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Processo nº 62/2020 Data: 09.09.2020
(Autos de recurso jurisdicional)

Assuntos : Concessão de terrenos.
Decurso do prazo da concessão.
Caducidade.
Nulidade por omissão de pronúncia.
Acto vinculado.



SUMÁRIO

1. A “nulidade” por “omissão de pronúncia” – tão só – ocorre quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre “questão” que lhe coubesse conhecer, e não quanto a todo e qualquer dos “fundamentos”, “razões”, “opiniões”, ou mesmo doutrinas que os sujeitos processuais invoquem para sustentar ou justificar o seu ponto de vista sobre as (verdadeiras) “questões” que colocam, pois que o vocábulo (legal) “questão” não pode ser entendido de forma a abranger todos os “argumentos” invocados pelas partes.

2. Se da factualidade apurada demonstrado estiver que decorrido está o prazo da concessão por arrendamento do terreno sem o seu aproveitamento, a Administração está “vinculada” a declarar a caducidade da concessão.

3. Nesta conformidade, sendo que o despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão se apresenta como o “exercício de um poder administrativo vinculado”, evidente é que com a sua prolação, desrespeitado não foi qualquer dos “princípios” que regulam a “actividade administrativa discricionária”, não ocorrendo também nenhuma violação ao “direito de propriedade” consagrado na Lei Básica.

O relator,

José Maria Dias Azedo


Processo nº 62/2020
(Autos de recurso jurisdicional)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. “SOCIEDADE DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO MAN KENG VAN, S.A.”, (“文景灣置業發展股份有限公司”), com sede em Macau, interpôs, no Tribunal de Segunda Instância, recurso contencioso do despacho do CHEFE DO EXECUTIVO de 03.05.2018 que declarou a caducidade da concessão por arrendamento do terreno com a área de 3.131 m², situado na península de Macau, designado por lote 6 da zona C, devidamente identificado nos presentes autos; (cfr., fls. 2 a 65 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Por Acórdão de 20.02.2020, (Proc. n.° 558/2018), foi o recurso julgado improcedente; (cfr., fls. 240 a 256-v).

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Inconformada com o decidido, do mesmo, traz a recorrente o presente recurso, alegando para, em conclusões, dizer o que segue:

“1. Para os efeitos do artigo 152.° do CPAC, entende a Recorrente que o Acórdão recorrido incorre em violação e numa errada aplicação da lei, nomeadamente dos artigos 5.° e 8.° do Código do Procedimento Administrativo ("CPA"), que estipulam os princípios da igualdade e boa fé; dos artigos 115.° do CPA e 21.°, do n.° 1, al. c) do CPAC, relativos ao vício de falta de fundamentação; do artigo 323.° do Código Civil, relativo à invocada existência de uma causa impeditiva da caducidade; do artigo 25.° e 103.° da Lei Básica e do artigo 1427.° do Código Civil, por referência ao direito do uso de superfície, e do artigo 55.° da Lei do. Planeamento Urbanístico;
2. Sendo que a alegada violação do artigo 55.° da Lei do Planeamento Urbanístico não foi sequer abordada no Acórdão recorrido, o que salvo o devido respeito configura o vício de omissão de pronúncia, o que determina a nulidade do Acórdão, de acordo com o previsto no artigo 571.°, n.° 1, al. d) do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 1.° do CPAC;
3. O efeito extintivo do direito da concessionária não se produz automaticamente pela mera ocorrência de um facto objectivo, exigindo-se um juízo avaliativo da Administração para declarar a caducidade, avaliação essa que deve ponderar todos os interesses concretamente em causa, avaliação que não é feita no ponto 7 do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, não existindo fundamentação sobre percurso traçado para chegar a essa conclusão, circunstância que consubstancia vício de falta de fundamentação, nos termos dos artigos 115.° do CPA e 21.°, n.° 1, al. c) do CPAC;
4. Recai sobre o órgão público competente o dever vinculado de verificar e avaliar as causas de caducidade, fazendo um juízo sobre a conduta do particular/sujeito privado, pois só assim poderá averiguar se há incumprimento e em que medida o incumprimento é imputável ao particular;
5. Saber se, no decurso do prazo fixado, foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento mínimo previamente estabelecidas, tal como é exigido no artigo 44.° da Lei de Terras, implica, pressupõe e exige que a Administração avalie efectivamente o comportamento contratual do concessionário, para, de tal modo, poder concluir pelo cumprimento ou incumprimento daquelas cláusulas;
6. Pelo que, na falta de uma avaliação quanto ao cumprimento do contrato de concessão, não pode a Administração declarar a caducidade da concessão de terreno apenas com base no decurso do prazo fixado no contrato;
7. Os artigos 44.°, 48.°, n.° 1; 212.° e 215.° da Lei de Terras citados nos Pareceres da Comissão de Terras e do Secretário para os Transportes e Obras Públicas não são normas legais que justifiquem a decisão proferida;
8. Não há fundamentação de direito quando não se invoca no acto administrativo norma legal ou princípio de direito justificativos do sentido decisório do acto apresentando-se, deste modo, insuficiente a fundamentação do acto que equivale a falta de fundamentação e determina consequentemente a sua anulação;
9. O Meritíssimo Juiz Fong Man Chong, na sua declaração de voto de vencido no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância n.° 824/2016, entendeu que não pode ser declarada a caducidade da concessão quando a Administração pratica actos que reconhecem direitos às concessionárias e que impedem a caducidade;
10. Como foi referido nas alegações facultativas, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes ("DSSOPT"), publicou e mantém disponível para consulta, há vários anos, no seu website, um link (https://www.dssopt.gov.mo/pt/menu/publicInfo/id/171) com uma lista designada "65 processos dos terrenos que não foram classificados como terrenos não desenvolvidos dentro do prazo, por razões não imputáveis ao concessionário no ano 2011", em Chinês "65個於2011年基於不可歸責承批人之原因,不被納入為未按時發展之土地個案", onde está incluído, em 16.° lugar, o lote de terreno em causa nos presentes autos;
11. E para que não se diga que a lista publicada pela DSSOPT não vincula a RAEM, importa recordar que o Exmo. Chefe do Executivo, na sua qualidade de representante máximo da RAEM, referiu, em 18 de Novembro de 2015 e 22 Abril de 2016, na Assembleia Legislativa, durante as apresentações das Linhas de Acção Governativa;
12. Disse o Senhor Chefe do Executivo, na primeira intervenção, que os 14 terrenos localizados nas zonas C e D da Nam Van, pertencem aos 65 casos que não são da responsabilidade dos concessionários e que não foram incluídos nos casos de desenvolvimento inacabado após a análise realizada em 2011 e que não foram concluídos devido à falta de aprovação dos planos, à alteração dos contratos de concessão, ao planeamento urbanístico, ao andamento dos processos judiciais e a outros motivos;
13. Acrescentou o Chefe do Executivo, na segunda intervenção, que o Governo está a trabalhar e a reexaminar os casos em que os terrenos não puderam ser desenvolvidos por razões imputáveis ao Governo, para apurar as responsabilidades que deve assumir;
14. As afirmações do Chefe do Executivo proferidas, nessa qualidade e na Assembleia Legislativa vinculam, obviamente a RAEM, no claro reconhecimento de culpa da Administração pelo incumprimento dos compromissos assumidos das legítimas expectativas criadas nas Autoras, como resulta com abundância nos autos;
15. Como tal, o entendimento de que as informações e comunicações da DSSOPT não vinculam a RAEM; e não podem configurar reconhecimento de culpa nem o reconhecimento de direitos, contende com a lista publicada no website da DSSOPT das concessionárias que não puderam desenvolver os terrenos concessionados por culpa do Governo e com as afirmações do Senhor Chefe do Executivo que as valida;
16. Ora, tendo a Administração reconhecido os direitos das concessionárias verem aprovado o projecto que apresentaram e as revisões dos seus contratos de concessão, não pode, agora, vir-se afirmar que a caducidade ocorreu ipsu iure, escudando-se nos supra referidos preceitos da Lei de Terras, em clara violação do artigo 8.° do Código Civil, que proíbe o intérprete de se cingir à letra da lei;
17. Afirmar que a caducidade das concessões opera por mero decurso do prazo, a Administração faz tábua rasa do reconhecimento da causa impeditiva e viola os princípios da igualdade e da boa fé, nomeadamente porque, nos Despachos do STOP n.° 20/2006, de 20 de Fevereiro de 2006, n.° 8/2009, de 3 de Fevereiro de 2009, e n.° 89/2007, de 23 de Outubro de 2007, publicado no BO n.° 44, II Série, de 31 de Outubro de 2007, foi verificada a falta de culpa dos concessionários no cumprimento dos prazos, sendo que as previsões relevantes da antiga Lei de Terras, citadas nos Pareceres da Comissão de Terras referidos naqueles três Despachos são iguais às da Lei de Terras em vigor;
18. Ao contrário do alegado no Acórdão recorrido, aqueles- Despachos são obviamente legais e enobrecem quem os praticou, porque denotam o respeito pela tutela da confiança contratual, pelos princípios da boa fé e da justiça, pelo cumprimento dos compromissos assumidos e pela segurança do comércio jurídico - que são pilares de um Estado de Direito;
19. A adopção de critérios diferentes para situações idênticas, dando por verificada a falta de culpa das concessionárias noutras concessões face à declaração de caducidade por parte da entidade recorrida no caso em análise nos autos, quando da sua conduta resultou sempre que não o iria fazer e sendo ela quem impediu a revisão do contrato de concessão, resulta na violação dos princípios da igualdade-e da boa fé, e consubstancia um abuso de direito, vg. artigos 25.° da Lei Básica, 5.° e 8.°, n.° 2, al. a) do CPA e 326.° do Código Civil, na modalidade de venire contra factum proprium, princípio que se mostra violado;
20. Por outro lado, como contrapartida pelas desistências das concessões dos lotes lotes B/b, B/f, B/g e B/1 da Zona B, o Governo garantiu, contratualmente, à Nam Van e às suas subsidiárias, incluindo a Recorrente, que iria rever os planos de pormenor das Zonas C e D, para nelas incluir as áreas dos quatro lotes que reverteram para a RAEM, tal como consta dos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.os 33/2004, 34/2004, 35/2004 e 36/2004 de 1 de Abril, publicados no B.O. n.° 14, II Série, de 14 de Abril de 2004;
21. O prometido aumento da área de construção e capacidade aedificandi das Zonas C e D não se verificou e constituiu, como é evidente, mais um factor de constrangimento criado pelo Governo no desenvolvimento dos projectos imobiliários das várias concessionárias, incluindo o da Recorrente;
22. O Meritíssimo Juiz Fong Man Chong tem defendido, e julga-se que bem, que o princípio da boa fé não se aplica só aos casos de exercício de poder discricionário por parte da Administração mas também nos casos de exercício de poderes vinculados;
23. Entendimento partilhado pelos Tribunais Portugueses, conforme consta do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 25/06/2008, no Processo n.° 0291/08, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte n.° 00101/2002.TFPRT.21 de 10/03/2016 e do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte n.° 01312/07.8BEPRT, de 02/11/2010;
24. Também os Professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos da Faculdade, de Direito da Universidade de Lisboa, Mário Aroso da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Fernando Alves Correia e Licínio Lopes da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra seguem o mesmo raciocínio jurídico, ou seja: princípios como o da justiça e da boa fé são aplicáveis mesmo no exercício de poderes vinculados, sobrepondo-se a outros deveres legais;
25. O princípio da tutela da confiança e do investimento de confiança assume especial relevância, dado que visa salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações injustificadamente imprevisíveis daqueles com quem se relacionem;
26. O entendimento expresso no Acórdão recorrido que dispensa a Administração de obedecer aos princípios da igualdade e boa fé, no exercício de poderes vinculados, conduz, necessariamente, à conclusão de que a Administração da RAEM pode agir de má fé e em abuso de direito;
27. Não se entende que a Administração se escude nos artigos 44.°, 48.°, n.° 1, 52.°, 212.° e 215.° da Lei n.° 10/2013, para apelar à caducidade das concessões dos lotes C5 e C6, quando é manifesto que esses preceitos só fazem sentido se não existir um comportamento culposo por parte da Administração;
28. Não existindo culpa da Recorrente, facto que a própria Entidade Recorrida reconheceu, o artigo 166.° da Lei de Terras não pode ser aplicado às concessões pretéritas, é este o resultado da ressalva da alínea 3) do artigo 215.° da Lei da Terras;
29. A Administração reconheceu direitos à Recorrente, nomeadamente, ao emitir as licenças para obras de infraestruturas de cravação de estacas nos lotes C5 e C6, para colocação de tapumes e para alteração da rede de drenagem dos referidos terrenos, desguarnecendo, em clara violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no n.° 2 do artigo 5.° do CPA, o cuidado e as precauções que devem ser tanto maiores quanto mais avultados forem os investimentos, como foram os efectuados pela Recorrente por via das aludidas licenças;
30. Foi a confiança depositada na Administração que levou a Recorrente a contrair os empréstimos bancários e a onerar o terreno concessionado, por escritura de 29 de Outubro de 2012, ou seja, apenas depois da emissão dos ofícios de 15 de Março e de 9 de Julho de 2007 e das autorizações e licenças para as obras de construção de tapumes, cravação de estacas e de redes de drenagem para o projecto conjunto de construção nos lotes C5 e C6;
31. A proibição da chamada conduta contraditória exige a conjugação de vários pressupostos reclamados pela tutela da confiança; esta variante do abuso do direito equivale a dar o dito por não dito, radica numa conduta contraditória da mesma pessoa, pois pressupõe duas atitudes espaçadas no tempo, sendo a primeira (factum proprium) contraditada pela segunda atitude, o que constitui, atenta a reprovabilidade decorrente da violação dos deveres de lealdade e de correcção, uma manifesta violação dos limites impostos pela boa fé;
32. O artigo 41.° da Lei de Terras estabelece, quanto ao regime jurídico aplicável à concessão por arrendamento, que a "concessão por arrendamento e o subarrendamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano rege-se pelas disposições da presente lei e diplomas complementares, pelas cláusulas dos respectivos contratos e, subsidiariamente, pela lei civil aplicável", e o artigo 220.°, preceitua que, em tudo quanto não estiver, expressamente, previsto na presente lei, são aplicáveis subsidiariamente, consoante a natureza das matérias, o Código do Procedimento Administrativo, o Decreto-Lei n.° 52/99/M, de 4 de Outubro, o Código Penal, o Código de Processo Penal e o Código do Registo Predial;
33. A menção ao Decreto-Lei n.° 52/99/M (Regime Geral das Infracções Administrativas) é indiciador de que o incumprimento da Lei de Terras implica a aplicação de sanções e, como tal, que a caducidade prevista nesta Lei é a caducidade-sanção e não a caducidade preclusiva;
34. O artigo 99.° da Lei de Terras estipula a sujeição do concessionário às vinculações prescritivas do plano urbanístico que vigore na zona onde o terreno concedido se encontre situado e a cumprir as condições que lhe sejam impostas para a racional utilização dos recursos naturais do terreno concedido;
35. O artigo 55.° da Lei do Planeamento Urbanístico determina que, quando a execução de um plano urbanístico colida com a finalidade da concessão ou com o aproveitamento de um terreno concedido, o concessionário tem direito, nos termos da Lei de Terras, a requerer a revisão do contrato de concessão ou, tratando-se de concessão onerosa, a transmissão das situações resultantes da concessão, sem prejuízo de ser indemnizado pelos danos que tenha sofrido, preceito que se considera violado, que foi objecto do recurso interposto do acto de declaração de caducidade e sobre o qual o Tribunal de Segunda Instância não se pronunciou;
36. Defende o Meritíssimo Juiz Fong Man Chong que enquanto não se verificar a condição (a aprovação do Plano Urbanístico) a Administração está inibida de declarar a caducidade da concessão de terrenos e de contar o decurso do prazo de aproveitamento, porque a Administração admitiu expressamente o direito das concessionárias sobre os terrenos e foi ela quem impôs uma condição ao acto praticado anteriormente, na verdade essa condição ainda não se verificou, estando ainda a Administração e as concessionárias a ela sujeitas;
37. Ou seja, o acto da Administração que ordenou a suspensão das obras constitui uma condição suspensiva prevista no artigo 111.° do CPA, só depois da aprovação do plano urbanístico é que era permitido o concessionário a continuar a construção e rever a concessão;
38. A Administração comprometeu-se, pelo Ofício da DSSOPT de 9 de Julho de 2007, a prorrogar os prazos de aproveitamento e a proceder às revisões dos contratos de concessão quando autorizasse o reinício do procedimento administrativo para aproveitamento dos terrenos concedidos, suspenso por ordem do Governo de Macau, como é mencionado no Parecer da Comissão de Terras anexo ao acto recorrido e foi reconhecido pelo Chefe do Executivo;
39. Com o reconhecimento expresso dos direitos que assistem à Recorrente, a Administração provocou o efeito jurídico impeditivo da caducidade, previsto no artigo 323.°, n.° 2 do Código Civil;
40. O artigo 323.°, n.° 2 do Código Civil determina que quando se trate de prazo fixado por contrato, o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido impede a caducidade;
41. Sendo o direito disponível, se for reconhecido pelo eventual beneficiário da caducidade, não constitui o reconhecimento um meio interruptivo da caducidade, pois a circunstância de esse beneficiário reconhecer o direito da outra parte não tem o efeito de inutilizar o tempo já decorrido e abrir novo prazo de caducidade (como aconteceria na prescrição), o reconhecimento impede, sim, a caducidade tal como impediria a prática do acto sujeito a caducidade;
42. O prazo de caducidade não se suspende nem interrompe, a não ser nos casos em que a lei o determine (artigo 320.° do nosso Código Civil), podendo, porém, ser impedido (artigo 323.° do nosso Código Civil), o que corresponderá à efectivação do direito, sem gerar novo prazo, ficando o mesmo sujeito às disposições que regem a prescrição;
43. Se o direito é reconhecido, fica definitivamente assente e não há já que falar em caducidade, esse reconhecimento impede a caducidade de um direito disponível porque, uma vez feito, seria violento e absurdo que o titular do direito tivesse, não obstante o reconhecimento do seu direito, de praticar o acto sujeito a caducidade.
44. Ensina Adriano Vaz Serra, como foi douta mente registado pelo Meritíssimo Juiz Fong Man Chong na sua Declaração de Voto no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância n.° 577/2018, que se a caducidade for arguida por quem lhe deu causa que a respectiva invocação pode ser paralisada por abuso de direito;
45. Entende-se que quem com a sua actuação obsta ao exercício tempestivo do direito do titular, e vem depois invocar a caducidade desse direito, procede contra a boa fé, podendo o titular opor-lhe a referida objecção, com o efeito de ao titular ser concedido o tempo adequado segundo as circunstâncias para o exercício do direito:
46. O direito de superfície reveste um carácter autónomo, em relação ao direito de propriedade do dono do terreno, sendo o seu objecto integrado pela faculdade de ocupação do espaço aéreo e do subsolo correspondentes à porção delimitada de terreno. Embora o solo continue pertença daquele, pode o superficiário ocupar com a construção ou com a plantação que tenha direito a fazer ou manter esse solo;
47. A Administração usa o instituto jurídico da caducidade como uma punição sem culpa, desembocando num efeito jurídico próximo do da expropriação sem compensação, em clara violação do espírito do artigo 103.° da Lei Básica;
48. Nem se diga que não é o direito de propriedade que está em causa, pois o que a Recorrente adquiriu foi o direito do uso da propriedade, também consagrado e protegido naquele preceito fundamental da lei de Macau, direito que lhe permitiu onerar, em 29 de Outubro de 2012, o terreno concessionado com as hipotecas e as consignações de rendimentos;
49. Neste sentido, o Prof. Doutor Fernando Alves Correia e o Juiz Fong Man Chon defendem que a concessão por arrendamento de terrenos do Estado dá lugar à aplicação subsidiária do regime jurídico do direito de superfície de duração previsto no artigo 1427.° do Código Civil;
50. Os concessionários por arrendamento viram-se impedidos de exercer o seu direito a fazer a obra, nos termos contratualmente acordados, por factos da Administração, aos quais são completamente alheios, e que não podiam de todo em todo ultrapassar;
51. Por conseguinte, em tais casos verifica-se, para os concessionários, uma situação de absoluta Invencibilidade do obstáculo criado pela Administração à realização do aproveitamento, pelo que se verificam "motivos de força maior" que impediram os concessionários de exercerem o seu direito, para os efeitos do n.° 1 do artigo 313.° do Código Civil de Macau;
52. Mesmo que se considerasse que a noção de motivo de força maior não abrange estas situações, o que, como acabámos de ver, não pode merecer dúvidas, ainda assim sempre seria aplicável o n.° 2 do artigo 313.° do Código Civil de Macau;
53. Na verdade, e a despeito deste n.° 2 mencionar o dolo da contraparte, entende-se que o mesmo é aplicável para o caso de, podendo embora não ter existido dolo da contraparte, ainda assim lhe ser imputável a não observância pelo devedor do prazo fixado, se a alegação da prescrição/caducidade pelo credor ofender a boa fé; e
54. Neste cenário, e contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, não ocorreu a caducidade da concessão e o respectivo prazo está suspenso, nos termos do artigo 313.° do Código Civil de Macau, aplicável por força do n.° 3.° do artigo 1427.° do mesmo código, ambos por sua vez convocados ex vi artigo 41.° da Lei de Terras”; (cfr., fls. 263 a 302).

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Na sequência das contra-alegações da entidade recorrida pugnando pela improcedência do recurso, (cfr., fls. 307 a 313), vieram os autos a este Tribunal, onde, em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“Vem impugnado o acórdão de 20 de Fevereiro de 2020, do Tribunal de Segunda Instância, que negou provimento ao recurso contencioso interposto por “Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A.” contra o despacho de 3 de Maio de 2018, do Exm.º Chefe do Executivo, através do qual foi declarada a caducidade da concessão por arrendamento de um terreno com a área de 3 131 m2, designado por lote C6, situado em Macau, na zona C do Fecho da Baía da Praia Grande.
A recorrente imputa ao acórdão recorrido a nulidade do artigo 571.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, por alegada omissão de pronúncia, e erro de julgamento dos vícios assacados ao acto.
Deve notar-se, quanto à arguida nulidade por omissão de pronúncia, que a recorrente a suscita por alegada falta de apreciação do vício de violação do artigo 55.º da Lei do Planeamento Urbanístico.
Nos termos do artigo 571.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, há omissão de pronúncia quando o tribunal não se debruça sobre questões que devesse apreciar. O que interessa, nos termos conjugados deste inciso com o artigo 563.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Civil, é que o tribunal resolva todas essas questões, não se lhe impondo que aborde todos os factos, argumentos, considerações ou razões produzidos pelas partes em abono dos seus pontos de vista – cf. Alberto dos Reis, em Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra Editora, 1984, reimpressão, a pgs. 143.
Ora bem, em contencioso administrativo de anulação, as questões que o tribunal é chamado a resolver são as da operatividade dos vícios que vêm imputados ao acto administrativo, como causas da sua possível invalidade. E há que convir que essas questões suscitadas foram todas resolvidas pelo acórdão, mediante remissão para o parecer do Ministério Público, neste tendo sido abordados e tratados todos os vícios imputados ao acto. É que, debruçando-nos sobre o teor da petição de recurso, constata-se que a violação do artigo 55.º da Lei do Planeamento Urbanístico não foi invocada como vício autónomo do acto. Esta norma foi mencionada, en passant, a propósito do vício de violação do princípio da igualdade e da existência de culpa por parte da Administração; não enquanto vício de que houvesse que conhecer-se especificamente.
Improcede este fundamento do recurso.
Passando aos erros de julgamento, verifica-se que a recorrente vem, em sede de recurso jurisdicional, esgrimir e repisar motivos e argumentos que já antes utilizara em sede de recurso contencioso, na caracterização e explicitação dos vícios do acto.
Na oportunidade, sobre esses vícios emitiu pronúncia o Ministério Público, fazendo-o nos moldes do parecer de fls. 232 e seguintes, manifestando-se contra a tese da ilegalidade do acto que agora volta a terreiro. Temos por pertinente e bem fundada a posição então avançada pelo Ministério Público no recurso contencioso, que sufragamos, e que aliás foi acolhida pelo acórdão impugnado.
Daí que, reafirmando o sentido do aludido parecer, nos pronunciemos pela improcedência dos fundamentos do recurso jurisdicional, também no tocante aos aventados erros de julgamento.
Termos em que se afigura não merecer censura o acórdão recorrido, que deve ser mantido, negando-se provimento ao recurso jurisdicional”; (cfr., fls. 322 a 323).

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Cumpre apreciar.

Fundamentação

Dos factos

2. O Tribunal de Segunda Instância deu como provada a seguinte matéria de facto:

«1. Por escritura pública de 30 de Julho de 1991, exarada a fls. 4 e seguintes do livro 285 da Direcção dos Serviços de Finanças, celebrada em conformidade com o Despacho n.º 203/GM/89, publicado no 4.º Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 29 de Dezembro de 1989, e com as alterações introduzidas pelos Despacho n.º 73/SATOP/92, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 27, de 6 de Julho de 1992, Despacho n.º 57/SATOP/93, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 17, de 26 de Abril de 1993, Despacho n.º 56/SATOP/94, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 22, II Série, de 1 de Junho de 1994, e Despacho n.º 71/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 33, II Série, de 18 de Agosto de 1999, foi titulada a concessão por arrendamento de vários lotes de terreno inseridos nas zonas A, B, C e D do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situados na Baía da Praia Grande e nos Novos Aterros do Porto Exterior, a favor da Sociedade de Empreendimentos Nam Van, S.A., com sede na [Endereço], em Macau, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis com o n.º XXXX (SO) a fls. XXX do livro C10.
2. Posteriormente, através do Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 84/2001, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 37, II Série, de 12 de Setembro de 2001, foi titulada a transmissão onerosa dos direitos resultantes da concessão do terreno com a área de 3,131 m2, designado por lote 6 da zona C do referido empreendimento a favor da Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A., com sede na [Endereço], em Macau, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis com o n.º XXXX (SO) a fls. XXX do livro C23.
3. O mencionado lote está descrito na Conservatória do Registo Predial, adiante designada por CRP, sob o n.º 22517 a fls. 169 do livro B49 e o direito resultante da concessão inscrito a favor daquela sociedade sob o n.º 26670F, encontrando-se o terreno onerado com uma hipoteca voluntária inscrita sob o n.º 143459C e uma consignação de rendimentos inscrita sob o n.º 33437F a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A.
4. De acordo com o estipulado na cláusula segunda do contrato de transmissão titulado pelo sobredito Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 84/2001, o arrendamento do terreno é válido até 30 de Julho de 2016.
5. Segundo o estabelecido na cláusula terceira do mesmo contrato de transmissão, o terreno seria aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, destinado a habitação, comércio e estacionamento, em conformidade com o plano de pormenor e respectivo regulamento, relativo à zona C, aprovado pela Portaria n.º 69/91/M, de 18 de Abril de 1991.
6. O prazo de arrendamento do aludido terreno expirou em 30 de Julho de 2016.
7. Em 04/11/2016, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu o seguinte parecer:
“…
1. Em conformidade com o Despacho n.º 203/GM/89, publicado no 4.º Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 29 de Dezembro de 1989, por escritura de 30 de Julho de 1991, exarada a fls. 4 e seguintes do livro n.º 285 da Direcção dos Serviços de Finanças, com as alterações introduzidas pelos contratos de revisão titulados pelos Despachos n.ºs 73/SATOP/92, 57/SATOP/93 e 56/SATOP/94, publicados respectivamente no Boletim Oficial de Macau n.º 27, de 6 de Julho de 1992, no Boletim Oficial de Macau n.º 17, de 26 de Abril de 1993 e no Boletim Oficial de Macau n.º 22, II Série, de 1 de Junho de 1994, foram concedidos por arrendamento a favor da Sociedade de Empreendimentos Nam Van, S.A., vários lotes de terreno inseridos nas zonas A, B, C e D do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situadas na Baía da Praia Grande e nos Novos Aterros do Porto Exterior (NAPE).
2. Nos termos do disposto na cláusula segunda do contrato de concessão titulado pela mencionada escritura, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da mesma.
3. Através do Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 84/2001, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) n.º 37, II Série, de 12 de Setembro de 2001, foi titulada a transmissão onerosa do direito resultante da concessão do terreno designado por lote 6 da zona C do referido empreendimento, a favor da Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A..
4. De acordo com o estabelecido na cláusula segunda do sobre dito contrato de transmissão do direito resultante da concessão do aludido lote, o prazo do arrendamento expirou em 30 de Julho de 2016.
5. Segundo o disposto na cláusula terceira do mesmo contrato, o terreno deveria ser aproveitado com a construção de um edifício em regime de propriedade horizontal, destinado a habitação, comércio e estacionamento, de acordo com as condições urbanísticas fixadas nos Regulamentos dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande aprovados pela Portaria n.º 69/91/M, publicada no 2.º Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 15, de 18 de Abril de 1991. A altura máxima permitida seria de 34,5 mNMM.
6. Uma vez que o prazo de arrendamento do terreno terminou em 30 de Julho de 2016 e o aproveitamento do terreno não foi concluído, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes propôs que fosse autorizado o seguimento do procedimento relativo à declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento e o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, o que mereceu a minha concordância, por despacho de 19 de Setembro de 2016.
7. Reunida em sessão de 27 de Outubro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo, tendo em consideração que o prazo de arrendamento terminou, sem que o aproveitamento estabelecido no contrato se mostre realizado, e que, sendo a concessão provisória, não pode ser renovada, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 48.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), aplicável por força dos seus artigos 212.º e 215.º. Deste modo, a concessão encontra-se caducada pelo termo do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Consultado o processo supramencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno…”.
8. Em 03/05/2018, o Senhor Chefe do Executivo proferiu o seguinte despacho:
“…Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento, a que se refere o Processo n.º 64/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 4 de Novembro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho”»; (cfr., fls. 249-v a 252).

Do direito

3. Inconformada com o pelo Tribunal de Segunda Instância decidido no âmbito do seu anterior recurso contencioso, traz a recorrente o presente recurso (jurisdicional), pedindo que se revogue o Acórdão recorrido com as suas legais e naturais consequências em relação ao despacho do Chefe do Executivo que declarou a “caducidade da concessão” por arrendamento do terreno identificado nos autos.

Nada obstando o conhecimento do recurso, vejamos, começando-se, por nos parecer oportuno, com uma breve “nota introdutória”.

O presente “recurso” implica a abordagem duma “matéria” que, nos últimos anos tem suscitado a atenção e opinião pública local; (cfr., v.g., sobre o tema Maria de Nazaré Saias Portela in, “A Caducidade no Contrato de Concessão de Terras”, Comunicação apresentada nas 3as Jornadas de Direito e Cidadania da Assembleia Legislativa da R.A.E.M., Janeiro 2011, pág. 419 e segs., o “Relatório” do C.C.A.C. sobre a matéria, datado de 15.12.2015, dando conta de mais de uma centena de lotes de terrenos em situações de não aproveitamento, notando-se, também, o recente trabalho de Paulo Cardinal, “Estudos Relativos à Lei de Terras de Macau”, 2019, onde se dedica ao tema um dos seus capítulos com o sugestivo título de: “Caducidades: Breves notas sobre a Polissemia da «Caducidade» na Lei de Terras de Macau”, cfr., pág. 251 e segs.).

Aliás, a reduzida extensão territorial da R.A.E.M., a conhecida (e muitas vezes, feroz) especulação imobiliária, a (cada vez mais) elevada densidade populacional, e a existência de um grande número de terrenos concedidos e que acabaram por não ser objecto de desenvolvimento nos termos das respectivas cláusulas contratuais, (cfr., o citado Relatório do C.C.A.C.), só podia dar lugar a um “aceso debate” sobre a situação, as suas soluções, assim como da (eventual) necessidade de alteração do seu regime legal.

Por sua vez, é também de várias dezenas o número de processos em que esta Instância se tem ocupado, apreciado e emitido pronúncia sobre a questão da “caducidade das concessões de terrenos”, sendo, em nossa opinião, se bem ajuizamos, e tanto quanto nos foi possível apurar, (legalmente) justa e adequada a solução a que se chegou, e que, por isso, se monstra de manter; (cfr., v.g., os Acs. deste T.U.I. de 11.10.2017, Proc. n.° 28/2017; de 07.03.2018, Proc. n.° 1/2018; de 23.05.2018, Proc. n.° 7/2018; de 06.06.2018, Proc. n.° 43/2018; de 15.06.2018, Proc. n.° 30/2018; de 31.07.2018, Procs. n°s 69/2017 e 13/2018; de 05.12.2018, Proc. n.° 98/2018; de 12.12.2018, Proc. n.° 90/2018; de 19.12.2018, Proc. n.° 91/2018; de 23.01.2019, Proc. n.° 95/2018; de 31.01.2019, Procs. n°s 62/2017 e 103/2018; de 20.02.2019, Proc. n.° 102/2018; de 27.02.2019, Proc. n.° 2/2019; de 13.03.2019, Proc. n.° 16/2019; de 27.03.2019, Proc. n.° 111/2018; de 04.04.2019, Proc. n.° 2/2019; de 10.07.2019, Procs. n°s 12/2019 e 13/2019; de 24.07.2019, Proc. n.° 75/2019; de 30.07.2019, Proc. n.° 72/2019; de 18.09.2019, Proc. n.° 26/2019; de 04.10.2019, Proc. n.° 11/2017; de 29.11.2019, Procs. n°s 81/2017 e 118/2019; de 26.02.2020, Proc. n.° 106/2018; de 03.04.2020, Procs. n°s 7/2019 e 15/2020; de 29.04.2020, Proc. n.° 22/2020; de 06.05.2020, Proc. n.° 31/2020; de 13.05.2020, Proc. n.° 29/2020; de 10.06.2020, Proc. n.° 35/2020; de 26.06.2020, Proc. n.° 53/2020; de 01.07.2020, Proc. n.° 55/2020; de 10.07.2020, Proc. n.° 38/2020; de 22.07.2020, Proc. n.° 54/2020 e de 31.07.2020, Proc. n.° 18/2020).

Não nos parecendo ser este o local para se elaborar ou tecer grandes considerações sobre o tema, tentar-se-á dar cabal resposta às questões colocadas.

Pois bem, percorrendo a alegação de recurso apresentada e as – extensas – conclusões pela recorrente aí, a final, produzidas, constata-se que pela mesma – e em síntese que se tem por adequada – vem suscitadas as questões seguintes:
- “nulidade por omissão de pronúncia”; e,
- “errado enquadramento legal da matéria de facto dada como provada”.

–– Começando pela primeira, pouco se mostra de dizer pois que se nos apresenta evidente que adequada é a solução pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público apresentada para a questão.

Na verdade, não se pode esquecer que a “nulidade” por “omissão de pronúncia” – tão só – ocorre quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre “questão” que lhe coubesse conhecer, e que tal apenas ocorre em relação a “questões”, e não quanto a todo e qualquer dos “fundamentos”, “razões”, “opiniões”, ou mesmo doutrinas que os sujeitos processuais invoquem para sustentar ou justificar o seu ponto de vista sobre as (verdadeiras) “questões” que colocam, pois que, vocábulo (legal) “questão” não pode ser entendido de forma a abranger todos os “argumentos” invocados pelas partes; (neste sentido, cfr., v.g., o recente Acórdão deste T.U.I. de 31.07.2020, Proc. n.° 51/2020).

–– Quanto, à segunda, vejamos.

Assim, ponderou o Tribunal de Segunda Instância, (passando-se a transcrever o teor do Acórdão recorrido na parte que se nos mostra relevante):

“1. Da natureza do despacho recorrido
Interpretando o acto recorrido em coerência com o Parecer do Sr. STOP de 04/11/2016 (doc. de fls.200 a 203 do P.A.), adquirimos que a declaração da caducidade titulada por esse acto tem por base factual que a concessão cuja titular era a recorrente tinha sido sempre provisória até à irreversível expiração do prazo de 25 anos, nunca convertida em definitiva.
Ora, é pacífica e consolidada a brilhante jurisprudência, segundo a qual decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato) o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, nesse prazo, não foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas, e o Chefe do Executivo não tem que apurar se o incumprimento das cláusulas de aproveitamento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário (cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º28/2017, n.º43/2018 e n.º72/2019). Pois a jurisprudência de Macau vai sempre no sentido de considerar a caducidade da concessão do terreno pelo decurso do prazo de arrendamento como caducidade preclusiva (a título exemplificativo, cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º69/2017, n.º102/2018 e n.º26/2019).
A nossa leitura dos arestos dos Venerandos TUI e TSI convence-nos de ser constante e unânime a orientação jurisprudencial, no sentido de que é vinculado o poder administrativo para declarar a caducidade, quer de preclusão quer de sanção, das concessões de terrenos (cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º62/2017 e 111/2018, do TSI nos n.º433/2015, n.º436/2015 e n.º743/2016).
Ora, a frase reiterada pelo Venerando TUI de que “se outro prazo não estiver fixado no contrato” significa iniludivelmente que o prazo da concessão, seja de 25 anos seja de duração mais curta, não é decisivo, o que causa directa e inevitavelmente à caducidade preclusiva da concessão é a peremptória expiração do prazo de concessão contratualmente fixado.
Nestes termos e na medida em que o despacho n.º83/2001 do STOP estipula que é válida até 31/07/2016 a concessão transmitida à recorrente na qualidade de terceiro outorgante, não podemos deixar de concluir que o despacho impugnado nestes autos é acto vinculado.
*
2. Da arguida falta de fundamentação
Ora, é praticamente uniforme a inculca de que “A fundamentação é um conceito relativo que depende do tipo legal do acto, dos seus termos e das circunstâncias em que foi proferido, devendo dar a conhecer ao seu destinatário as razões de facto e de direito em que se baseou o seu autor para decidir nesse sentido e não noutro, não se podendo abstrair da situação específica daquele e da sua possibilidade, face às circunstâncias pessoais concretas, de se aperceber ou de apreender as referidas razões, mormente que intervém no procedimento administrativo impulsionando o itinerário cognoscitivo da autoridade decidente.” ( a título exemplificativo, Acórdão do STA no processo n.º44302)
Não se deve olvidar que concordar é uma coisa, e compreender é outra, a discordância duma posição não se equivale à incompreensão ou à incompreensibilidade. Por isso, a não concordância do interessado com a posição da Administração não germina a falta de fundamentação. De outra banda, interessa realçar que a falta de fundamentação se distingue da falta de fundamentos (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º663/2009)
Bem, sufragamos a douta jurisprudência que preconiza (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º288/2015): O acto administrativo considera-se fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal … possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de reacção, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.
Em esteira, e considerando o supramencionado Parecer do Exmo. Sr. STOP e o Parecer n.º127/2016 da Comissão de Terras (docs. de fls.200 a 203 e 190 a 199 do P.A.), não podemos deixar de concluir que é falida a arguição da falta de fundamentação, pois, o ponto 7 do Parecer do Exmo. Sr. STOP assegura a recorrente a apreender suficientemente os fundamentos de facto e de direito da declaração da caducidade da concessão.
Por cautela e na mera hipótese de ser insuficiente a fundamentação do despacho recorrido, colhemos que tal insuficiência é irrelevante, dado que ao caso sub judice se aplica o princípio do aproveitamento dos actos administrativos praticados no exercício de poderes vinculados.
*
3. Da não verificação da caducidade e causa impeditiva
Bem, sustentando o pedido de anulação do despacho em questão, a recorrente arguiu a não verificação da caducidade bem como o erro nos pressupostos de direito e da causa impeditiva da caducidade, arrogando que o incumprimento das cláusulas do contrato de concessão é imputável à Administração e esta reconheceu os direitos resultantes da transmissão à recorrente relativos ao terreno identificado no contrato de concessão.
Repare-se que “As vicissitudes ocorridas no prazo de concessão e respeitantes ao aproveitamento do terreno não se revelam pertinentes, já que, no caso de declaração da caducidade pelo decurso do prazo de arrendamento do terreno, não é essencial a questão de culpa no não aproveitamento do terreno, pois com o decurso do prazo máximo da concessão provisória sem a conclusão do aproveitamento do terreno, a mesma concessão não pode ser renovadas, desde que não se verifique a excepção prevista na lei (art.48.º n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 10/2013).” (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º29/2019) Daí resulta que mesmo sejas constatadas e verdadeiras, a não imputabilidade e inocência da recorrente não obstam à verificação da caducidade preclusiva da concessão.
É bom de lembrar a brilhante jurisprudência inculcando que “Ainda que estivessem em causa direitos disponíveis, uma informação da Direcção dos Serviços de Programação e Coordenação de Empreendimentos, independentemente do que ela contivesse, nunca poderia constituir reconhecimento de nenhum direito da recorrente por parte da RAEM, dado que informações burocráticas de técnicos da Administração ou mesmo de directores de serviços não representam nem obrigam a RAEM, pelo que nunca poderiam reconhecer direito algum da recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º2 do artigo 323.º do Código Civil.” (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º16/2019)
Pois, as comunicações de serviço interno da DSSOPT, bem como a atitude da DSSOPT revelada nos ofícios, com os quais as recorrentes foram notificadas que os projectos apresentados eram passíveis de aprovação pela DSSOPT, mas que o procedimento administrativo ficava suspenso provisoriamente até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística da zona onde se encontram os terrenos concedidos, nunca poderiam constituir reconhecimento de nenhum direito das recorrentes por parte da RAEM, uma vez que as informações ou opiniões nelas contidas não representam nem obrigam a RAEM, muito menos depois do termo do prazo de arrendamento dos terrenos. (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º2/2019)
E, os actos praticados pela Administração, invocados pela recorrente para demonstrar que a Administração criou legítimas expectativas na recorrente, nomeadamente, ao afirmar que iria rever o contrato de concessão atenta a alteração de finalidade do terreno, nunca poderiam constituir o reconhecimento de algum direito da recorrente por parte da RAEM (por exemplo o direito de aproveitar o terreno depois do termo do prazo de arrendamento) nem obstar à declaração da caducidade pelo decurso de tal prazo. (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º12/2019)
Em sintonia com tais sensatas jurisprudências, estamos convictos de que falece incuravelmente a arguição da não verifica da caducidade e da existência da causa impeditiva da mesma, portanto, o despacho atacado no presente recurso não colide com o art.323º do Cód. Civil.
*
4. Do abuso de direito e violação dos princípios gerais
Como causa de pedir, a recorrente assacou, ao despacho em escrutínio, ainda o abuso de direito e a violação dos princípios da igualdade, da boa fé na sua vertente da tutela de confiança, da decisão e da eficiência da Administração, previstos nos arts.5º, 8º, 11º e 12º do CPA.
4.1. Ora, o abuso de direito, para vingar no recurso contencioso, impõe a prova de um exercício ilícito de direito, implica a demonstração de que o titular do direito o exerceu em termos clamorosamente ofensivos da justiça e que excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito (art.334º, do CC). E não preenche estes requisitos a actuação administrativa que se limita, como no caso vertente, a cumprir as cláusulas do contrato e a lei e a acatar as normas imperativas de direito público sobre o regime legal das concessões.” (cfr. Acórdãos do TSI nos Processos n.º179/2016, n.º290/2017 e n.º578/2018)
Essa sagaz jurisprudência encoraja-nos a concluir que o despacho em questão não constitui abuso de direito, e por isso, não infringe o preceito no art.326º do Código Civil.
4.2. Na nossa óptica, é doutrinal e jurisprudencialmente assente que do princípio da decisão nascem para a Administração o dever geral de pronúncia e o específico de decisão (Lino Ribeiro, José Cândido de pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, pp.119 a 121; Mário Esteves de Oliveira e outros: Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª ed., p.125 e ss.)
Afigura-se-nos igualmente pacífica a doutrina inculcando que a não observância ao princípio da decisão e o incumprimento do dever de decisão não pode germinar a invalidade, pese embora possam dar lugar a acto administrativo tácito (arts.101º e 102º do CPA), ou a responsabilidade civil por acto ilícito de gestão (Mário Esteves de Oliveira e outros: ob. cit., p.129). Assim, podemos tranquilamente extrair que mesmo a falta da resposta ao requerimento aludido no art.231º da petição infringisse o princípio da decisão, tal falta daria luz, no máximo e tão-só, ao indeferimento tácito, por não se descortinar nenhuma norma que preveja o contrário (arts.101º e 102º do CPA).
Na medida em que o incumprimento de qualquer dos dois deveres nascidos do princípio da decisão não tem virtude de causar invalidade ao despacho em causa, a arguição (pela recorrente) da violação do princípio da decisão não pode deixar de ser necessariamente inoperante.
4.3. No actual ordenamento jurídico de Macau vê-se solidamente consolidada a brilhante jurisprudência, no sentido de que os princípios gerais de igualdade, de proporcionalidade, da imparcialidade, da justiça e de boa fé se aplicam apenas ao exercício de poderes discricionários, sendo assim inoperante para os actos vinculados. (a título exemplificativo, cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º32/2016, n.º79/2015 n.º46/2015, n.º14/2014, n.º54/2011, n.º36/2009, n.º40/2007, n.º7/2007, n.º26/2003 e n.º9/2000, a jurisprudência do TSI vem andar no mesmo sentido).
Seja como for, a violação do princípio da igualdade não releva no exercício de poderes vinculados, já que não existe um direito à igualdade na ilegalidade, o princípio da igualdade não pode ser invocado contra o princípio da legalidade: um acto ilegal da Administração não atribui ao particular o direito de exigir a prática no futuro de acto de conteúdo idêntico em face de situações iguais (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º7/2007).
Ainda preconiza peremptoriamente o Venerando TUI que “Havendo fundamento para declarar a caducidade de concessão de terreno urbano, porque houve culpa da concessionária no não aproveitamento do terreno no prazo fixado, tal constitui um acto vinculado para a Administração. Se esta, noutros procedimentos administrativos, ilegalmente, não declarou a caducidade de outras concessões, supostamente havendo semelhança dos mesmos factos essenciais, tal circunstância não aproveita, em nada, à concessionária em causa visto que os administrados não podem reivindicar um direito à ilegalidade.” (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º111/2018)
Assim sendo e na medida em que o despacho atacado nestes autos constitui a única resolução legalmente admissível, não podemos deixar de colher que tal despacho não pode ofender nem ofende os princípios da boa fé na vertente da tutela da confiança e da igualdade.
*
5. Da violação dos preceitos da Lei Básica
Quanto à arguição da violação do disposto nos arts.7º, 25º e 103º da Lei Básica, interessa ter presente a consolidada jurisprudência do Venerando TUI, no sentido de que no caso de declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento do terreno, não se vislumbra violação das normas contidas nomeadamente nos art.ºs 6.º, 103.º e 120.º da Lei Básica (a título exemplificativo, cfr. Acórdão nos Processos n.º26/2019).
Por sua vez, o Venerando TSI assevera inequivocamente que “Os artigos 6º, 7º e 103º da Lei Básica não apresentam qualquer relevância para os casos em que é declarada administrativamente a caducidade de uma concessão e em que, consequentemente, não está em causa propriedade privada da concessionária.” (cfr. Acórdãos do TSI nos Processos n.º370/2016, n.º419/2017 e n.º571/2018)
Ora, interessa acrescentar que o n.º1 do art.48º da Lei n.º10/2013 e a caducidade preclusiva não impedem que um concessionário inocente e lesado por declaração da caducidade venha invocar e provar a eventual culpa da Administração na acção, a intentar por ele, para efectivação da responsabilidade contratual ou extracontratual nos termos gerais.
Nestes termos e ao abrigo da disposição no n.º1 do art.168º da Lei n.º10/2013, não podemos deixar de concluir que o art.48º desta Lei não infringe nenhum preceito da Lei Básica e que em consequência, o despacho recorrido não contende com qualquer disposição da Lei Básica, nem ofendeu o direito fundamental (da recorrente) à propriedade privada.
(…)”; (cfr., fls. 252-v a 256).

Perante o assim decidido, que se tem como adequado, (e notando-se que, como – bem – salienta o Ministério Público, limitando-se a recorrente a repisar os argumentos antes já esgrimidos), evidente se apresenta que o presente recurso terá que improceder, pois que a solução a que chegou o Tribunal de Segunda Instância, corresponde ao que por esta Instância se tem vindo a entender sobre a matéria, (como sem esforço se pode constatar de um mero confronto e leitura dos Acórdãos atrás citados e para onde se remete).

Na verdade, e tal como resulta da factualidade dada como provada, a “concessão por arrendamento” do terreno em questão era para durar por “25 anos” contados a partir da outorga da respectiva escritura pública, (30.07.1991), e, como é bom de ver, expirado estando tal prazo sem que concluído estivesse o seu aproveitamento, (o que sucedeu em 30.07.2016), legalmente correcta se apresenta a decisão do Chefe do Executivo que, (em 03.05.2018), declarou a sua caducidade.

Com efeito, e como tem constituído entendimento deste Tribunal de Última Instância:

“Se da factualidade apurada demonstrado estiver que decorrido está o prazo da concessão por arrendamento do terreno sem a conclusão do seu aproveitamento, a Administração está “vinculada” a declarar a caducidade da concessão.
Nesta conformidade, sendo que o despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão se apresenta como o “exercício de um poder administrativo vinculado”, evidente é que com a sua prolação, desrespeitado não foi qualquer dos “princípios” que regulam a “actividade administrativa discricionária”, não ocorrendo também nenhuma violação ao “direito de propriedade” consagrado na Lei Básica”; (cfr., os Acs. atrás referidos, e entre outros, o recente Ac. de 01.07.2020, Proc. n.° 55/2020).

No mesmo sentido, e como se fez constar no sumário do recente Acórdão deste Tribunal de 31.07.2020, Proc. n.° 18/2020:

“No que concerne à declaração de caducidade da concessão do terreno, por decurso do prazo de arrendamento sem aproveitamento, é aplicável a nova Lei de Terras (Lei n.º 10/2013), e não a antiga Lei (Lei n.º 6/80/M).
A jurisprudência dos tribunais da RAEM vai no sentido de considerar a caducidade da concessão do terreno por decurso do prazo de arrendamento como caducidade preclusiva.
No caso de ter decorrido o prazo de concessão sem que se tenha sido aproveitado o terreno, tem a Administração o dever de declarar a caducidade da concessão. Trata-se dum acto vinculado.
O Chefe do Executivo não tem que apurar se a falta de aproveitamento do terreno se deveu a culpa do concessionário ou se, por exemplo, a Administração teve culpa, exclusiva ou não, em tal falta de aproveitamento. Ou, ainda, se a falta de aproveitamento se deveu a caso fortuito ou de força maior.
Sempre que, no exercício de poderes vinculados por parte da Administração, o tribunal conclua, através de um juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa tomada era a única concretamente possível, a falta de audiência do interessado, prevista no art.º 93.º n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, degrada-se em formalidade não essencial do procedimento administrativo.
No âmbito da actividade vinculada não se releva a alegada violação dos princípios gerais do Direito Administrativo, incluindo os princípios da boa fé, da justiça e da igualdade, da adequação e da proporcionalidade e ainda da colaboração entre a Administração e os particulares”.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, com a taxa de justiça de 10 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 9 de Setembro de 2020


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Álvaro António Mangas Abreu Dantas

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Proc. 62/2020 Pág. 33