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Processo nº 288/2020
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 11 de Junho de 2020
Recorrente: A (Autor)
Recorrida: B, S.A. (Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
  Por sentença de 11/12/2019, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré B, S.A. a pagar ao Autor A a quantia de MOP$78,022.50, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
1. Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Ré (C) na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, na medida em que a concreta fórmula de cálculo utilizada na Decisão Recorrida se mostra em manifesta oposição à que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância;
2. De onde, salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, em violação ao disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
Em concreto,
3. Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral, a liquidar em execução de sentença;
4. Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
5. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado;
6. Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
7. De onde, provado que durante o período da relação laboral a Recorrida não garantiu ao Autor o gozo do descanso semanal no máximo ao 7.º dia após 6 dias consecutivos de trabalho, deve a mesma ser condenada a pagar ao Recorrente "o dobro da retribuição normal por cada um dos sétimos dias de trabalho prestado", isto é, a quantia de MOP$112.785,00 - e não apenas MOP$56.392,50 correspondente a um dia de salário em singelo - conforme resulta da douta Decisão recorrida, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
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A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 107 a 111, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
- Entre 19/06/2004 a 31/07/2010 o Autor esteve ao serviço da Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
- Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor auferiu da Ré um salário de base de HK$7.500,00 por cada mês de trabalho prestado. (B)
- Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou as ordens e as instruções emanadas pela Ré. (1º)
- Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos, horários e postos de trabalho fixados pela Ré. (2º)
- Entre 19/06/2004 a 31/12/2008, por ordem da Ré (B), o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, tendo aí permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (3º)
- Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual eram inspeccionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (4º)
- Durante o briefing (leia-se, reunião) o Team Leader informava os guardas a respeito de alguma questão de segurança que pudesse ter acontecido no turno anterior, ou da necessidade de participação em qualquer evento especial. (5º)
- Entre 19/06/2004 a 31/12/2008, o Autor prestou diária e efectivamente o trabalho, tendo comparecido com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, sem prejuízo das férias anuais, dispensas de trabalho e dos descansos referidos na resposta ao quesito 12º da Base Instrutória. (6º)
- Entre 19/06/2004 a 31/12/2008, a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (normal e/ou adicional) pelo período de tempo que antecedia o início de cada um dos turnos. (7º)
- Entre 19/06/2004 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (8º)
- Após a prestação pelo Autor de trabalho durante sete dias de trabalho consecutivos, seguia-se um período de vinte e quatro horas de descanso, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (9º)
- O Autor gozou de 24 dias de férias por cada ano civil, concedidas e organizadas pela Ré. (10º)
- Entre 19/06/2004 a 31/12/2008, a Ré (B) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, em cada período de sete dias. (11º)
- Entre 19/06/2004 a 31/12/2008, o Autor prestou trabalho a cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias consecutivos de trabalho, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 09/06/2005 e 30/06/2005 (22 dias), entre 16/05/2006 e 10/06/2006 (26 dias), entre 03/04/2007 e 27/04/2007 (25 dias), entre 30/04/2007 e 01/05/2007 (2 dias), entre 07/07/2007 e 08/07/2007 (2 dias), entre 06/11/2007 e 07/11/2007 (2 dias) e entre 06/05/2008 e 03/06/2008 (29 dias). (12º)
- A Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia pelo trabalho prestado em cada um dos sétimos dias, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivo. (13º)
- A Ré pagou sempre ao Autor o salário correspondente aos dias de descanso semanal. (14º)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
O recurso do Autor não deixará de se julgar provido face à jurisprudência unânime deste TSI nos processos congéneres em que a Ré também é parte.
Assim, a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao recurso do Autor, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a Ré a pagar ao Autor, a título da compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal, a quantia de MOP$112,785.00, com juros de mora à taxa legal a partir da data do presente aresto (cfr. Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010).
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Custas pela Ré.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 11 de Junho de 2020.
Ho Wai Neng
Rui Carlos dos Santos P. Ribeiro
Tong Hio Fong
(Vencido quanto à fórmula adoptada na compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, por entender que, sendo o trabalho prestado nesses dias pago pelo “dobro da retribuição” (cfr. se refere na alínea a) do nº 6 do artigo 17º do DL nº 24/89/M), este “dobro” seria constituído por um dia de salário normal (ao qual o trabalhador teria sempre direito mesmo que não prestasse trabalho) mais um dia de acréscimo. Provado que o Autor já recebeu da Ré ora sua entidade patronal o salário diário em singelo, teria apenas mais um dia de salário pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal, sob pena de o Autor, salvo o devido respeito, incluindo o dia de descanso compensatório previsto no n.º 4 do artigo 17.º a que tem direito, estar a receber um acréscimo salarial correspondente ao “triplo” da retribuição normal.
Pelo que não merece, a meu ver, reparo a fórmula adoptada pelo Tribunal recorrido para cálculo da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.)



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