulteriores foi alterado de 06/03/2009 a 26/11/2009 para 06/03/2009 a 14/03/2010. A respectiva alteração da contagem do prazo da multa, sem dúvida que alterou o conteúdo da conduta anterior, razão porque esse cálculo da multa em períodos diferentes afecta o valor da multa e enfim a recorrente tem de pagar uma multa mais elevada por causa dessa alteração, conduzindo-a numa situação desfavorável.
47. Dado que nos despachos proferidos pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo, respectivamente em 12/02/2010 e 29/03/2010, os fundamentos de facto e de direito alegados não são iguais, pelo que, o posterior não é despacho “meramente confirmativo” do anterior. Assim sendo, no despacho proferido pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo em 29/03/2010, só a parte que indeferiu a reclamação apresentada pela recorrente, mantendo a multa aplicada no despacho de 12/02/2010, é que se trata de acto confirmativo do acto administrativo, portanto é recorrível.
48. Porém, a tal notificação onde consta o pedido/parecer nº 033/DPED/2010 que alterou a contagem do prazo da multa para desde 06/03/2009 a 14/03/2010, este acto não cumpriu o disposto no artº 207º, nº 3 do DL nº 77/99/M, de ter concedido à recorrente oportunidade de deduzir a sua defesa, nos termos do artº 122º, nº 2, al. d) do CPAC, este acto administrativo é “nulo”.
49. O acórdão recorrido alega que o acto impugado no objecto do presente recurso contencioso, isto é, o despacho proferido pelo Exmº Senhor Chefe do Executivo em 29 de Março de 2010 que indeferiu a reclamação apresentada pela recorrente, mantendo a multa aplicada no despacho de 12/02/2010 (não obstante tal despacho, de facto, alterou o período da multa), trata-se apenas de um “acto confirmativo” e como tal é irrecorrível, esta afirmação evidentemente violou o disposto no artº 207º, nº 3 do DL nº 77/99/M, artº 28º e 31 do CPAC, pelo que deve ser revogada, bem como julgar procedente o recurso contencioso interposto pela recorrente, ou ordenar para que o TSI continue com o julgamento do presente processo até final, ou decretar a contagem do prazo do presente recurso contencioso seja a partir do trânsito em julgado do acórdão deste colectivo”; (cfr., fls. 1503 a 1542 e 1654 a 1719).

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Contra-alegando, afirma a Entidade Recorrida:

“1 - O Acórdão do TSI ora recorrido não é nulo por omissão de pronúncia por não se verificar a causa de nulidade prevista no artigo 571.°, n.° 1, alínea d) do CPC.
2 - O acto da Entidade Recorrida exarado a 12 de Fevereiro de 2010 que aplicou à Recorrente uma multa por atraso na conclusão da "Empreitada de Remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto" foi devidamente notificado à Recorrente a 22 de Fevereiro de 2010.
3 - O acto da Entidade Recorrida a 29 de Março de 2010, que se limita a manter o acto da Entidade Recorrida exarado a 12 de Fevereiro de 2010, foi devidamente notificado à Recorrente a 9 de Abril de 2010.
4 - O acto da Entidade Recorrida exarado a 29 de Março de 2010 é um acto meramente confirmativo que não sofre de nenhum vício, muito menos de vício que determine a nulidade ou inexistência do acto.
5 - O recurso contencioso interposto pela Recorrente do acto da Entidade Recorrida exarado a 29 de Março de 2010 deve ser rejeitado em respeito pelo disposto no artigo 31.° do CPAC.
6 - O Acórdão do TSI não entendeu erroneamente que o acto recorrido era irrecorrível uma vez que o recurso contencioso interposto pela Recorrente do acto da Entidade Recorrida exarado a 29 de Março de 2010 é extemporâneo, devendo ser rejeitado por caducidade do direito de recurso a que alude o artigo 46.°, n.° 2, alínea h) do CPAC, por não ter sido respeitado o prazo de interposição do recurso previsto no artigo 25.°, n.° 2, alínea a) do CPAC ex vi do disposto no artigo 115.°, n.° 2 do CPAC”; (cfr., fls. 1548 a 1565).

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Em sede de vista, emitiu o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“Vem impugnado o acórdão de 24 de Maio de 2018, do Tribunal de Segunda Instância, que, conhecendo da excepção de caducidade do direito de recurso, rejeitou, por extemporâneo, o recurso contencioso interposto por “A”.
A recorrente imputa ao acórdão recorrido nulidade por omissão de pronúncia e erros de julgamento.
Vejamos a questão da nulidade.
Diz a recorrente que o tribunal a quo não se debruçou sobre a justificação por si apresentada para a não interposição tempestiva do recurso. No seu entender, o atraso na interposição do recurso ter-se-ia ficado a dever a uma informação errónea prestada pela entidade administrativa contenciosamente recorrida. E sobre esta alegação de informação errónea o tribunal não se teria pronunciado. Donde a invocada omissão.
Há omissão de pronúncia quando o tribunal não se debruça sobre questões que devesse apreciar, como se extrai da norma do artigo 571.°, n.° 1, alínea d), do Código de Processo Civil. O que interessa é que o tribunal resolva as questões que o processo lhe coloca, não se lhe impondo que aborde todos os factos, argumentos, considerações ou razões produzidos pelas partes em abono dos seus pontos de vista. Nas palavras de Alberto dos Reis, em Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra Editora, 1984, reimpressão, a pgs. 143, são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.
Pois bem, a questão cuja resolução estava em causa, e que fora suscitada pelo Ministério Público, era a da tempestividade ou não do recurso contencioso. E essa foi resolvida, como é bom de ver, tendo o acórdão concluído pela caducidade do direito de recurso. Os motivos que levaram a recorrente a apresentar tardiamente o seu recurso contencioso e a responsabilidade pelo atraso já são incidências ou fundamentos esgrimidos na defesa do seu ponto de vista, não constituindo propriamente uma questão que o tribunal tivesse que versar especificamente.
Improcede a arguida nulidade.
Em matéria de erros de julgamento, a recorrente aparenta querer censurar o facto de não ter sido ponderado que a notificação que lhe foi feita pela Administração omitia a menção exigida pelo artigo 70.°, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo, acerca da (ir)recorribilidade contenciosa do acto.
Parece que a recorrente pretende defender que, na falta daquela indicação, o prazo para a interposição do recurso nem sequer se havia iniciado quando de facto interpôs o recurso contencioso.
Mas a razão não está do seu lado. De acordo com o artigo 26.° do Código de Processo Administrativo Contencioso, a contagem do prazo inicia-se, em regra, com a notificação, a menos que esta não dê a conhecer os elementos essenciais do acto, ou seja, o respectivo sentido, o autor e a data, caso em que a contagem não se inicia. Por seu turno, o artigo 27.° do Código de Processo Administrativo Contencioso prevê a possibilidade de suspensão da contagem do prazo, por motivo de omissão, na notificação, de alguma das referências previstas no artigo 70.° do Código do Procedimento Administrativo. Ponto é que o interessado requeira, no prazo de 10 dias, a notificação dos elementos em falta. Ora, no caso em análise, não estava em causa a omissão de elemento essencial, nem a recorrente e interessada requereu a notificação de elementos em falta, ao abrigo daquele artigo 27.°. Logo, a contagem do prazo do recurso iniciou-se com a notificação e decorreu de forma contínua.
Estas regras acerca das notificações, dos prazos e sua contagem são regras disciplinadoras do uso dos meios processuais, aplicáveis por igual a todos os utentes da justiça, que não impedem, nem dificultam de forma intolerável, o acesso aos meios contenciosos, pelo que em nada brigam com o princípio da tutela jurisdicional efectiva. Por outro lado, o lamento de que não conhece a lei e de que a Administração lhe deu uma informação/notificação deficiente são irrelevantes para a sua pretensão, pois não possuem a virtualidade de a eximirem do cumprimento da lei.
Improcede também este fundamento do recurso.
Depois, a recorrente sustenta que o acórdão errou ao não considerar o acto nulo e, por conseguinte, não sujeito a prazo de impugnação. Para, tanto, argumenta que, ao não indicar clara e inequivocamente o valor da multa, o acto não esclarece o seu sentido e alcance, sendo nulo, nos termos do artigo 122.°, n.° 1, do Código do Procedimento Administrativo, por carência de um elemento essencial; para além disso, sendo de valor incerto a multa aplicada, o acto viola o direito fundamental do arguido, pelo que é nulo, nos termos do artigo 122.°, n.° 2, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo.
Este raciocínio não colhe. Como o acórdão explicou, a notificação do acto que fixou a multa, além de esclarecer inequivocamente o montante diário e imutável da multa e de actualizar o seu cômputo à data do acto, alertou que o valor global estava sujeito a actualização, em função da demora da própria recorrente em concluir a obra. Este é o sentido inequívoco, claro e inteligível do acto, o que exclui a apontada falta de elemento essencial. O cômputo global, que estava dependente dos dias de calendário que a recorrente demorasse para operação matemática, que em nada podia interferir com o sentido e alcance do acto que fixou a multa. E o mesmo se diga do acto que decidiu a reclamação.
Por outro lado, e pelos mesmos motivos de inequívoca clareza do montante diário da multa e da sua prevalência até à conclusão e entrega da obra, ainda que estivesse em causa um procedimento sancionatório do tipo disciplinar – e não estava, resumindo-se a situação a uma multa contratual convencionada e aceite pelas partes no contrato – o acto continha todos os elementos necessários à pronúncia ou defesa do assim designado arguido, pelo que nenhum direito fundamental, e muito menos o conteúdo essencial de um direito fundamental, podia daí resultar beliscado.
Improcede igualmente este fundamento do recurso.
Por fim, a recorrente diz que o acórdão errou ao considerar irrecorrível o acto objecto de recurso contencioso.
A recorribilidade ou irrecorribilidade do acto não foi uma questão dirimida no acórdão. Como se vê do seu texto e dispositivo, o que foi objecto de decisão foi a excepção de caducidade do direito de recurso, terminando o acórdão por rejeitar o recurso contencioso, por extemporâneo.
Constata-se, todavia, que o acórdão refere, a fls. 1489 verso, en passant, que Acresce ainda uma outra particularidade nesta parte, que é a de que este último acto é um acto confirmativo de um outro anterior, e como tal é irrecorrível. Mas, como bem resulta do acórdão, trata-se de uma simples achega, que não constitui fundamento da decisão e em nada interfere com esta. É um mero obiter dictum, sem qualquer influência na decisão, pelo que o acerto ou desacerto da afirmação se apresenta irrelevante.
Soçobra também este fundamento do recurso.
Termos em que se afigura não merecer censura o acórdão recorrido, que deve ser mantido, negando-se provimento ao recurso jurisdicional”; (cfr., fls. 1721 a 1723-v).

*

Corridos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos, cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Pelo Tribunal de Segunda Instância foi considerada assente a seguinte matéria de facto:

“1. - Em 28/8/2009 foi elaborado o auto da aplicação da multa (artigo 174º do DL nº74/99/M, de 8 de Novembro), em que imputa à empreiteira A o atraso na conclusão obra, propondo-se aplicar-lhe uma multa diária de MOP$30,000.00, durante 177 dias (até então), contabilizados desde o dia 6/03/2009 (fls.270 a 272);
2. - Em 28/08/2009 o referido Auto foi notificado ao representante da empreiteira (fls. 273);
3. - Em 06/09/2009 a empreiteira apresentou a sua defesa ao Presidente do Instituto do Desporto de Macau (fls. 274 a 278);
4. - Em 18/01/2010 o Instituto do Desporto de Macau elaborou um parecer com o teor de fls. 369 a 371, em que se propôs aplicar à empreiteira a multa indicada no auto de aplicação, elaborado em 28/08/2009;
5. - Em 12/02/2010 o Chefe do Executivo da RAEM proferiu o despacho de “concordo” na proposta acima referida.
6. - Em 22/02/2010 o Instituto do Desporto de Macau procedeu à notificação do despacho do Chefe do Executivo à empreiteira mediante o ofício 842/DPED/2010 (fls. 367);
7. - Em 10/3/2010, o dono da obra recebeu a reclamação apresentada pela empreiteira contra o despacho punitivo (fls. 377 a 383, fls. 618 mencionou também este facto);
8. - Em 09/04/2010 o Instituto do Desporto de Macau procedeu à notificação à empreiteira da decisão da reclamação mediante o ofício nº 1866/DPED/2010 (fls. 616);
9. - Em 04/10/2010 a empreiteira propôs uma acção no Tribunal Administrativo (fls. 6 a 45), tendo formulado os seguintes pedidos:
a) – Declarar que a empreiteira não violou o contrato de empreitada em causa;
b) – Anular o despacho do Chefe do Executivo, de 29/03/2010, que, decidindo a reclamação deduzida pela empreiteira, manteve a decisão aplicadora de multa, ou declarar nula esta decisão;
c) – Condenar a RAEM a pagar à Autora a quantia de MOP$6,928,817.60 (por obras aumentadas);
d) – Pede, no caso de o Tribunal entender que o atraso na conclusão da obra se deva à culpa da empreiteira, que proceda à redução da multa aplicada, segundo o critério de equidade;
e) – Chamar intervir a C. por para esta ter sido transferida a responsabilidade mediante contrato de seguro.
(…)
Em 3/05/2013 a MMa Juíza do TA proferiu o despacho constante de fls. 1031 a 1055, em que apreciou várias questões prévias suscitadas pelas partes, declarando a recorribilidade da decisão aplicadora da multa do Chefe do Executivo;
(…)”; (cfr., fls. 1487 a 1488).

Do direito

3. Insurge-se a recorrente contra o decidido no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que, apreciando a invocada excepção de “caducidade do direito de recurso”, declarou-o “extemporâneo”.

Sendo o acto administrativo em questão o que aplicou à ora recorrente uma multa por atraso na conclusão das obras na “Empreitada de Remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto”, vejamos.

O Acórdão recorrido considerou que o recurso contencioso da recorrente foi interposto muito para além do prazo legal de 30 dias para o seu efeito, (cfr., art. 25° do C.P.A.C.), pelo que, como se disse, deu-o por extemporâneo, decidindo pela sua rejeição.

Para tal, ponderou – essencialmente – nos termos seguintes:

“(…)
Ora, é de verificar que a Recorrente foi notificada do acto em 09/04/2010, mas só veio a impugná-lo contenciosamente em 04/10/2010, fazendo-o em cumulação com uma acção sobre contrato, instaurado no TA, da qual viria extrair certidão, par autonomizar o recurso contencioso, na sequência do acórdão uniformizador de jurisprudência de 1/07/2015.
Ora, o artigo 115º (prazo) do CPAC dispõe:
1. O direito de acção sobre validade dos contratos para cuja propositura tenham legitimidade as entidades referidas nas alíneas b) a d) do n.º 2 do artigo anterior caduca nos seguintes prazos:
a) 180 dias contados do conhecimento do conteúdo do contrato, mas nunca depois de decorridos 3 anos desde a sua celebração, nas hipóteses previstas nas alíneas b) e d);
b) 180 dias contados do trânsito em julgado da decisão de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de acto administrativo relativo à formação do contrato, na hipótese prevista na alínea c).
2. Ao pedido de anulação previsto no n.º 3 do artigo 113.º é aplicável o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 25.º e nos artigos 26.º e 27.º
Perante o nº3 deste normativo, não há dúvida de que o presente recurso foi interposto fora do prazo legal!
Este recurso só pode prosseguir se se encontrar fundamentos para chegar à conclusão de que a decisão ora atacada seja nula, assim nos termos do disposto no nº 1 do artigo 25º do CPAC, não há limitação do prazo.
Ora, a Recorrente imputa a nulidade ao despacho punitivo por seguintes razões:
- A primeira notificação disse que o montante de multa era de MOP$5,310,000.00 (fls. 275 a 278);
- A segunda notificação já disse que o montante de multa era de MOP$7,980,00.00 (fls. 372 a 373);
- A terceira notificação disse que a multa era calculada desde 6/03/2009 até 14/03/2010 (a recepção provisória da obra teve lugar em 15/03/2010), à razão diária de MOP$30,000.00.
Na óptica da Recorrente, esta variação do valor de multa conduz à falta de elementos essenciais do acto administrativo (punitivo), e como tal cai na alçada da alínea d) do nº2 do artigo 122º do CPC, o que gera a nulidade do acto ora atacado.
Salvo o merecido respeito, não acolhemos esta tese, visto que:
- Quer na primeira notificação, que na segunda, o dono da obra (Instituto do Desporto de Macau) faz sempre ressalva, no sentido de que o valor de multa estava sujeita à actualização posterior, por no momento, não se saber ainda quando é que haveria lugar à recepção provisória da obra, porque só a partir desta recepção é que termina o prazo do atraso na conclusão da obra.
- Por outro lado, este valor de multa, actualizável em função dos factores previstos no próprio contrato, não é elemento essencial do acto administrativo, pois o que está em causa é o dono da obra decidir aplicar uma sanção pecuniária à Recorrente nos termos fixados pelo próprio contrato. Sujeito activo, sujeito passivo, competência de quem tomou a decisão e conteúdo da mesma estão todos bem definidos. Pelo que, não se trata de falta de elemento essencial do acto administrativo.
- Vistas as coisas noutra perspectiva, ainda que se toma como decisão final o teor da última notificação (para notificar a decisão de 29/03/2010), que foi feita mediante o ofício de 09/04/2010 (fls. 616), para efeitos da contagem do prazo da interposição do recurso, este só veio a ser interposto em 04/10/2010, obviamente já passaram muito mais do que 30 dias, prazo estipulado no artigo 25º/2 do CPAC. Acresce ainda uma outra particularidade nesta parte, que é a de que este último acto é um acto confirmativo de um outro anterior, e como tal é irrecorrível.
Pelo exposto, a nossa conclusão é inexistir fundamentos conducentes à nulidade ou inexistência do acto punitivo.
O expedido é suficiente para rejeitar o recurso por extemporâneo!
(…)”; (cfr., fls. 1488-v a 1489-v).

Perante o assim considerado e decidido, que dizer?

Pois bem, temos para nós que o Acórdão recorrido não merece censura, correcta e adequada se nos apresentando a solução a que se chegou.

Passa-se a tentar explicitar o porquê deste nosso ponto de vista, dando-se, desde já – e por economia processual – como reproduzidas as considerações pelo Ministério Público tecidas no seu douto Parecer, que dão cabal e clara resposta ao inconformismo da ora recorrente.

Seja como for, não se deixa de consignar o que segue.

Lidas as – longas – alegações e conclusões da recorrente – onde, diga-se, para além de insistir em aspectos sem relevância, repete-se, várias vezes, confundindo questões e tornando desgastante o alcance do seu sentido – cremos que, em bom rigor, o que importa é saber se, de facto, (in)tempestivo foi o recurso contencioso que interpôs.

Vale então a pena deixar claro que o acto administrativo objecto do recurso contencioso interposto é o acto do CHEFE DO EXECUTIVO, datado de 29.03.2010, e notificado à recorrente por ofício de 09.04.2010, que em sede de reclamação de anterior decisão de 12.02.2010, manteve o decidido no sentido de se aplicar à recorrente uma multa diária de MOP$30.000,00, a contar desde 06.03.2009, em virtude do (seu) atraso na conclusão das obras na “Empreitada de Remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto” (atrás já referida), indeferindo assim a dita reclamação.

Para além disso, importa igualmente ter presente que o aludido “recurso contencioso” foi deduzido em “acção sobre contrato administrativo” no Tribunal Administrativo intentada em 04.10.2010, (n.° 138/10/CA, cfr., fls. 6 e segs.) – e que após vicissitudes várias que não são agora relevantes para a decisão a proferir – pelo Mmo Juiz do dito Tribunal foi ordenada a extracção de certidão do processado e remetida ao Tribunal de Segunda Instância para a sua apreciação, vindo-se a proferir o Acórdão agora recorrido.

Ora, cotejando as datas da notificação do despacho recorrido (09.04.2010), e a do registo de entrada da referida “acção administrativa”, (04.10.2010), onde a recorrente, em “cumulação de pedidos”, enxertou o seu “recurso contencioso”, sem esforço se vê que, em relação a este – e patente sendo a inexistência de qualquer “nulidade” ou “inexistência” – há muito que decorrido estava o prazo legal (de 30 dias) pelo art. 25° do C.P.A.C. previsto para a sua interposição.

Aliás, tal é “ponto assente” (não discutido) pela própria recorrente que alega apenas que o “atraso” a ela não se deve dado que foi induzida em erro pelos termos da notificação que lhe foi efectuada.

Porém, não se mostra de acompanhar o assim considerado.

Tem este Tribunal entendido que:

“Se a notificação da Administração Pública induzir o particular, que não agiu com culpa indesculpável, no erro de que do acto ainda não cabia recurso contencioso, deve permitir a contagem do novo prazo para a sua interposição com fundamento na anulabilidade do acto”, (cfr., o Ac. de 10.06.2005, Proc. n.° 26/2004); e que,
“Cabendo legalmente à Administração, que notifica um particular de um acto administrativo, indicar se o acto é impugnável, perante que órgão e em que prazo, nos termos do artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo, se aquela fornece indicações erradas quanto à recorribilidade contenciosa do acto, que levam o particular a actuar erradamente, recorrendo contenciosamente e não hierarquicamente, como devia, há que conceder a possibilidade de o interessado rectificar a sua impugnação”; (cfr., o Ac. de 04.04.2019, Proc. n.° 30/2019).

Porém, atento o que consta da notificação em causa, não se nos apresenta ser o caso dos autos.

Como consta da matéria de facto pelo Tribunal recorrido dada por assente (e não contestada), a recorrente foi notificada do acto administrativo em questão mediante o ofício n.° 1866/DPED/2010, que tem, (quanto ao que agora releva), o teor seguinte:

“(…)
Assunto “Obra de remodelação do Edifício Administrativo da Ala Oeste do Instituto do Desporto” - Multa por atraso na obra.
(…)
Comunicamos a V. Exas. que, por despacho de S. Exa. o Chefe do Executivo, de 29/03/2010, na proposta analisada por este Instituto, para cujo conteúdo se remete, foi indeferida a reclamação apresentada contra o anterior despacho de 12/02/2010.
Assim, mantém-se a multa aplicada nos precisos termos que constam do referido despacho de 12/02/2010.
Mais se informa que o presente indeferimento não inibe V. Exas. de discutir a matéria da reclamação em acção própria a intentar no Tribunal Administrativo no prazo de cento e oitenta dias (180) dias, nos termos das disposições conjugadas nos artigos 219.° do Decreto-Lei 74/99/M, de 8 de Novembro, 113.° e seguintes do Código de Processo Administrativo Contencioso e 30.° da Lei n.° 9/1999, de 20 de Dezembro.
(…)”; (cfr., fls. 616).

Ora, em face do que se deixou transcrito, temos pois por adequada a solução a que se chegou no Acórdão recorrido.

Com efeito, para além de claro ser o que na dita notificação se consignou sobre a “acção administrativa”, na mesma fez-se – expressa – referência ao “art. 113° do C.P.A.C.” que preceitua que:

“1. A acção sobre contratos administrativos tem por finalidade dirimir os litígios sobre interpretação, validade ou execução dos contratos, incluindo a efectivação de responsabilidade civil contratual.
2. O conhecimento da acção sobre contratos administrativos não impede o recurso contencioso de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato.
3. O pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato pode ser deduzido, inicial ou supervenientemente, em acção sobre contratos administrativos quando aquele pedido e os formulados nos termos do n.º 1 estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência ou quando a procedência de todos os pedidos dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas normas jurídicas ou cláusulas contratuais”.

E, atento o assim estatuído, inegável é dizer-se que não podia a recorrente deixar de saber que tinha “duas formas” de reagir ao acto administrativo em questão: a “acção administrativa” e o “recurso contencioso”, (cfr., n.° 1 e 2 e o art. 30° da Lei n.° 9/1999, “Lei de Bases da Organização Judiciária”), podendo, se o quisesse, “enxertar” este último naquela, (n.° 3).

No caso, entendeu a recorrente fazer uso da faculdade consentida no n.° 3, “cumulando os pedidos”

Porém, não respeitou os “prazos” legalmente previstos para cada “meio processual”.

Admite-se (também) que se possa considerar que mais completa e explícita podia ser a dita notificação.

Mas nestas coisas, (como em tudo na vida), importa a “razoabilidade”.

De outra forma, ter-se ia que se proceder a notificações enviando-se as cópias de todos os códigos, diplomas e leis avulsas relevantes, com exemplares dos respectivos “trabalhos preparatórios”, e, se calhar, os manuais de direito que lhes dissessem respeito…

Ora, como se referiu, há que haver – pelo menos, alguma – razoabilidade, até porque, nada impede que o particular se dirija ao Serviço Administrativo em questão e solicite as informações complementares que entenda por adequadas, não sendo de olvidar que, em relação a qualquer dos meios processuais referidos no art. 113° do C.P.A.C., obrigatório é o “patrocínio judiciário”, claras sendo as razões para assim se ter entendido.

Por sua vez, e como igualmente já decidiu este Tribunal, (e motivos não existem para se não manter o entendido):

“Quando a notificação ou a publicação do acto administrativo não dêem a conhecer os elementos essenciais da notificação do acto (sentido, autor e data da decisão), a contagem do prazo para interposição do recurso contencioso não se inicia, como dispõe o n.º 1 do artigo 26.º do Código de Processo Administrativo Contencioso” e,
“Quando a notificação ou a publicação do acto administrativo não dêem a conhecer as restantes indicações da notificação do acto, mencionadas no artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo (a fundamentação integral do acto, a identificação do procedimento administrativo, o órgão competente para apreciar a impugnação do acto e o prazo para esse efeito e a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso), do n.º 2 do artigo 27.º do Código de Processo Administrativo Contencioso resulta que só fica suspenso o prazo para interposição do recurso contencioso se o interessado requerer, no prazo de dez dias, à entidade que praticou o acto, a notificação das indicações ou dos elementos em falta ou a passagem de certidão ou fotocópia autenticada que os contenha, suspensão essa a partir da data da apresentação do requerimento e até à daquela notificação ou passagem”; (cfr., o Acórdão de 28.09.2011, Proc. n.° 33/2011 assim como o de 13.06.2012, Proc. n.° 25/2012).

Assim, e no caso, nada tendo a recorrente requerido, impõe-se ter como decorrido o prazo para o recurso contencioso do acto administrativo em causa, pelo que acertada foi a decisão recorrida.

Dest’arte, e sendo o recurso em questão “extemporâneo”, mais não se mostra de dizer para se confirmar o Acórdão recorrido, inútil – e, assim, “ilícita”, cfr., art. 87° do C.P.C.M. aqui aplicável nos termos do art. 1° do C.P.A.C. – sendo a apreciação de qualquer outra questão, imperativa se apresentando a decisão que segue.

Decisão

4. Nos termos do expendido, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, com a taxa de justiça que se fixa em 8 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 22 de Janeiro de 2020


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator) – Sam Hou Fai – Song Man Lei

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa
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