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Processo n.º 117/2020 Data do acórdão: 2020-9-3 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– recebimento de fichas de jogo a mais
– por erro da trabalhadora de casino
– art.o 200.o, n.o 1, do Código Penal
– legitimidade para apresentar queixa criminal
S U M Á R I O
No caso dos autos, como o tipo de crime pelo qual vinha condenado o arguido em primeira instância é o descrito no art.o 200.o, n.o 1, do Código Penal (segundo o qual quem se apropriar ilegitimamente de coisa alheia que tenha entrado na sua posse por efeito de erro é punido), e ele recebeu fichas de jogo a mais, por causa do erro cometido por uma agente de relações públicas de casino no seu trabalho, então a essa senhora (apesar de não ser proprietária dessas fichas de jogo) assistia a legitimidade para apresentar queixa daquele crime, precisamente porque as mesmas fichas foram por erro cometido por ela que passaram a entrar na posse do arguido.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 117/2020
Recorrente (arguido): A







ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com a sentença proferida a fls. 83 a 85 do Processo Comum Singular n.o CR3-19-0290-PCS do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de um crime de apropriação ilegítima de coisa alheia, p. e p. pelo art.o 200.o, n.o 1, do Código Penal (CP), em dois meses de prisão, suspensa na execução por um ano, para além de ficar condenado a pagar dezoito mil dólares de Hong Kong como quantia indemnizatória arbitrada oficiosamente a favor da ofendida B, veio o arguido A recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), assacando, na motivação apresentada a fls. 101 a 107 dos presentes autos correspondentes, àquela decisão condenatória o erro de aplicação do art.o 105.o, n.o 1, do CP, para rogar a extinção do procedimento criminal em causa, por sobretudo alegada falta de apresentação da queixa por quem de direito.
Ao recurso, respondeu a Digna Delegada do Procurador a fls. 109 a 111v dos presentes autos, no sentido de improcedência do recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista, parecer a fls. 121 a 122 dos autos, opinando pela manutenção da decisão recorrida.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cabe decidir do recurso.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que a sentença ora recorrida ficou proferida a fls. 83 a 85, cuja fundamentação fáctica se dá por aqui integralmente reproduzida.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesse enquadramento, vê-se que o arguido ora recorrente imputou à decisão condenatória recorrida apenas o erro de aplicação do art.o 105.o, n.o 1, do CP, norma esta que determina o seguinte: Quando o procedimento penal depender de queixa, tem legitimidade para apresentá-la, salvo disposição em contrário, o ofendido, considerando-se como tal o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação.
No caso dos autos, o tipo legal de crime pelo qual vinha condenado o arguido recorrente em primeira instância é o descrito no art.o 200.o, n.o 1, do CP, de seguintes moldes: Quem se apropriar ilegitimamente de coisa alheia que tenha entrado na sua posse ou detenção por efeito de força natural, erro ou caso fortuito, ou por qualquer maneira independente da sua vontade, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.
Na situação sub judice, o arguido recebeu dezoito mil dólares de Hong Kong em fichas de jogo a mais, por causa do erro cometido pela senhora B no seu trabalho como agente de relações públicas de um casino de Macau.
É certo que a pessoa proprietária dessas fichas de jogo então recebidas a mais pelo arguido recorrente não foi essa senhora, mas isto não impediu a legitimidade que assistia a essa senhora para apresentar queixa criminal nos presentes autos penais, precisamente porque as mesmas fichas de jogo foram por erro cometido por ela que passaram a entrar na posse do arguido recorrente.
Aliás, pode referir-se à posição jurídica maoritária detalhadamente veiculada no acórdão definitivo proferido por este TSI em 16 de Janeiro de 2014 no Processo n.o 578/2013.
Assim sendo, e sem mais indagação por desnecessária ou prejudicada, há que julgar não provido o recurso.
IV – DECISÃO
Em sintonia com o exposto, acordam em julgar não provido o recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com duas UC de taxa de justiça, e duas mil patacas de honorários a favor do seu Ex.mo Defensor Oficioso.
Comunique a presente decisão à ofendida.
Macau, 3 de Setembro de 2020.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chao Im Peng
(Segunda Juíza-Adjunta)



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