打印全文
Processo n.º 18/2019
(Autos de recurso contencioso)

Data: 29/Abril/2020

Recorrente:
- A

Entidade recorrida:
- Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A, com sinais nos autos, notificado do despacho do Exm.º Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, que indeferiu o pedido de que lhe fosse aplicado retroactivamente o regime previsto no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, donde constam as normas especiais aplicáveis ao pessoal que presta serviço nas delegações da RAEM, reconhecendo os respectivos direitos, regalias e subsídios, dele não se conformando, interpôs o presente recurso contencioso de anulação de acto, formulando na petição de recurso as seguintes conclusões:
“1. O objecto da presente impugnação contenciosa é constituído pelo supra referido despacho do Exmo. Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, de 28/09/2018, esclarecido e confirmado pelo despacho da mesma entidade recorrida, de 26/11/2018, que indeferiu o pedido do ora Recorrente, com a fundamentação constante do Parecer do GSAJ (razão por que ao longo da peça se utiliza o plural “despachos recorridos” e o singular “acto recorrido”).
2. O acto administrativo recorrido padece do vício de procedimento, por incumprimento da formalidade essencial da audiência dos interessados, estabelecida no artigo 93º/1 do CPA.
3. A exigência legal da audiência dos interessados constitui uma garantia de defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos administrativos, permitindo-lhes a sua participação na formação da vontade da Administração, confrontando os critérios desta e apontando as razões e fundamentos, quer de facto quer de direito, por forma a fazerem valer os seus interesses no conjunto dos interesses que aquela tem de ponderar na sua decisão.
4. A Administração não pode dispor livremente do trâmite procedimental da audiência dos interessados, excepto nos casos que lei tipifica, dado constituir uma posição jurídica subjectiva procedimental fundamental (um direito fundamental) dos administrados nas suas relações com a Administração, cumprindo funções relevantes num estado de direito, nomeadamente as funções de garantia e de participação procedimental.
5. No caso dos autos, a Administração estava vinculada, antes de proferir a decisão final, a ouvir o Recorrente, em sede de audiência de interessados, dando-lhe conhecimento do sentido provável da decisão e a oportunidade de se pronunciarem, o que não sucedeu.
6. A Administração não deu ao Recorrente a oportunidade de carrear para o procedimento, em momento prévio à tomada de decisão, as razões, argumentos e elementos reveladores dos seus legítimos direitos e interesses, dignos de protecção legal, o qual foi apanhado de surpresa quanto às razões invocadas para o indeferimento do seu pedido.
7. O incumprimento deste trâmite procedimental pela Administração, traduzindo-se em violação dos princípios da colaboração entre a Administração e os particulares e da participação dos particulares na formação das decisões que lhes dizem respeito, é também facto de violação do princípio da imparcialidade, pelo acto recorrido ficou afectado pela ilegalidade decorrente desse vício.
8. O acto recorrido padece também do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 10º/1-a-c-d-e-f/2 do ETAPM e 118º/2-a do CPA.
9. Não é válido o argumento invocado no Parecer que contém os fundamentos do acto recorrido da nulidade do provimento do Recorrente como coordenador, nos termos do artigo 16º/2 do ETAPM, em virtude da alegada inobservância dos requisitos estabelecidos nos artigos 10º/1-a-c-d-f/2 do ETAPM, primeiro argumento utilizado para justificar o indeferimento do pedido do Recorrente.
10. O Recorrente quando, em 16/06/2005, foi nomeado coordenador do CPITMP, não tinha que fazer a prova dos requisitos previstos no artigo 10º do ETAPM.
11. O Parecer do GSAJ não leva em devida conta o facto de o Recorrente, nesse momento, exercer, de forma ininterrupta, desde 23/05/1994, no âmbito da Administração Pública de Macau, concretamente na DST, funções em termos de relação de emprego público.
12. Sendo o Recorrente requisitado à República Portuguesa, ao abrigo do artigo 69º do então Estatuto Orgânico de Macau, em Maio de 1994, quando deu início à relação de emprego público no âmbito da DST, o seu processo foi instruído com os documentos que foram remetidos pelo seu serviço de origem, em Portugal, com o que ficaram observadas as exigências decorrentes do referido artigo 10º do ETAPM.
13. No momento em que o Recorrente foi nomeado, em comissão de serviço, coordenador do CPITMP, por despacho do então SASC, o mesmo encontrava-se a exercer funções no então escritório de representação da DST, em Lisboa, ao abrigo de contrato individual de trabalho, segundo a lei da RAEM, com a categoria de técnico superior.
14. Apesar de titulado por este tipo de contrato, tal vínculo era de direito público, tal como resulta do conteúdo do referido contrato.
15. A nomeação para o cargo de coordenador do CPITMP, sem solução de continuidade, relativamente à relação de emprego público acabada de referir, não impunha a necessidade da verificação dos requisitos de provimento consagrados no artigo 10º do ETAPM, dado que os mesmos se encontram preenchidos desde Junho de 1994, quando iniciou funções na DST.
16. O comportamento da DST, que iniciou oficiosamente o procedimento tendente a essa nomeação, como do então SASC, que nomeou o Recorrente, ao nunca terem solicitado ao Recorrente, que se encontrava no exercício das funções referidas, em Portugal, há cerca de 5 anos, a comprovação da verificação de tais requisitos, é demonstrativo de que não se impunha tal comprovação fosse porque se entendia que a lei o não o exigia, fosse porque, atendendo às circunstâncias do caso, não se justificava que o fizesse.
17. O Parecer do GSAJ confunde documentos e requisitos, dado que trata os documentos destinados a provar os requisitos, como se fossem eles próprios os requisitos.
18. A prova dos requisitos de provimento tem carácter instrumental, o que significa que os documentos dirigidos a essa prova não são eles próprios requisitos e, portanto, não podem ser tratados como tais.
19. Da não entrega do certificado de registo criminal e do atestado de aptidão mental, emitidos pelas entidades competentes da RAEM, não se segue necessariamente que, in casu, se não verificaram tais requisitos.
20. O que exige se pondere a situação concreta que levou ao quadro de desconformidade com o direito e se pondere o desenvolvimento da relação funcional.
21. Não é possível imputar-se ao Recorrente qualquer intenção malévola ou até mesmo actuação negligente na não junção de tais documentos, quando muito, no caso de se considerar que se impunha tal exigência, o que se afirma sem conceder, resultaria apenas demonstrada a negligência dos Serviços de Turismo pela não solicitação ao Recorrente de tais documentos.
22. Negligência que seria grave, considerando o tempo por que durou este vínculo e principalmente porque a comissão de serviço do Recorrente foi renovada por 8 vezes consecutivas, sem nunca tais Serviços terem detectado tal irregularidade.
23. Ademais, encontravam-se acautelados os interesses públicos subjacentes ao estabelecimento dos requisitos cuja comprovação pressupunham a apresentação do certificado de registo criminal e do atestado de aptidão física e mental.
24. No caso, visando a apresentação do certificado de registo criminal fundamentalmente a comprovação da inexistência de situações de inibição para o exercício de funções públicas ou de proibição de exercício de certas funções, decorrentes de sanção acessória aplicada por decisão judicial, tal se encontrava garantido pelo facto de o Recorrente, no momento em que foi nomeado coordenador do referido Centro, ser trabalhador da DST, em regime de direito público, há mais de 11 anos e nada existir em desabono da sua honorabilidade e reputação profissional, para além que de a lei estabelece o dever de comunicação oficiosa por parte do tribunal à autoridade de que o funcionário dependa da condenação pela prática de crime por aquele.
25. E o mesmo se diga para o atestado de aptidão física e mental, dado que visando este, fundamentalmente, garantir a ausência de lesões ou enfermidades e de anomalias de personalidade e ou patologias de natureza neuropsiquiátrica que impossibilitem ou dificultem o exercício das tarefas a que o provimento se reporta, tal se encontrava garantido pelo facto de o Recorrente vir exercendo, no momento em que foi nomeado, de forma continuada e ininterrupta, funções no âmbito da DST, para além de que o vínculo do Recorrente foi renovado por 8 vezes consecutivas, até o Recorrente atingir o limite de identidade para o exercício de tais funções, o que não teria acontecido se este revelasse a existência de tais problemas.
26. Relevante ainda é o facto de o Recorrente, no exercício das respectivas funções, sempre ter agido de forma pacífica, contínua e publicamente, durante um longo período de tempo, cerca de 13 anos, tendo assegurado a satisfação de necessidades permanentes ligadas à criação de tal Centro.
27. O que sempre fez de forma elevada e prestigiosa para os Serviços de Turismo de Macau, o que levou a que entidades de relevo em matéria turística lhe tivessem conferido as mais altas distinções, nomeadamente o Prémio Carreira Belmiro Santos e a Medalha de ouro de Mérito Turístico, realçando os relevantes serviços prestados Recorrente em prol do turismo.
28. O argumento utilizado revela-se, a todos os títulos, absurdo e bizarro, sendo a sua formulação manifestação clara de abuso de direito por parte da Administração.
29. Inexistindo a invocada invalidade, encontram-se preenchidos os pressupostos do artigo 118º/2-a do CPA para que seja atribuída eficácia retroactiva à decisão favorável que o Requerente solicitou.
30. O acto recorrido padece também do vício de violação de lei por erro de interpretação e aplicação das normas do artigo 110º do CPA e das normas do Regulamento Administrativo n.º 20/2003.
31. No caso, não procede o argumento do Parecer segundo o qual o Recorrente não pode ver efectivado o seu direito à obtenção dos subsídios e abonos, previstos no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, pela não impugnação oportuna dos actos processadores do respectivo vencimento, entendidos como verdadeiros actos administrativos.
32. O Parecer parte do pressuposto errado de que os actos de processamento de vencimentos são sempre actos administrativos, o que não é verdade, dado que, muitas vezes, não passam de actos de execução ou operações materiais.
33. De acordo com a jurisprudência de Macau, que corresponde à dos tribunais portugueses, só são actos administrativos os actos de processamento de vencimentos que contenham uma definição voluntária e inovatória, por parte da Administração, da situação jurídica do funcionário abonado, relativamente ao processamento em determinado sentido e com determinado conteúdo.
34. Para que os actos de processamento de vencimentos possam ser considerados actos administrativos, exige-se que os mesmos contenham uma definição voluntária, por parte da Administração, no exercício do seu poder de autoridade, da situação jurídica do administrado relativamente ao processamento em determinado sentido e com determinado conteúdo e que o conteúdo desse acto seja levado ao conhecimento do interessado através de notificação, que, para ser eficaz, deve obedecer aos parâmetros impostos pelo artigo 70º do CPA.
35. De acordo com a lei e a doutrina, para haver acto administrativo, temos que estar perante uma decisão da Administração que produza efeitos externos numa situação concreta, o que significa que tem que haver uma resolução ou uma tomada de posição sobre um assunto colocado à Administração.
36. Exige-se a existência de uma decisão voluntária e unilateral, não bastando uma pura omissão definidora de uma situação concreta e que tenha sido notificada ao interessado nos termos das regras próprias da notificação dos actos administrativos.
37. Ex adverso, as operações materiais ou actos de mera execução são os actos praticados pela Administração em consequência necessária de actos administrativos anteriores que contenham a definição de situações jurídicas, visando a sua concretização.
38. O acto de processamento de vencimento só poderá considerar-se acto administrativo quando decida uma qualquer questão, quando tenha tomado sobre ela uma determinada posição com vontade decisória, quando contenha uma definição inovatória e voluntária e a dê a conhecer ao interessado, ao invés, será uma operação material quando, praticada normalmente pelos serviços administrativos ou financeiros, da mesma não conste qualquer tomada de posição com vontade decisória sobre determinada questão.
39. Todos os actos processadores das remunerações do Recorrente durante todo em que exerceu funções como coordenador do CPITMP não passam de meras operações materiais.
40. A definição ad futurum do estatuto remuneratório do Recorrente não se encontra no despacho de nomeação, mas antes, no artigo 5º do despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005 que instituiu o CPITMP, que é um verdadeiro regulamento administrativo.
41. Os actos de processamento do vencimento do Recorrente limitam-se apenas a proceder à liquidação da remuneração deste, executando escrupulosamente a definição remuneratória constante daquele despacho, tal como se revela através da Notas de Abonos e Descontos enviadas ao Recorrente.
42. Obedecendo todos estas Notas ao mesmo padrão e tendo todas o mesmo conteúdo, não se vislumbra de nenhuma delas que a Administração tenha decidido ou tenha tomado qualquer posição, em termos de vontade decisória, sobre a aplicabilidade ou não aplicabilidade ao Recorrente dos subsídios e abonos constantes desse regulamento.
43. Tais Notas limitam-se a proceder à notificação da liquidação da remuneração e subsídios efectuada nos termos do ETAPM, sem nunca fazerem qualquer menção aos subsídios e abonos consagrados neste Regulamento Administrativo.
44. O silêncio que delas resulta relativamente a tal questão não pode ser significativo de uma definição inovatória e voluntária por parte da Administração, por forma a poder-se dizer, como erradamente pretende o referido Parecer, que os actos processadores do vencimento mensal do Recorrente se devem considerar como actos administrativos, susceptíveis de impugnação administrativa e contenciosa.
45. Tais Notas revelam, claramente, que os actos processadores do vencimento mensal do Recorrente devem antes ser considerados antes como operações materiais ou actos de mera execução, na medida em que foram praticados em consequência necessária da norma do artigo 5º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005, que define o estatuto remuneratório do Recorrente, visando apenas a sua concretização periódica, não contendo qualquer definição voluntária e inovatória, por parte da Administração, da situação jurídica do Recorrente abonado, relativamente ao processamento em determinado sentido e com determinado conteúdo.
46. Contrariamente, ao que se defende no Parecer aqui referido, o direito de impugnação do Recorrente não se encontra caducado, dado que não havia que impugnar os actos processadores do vencimento mensal do Recorrente, uma vez que insusceptíveis de recurso.
47. Também o despacho de então SASC n.º 59/2005, de 14 de Junho, que nomeou o Recorrente, que se limita ao preenchimento do lugar, não tendo por objecto a definição estatuto remuneratório do Recorrente, não padece, no que respeita a esta matéria, de qualquer ilegalidade, razão por que não era possível recorrer do mesmo.
48. No momento da criação do referido Centro (em Maio de 2005), nada se dispondo sobre tal ponto no referido diploma, não era líquido que o Regulamento Administrativo n.º 20/2003 fosse de aplicar ao pessoal que viesse a exercer funções neste Centro, dado que a letra do mesmo se refere apenas às delegações da RAEM no exterior.
49. O problema da aplicabilidade do referido regulamento ao Recorrente apenas se começou a colocar à medida que os Serviços de Turismo da RAEM foram aplicando casuisticamente esse regulamento ao pessoal, com vínculo à Administração da RAEM, destacado para exercer funções no referido Centro, e como sucedeu também com a nova coordenadora, recentemente nomeada para esse cargo, após a cessação de funções do Recorrente, por limite de idade para o exercício das mesmas.
50. Antes do requerimento que deu origem ao acto de que ora se recorre, nunca a questão da aplicabilidade desse regulamento ao Recorrente foi posta formalmente à Administração, razão por que nunca houve nem tinha que haver uma decisão de que fosse necessário recorrer.
51. Nem se pode dizer que essa questão foi decidida de forma implícita, uma vez que o Recorrente nunca recebeu qualquer dos subsídios e abonos previstos nesse regulamento, além de que a remuneração que foi processada mensalmente ao Recorrente não era excludente de nenhum dos subsídios e abonos do Regulamento Administrativo n.º 20/2003.
52. Tal regulamento não veio derrogar ou ab-rogar as regras relativas à definição da remuneração do coordenador do referido Centro, entendendo-se, antes, que os subsídios e abonos nele previstos constituem um plus destinado a acrescer à remuneração definida nos termos do ETAPM, visando compensar os trabalhadores da RAEM que exercem funções no exterior da Região.
53. A demonstrar que tal questão nunca chegou a ser objecto de decisão ou de tomada de posição por parte da Administração, quer no momento da nomeação do Recorrente, quer no momento do processamento do seu vencimento, quer noutro qualquer momento, está o facto de os Serviços de Turismo, na apreciação do requerimento do Recorrente, terem definido como uma das questões a decidir justamente a questão da aplicabilidade desse regulamento ao ora Recorrente.
54. Razão por que se tem de concluir que a decisão de indeferimento, com o fundamento que se acabada de refutar, padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, dado não se poder considerar caducado o direito de impugnação do Recorrente, uma vez que nunca se chegou a firmar na ordem jurídica qualquer tomada de posição da Administração em sentido desfavorável à pretensão do Recorrente.
55. O acto recorrido enferma ainda do mesmo vício por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 302º, 303º-f e 311º/1-c do Código Civil.
56. O terceiro argumento formulado no Parecer, sobre prescrição dos créditos do Recorrente, também não procede, dado que contraria os dados normativos do nosso sistema, como a solução amplamente sufragada pela nossa jurisprudência superior.
57. Não estabelecendo as normas de direito administrativo solução em matéria de prescrição de créditos desta natureza, há que recorrer não à regra do artigo 303º-f do Código Civil, mas, antes, à regra geral do artigo 302º deste diploma, que estabelece o prazo geral de 15 anos, tal como de forma reiterada tem entendido a nossa jurisprudência.
58. Sem conceder, mesmo que fosse de aceitar o prazo de prescrição do Parecer, sempre se teria de afirmar, contrariamente ao sustentado no mesmo, que nenhum dos créditos do Recorrente, relativos a todo o período em que exerceu funções como coordenador no CPITMP, se encontra prescrito, por força do artigo 311º/1-c do Código Civil, norma o referido Parecer não chega a equacionar.
59. Por força de tal norma, mesmo que o prazo prescricional fosse de 5 anos, o Recorrente poderia reclamar todos os créditos emergentes da referida relação até 27/06/2020, porque só nessa altura é que tal prazo se completa.
60. Finalmente, o acto recorrido padece do vício de violação de lei decorrente da violação flagrante do princípio da igualdade, consagrado no artigo 25º da Lei Básica e no artigo 5º/1 do CPA.
61. O princípio da igualdade traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio, postulando o tratamento igual de situações iguais e o tratamento desigual de situações desiguais, exigindo, para as diferenciações de tratamento, a existência de fundamento material bastante ou uma justificação razoável segundo critérios de valor objectivo.
62. No caso, verifica-se que o Recorrente foi tratado diferentemente de outros funcionários que exerceram ou exercem funções no CPITMP, principalmente da actual coordenadora, nomeada para suceder àquele, que cessou funções por limite de idade, sem que houvesse fundamento material bastante ou justificação objectiva e racional.
63. Existe acentuada similitude entre as situações do Recorrente e da actual coordenadora, podendo-se até afirmar que as diferenças existentes seriam mais favoráveis à aplicação de tal regime ao Recorrente do que à actual coordenadora.
64. A Administração agiu, no que respeita à situação remuneratória do Recorrente, de forma totalmente arbitrária, violando as exigências fundamentais decorrentes do princípio da igualdade.
65. E mesmo que se considere que a violação do princípio da igualdade só assume relevância autónoma quando a Administração actua no exercício de poderes discricionários, o que se afirma sem conceder, a disparidade de tratamento dispensada pela Administração ao Recorrente e à actual coordenadora só reforça a ilegalidade da decisão recorrida, impondo à Administração a obrigação colocar o Recorrente na situação em que estaria se aquela tivesse exercido os poderes vinculados em conformidade com a lei.
66. A Administração estava legalmente vinculada a aplicar ao Recorrente o disposto no referido regulamento administrativo, aliás, tal como se reconhece nas Informações e Pareceres constantes do processo administrativo, inclusive no Parecer que constitui a fundamentação do acto recorrido.
67. Os vícios apontados em que incorre o Parecer supra referido comunicam-se ao acto recorrido, na medida em que este faz seus os fundamentos que constam daquele.
68. O acto recorrido violou, entre outras, as normas dos artigos 93º/1, 94º, 110º e 118º/2-a do CPA; 10º/1-a-c-d-e-f/2, 15º, 16º do ETAPM, as normas do Regulamento Administrativo n.º 20/2003 e ainda as normas dos artigos 302º, 303º-f e 311º/1-c do Código Civil e os princípios da colaboração entre a Administração e os particulares, da participação dos particulares na formação das decisões que lhes digam respeito, da imparcialidade e da igualdade de tratamento, consagrados nos artigos 25º da Lei Básica, 5º/1, 7º, 9º e 10º do CPA.
Termos em que, contando com o douto suprimento de Vossa Excelência, deve ser dado provimento ao presente recurso, com fundamento nos supra mencionados vícios e, a final,
A) Ser anulado, nos termos supra referidos os Despachos do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, datados de 26 de Setembro de 2018 e 26 de Novembro de 2018, dos quais conjuntamente resulta a decisão de indeferimento do requerimento do Recorrente, datado de 21 de Junho de 2018, por violação das normas supra referidas;
B) Ser a entidade recorrida condenada à prática do acto administrativo devido, em substituição do acto praticado, nos termos do artigo 24º/1-a do CPAC, o qual, em concreto, se deve consubstanciar na prática do acto que determine o pagamento retroactivo ao Recorrente dos subsídios e abonos, constantes do Regulamento Administração n.º 20/2003, emergentes da relação de emprego público que decorreu entre 16/06/2015 e 28/06/2018, uma vez que a Administração estava legalmente vinculada a aplicar ao Recorrente tal diploma, tal como reconhece hoje, no âmbito dos presentes autos, e não se verificam os obstáculos que levaram à decisão de indeferimento que ora se impugna.”
*
Regularmente citada, apresentou a entidade recorrida contestação, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1. Aceitam-se como verdadeiros os factos descritos sob os artigos 10º, 18º a 23º, 27º a 36º e 37º a 43º da petição de recurso, correspondendo também à verdade os factos constantes dos art.ºs 24º, 25º e 26º da mesma peça processual.
2. Os art.ºs 11º a 17º reproduzem factos extraídos de um diploma legal, pelo que também nada há a opor aos mesmos.
3. Não se mostra violado o direito de audiência prévia do recorrente, uma vez que, pelo que ficou dito, ainda que tivesse sido ouvido, a decisão seria a mesma, justificando-se aqui o princípio do aproveitamento do acto administrativo.
4. Quanto à violação do princípio da imparcialidade, o recorrente não esclarece as razões pelas quais o mesmo se mostra violado, sendo certo que nenhum facto existe, denunciador de a Administração ter praticado o acto de forma injusta ou imparcial.
5. Não se mostra violado o n.º 2, alínea a) do art.º 118º do CPAM, uma vez que a fixação de efeito retroactivo ao acto administrativo é de natureza discricionária, sendo ainda certo que, no caso concreto, o recorrente não reunia as condições para lhe ser aplicado o Regulamento Administrativo n.º 20/2003.
6. Também se não mostra violado o art.º 110º do CPAM nem as normas do Regulamento Administrativo 20/2003, no que se refere à falta de impugnação dos actos de processamento, uma vez que as notas dos abonos ao longo dos anos são esclarecedoras de que a Administração entendia não ser aplicável ao recorrente o citado Regulamento.
7. Finalmente, também não se mostra violado o princípio da igualdade, uma vez que o citado Regulamento Administrativo não era aplicável a todos os funcionários indistintamente, devendo estes preencher determinados requisitos para a sua aplicação, não tendo o recorrente invocadas factos concretos que demonstrem ter sido o mesmo aplicado a funcionários com as mesmas condições que as suas, não bastando o mero facto do trabalho no mesmo local.
Nestes termos e por todo o exposto, deverá ser negado provimento ao recurso.”
*
Notificadas as partes para, querendo, apresentarem alegações facultativas, ambas as partes usaram desta faculdade, reiterando as razões inicialmente assumidas nos respectivos articulados.
Aberta vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, foi emitido o seguinte douto parecer:
“Nos presentes autos de recurso contencioso que foi interposto por A, melhor identificado nos autos, e que tem por objecto o acto do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, datado de 28 de Setembro de 2018 e esclarecido e confirmado em 26 de Novembro de 2018, vem o Ministério Público, ao abrigo do disposto no artigo 69.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), emitir parecer nos termos que seguem:
1.
Por requerimento datado de 21 de Junho de 2018, dirigido à Directora dos Serviços de Turismo, o ora Recorrente solicitou que lhe fosse aplicado retroactivamente, nos termos do artigo 118.º, n.º 2, alínea a) do Código do Procedimento Administrativo (CPA), o regime previsto no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, donde constam as normas especiais aplicáveis ao pessoal que presta serviço nas delegações da Região Administrativa Especial de Macau, reconhecendo-se os respectivos direitos, regalias e subsídios.
A Direcção dos Serviços de Turismo (DST) elaborou a Informação n.º 8/DAF/2018, de 10 de Setembro de 2018, propondo à Entidade Recorrida, o deferimento do pedido formulado pelo ora Recorrente.
Em face de tal Informação, a Entidade Recorrida solicitou um parecer ao Gabinete da Secretária para a Administração e Justiça, que o emitiu em 24 de Setembro de 2018, aí se concluindo no sentido dever ser indeferido o pedido formulado pelo ora Recorrente.
A Entidade Recorrida, na sequência desse parecer, exarou na Informação da DST, em 28 de Setembro de 2018, o seguinte despacho: «Vide o anexo, Parecer em anexo n.º 181/CSH/GSAJ/2018».
Posteriormente, a solicitação do ora Recorrente, a Entidade Recorrida, em 26 de Novembro de 2018, esclareceu que a sua decisão de 28 de Setembro era de indeferimento da pretensão (acto recorrido).
Inconformado, o Recorrente interpôs o presente recurso contencioso, imputando ao acto recorrido os seguintes vícios:
• Vício de procedimento por incumprimento do trâmite procedimental da audiência dos interessados;
• Vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por erro na interpretação e aplicação das normas dos artigos 10.º, n.º 1 e 2 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (ETAPM), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 87/89, de 21 de Dezembro, e 118.º, n.º 2, alínea a) do CPA;
• Vício de violação de lei por erro de interpretação e aplicação das normas do artigo 110.º do CPA e normas do Regulamento Administrativo n.º 20/2003;
• Vício de violação de lei por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 302.º, 303.º, alínea f) e 311.º, n.º 1, alínea c) do Código Civil;
• Vício de violação de lei por violação do princípio da igualdade.
2.
2.1.
O primeiro dos vícios que o Recorrente imputa ao acto recorrido é o resultante do alegado incumprimento do trâmite procedimental da audiência dos interessados.
Decorre do disposto no n.º 1 do artigo 93.º do CPA:
«(…) concluída a instrução, os interessados têm direito a ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta».
No caso, o Recorrente, antes da decisão final, não foi informado do sentido dessa decisão nem, consequentemente, teve oportunidade de se pronunciar sobre o projectado indeferimento e a situação não é, de todo, enquadrável nas normas dos artigos 96.º e 97.º do CPA.
Trata-se, como é de bom de ver, de uma clara violação daquele direito de participação procedimental, tanto mais que o indeferimento se baseou em matéria de «excepção», se assim podemos dizer, sobre a qual o Recorrente não teve nem podia ter tido qualquer oportunidade de emitir pronúncia em momento anterior.
A omissão da audiência do Recorrente previamente à decisão final constitui vício procedimental que, nos termos do disposto nos artigos 124.º e 130.º, n.º 1 do CPA, é gerador da respectiva anulabilidade.
Procede, a nosso ver e salvo melhor juízo, o primeiro dos vícios invocados pelo Recorrente.
2.2.
Sem prejuízo, e para o caso de não vir a ser esse o douto entendimento do Tribunal, iremos, modestamente, pronunciar-nos sobre os demais vícios alegados.
Diz o Recorrente que o acto enferma de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por ter errado na interpretação e aplicação das normas dos artigos 10.º, n.º 1 e 2 do ETAPM e 118.º, n.º 2, alínea a) do ETAPM.
Vejamos.
No douto parecer que integra o acto recorrido, considerou-se que o provimento do ora Recorrente como coordenador do Centro de Informação e Promoção Turística de Macau em Lisboa, que ocorreu no ano de 2005, está ferido de nulidade por inobservância dos requisitos estabelecidos no artigo 10., n.º 1, alínea a), c), d), e) e f) e n.º 2 do ETAPM, pelo que, ainda de acordo com o mesmo parecer, a comissão de serviço do ora Recorrente era inválida por falta de junção dos certificados de registo criminal e do atestado de aptidão física e mental emitidos pelas autoridades competentes da RAEM.
Portanto, dada a invalidade do provimento do ora Recorrente, seria inviável, de acordo com a Entidade Recorrida, a atribuição de eficácia retroactiva ao acto administrativo que reconheça ao ora Recorrente o direito aos abonos que pretende.
É com alguma perplexidade, com todo o respeito o dizemos, que olhamos para este fundamento invocado no acto recorrido para indeferir a pretensão do ora Recorrente.
Cerca de treze anos depois do primeiro provimento do ora Recorrente e após várias renovações, a Entidade Recorrida vem invocar perante o próprio Recorrente que, afinal, esse provimento é nulo.
Mas a verdade é que esse provimento não é nulo, tendo a Entidade Recorrida incorrido em erro na interpretação e aplicação das normas dos artigos 10.º e 16.º do ETAPM.
Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 10.º do ETAPM, «são requisitos gerais para o desempenho de funções públicas:
a) A nacionalidade portuguesa ou chinesa;
b) A maioridade;
c) A habilitação académica ou profissional;
d) A capacidade profissional;
e) A aptidão física e mental;
f) A residência no território de Macau (leia-se: RAEM)».
Por sua vez, o n.º 2 do artigo 16.º do citado diploma legal preceitua:
«Os provimentos efectuados com inobservância dos requisitos estabelecidos nas alíneas a), c), d), e) e f) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 10.º são nulos».
Da leitura conjugada das transcritas normas resulta que aquilo que gera a nulidade do provimento é a falta dos requisitos elencados no artigo 10.º do ETAPM, não a falta da junção dos documentos comprovativos de tais requisitos. Só assim se justifica a severidade da invalidade cominada.
Além de que, como Recorrente salienta na sua douta petição inicial, ele vinha a exercer funções públicas ininterruptamente quando foi nomeado coordenador do CIPTM em Lisboa e portanto, na falta de qualquer circunstância superveniente relevante, não se justificava nova comprovação dos requisitos.
Donde, o obstáculo invocado no acto recorrido para atribuir eficácia retroactiva ao acto pretendido pelo Recorrente não se verifica e daí que, nesta parte, nos pareça que a razão está do lado do Recorrente.
2.3.
Analisemos, agora, o terceiro fundamento do presente recurso contencioso.
Alega o Recorrente que o acto recorrido incorreu em violação de lei porque os concretos actos de processamento do seu vencimento entre 16.6.2005 e 28.6.2018 não são, ao contrário do que ali se entendeu, verdadeiros actos administrativos, mas meras operações materiais e, portanto, não pode, em relação a eles, falar-se de caducidade do direito de impugnação por parte do Recorrente.
Resulta da fundamentação do acto recorrido que se consideraram os actos de processamento de salários e subsídios ao Recorrente e que praticados ao longo do tempo como sendo actos administrativos que não foram impugnados pelo ora Recorrente e que, como tal, se consolidaram na ordem jurídica em virtude da caducidade do direito à respectiva impugnação.
A propósito da questão da natureza dos actos de processamento de vencimentos, o Tribunal de Última Instância definiu já o sentido da que deve ter-se pela boa interpretação da lei, no sentido de que, «o acto de processamento de abono, que contenha uma definição inovatória e voluntária por parte da Administração, e cujo conteúdo tenha sido levado ao conteúdo do interessado através de notificação, constitui um acto administrativo e consolida-se na ordem jurídica, como caso decidido, se não impugnado» (cfr. Ac. do Tribunal de Última Instância de 15 de Junho de 2010, proc. n.º 22/2010).
O acto recorrido parece querer encontrar apoio nesta douta jurisprudência. Mas a verdade é que, em relação à pretensão concretamente deduzida pelo Recorrente, aquela jurisprudência não é invocável.
Na verdade, a pretensão do Recorrente assenta no que diz ser um novo entendimento da Administração que, ao arrepio da norma do artigo 5.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005, considerou, aí sim, inovadoramente, aplicável ao coordenador do Centro de Promoção e Informação Turística de Macau em Portugal (CPITMP), o regime decorrente do Regulamento n.º 20/2003.
Os actos de processamento do vencimento do Recorrente estavam em absoluta conformidade com as normas legais e regulamentares e por isso não tinha ele qualquer fundamento para impugnar contenciosamente tais actos que, de resto, não continham qualquer definição inovatória e autoritária da situação do Recorrente. O que sucedeu, como dissemos, foi uma interpretação superveniente da Administração que considerou que a pessoa que foi ocupar o lugar do Recorrente, afinal tinha direito aos subsídios e abonos constantes do Regulamento Administrativo n.º 20/2003 e foi com base nessa interpretação que o Recorrente veio reclamar para si igual benefício e com efeitos retroactivos.
Não pode falar-se, portanto, de actos administrativos que, pronunciando-se sobre a questão agora colocada pelo Recorrente a tenham decidido e se tenham consolidado na ordem jurídica por falta de impugnação atempada.
Cremos, por isso, que, também nesta parte o acto recorrido está ferido da invalidade que lhe é apontada pelo Recorrente.
2.4.
O quarto vício apontado ao acto recorrido é o da violação de lei por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 302.º, 303.º, alínea f) e 311.º, n.º 1, alínea c) do Código Civil.
Para o acto recorrido, já teria decorrido, em parte, o prazo de prescrição de 5 anos a que se reporta o artigo 303.º, alínea f) do Código Civil, pelo que não deveria ser praticado um acto com eficácia retroactiva nos termos pretendidos pelo Recorrente.
No entanto, a Entidade Recorrida, com o devido respeito, não ponderou duas coisas.
A primeira foi a de que a prescrição, ainda que se verificasse, não constituiria motivo para, só por isso, para indeferir totalmente a pretensão deduzida pelo Recorrente.
A segunda foi a de que, de acordo com a alínea c) do n.º 1 do artigo 311.º do Código Civil, a prescrição não se completa, entre as partes de um contrato individual de trabalho, relativamente aos créditos emergentes da relação laboral, antes de 2 anos corridos sobre o termo de tal contrato.
Ora, quando o Recorrente dirigiu a sua pretensão à Entidade Recorrida, tal prazo de 2 anos ainda não estava consumado, pelo que jamais se poderiam ter por prescritos os créditos alegados.
Parece-nos, por isso, que também este fundamento do recurso é procedente.
2.5.
Finalmente, em relação ao alegado vício de violação de lei por violação do princípio da igualdade, propendemos a considerar que o Recorrente não tem razão.
Na verdade, estamos em matéria estritamente vinculada ou seja, em matéria relativamente à qual a Administração não dispõe de margem de decisão. Ou o Recorrente preenche os pressupostos legalmente fixados para a atribuição dos complementos remuneratórios que pretende e terá direito a eles ou não preenche tais pressupostos e, nesse caso, não lhe poderão ser atribuídos.
Ora, como a jurisprudência dos nossos Tribunais tem reiteradamente decidido, a violação do princípio igualdade, como, em geral, dos demais princípios gerais da actividade administrativa, só tem relevância autónoma  no âmbito do exercício de poderes discricionários, pois na actividade vinculada o órgão administrativo se tem de limitar a cumprir estritamente a lei, não tendo autonomia na execução normativa (assim, entre muitos outros, Ac. do Tribunal de Última Instância de 30.7.2015, processo n.º 46/2015).
Daí que, como referimos, nos pareça que este vício da violação do princípio da igualdade não pode proceder.
3.
Sem prejuízo do que vimos de dizer e, nomeadamente, de considerarmos que o acto recorrido padece, com excepção do último antes referido, dos vícios que lhe são imputados pelo Recorrente, parece-nos que o presente recurso não deve proceder.
Como referimos, estamos no âmbito de matéria de estrita vinculação legal e nesse quadro, o que se verifica, em nosso modesto entendimento, é que não estão reunidos os pressupostos legais de que depende a atribuição ao Recorrente dos complementos remuneratórios que ele pretende.
Iremos procurar demonstrar porquê.
A questão é a de saber se o Coordenador do CPITMP tem ou não direito ao abono dos direitos e regalias previstos no Regulamento Administrativo 20/2003.
Vejamos.
Logo na norma do seu artigo 1.º, o Regulamento Administrativo n.º 20/2003 define o seu objecto e âmbito nos seguintes termos:
«O presente regulamento administrativo estabelece as normas especiais aplicáveis ao pessoal que presta serviço nas Delegações da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM)».
O conteúdo normativo deste inciso regulamentar é muito claro. As normas especiais (especiais, diga-se, em relação ao Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) que se estabelecem no Regulamento Administrativo n.º 20/2003 só se aplicam ao pessoal que presta serviço nas Delegações da RAEM e portanto, por exclusão, a nenhum outro pessoal da Administração Pública. Por isso que são normas especiais.
Ora, o CPITMP, embora funcionando nas instalações da Delegação Económica e Comercial de Macau, em Portugal (ponto 1.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005), não é, ele próprio, uma Delegação da RAEM.  É uma pequena equipa de projecto que tem objectivos muito limitados e específicos, em concreto, o desenvolvimento e implementação de acções de promoção turística nos mercados português e espanhol (cfr. ponto 3 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005). Nada mais.
Em Lisboa, há a Delegação Económica e Comercial de Macau e há, a funcionar nas instalações desta, mas com ela não se confundindo, o CPITMP.
Daí que, ao pessoal que presta serviço no CPITMP, não sendo este uma delegação da RAEM, não sejam aplicáveis as normas especiais resultantes do Regulamento Administrativo 20/2003.
De resto, o Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005, que criou o CPITMP, embora contenha normas relativas ao pessoal que ali presta funções, nomeadamente os respectivos n.ºs 5, 6 e 7, em lado algum estende a aplicação a esse pessoal das normas especiais do Regulamento Administrativo n.º 20/2003. Pelo contrário. O Despacho especificou, relativamente ao coordenador do CPITMP,  que este é remunerado segundo o índice 700 da tabela indiciária (cfr. o ponto 5 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005), para além, naturalmente das componentes remuneratórias previstas, em geral para os trabalhadores da Administração Pública, no ETAPM.
Também não se pode dizer que existe uma lacuna carecedora de integração uma vez que parece claro que o autor da regulação normativa da matéria em causa, o Chefe do Executivo, não quis estender ao pessoal do CPITMP os direitos e as regalias previstas no Regulamento Administrativo 20/2003. Estabeleceu em relação ao pessoal das delegações e ao pessoal do CPITMP uma diferenciação que se justifica pelo facto de se tratar de estruturas administrativas muito diferentes entre si. Se quisesse ver aplicado o mesmo estatuto bastaria introduzir uma norma remissiva no Despacho n.º 154/2005. O certo é que não o fez.
É igualmente inviável considerar, por via interpretativa, que a letra do texto da norma do artigo 2.º do Regulamento Administrativo n.º 20/2003, ficou aquém do seu espírito e que a fórmula verbal adoptada peca por defeito por dizer menos do que aquilo que se pretendeu dizer, para, com base nisso interpretar extensivamente a norma. É que a formulação da norma do artigo 2.º é muito clara: por um lado diz que no Regulamento se criam normas especiais, que se afastam, portanto, do regime geral; e que essas normas especiais só se aplicam a um grupo de trabalhadores, os que prestam serviço nas delegações. Importa sublinhar que estamos a falar de normas regulamentares que prevêem despesa para o erário público que devem, por isso, ser objecto de uma interpretação criteriosa e prudente, pois o seu alargamento por via de aplicações casuísticas por parte da Administração por meio de interpretações que não encontram na letra da lei, um mínimo de correspondência verbal (cfr. artigo 8.º, n.º 2 do Código Civil), acabarão por redundar em despesas públicas sem suporte legal.
Como é manifesto, para sustentar a aplicabilidade das regalias previstas no Regulamento n.º 20/2003 aos trabalhadores do CPITMP, não basta invocar, como fez a Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública, no ofício que a propósito desta questão enviou à Directora dos Serviços de Turismo e cuja cópia se encontra a fls. 542 do processo administrativo instrutor, «os elementares princípios gerais que regem o nosso ordenamento jurídico, como sejam os da igualdade e da justiça».
É que, para além de não se vislumbrar qualquer exigência de igualdade e justiça que implique a extensão do regime, dado que, como vimos, se trata de situações diversas, a verdade é que só o Chefe do Executivo, através de uma intervenção normativa de natureza regulamentar pode, com base nessa ou noutras considerações, estender o regime do pessoal das delegações aos trabalhadores do CPITMP ou a outros trabalhadores. Isso não cabe a quem, na Administração, está vinculado a aplicar a lei ou os regulamentos vigentes. Parece-nos truístico que a Administração actua de jure constituto não de jure constituendo.
Daí que entendamos, salvo melhor opinião, que a pretensão do Recorrente está votada ao insucesso, sendo o seu indeferimento a única decisão legalmente possível.
Por isso consideramos que, no caso em apreço, o efeito anulatório dos diversos vícios de que o acto recorrido padece se não deve produzir, dado que, uma vez que, só sendo legal um acto de indeferimento, tal redundaria na prática, pela Administração, de outro acto com os mesmos efeitos, em contrário, portanto, da economia de procedimentos que um critério de simples racionalidade parece aconselhar.
Sempre se diga que esta neutralização do efeito anulatório não depende da natureza dos vícios do acto impugnado. Podem ter natureza formal ou procedimental, como normalmente sucede, mas também podem ser vícios substanciais, como no caso ocorre (sobre isto e neste sentido, cfr. JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, in Comentários à revisão do Código do Procedimento Administrativo, Coimbra, 2016, pp. 330-331 e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito Administrativo, 3.ª edição, Coimbra, 2015, p. 277. Embora o nosso CPA não contenha norma idêntica à do n.º 5 artigo 163.º do CPA, a verdade é que esta norma é reflexo de uma longa prática jurisprudencial num quadro normativo idêntico ao nosso).
4.
Face ao exposto, somos de parecer de que o presente recurso, salvo melhor opinião, deve ser julgado improcedente.
//
Na sua petição de recurso, o Recorrente alega que a actual Coordenadora do CPITMP tem vindo a receber os direitos e regalias previstos no Regulamento n.º 20/2003. A verificar-se, tal situação carecerá, pelo que dissemos e no nosso entendimento, de qualquer base legal.
Daí que, por força do artigo 90.º da Lei Básica e do n.º 1 do artigo 56.º da Lei de Bases da Organização Judiciária, se imponha ao Ministério Público, em defesa da legalidade administrativa, encetar diligências tendentes a apurar se, em que termos e a que título, a actual Coordenadora do CPITMP aufere os ditos complementos remuneratórios, tendo em vista ponderar, nomeadamente, a eventual interposição do meio contencioso que se afigure pertinente no exercício da legitimidade processual que decorre da alínea c) do artigo 33.º do CPAC.
Pelo exposto, respeitosamente requeremos a Vossa Excelência, Senhor Juiz Relator, que ordene a extracção de certidão deste parecer e da petição inicial do recurso contencioso e que determine que a mesma nos seja entregue.”
*
Corridos os vistos, cumpre decidir.
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas, estão devidamente representadas e têm interesse processual.
Não existem nulidades nem excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
A certidão solicitada pelo Ministério Público foi oportunamente emitida e entregue àquela instituição.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
Resulta provada dos elementos constantes dos autos, designadamente do processo administrativo, a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão do recurso:
O recorrente iniciou funções em Macau, em Janeiro de 1982, tendo exercido funções de subdirector, em regime de substituição, e de director, também em substituição, na Direcção dos Serviços de Turismo (DST) até Outubro de 2000, data a partir da qual e sem interrupção de serviço, passou a exercer funções no então escritório de representação da DST em Lisboa, em regime de contrato individual de trabalho, com a categoria de técnico superior.
Em 2003, foi publicado, no Boletim Oficial da RAEM, o Regulamento Administrativo n.º 20/2003, que estabelece, tal como resulta do seu artigo 1.º, “as normas especiais aplicáveis ao pessoal que presta serviço nas Delegações da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM)”.
Em 10.5.2005, através do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 20, I Série, de 16.5.2005, foi criado o Centro de Promoção e Informação Turística de Macau, em Portugal, ou abreviadamente “CPITMP”.
Por despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura n.º 59/2005, de 14.6.2005, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 25, II Série, de 22.6.2005, o recorrente foi nomeado coordenador do CPITMP.
O acto público de tomada de posse e assinatura do respectivo termo teve lugar em Macau, no dia 6.7.2005.
Na sequência da tomada de posse e tal como decorre da norma do artigo 5.º do Regulamento Administrativo n.º 154/2005, o recorrente passou a ser remunerado segundo o índice 700 da tabela indiciária.
Ao recorrente nunca foi aplicado o regime previsto no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, aplicável ao pessoal que presta serviço nas delegações da RAEM.
No entanto, tal regime chegou a ser aplicado ao pessoal com vínculo à Administração Pública da RAEM destacado para exercer funções no referido CPITMP.
O mesmo sucedeu relativamente à nova coordenadora, recentemente nomeada por despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura n.º 120/2018, de 21.9.2018, justamente para preencher o lugar deixado vago pelo recorrente, por ter atingido o limite de idade para o exercício de funções públicas em 27.6.2018.
Por requerimento de 21.6.2018, o recorrente solicitou que fosse analisada a sua situação jurídica, pedindo que lhe fosse aplicado retroactivamente o regime previsto no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, donde constam as normas especiais aplicáveis ao pessoal que presta serviço nas delegações da RAEM, reconhecendo os respectivos direitos, regalias e subsídios.
Foi elaborado pelo Gabinete da Secretária para a Administração e Justiça o seguinte parecer:
“根據社會文化司司長辦公室第2620/GSASC/2018號公函,附上旅遊局第8/DAF/2018號報告書及附件,敬請本辦對有關事宜提供意見,現本人發表意見如下:
一、概況
1. A先生,前澳門駐葡萄牙旅遊推廣暨諮詢中心(下稱中心)協調員,自1977年9月進入葡國公職,並自1982年11月18日起來澳擔任公共職務,為澳門特區永久性居民。於該中心成立前,即2000年10月1日至2005年6月15日期間以個人勞動合同方式於旅遊局里斯本辦事處工作,之後於中心成立時,即2005年6月16日以定期委任方式擔任中心協調員,一直至2018年6 月27日達年齡上限退休為止。
2. 於2018年6月21日,其向旅遊局作出申請,冀重新分析其法律狀況,並根據《行政程序法典》第118條第2款a)項的規定,要求對其追溯適用第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辧事處人員制度》規定的制度以及承認其有關權利、福利及津貼。
3. 於2018年8月14日,因旅遊局對上述追溯適用存有疑問,於是透過第480/Conf./DAF/2018號公函諮詢行政公職局的意見: 1) 對本個案,是否適用第20/2003號行政法規? 2) 如果適用,是否允許有關法規的追溯、有關返還時效是多少以及有關津貼的金錢計算,包括駐外月津貼、設備津貼等等?
4. 於2018年8月28日,行政公職局以第1808270026/DTJ號公函回覆旅遊局,對於第一個問題,行政公職局認為協調員是適用第20/2003號行政法規規定的制度,因為中心人員工作情況類似澳門特別行政區駐外辦事處人員以及考慮到澳門特區法制的原則,如平等原則和公正原則;對於第二個問題,行政公職局認為,按照《行政程序法典》第117及118條,特別是按照第118條第2款a)項的規定,有權限實體,即社會文化司司長有權決定是否追溯適用有關法規至A先生被定期委任為中心協調員之日。並且旅遊局應具體計算那些補助或津貼可支付給A先生,因其可能之前已收取某些補助或津貼。
5. 於2018年9月10日,基於上述行政公職局的意見,旅遊局透過題述第8/DAF/2018號報告書,建議社會文化司司長批准追溯給予A先生自2005年6月16日至2018年6月27日期間的駐外月津貼、一次性安頓補助、每年的旅程權利以及每年5個工作日補充年假的相應金額,大約總值4,631,250.00澳門幣。但對此建議,社會文化司司長辦公室以題述公函諮詢本辦意見。
二、分析
1. 根據第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》第1條的規定,本法規是適用於在澳門特別行政區駐外辦事處提供服務的人員的特別規定。又根據第154/2005號行政長官批示第1款的規定,“設立“澳門駐葡萄牙旅遊推廣暨諮詢中心”(下稱“中心”),性質為項目組,在中國澳門駐葡萄牙經濟貿易代表處設施內運作。”我們認為,中心是屬於上述法規所定的澳門特別行政區駐外辦事處的性質,所以在中心的工作人員應適用該駐外辦事處人員的制度,這與行政公職局的看法一致。
2. 但是,在本個案中,我們不認同行政公職局第二個看法(按照《行政程序法典》第118條第2款a)項的規定,社會文化司司長可作出批示,給予A先生第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》所規定的津貼及補助,批示效力追溯至A先生被定期委任為中心協調員之日,即2005年6月16日),理由如下。
3. 第一,根據上述行政公職局的公函,其中提及該局曾以第303/DTJ/EMAIL/2018號電郵回答旅遊局提出的第一個問題。其中電郵第26點指出,刑事紀錄證明書以及身體及精神健康證明書不能由葡國的官方機構發出,即使中心協調員的職務是在澳門特區外進行,因此,我們相信,當A先生被定期委任為中心協調員時,他缺少上述證明書,所以,根據《澳門公共行政工作人員通則》第16條第2款的規定,不遵守該通則第10條第1款a項、c項、d項、e項及f項以及同條第2款所指要件之情況下作出之任用無效,即是說,A先生因缺乏提交由澳門特區的有關機構發出的刑事紀錄證明書以及身體及精神健康證明書,造成其定期委任無效。
4. 又根據《行政程序法典》第118條第2款a項的規定,賦予行政行為追溯效力必須同時答合三要件: 1) 賦予追溯效力對利害關係人有利;2) 賦予追溯效力不損害第三人之權利或受法律保護之利益;3) 在該行為之效力擬溯及之日必須已存在證明賦予追溯效力為合理之前提。由於在委任A先生為中心協調員之日,缺乏提交由澳門特區的有關機構發出的刑事紀錄證明書以及身體及精神健康證明書,使到其委任無效,所以在該日沒有存在證明賦予追溯效力為合理之前提。因此,不能根據上述法典第118條第2款a項的規定,要求社會文化司司長作出具追溯效力至2005年6月16日的批示,給予A先生第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》所規定的津貼及補助。
5. 雖然我們認為當時中心協調員的定期委任無效,但可根據《行政程序法典》第123條第3款的規定,因時間的經過及按法律的一般原則,可賦該無效行為的表見或假定效果(efeitos putativos),即是說,在定期委任期間,中心協調員所作的行為或對他所作的行為不受影響,不需要返還行政當局對他作出的給付,如薪俸、其他津貼等等。
6. 第二,假設當時中心協調員的定期委任有效,我們仍然認為,社會文化司司長不應現在作出一個具追溯效力至2005年6月16日行為,賦予當事人第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助。因為,在當事人定期委任期間,行政當局每月都向其作出發放薪俸及津貼的行為,而這每月發放薪俸及津貼的行為是一個真正的行政行為,這個見解是得到中級法院第489/2009號合議庭裁判書的支持。根據有關法律的規定,如當事人認為有關行政行為違反法律,存有瑕疵,應進行申駁,如行政上訴及司法上訴,否則經過一年之後,有關可撤銷的行為將得已補正,變成有效的行為。在本個案中,如從2005年6月16日開始,每月的發薪行為,因沒有發放予當事人有關第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助,屬占有違法瑕疵而可撤銷的行為,但是當事人從來沒有提出申駁,令其有關申駁權已經失效,再加上時間的過去,也令這些無數的可撤銷的行為得到補正,所以我們認為,違法的行為,可撤銷的行為已得到補正,現在已沒有基礎支持社會文化司司長作出一個具追溯效力至2005年6月16日行為,賦予當事人第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助。
7. 第三,即使不認同上點的理據,但是根據《民法典》第303條f項的規定,由於當事人從2005年6月16日至現在沒有實際行使有關第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助的權利,所以從2005年6月16日至五年前期間的有關權利的時效已過,現在社會文化司司長不應作出一個具追溯效力至2005年6月16日行為,賦予當事人第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助。
三、結論
綜上所述,我們認為現在社會文化司司長不應作出一個具追溯效力至2005年6月16日行為,賦予當事人第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助,因為當事人當時沒有提交由澳門特區有關機構發出的刑事紀錄證明書以及身體及精神健康證明書,不遵守法律規定的入職要件,令其委任無效,因此不符合《行政程序法典》第118條第2款a項最後部份的規定。除此之外,也因為從當事人定期委任起始,行政當局每月沒有向當事人發放第20/2003號行政法規《澳門特別行政區駐外辦事處人員制度》規定的津貼及補助的違法行為已得到補正至不具司法上訴期為止以及從2005年6月16日至五年前期間,當事人的有關權利的時效已過。”

Por despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, de 28.9.2018, foi proferido o seguinte despacho:
“見附件行政法務司司長辦公室第181/CSH/GSAJ/2018意見書。”

Pedindo o recorrente para esclarecer o referido despacho, foi elaborada a seguinte Informação:
“1. Como é do conhecimento de V. Ex.a, a Direcção dos Serviços de Turismo recebeu, aos 21 de Junho de 2018, um ofício do ex-coordenador do Centro de Promoção e Informação Turística de Macau, em Portugal (ora adiante designado por “Centro”), A, no qual solicitou uma análise e revisão retroactiva da natureza da sua vinculação funcional, apelando que a aplicação do Regulamento Administrativo n.º 20/2003 seria obrigatória à data da sua nomeação em comissão de serviço, como Coordenador do Centro (Vd. Anexo 1). Posteriormente, em 10 de Setembro de 2018, estes Serviços submeteram a Proposta n.º 8/DAF/2018 (Vd. Anexo 2), propondo a aplicação retroactiva a A do subsídio mensal de deslocação entre 16 de Junho de 2005 e 27 de Junho de 2018, do abono para despesas de instalação a pagar duma só vez, dos direitos a viagens anual e de um complemento de licença para férias correspondente a 5 dias úteis, por meio pecuniário, de acordo com o parecer jurídico constante do Ofício n.º 1808270026/DTJ da DSAFP (Vd. Anexo 3), tendo estes Serviços a 28 de Setembro de 2018, recebido o despacho de V. Ex.a, no qual refere que “Vide o anexo, Parecer n.º 181/CSH/GSAJ/2018 do GSAJ”.
2. Em 9 de Outubro de 2018, a DST transcreveu o parecer jurídico do GSAJ a A mediante o Ofício n.º 582/Conf./DAF/2018 (Vd. Anexo 4). Aos 13 de Novembro de 2018, recebeu a DST uma carta emitida pelo advogado procurado por A, Dr. João Soares (Vd. Anexo 5), requerendo a informação de decisão proferida sobre o pedido em causa e a ordenação da notificação da mesma, incluindo as menções referidas no artigo 70º do CPA. Solicitou ainda a emissão de certidão dos pareceres emitidos pela DSAJ e do GSAJ, bem como do despacho de V. Ex.a em 28 de Setembro de 2018.
3. Pese embora que o despacho proferido por V. Ex.a, de 28 de Setembro de 2018, na Proposta n.º 8/DAF/2018 não seja enunciada, de forma precisa, sobre o indeferimento do pedido de A, refere-se expressamente que “Vide o anexo, Parecer n.º 181/CSH/GSAJ/2018 do GSAJ”, no qual indicou “(…) em nosso entender, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura não deve atribuir eficácia retroactiva, desde 16 de Junho de 2005, dos abonos e subsídios constantes do Regulamento Administrativo n.º 20/2003 (Regime do Pessoal das Delegações da Região Administrativa Especial de Macau) ao requerente em causa” (Vd. Anexo 6). Deste modo, a DST entende que através do despacho de V. Ex.a de 28 de Setembro de 2018, o pedido de A foi indeferido.
4. Nestes termos, caso V. Ex.a concorde com o entendimento da DST supramencionado, de modo a cumprir o disposto nos artigos 63º e 65º do CPA, estes Serviços passarão, no prazo de 10 dias úteis a contar da apresentação do respectivo requerimento (ou seja até 27 de Novembro de 2018), certidão solicitada na carta do advogado procurado por A, Dr. João Soares. De acordo com os artigos 68º a 72º do CPA, a DST irá notificar novamente a decisão de indeferimento proferida por V. Ex.a, incluindo, nomeadamente, a indicação de que a referida decisão é impugnável por meio de reclamação e de recurso hierárquico facultativo, respectivamente, ao Ex.mo Senhor Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura e Ex.mo Senhor Chefe do Executivo, no prazo de 15 (quinze) dias e 60 (sessenta) dias, a contar da data da notificação da decisão, nos termos do artigo 148º, alínea b) do artigo 149º, artigo 153º e n.º 2 do artigo 155º do CPA e da alínea b) do n.º 2 do artigo 25º do CPAC; é ainda susceptível de recurso contencioso para o Tribunal de Segundo Instância, a interpor no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da notificação da decisão, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 25º e alínea a) do n.º 2 do artigo 26º do CPAC e (2) da alínea 8) do artigo 36º da Lei n.º 9/1999 (Lei de Bases da Organização Judiciária), republicado pelo Despacho do Chefe do Executivo n.º 265/2004.
5. Tendo em conta que a DST não tem a versão original do Parecer n.º 181/CSH/GSAJ/2018 do GSAJ, não podendo passar a respectiva certidão conforme o pedido constante da carta do Dr. João Soares, advogado procurado por A. Deste modo, solicita-se o fornecimento da versão original do Parecer n.º 181/CSH/GSAJ/2018.
À consideração superior de V. Ex.a.”

Sobre tal Informação recaiu o seguinte despacho do Secretário para os Assuntos Sociais e Culturais, de 26.11.2018:
“同意。”
*
Vejamos agora os vícios invocados pelo recorrente, segundo a ordem dos fundamentos cuja procedência permita uma maior estabilidade ou tutela dos direitos e interesses do administrado, ao abrigo da alínea a) do n.º 3 do artigo 74.º do CPAC.

Do alegado vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 10.º, n.º 1, alíneas a), c), d), e) e f) e n.º 2 do ETAPM e 118.º, n.º 2, alínea a) do CPA
Entende a entidade recorrida que os certificados de registo criminal e os atestados de aptidão física e mental não podem ser emitidos pela Administração Pública de Portugal, daí que a falta de junção dos respectivos documentos legais acarreta a nulidade do seu provimento prevista no artigo 16.º, n.º 2 do ETAPM, pela inobservância dos requisitos estabelecidos no artigo 10.º, n.º 1, alíneas a), c), d), e) e f) e n.º 2 do mesmo diploma legal.
Quanto a essa questão, conferimos o parecer do Ministério Público na parte em que abordou aquela matéria, com o qual concordamos inteiramente nos seguintes termos transcritos:
“Diz o Recorrente que o acto enferma de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, por ter errado na interpretação e aplicação das normas dos artigos 10.º, n.º 1 e 2 do ETAPM e 118.º, n.º 2, alínea a) do ETAPM.
Vejamos.
No douto parecer que integra o acto recorrido, considerou-se que o provimento do ora Recorrente como coordenador do Centro de Informação e Promoção Turística de Macau em Lisboa, que ocorreu no ano de 2005, está ferido de nulidade por inobservância dos requisitos estabelecidos no artigo 10., n.º 1, alínea a), c), d), e) e f) e n.º 2 do ETAPM, pelo que, ainda de acordo com o mesmo parecer, a comissão de serviço do ora Recorrente era inválida por falta de junção dos certificados de registo criminal e do atestado de aptidão física e mental emitidos pelas autoridades competentes da RAEM.
Portanto, dada a invalidade do provimento do ora Recorrente, seria inviável, de acordo com a Entidade Recorrida, a atribuição de eficácia retroactiva ao acto administrativo que reconheça ao ora Recorrente o direito aos abonos que pretende.
É com alguma perplexidade, com todo o respeito o dizemos, que olhamos para este fundamento invocado no acto recorrido para indeferir a pretensão do ora Recorrente.
Cerca de treze anos depois do primeiro provimento do ora Recorrente e após várias renovações, a Entidade Recorrida vem invocar perante o próprio Recorrente que, afinal, esse provimento é nulo.
Mas a verdade é que esse provimento não é nulo, tendo a Entidade Recorrida incorrido em erro na interpretação e aplicação das normas dos artigos 10.º e 16.º do ETAPM.
Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 10.º do ETAPM, «são requisitos gerais para o desempenho de funções públicas:
a) A nacionalidade portuguesa ou chinesa;
b) A maioridade;
c) A habilitação académica ou profissional;
d) A capacidade profissional;
e) A aptidão física e mental;
f) A residência no território de Macau (leia-se: RAEM)».
Por sua vez, o n.º 2 do artigo 16.º do citado diploma legal preceitua:
«Os provimentos efectuados com inobservância dos requisitos estabelecidos nas alíneas a), c), d), e) e f) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 10.º são nulos».
Da leitura conjugada das transcritas normas resulta que aquilo que gera a nulidade do provimento é a falta dos requisitos elencados no artigo 10.º do ETAPM, não a falta da junção dos documentos comprovativos de tais requisitos. Só assim se justifica a severidade da invalidade cominada.
Além de que, como o Recorrente salienta na sua douta petição inicial, ele vinha a exercer funções públicas ininterruptamente quando foi nomeado coordenador do CIPTM em Lisboa e portanto, na falta de qualquer circunstância superveniente relevante, não se justificava nova comprovação dos requisitos.
Donde, o obstáculo invocado no acto recorrido para atribuir eficácia retroactiva ao acto pretendido pelo Recorrente não se verifica e daí que, nesta parte, nos pareça que a razão está do lado do Recorrente.”
Face às considerações acima expostas, julgamos procedente o vício apontado.
*
Do alegado vício de violação de lei por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 110.º do CPA e do Regulamento Administrativo n.º 20/2003.
Entende ainda a entidade recorrida que o recorrente não pode ver efectivado o seu direito à obtenção dos subsídios e abonos previstos no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, com fundamento de que tendo-lhe sido processado todos os meses a respectiva remuneração e sendo os actos processadores do vencimento verdadeiros actos administrativos, os mesmos se estabilizaram na ordem jurídica, por não terem sido impugnados oportunamente.
No tocante a essa questão, também concordamos inteiramente com a opinião emitida pelo Digno Magistrado do Ministério Público no seu parecer que a seguir se transcreve e que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais:
“Analisemos, agora, o terceiro fundamento do presente recurso contencioso.
Alega o Recorrente que o acto recorrido incorreu em violação de lei porque os concretos actos de processamento do seu vencimento entre 16.6.2005 e 28.6.2018 não são, ao contrário do que ali se entendeu, verdadeiros actos administrativos, mas meras operações materiais e, portanto, não pode, em relação a eles, falar-se de caducidade do direito de impugnação por parte do Recorrente.
Resulta da fundamentação do acto recorrido que se consideraram os actos de processamento de salários e subsídios ao Recorrente e que praticados ao longo do tempo como sendo actos administrativos que não foram impugnados pelo ora Recorrente e que, como tal, se consolidaram na ordem jurídica em virtude da caducidade do direito à respectiva impugnação.
A propósito da questão da natureza dos actos de processamento de vencimentos, o Tribunal de Última Instância definiu já o sentido da que deve ter-se pela boa interpretação da lei, no sentido de que, «o acto de processamento de abono, que contenha uma definição inovatória e voluntária por parte da Administração, e cujo conteúdo tenha sido levado ao conhecimento do interessado através de notificação, constitui um acto administrativo e consolida-se na ordem jurídica, como caso decidido, se não impugnado» (cfr. Ac. do Tribunal de Última Instância de 15 de Junho de 2010, proc. n.º 22/2010).
O acto recorrido parece querer encontrar apoio nesta douta jurisprudência. Mas a verdade é que, em relação à pretensão concretamente deduzida pelo Recorrente, aquela jurisprudência não é invocável.
Na verdade, a pretensão do Recorrente assenta no que diz ser um novo entendimento da Administração que, ao arrepio da norma do artigo 5.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005, considerou, aí sim, inovadoramente, aplicável ao coordenador do Centro de Promoção e Informação Turística de Macau em Portugal (CPITMP), o regime decorrente do Regulamento n.º 20/2003.
Os actos de processamento do vencimento do Recorrente estavam em absoluta conformidade com as normas legais e regulamentares e por isso não tinha ele qualquer fundamento para impugnar contenciosamente tais actos que, de resto, não continham qualquer definição inovatória e autoritária da situação do Recorrente. O que sucedeu, como dissemos, foi uma interpretação superveniente da Administração que considerou que a pessoa que foi ocupar o lugar do Recorrente, afinal tinha direito aos subsídios e abonos constantes do Regulamento Administrativo n.º 20/2003 e foi com base nessa interpretação que o Recorrente veio reclamar para si igual benefício e com efeitos retroactivos.
Não pode falar-se, portanto, de actos administrativos que, pronunciando-se sobre a questão agora colocada pelo Recorrente a tenham decidido e se tenham consolidado na ordem jurídica por falta de impugnação atempada.
Cremos, por isso, que, também nesta parte o acto recorrido está ferido da invalidade que lhe é apontada pelo Recorrente.”
Efectivamente, a questão material agora em apreço, no sentido de saber se o recorrente tem ou não direito a receber os respectivos subsídios e abonos, nunca foi abordada nos actos de processamento de vencimentos, pelo que não se pode dizer que a questão se tenha consolidado na ordem jurídica por falta de impugnação por parte do recorrente, pelo que o acto recorrido está ferido da invalidade apontada pelo recorrente.
*
Do pretenso vício de violação de lei por erro de interpretação e aplicação das normas dos artigos 302.º, 303.º, alínea f) e 311.º, n.º 1, alínea c) do Código Civil
Ao contrário do defendido no acto recorrido, o recorrente entende que o prazo de prescrição não é de 5 anos, mas sim o prazo-regra estabelecido no artigo 302.º do Código Civil, que é de 15 anos.
Em boa verdade, valendo-se da opinião do Digno Magistrado do Ministério Público, no sentido de que, independentemente da questão de saber se o prazo de prescrição é de 5 ou 15 anos, essa prescrição não se completa antes de 2 anos corridos sobre o termo do contrato de trabalho, nos termos estatuídos na alínea c) do n.º 1 do artigo 311.º do Código Civil.
No caso vertente, o recorrente cessou a sua relação de trabalho com a Administração em 27.6.2018 por ter atingido o limite de idade para o exercício de funções públicas, tendo formulado o requerimento pedindo que fosse analisada a sua situação jurídica para efeitos de reconhecimento dos respectivos direitos, regalias e subsídios previstos no Regulamento Administrativo n.º 20/2003, ainda antes da cessação da relação de trabalho, ou seja, em 21.6.2018, pelo que não decorreram os dois anos sobre o termo do contrato de trabalho, mostrando, assim, o acto recorrido inquinado do vício invocado pelo recorrente.
*
Do alegado vício de violação de lei por afronta ao princípio da igualdade
Defende o recorrente que houve violação do princípio da igualdade alegando que o recorrente foi tratado diferentemente de outros funcionários que exerceram ou exercem funções no CPITMP.
Ora bem, os Tribunais da RAEM têm reiteradamente decidido que a violação do princípio da igualdade, e dos demais princípios gerais da actividade administrativa, só releva no âmbito do exercício de poderes discricionários, e não na actividade vinculada da Administração.
No que respeita à atribuição de subsídios e abonos aos funcionários que exercem funções no CPITMP, somos a entender que não se trata de matéria que depende do uso de poderes discricionários, antes se está perante uma situação de estrita vinculação legal, ou seja, a atribuição daqueles benefícios remuneratórios aos trabalhadores depende da verificação dos respectivos pressupostos legais.
Na medida em que a atribuição daquelas remunerações está sujeita a pressupostos legais, não pode haver lugar a ofensa do princípio da igualdade, quando muito apenas a da violação de lei, assim, improcede o recurso nesta parte.
*
Da alegada falta de audiência do interessado
Diz o recorrente que ele não foi ouvido sobre as razões do indeferimento, imputando ao acto administrativo vício de preterição da audiência do interessado.
Prevê o n.º 1 do artigo 93.º do CPA que, salvo o disposto nos artigos 96.º e 97.º, uma vez concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
Ora bem, o que se pretende com a audiência dos interessados é assegurar o direito do contraditório dos interessados, evitando a chamada decisão surpresa, permitindo que os mesmos, no caso de se ter realizado alguma diligência instrutória, manifestem os seus pontos de vista adquiridos no procedimento, tendo como objectivo dotar a Administração de elementos necessários para poder dar uma decisão acertada.
Em boa verdade, o recorrente não foi ouvido antes da decisão final, nem está em causa qualquer das situações previstas nos artigos 96.º e 97.º do Código do Procedimento Administrativo, a saber, inexistência ou dispensa de audiência de interessados, pelo que verificado está o vício invocado.
Não obstante, essa preterição não prejudica o resultado final, degradando a sua omissão em formalidade não essencial, não invalidante do acto, como veremos a seguir.
*
Conforme decidido acima, o acto recorrido está inquinado dos vícios de forma e de violação de lei.
Não obstante, somos a entender que, tal como referido pelo Digno Magistrado do Ministério Público, e bem, o indeferimento da pretensão do recorrente é a única decisão legalmente possível.
Pelo Digno Magistrado do Ministério Público foi emitido o seguinte douto parecer:
“Sem prejuízo do que vimos de dizer e, nomeadamente, de considerarmos que o acto recorrido padece, com excepção do último antes referido, dos vícios que lhe são imputados pelo Recorrente, parece-nos que o presente recurso não deve proceder.
Como referimos, estamos no âmbito de matéria de estrita vinculação legal e nesse quadro, o que se verifica, em nosso modesto entendimento, é que não estão reunidos os pressupostos legais de que depende a atribuição ao Recorrente dos complementos remuneratórios que ele pretende.
Iremos procurar demonstrar porquê.
A questão é a de saber se o Coordenador do CPITMP tem ou não direito ao abono dos direitos e regalias previstos no Regulamento Administrativo 20/2003.
Vejamos.
Logo na norma do seu artigo 1.º, o Regulamento Administrativo n.º 20/2003 define o seu objecto e âmbito nos seguintes termos:
«O presente regulamento administrativo estabelece as normas especiais aplicáveis ao pessoal que presta serviço nas Delegações da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM)».
O conteúdo normativo deste inciso regulamentar é muito claro. As normas especiais (especiais, diga-se, em relação ao Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau) que se estabelecem no Regulamento Administrativo n.º 20/2003 só se aplicam ao pessoal que presta serviço nas Delegações da RAEM e portanto, por exclusão, a nenhum outro pessoal da Administração Pública. Por isso que são normas especiais.
Ora, o CPITMP, embora funcionando nas instalações da Delegação Económica e Comercial de Macau, em Portugal (ponto 1.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005), não é, ele próprio, uma Delegação da RAEM.  É uma pequena equipa de projecto que tem objectivos muito limitados e específicos, em concreto, o desenvolvimento e implementação de acções de promoção turística nos mercados português e espanhol (cfr. ponto 3 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005). Nada mais.
Em Lisboa, há a Delegação Económica e Comercial de Macau e há, a funcionar nas instalações desta, mas com ela não se confundindo, o CPITMP.
Daí que, ao pessoal que presta serviço no CPITMP, não sendo este uma delegação da RAEM, não sejam aplicáveis as normas especiais resultantes do Regulamento Administrativo 20/2003.
De resto, o Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005, que criou o CPITMP, embora contenha normas relativas ao pessoal que ali presta funções, nomeadamente os respectivos n.ºs 5, 6 e 7, em lado algum estende a aplicação a esse pessoal das normas especiais do Regulamento Administrativo n.º 20/2003. Pelo contrário. O Despacho especificou, relativamente ao coordenador do CPITMP,  que este é remunerado segundo o índice 700 da tabela indiciária (cfr. o ponto 5 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 154/2005), para além, naturalmente das componentes remuneratórias previstas, em geral para os trabalhadores da Administração Pública, no ETAPM.
Também não se pode dizer que existe uma lacuna carecedora de integração uma vez que parece claro que o autor da regulação normativa da matéria em causa, o Chefe do Executivo, não quis estender ao pessoal do CPITMP os direitos e as regalias previstas no Regulamento Administrativo 20/2003. Estabeleceu em relação ao pessoal das delegações e ao pessoal do CPITMP uma diferenciação que se justifica pelo facto de se tratar de estruturas administrativas muito diferentes entre si. Se quisesse ver aplicado o mesmo estatuto bastaria introduzir uma norma remissiva no Despacho n.º 154/2005. O certo é que não o fez.
É igualmente inviável considerar, por via interpretativa, que a letra do texto da norma do artigo 2.º do Regulamento Administrativo n.º 20/2003, ficou aquém do seu espírito e que a fórmula verbal adoptada peca por defeito por dizer menos do que aquilo que se pretendeu dizer, para, com base nisso interpretar extensivamente a norma. É que a formulação da norma do artigo 2.º é muito clara: por um lado diz que no Regulamento se criam normas especiais, que se afastam, portanto, do regime geral; e que essas normas especiais só se aplicam a um grupo de trabalhadores, os que prestam serviço nas delegações. Importa sublinhar que estamos a falar de normas regulamentares que prevêem despesa para o erário público que devem, por isso, ser objecto de uma interpretação criteriosa e prudente, pois o seu alargamento por via de aplicações casuísticas por parte da Administração por meio de interpretações que não encontram na letra da lei, um mínimo de correspondência verbal (cfr. artigo 8.º, n.º 2 do Código Civil), acabarão por redundar em despesas públicas sem suporte legal.
Como é manifesto, para sustentar a aplicabilidade das regalias previstas no Regulamento n.º 20/2003 aos trabalhadores do CPITMP, não basta invocar, como fez a Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública, no ofício que a propósito desta questão enviou à Directora dos Serviços de Turismo e cuja cópia se encontra a fls. 542 do processo administrativo instrutor, «os elementares princípios gerais que regem o nosso ordenamento jurídico, como sejam os da igualdade e da justiça».
É que, para além de não se vislumbrar qualquer exigência de igualdade e justiça que implique a extensão do regime, dado que, como vimos, se trata de situações diversas, a verdade é que só o Chefe do Executivo, através de uma intervenção normativa de natureza regulamentar pode, com base nessa ou noutras considerações, estender o regime do pessoal das delegações aos trabalhadores do CPITMP ou a outros trabalhadores. Isso não cabe a quem, na Administração, está vinculado a aplicar a lei ou os regulamentos vigentes. Parece-nos truístico que a Administração actua de jure constituto não de jure constituendo.”
Trata-se, a nosso ver, de uma opinião com a qual concordamos e subscrevemos inteiramente, e que tem como fundamento a salvaguarda do princípio da economia dos actos públicos, por forma a evitar a anulação de actos administrativos e que depois seriam repetidos com o mesmo conteúdo decisório.
Isto quer dizer que, não obstante a invalidade verificada, mas como a única solução para o caso vai ser o indeferimento da pretensão do recorrente, deve ser afastado o efeito anulatório do acto administrativo, quanto aos efeitos consignados no próprio acto recorrido.
Isto posto, é de julgar improcedente o recurso contencioso.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso, mantendo o acto administrativo impugnado.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça em 8 U.C.
Registe e notifique.
***
RAEM, 29 de Abril de 2020
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Fong Man Chong

Mai Man Ieng



Recurso Contencioso 18/2019 Página 55