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Processo n.º 534/2020
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Relator: Fong Man Chong
Data : 17 de Setembro de 2020

Assuntos:

- Imposto de Rendimento Complementar e pressupostos tributários


SUMÁRIO:

I – O imposto de rendimento complementar (IRC) é imposto sobre o rendimento, cujo facto gerador é a percepção de um rendimento no decurso de um determinado período - período de imposto ou período de tributação -, em geral correspondendo a um período de um ano.
II – O IRC, quando incide sobre o rendimento derivado de actividades comerciais e industriais, o facto jurídico que dá origem à obrigação de imposto é a realização do rendimento, dispensando-se investigar se o contribuinte dispõe ou não desse rendimento.
III - A Recorrente, uma sociedade comercial constituída em Macau, no exercício correspondente ao ano de 2014, auferiu na RAEM rendimentos provenientes de uma actividade comercial (pagos pela B) que aqui desenvolveu, nos termos do artigo 2.º e do artigo 3.º, n.º 1, alínea a) do RICR, reúne os pressupostos legais positivos de incidência tributária em sede de imposto complementar.
IV - O imposto pago pelo B no âmbito do artigo 28º da Lei nº 16/2001, não tem nada a ver com a ora Recorrente, porque tal imposto é um imposto especial, que incide sobre as concessionárias de exploração de jogos de fortuna e azar nos termos da lei citada, com lucro ou sem lucro as concessionárias estão sujeitas a tal imposto de jogo! Uma espécie de retenção na fonte sui generis, ex lege e automática!
V – O alegado contrato celebrado entre a Recorrente e a B não é um contrato de associação em participação, por não se verificarem as notas caracterizadoras da figura em causa, nomeadamente as previstas no artigo 551º/1 do CCOM, e ainda as notas referentes ao exercício dos direitos de informação, de fiscalização e de intervenção na gestão pelos associados (artigo 552º do CCOM). O que existe entre eles é um contrato de promoção de jogos, ou seja, a B autoriza que a Recorrente desenvolva actividades de promoção de jogos de fortuna e azar e depois explora estas actividades nas instalações da B. Pois, é uma actividade que só pode ser exercida por quem está legalmente licenciada e no espaço devidamente autorizado.
VI – Nestes termos, tal contrato não altera a natureza de rendimentos, pagos pela B, que está sujeito ao ICR, nos termos do artigo 2º do RICR.

O Relator,

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Fong Man Chong

Processo n.º 534/2020
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Data : 17/Setembro/2020

Recorrente : A Limited

Recorrida : Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças (財政局所得補充稅複評委員會)

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    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I - RELATÓRIO
A Limited, Recorrente, devidamente identificada nos autos, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 26/02/2020, que negou provimento ao recurso contencioso interposto pela Recorrente contra a deliberação da CRIC que não atendeu à reclamação apresentada por ela relativa à fixação do seu rendimento colectável relativo ao ano de 2014, em sede de Imposto Complementar de Rendimentos, veio, em 30/03/2020, recorrer jurisdicionalmente para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 168 a 181, tendo formulado as seguintes conclusões :
1) Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. 152 a 161v dos autos, que deu por totalmente improcedente o recurso contencioso apresentado pela ora Recorrente contra a deliberação da Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos do dia 7 de Dezembro de 2018, não atender a uma suposta reclamação (não tendo essa Comissão sido capaz de indicar a data dessa inexistente reclamação) que teria sido apresentada pela ora Recorrente e na qual aparentemente se solicitava a revisão da matéria colectável fixada referente ao exercício de 2014, pelo que a mesma se manteve no total de MOP$261,173,900.00 (duzentos e sessenta e um milhões, cento e setenta e três mil e novecentas patacos), com um agravamento a título de custos de 0.005%.
2) Na sentença recorrida foi ainda dito que "Pese embora não chegou a apurar do acto recorrido a análise sobre o contrato celebrado entre a recorrente e a "B”, em particular, como se conclui dos respectivos clausulados que se não respeitam ao alegado "contrato de associação" ou contrato como lido por epígrafe, ou em que termos se avaliou a situação da recorrente com as situações de outros contribuintes que detêm contrato celebrado com a B e autorizado pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), nem se pode aceitar a autorização como suporte bastante para se distinguir dos outros contribuintes que beneficiam da respectiva isenção fiscal, tal como bem explicado pelo Digno Delegado Coordenador do Ministério Público junto deste Tribunal, no seu douto parecer, “… estando assegurada a validade substantiva do acto recorrido por alguns dos fundamentos invocados, sempre será inoperante, caso exista, a ilegalidade derivada da chamada motivação superabundante (...)".
3) Salvo o devido respeito, é a Comissão de Revisão que no acto confirmativo impugnado vem escudar-se no argumento de que não há tratamento desigual em relação a outras associadas da B porque, "comparando a situação da reclamante com as situações de outros contribuintes, designadamente cujo contrato com a B tenha sido autorizado, estamos perante situações diferentes, e em consequência, não há violação do princípio da igualdade, nem tal pode ser aferido nesta sede.".
4) O ponto essencial da fundamentação do acto administrativo praticado pela Entidade Recorrida é, salvo o devido respeito, o de que os montantes obtidos pela Recorrente no âmbito do contrato em associação com a B estão sujeitos ao imposto complementar de rendimentos porque o seu contrato não foi autorizado pela DICJ, ao contrário do que sucedeu com outros contribuintes com contrato com a B.
5) É esse o ponto que supostamente justifica o tratamento discriminatório da ora Recorrente em relação aos seus concorrentes comerciais.
6) Não há assim qualquer motivação superabundante, a Entidade Recorrida limita-se a considerar no acto recorrido que a Recorrente "não tem um contrato autorizado", sendo por isso a sua situação distinta das demais concorrentes comerciais.
7) Como se teve oportunidade de dizer, a Recorrente sempre defendeu que a remuneração que lhe é paga vem já tributada em Imposto Especial sobre o Jogo (doravante, "IEJ") à taxa de 35% (cfr. artigo 28.º da Lei n.º 16/2001) e demais contribuições obrigatórias exigíveis às concessionárias, ao abrigo das alíneas 7) e 8) do artigo 22.º da mesma Lei.
8) Ao abrigo do contrato de associação em participação, a Recorrente recebe da sua parceira B uma prestação mensal correspondente a 55% do rendimento gerado na zona afecta ao mercado de massas do casino, 57% do rendimento emergente do jogo das salas VIP e 40% do rendimento emergente de jogos em slot machines, tudo de acordo com a contagem efectuada pela DICJ.
9) A entidade recorrida fez uma errada qualificação do contrato ao considerar que estava em causa um contrato de prestação de serviços para assim considerar a situação da Recorrente em moldes diferentes do que faz para as demais associadas da B.
10) Como se disse, é o próprio acto recorrido que faz verter na sua fundamentação que "comparando a situação da reclamante com as situações de outros contribuintes, designadamente cujo contrato com a B tenha sido autorizado, estamos perante situações diferentes, e em consequência, não há violação do princípio da igualdade, nem tal pode ser aferido nesta sede.".
11) E isto porque o entendimento da DSF nesta matéria, desde 2006 e mantido recentemente em 2013, tem sido o de considerar que os montantes pagos pela B, no âmbito da sua actividade do jogo, como remuneração às suas associadas através de Acordos de natureza idêntica ao que celebrou com a ora Recorrente, não estão sujeitos a ICR porque já vêm pagos em sede de Imposto Especial do Jogo!
12) Só que, no caso da Recorrente, a Entidade Recorrida limita-se a considerar que é uma situação diferente das outras associadas da B (oferecidas a título de exemplo pela Recorrente), tudo para não dar o mesmo tratamento fiscal à Recorrente.
13) A Recorrente não reclama, ao contrário que é dito no acórdão recorrido, um tratamento fiscal privilegiado, mas antes um tratamento fiscal idêntico ao das suas concorrentes comerciais, em idênticas posições contratuais de associação em participação com a B.
14) Pelo que manifesto fica que a entidade incorre num vício de direito, relativamente à qualificação jurídica do contrato celebrado entre a Recorrente e a B, considerando-o em termos absolutamente distintos da forma como qualifica os demais contratos de idêntica natureza e cariz obrigacional celebrados entre a B e as suas associadas, para depois vir negar aquilo que concede às demais associadas da B!
15) Surge então que, para aquelas concorrentes comerciais da Recorrente, a Entidade Recorrida considera que há uma identidade de normas a tributar o rendimento gerado no Casino que resultam da aplicação conjunta dos artigos 27.º e 28.º da Lei n.º 16/2001 e do artigo 3.º do RICR, mas já no que concerne à Recorrente, idêntico tratamento fiscal não pode ser dado por não ter o "contrato autorizado", situação que não tem qualquer suporte e que representa violação dos princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade, vícios que são sancionados com a anulabilidade ao abrigo do artigo 124.º do CPA e que não foram devidamente apreciados pelo Tribunal recorrido.
16) Deste modo, temos que também nesta vertente padece o acto recorrido de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto, face à clara intenção do Governo da Região, ao longo dos anos, pretender eliminar a dupla tributação nesta matéria, o que conduz à sua anulação, o que se requer ao abrigo do artigo 20.º e 21.º, n.º 1, alínea d), do CPAC.

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A Recorrida, Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças (財政局所得補充稅複評委員會), veio, 21/05/2020, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 184 a 194, tendo formulado as seguintes conclusões:
1) O presente recurso tem por objecto a douta sentença de 26 de Fevereiro de 2020 do Tribunal Administrativo que negou provimento ao recurso contencioso apresentada pela recorrente da deliberação da CRIC que não atendeu à reclamação apresentada pela recorrente relativa à fixação do seu rendimento colectável relativo ao ano de 2014 em sede de Imposto Complementar de Rendimentos.
2) Alega a recorrente que deveria beneficiar da isenção fiscal que a Administração fiscal já tinha concedido a favor de outras suas concorrentes que se encontram em situação idêntica, mas continua a não invocar em seu favor nenhuma norma fiscal respeitante à previsão da isenção fiscal.
3) O regime da Lei nº 16/2001 prevê expressamente duas situações em que é possível o enquadramento de isenção fiscal relativo ao Imposto Complementar de Rendimentos: o artigo 28°, que se refere às concessionárias, e o artigo 29°, que se refere aos promotores de jogo.
4) Defende a recorrente que os seus rendimentos não se enquadram em nenhuma das situações uma vez que os rendimentos não são seus nem podiam ser porque decorrem directamente do exercício da actividade concessionada: são rendimentos da B que por eles deve o devido imposto mas que do respectivo pagamento fica isenta.
5) Pelo que só a B pode ser titular das obrigações tributárias resultantes da actividade concessionada e, em consequência, a recorrente percebe daquela, já depois de tributados tais rendimentos da B, uma prestação mensal constituída por percentagens diversas dos rendimentos gerados na zona afecta ao mercado de massas do casino, do rendimento gerado nas salas VIP e, finalmente, do rendimento gerado nas slot machines.
6) E, segundo a recorrente, paga a B tal prestação mensal porque a recorrente celebrou com a B um contrato de associação de participação.
7) Ora existindo expressas, no documento contratual que foi submetido, as características de um contrato de prestação de serviços e de ocupação e uso de espaço e não se vislumbrando no mesmo documento quaisquer das características ou referências do contrato de associação em participação.
8) Além disso, permanece intacto e independentemente da natureza do contrato, o facto de este ter sido submetido pela B - por si e, implicitamente, em nome da recorrente posto que é sua co-contratante - à apreciação da DICJ, sem que tenha daí resultado acto favorável de sancionamento.
9) A B, bem como outras operadoras, celebraram diversos contratos com empresas prestadoras de serviços e outras que são algo semelhantes ao contrato em que a ora recorrente baseia a sua pretensão, só que desses vários contratos, uns foram aprovados e autorizados pela tutela, enquanto outros não tiveram a mesma sorte, como foi o caso da recorrente.
10) A diferença destes resultados depende da avaliação que a DICJ, no exercício das suas competências exclusivas faz das circunstâncias materiais que rodeiam cada caso, sendo que a Administração Fiscal apenas faz reflectir, como consequência, a decisão da DICJ na fixação ou revisão da matéria colectável desses contribuintes.
11) O acto de fixação da matéria colectável e a sua posterior revisão, quando esta exista, é, nestes casos, um acto vinculado da Administração Fiscal ao acto que lhe é prévio, no âmbito da DICJ, que autoriza ou não o contrato celebrado.
12) Foi, pois, pela aplicação do Princípio da Igualdade que a Administração Fiscal tratou de maneira diferente a recorrente relativamente a outras concorrentes comerciais, já que estas obtiveram aquilo que a recorrente falhou em conseguir: a aprovação da tutela para o seu contrato.
13) Uma vez que, como é sabido, o Princípio da Igualdade (e os aqui consequentes Princípios da Justiça e da Imparcialidade) pressupõe que a situações iguais seja dado tratamento igual; mas também exige que a situações diferentes seja dado tratamento diferente.
14) Por fim, não se duvida que existe uma situação de dupla tributação quando, sobre o mesmo rendimento, se faz incidir o Imposto Especial sobre o Jogo e o Imposto Complementar de Rendimentos. Mas não é o caso da recorrente que não tem - nem poderia, sem que para tal estivesse autorizada - rendimentos provenientes da exploração do jugo: o que a recorrente aufere é de uma contraprestação mensal que lhe é devida pelo contrato de prestação de serviços e de uso de espaço que celebrou com a B, sociedade esta que, titular de uma concessão, aufere de rendimentos dessa natureza.
15) Para além de que não é de forma alguma ilegal a dupla tributação resultante da aplicação ao mesmo facto fiscal objectivo do Imposto Especial do Jogo e do Imposto Complementar de Rendimentos, já que essa é urna prerrogativa que assiste ao legislador fiscal que é, no caso da RAEM, a Assembleia Legislativa.
16) Que o legislador quis que fosse exactamente assim é indubitável face ao teor do artigo 28° da Lei n° 16/2001, onde se regulamentou especificamente a questão da dupla tributação.

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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls.202):
Visto.
Nos presentes autos de recurso jurisdicional, verifica-se que a recorrente, "A, Limited" impugna a sentença de 26 de Fevereiro de 2020, do Tribunal Administrativo, imputando-lhe erro no julgamento de vícios que havia suscitado no recurso contencioso (erro nos pressupostos de facto e de direito, com ofensa dos princípios da igualdade, justiça e imparcialidade, e dupla tributação).
Sobre os vícios do acto pronunciou-se oportunamente o Ministério Público, fazendo-o nos moldes do parecer de fls. 147 e seguintes, onde sustentada e desenvolvidamente se manifesta contra a tese da ilegalidade escorada nesses vícios em que agora a recorrente volta a insistir.
Dado que a alegação de recurso jurisdicional, sobre o invocado erro de julgamento dos vícios do acto, constitui, no fundo, um retomar e repisar de argumentos já esgrimidos em sede de recurso contencioso, temos por bem reafirmar aqui o sentido daquele referido parecer, que convocamos em amparo da douta sentença recorrida.
Termos em que, na improcedência dos fundamentos do recurso, nos pronunciamos no sentido de lhe ser negado provimento.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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    III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
1.º - Por ofício com n.º de referência: 55/CONF/2012 datado de 18/01/2012, à solicitação da Direcção dos Serviços de Finanças (D.S.F.), a Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos deu resposta quanto às informações solicitadas sobre a lista das sociedades autorizadas a celebrar contratos de prestação de serviço com as concessionárias de jogos de fortuna ou azar, nela se incluem C S.A. (Sociedade de Investimento Predial C, S.A.), D S.A. e E Lda. (cfr. fls. 45 e 55 a 62 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
2.º – Pelo despacho de “concordância” do Senhor Secretário para a Economia e Finanças exarado sobre o relatório n.º 051/DIR/2012, de 09/01/2013, foi determinado a manutenção do entendimento exposto no ofício com n.º de referência: 123/NAJ/JJ/06, emitido pela D.S.F., de que os lucros da Sociedade de Investimento Predial C, S.A. provenientes das actividades de jogos e referidos no contrato de prestação de serviço celebrado com a B, S.A., não serão considerados para efeitos do imposto complementar de rendimentos (cfr. fls. 52, 66 a 69 e 71 a 74 e verso dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
3.º - Pelo despacho de “concordância” datado de 27/08/2015 e exarado sobre a informação n.º 0247/DIFT/DAIJ/2015/VI, de 21/08/2015, o Director da D.S.F. determinou o procedimento para tratarem os contribuintes que faltam a apresentar a declaração M/1 (cfr. fls. 19 a 21 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
4.º - Em 29/06/2016, a recorrente apresentou a declaração de rendimentos do imposto complementar de rendimentos – Grupo “A”, modelo M/1, respeitante ao exercício de 2014, tendo declarado como lucro tributável negativo ou prejuízo no valor de MOP155.699,00, com a junção dos documentos comprovativos (cfr. fls. 34 a 46 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
5.º - Em 05/10/2018, a Comissão de Fixação da D.S.F. fixou o rendimento colectável do imposto complementar de rendimentos – Grupo “A” da recorrente referente ao exercício de 2014, no valor de MOP261.173.900,00, e em 08/10/2018, o Director da D.S.F. procedeu à respectiva liquidação da colecto no montante de MOP31.268.868,00 (cfr. fls. 16 e 18 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
6.º - Em 09/10/2018, o Director da D.S.F. emitiu à recorrente a notificação de fixação de rendimento do imposto complementar de rendimentos (cfr. fls. 14 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
7.º - Em 24/10/2018, a recorrente apresentou a reclamação contra a decisão de fixação junto do Presidente da Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos (cfr. fls. 22 a 31 e verso do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
8.º - Pela deliberação datada de 07/12/2018, a entidade recorrida deliberou negar provimento à reclamação, mantendo o rendimento colectável da recorrente para o exercício de 2014 no valor de MOP261.173.900,00, com a aplicação do agravamento de 0.005% sobre a colecta de MOP31.268.868,00 (cfr. fls. 12 a 13 e verso do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
9.º - Por ofício com n.º de referência: 157/DAIJ/CRIC/18, foi a recorrente notificada da deliberação da entidade recorrida de 07/12/2018 (cfr. fls. 11 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
10.º - Em 14/02/2019, a recorrente interpôs o presente recurso contencioso fiscal contra a supradita deliberação da entidade recorrida de 07/12/2018 (cfr. fls. 2 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).

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    IV - FUNDAMENTOS
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este proferiu a decisão com base nos seguintes argumentos:

A LIMITED, ora recorrente, melhor identificada nos autos, vem interpor o presente recurso contencioso fiscal sobre a deliberação tomada pela Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos da Direcção dos Serviços de Finanças, ora entidade recorrida, de 7 de Dezembro de 2018, que rejeitou a reclamação apresentada pela recorrente, mantendo o rendimento colectável da recorrente para o exercício de 2014 no montante MOP261.173.900,00, com o agravamento a título de custas de 0.005% sobre a colecta de MOP31.268.868,00, pedindo a anulação do acto recorrido por erros nos pressupostos de facto e de direito e por violação da dupla tributação e dos princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade.
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Na contestação apresentada, a entidade recorrida defendeu a legalidade do acto recorrido e pugnou-se pela improcedência dos argumentos suscitados e do presente recurso contencioso.
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Ambas as partes apresentaram as alegações facultativas no sentido de manterem todos os fundamentos alegados nos articulados anteriores (cfr. fls. 125 a 135 e 136 a 145 dos autos).
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O Digno Delegado Coordenador do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de improceder o presente recurso contencioso por decaimento dos todos os fundamentos invocados (cfr. fls. 146 a 151 e verso dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
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O Tribunal é competente em razão da matéria e hierarquia.
O processo é próprio e não há nulidades.
A recorrente e a entidade recorrida dispõem de personalidade e capacidade judiciárias e são partes legítimas.
Não há excepções ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito do pedido.
***
I. Factos
Dos documentos constantes dos autos e do P.A. em anexo resulta provada a seguinte factualidade relevante para a decisão da causa:
(…)
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II. Fundamentação
Cumpre agora decidir.
Erros nos pressupostos de facto e de direito e da violação dos princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade
Segundo os alegados da recorrente, os lucros aqui discutidos sujeitos à tributação em sede de imposto complementar de rendimentos são decorrentes da execução de um contrato de associação em participação como disposto no art.º 553.º do «Código Comercial», com a concessionária de jogos de fortuna ou azar “B, S.A.” (“B”), que já assume perante o Governo de Macau todas as obrigações tributárias geradas na zona de “Casino XXX”, enquanto a recorrente, na qualidade da associada, participa nas receitas da “B” resultantes da exploração da actividade de jogos de fortuna ou azar neste casino. Por seu turno, em termos da realização de um investimento remunerado na actividade da sua associante “B”, a recorrente fica obrigada de criar todas as condições necessárias para a potencialização do lucro da associante, consistindo a sua contribuição patrimonial em facultar à “B” o acesso de espaço afecto a jogos no “Hotel XXX” e a assunção de encargos inerentes ao marketing, promoção, publicidade, gestão e angariação de clientes e coordenação de todas as actividades do casino, bem como as despesas com pessoal, a decoração da zona do casino e respectiva manutenção, e a aquisição e manutenção do equipamento necessário ao funcionamento do casino.
A que acresce desde o ano de 2006 até ao de 2013, inclusive, a Administração Fiscal tem sempre isentado as associadas da “B” do imposto complementar de rendimentos sobre os montantes pagos pela “B” através deste tipo de “acordo”, como se vislumbra no caso da “F Limited”1. Donde, vem imputar ao acto recorrido erro na qualificação jurídica do seu contrato celebrado com a “B”, em termos absolutamente distintos da forma como qualifica os demais contratos de natureza e cariz obrigacional idêntica celebrado entre a “B” e as suas associadas, violando assim os princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade previstos nos art.ºs 25.º da «Lei Básica» e 5.º e 7.º do «Código do Procedimento Administrativo».
Aqui se transcreve a parte do acto recorrido respeito aos fundamentos do indeferimento de reclamação:
“…1. Nos termos do disposto no artigo 2.º do regulamento do imposto complementar de rendimentos, doravante abreviadamente RICR, este imposto incide sobre o rendimento global definido nos termos do artigo 3.º, que as pessoas singulares ou colectivas, qualquer que seja a sua residência ou sede, aufiram no Território.
2. O rendimento global das pessoas colectivas é o lucro líquido anual derivado do exercício de actividade comercial ou industrial e calculado nos termos do RICR.
3. A Administração Fiscal entende que o rendimento colectável em MOP$ 261,173,900.00, sobre o qual fixou a colecta do imposto complementar de rendimentos na importância de MOP$ 31,268,868.00, em relação ao ano de exercício económico de 2014 - decorre de rendimentos obtidos por prestação de serviços da contribuinte “A Limited” à B.
4. A contribuinte, ora reclamante, pertence ao grupo A, sendo tributada com base nos lucros efectivamente determinados através de contabilidade devidamente organizada, assinada e verificada por contabilistas ou auditores inscritos nos Serviços de Finanças de acordo com o RICR.
5. Entende a Administração Fiscal que a contribuinte reclamante não se enquadra nem preenche qualquer das normas legalmente previstas de isenção do Imposto Complementar de Rendimentos, designadamente nem as vertidas no artigo 9.º do RICR.
6. Nem tão pouco, por não ser concessionária, o previsto no nº2 do artigo 28º1 da Lei nº1/2001.
7. Esta previsão legal estabelece que só a concessionária pode ser isenta excepcionalmente do pagamento do imposto complementar de rendimentos, tendo o legislador concedido ao Chefe do Executivo um poder discricionário.
8. Assim, comparando a situação da reclamante com as situações de outros contribuintes, designadamente cujo contrato celebrado com B tenha sido autorizado, estamos perante situações diferentes, e em consequência, não há violação do princípio de igualdade, nem tal pode ser aferido nesta sede.
9. Quanto a alegada violação dos princípios da justiça, da imparcialidade e da proporcionalidade, é pacífico o entendimento na doutrina, como na jurisprudência, que esses só assumem relevância autónoma quando a administração actua no exercício de poderes discricionários.
10. No caso em apreciação a lei não deixa à entidade tributária uma margem de discricionariedade aquando da fixação ou não do rendimento colectável do imposto complementar de rendimentos, pelo que, não pode haver ofensa a esses princípios.
11. De igual modo não existe a acumulação de cargas tributárias na reclamante e relativas aos mesmos rendimentos, ou seja, não estamos perante a identidade da matéria colectável.
12. A B, na qualidade de concessionária, é tributada no imposto especial de jogos por incidir sobre o rendimento bruto da exploração do jogo enquanto a reclamante aufere o rendimento derivado da transacção efectuada com a B, como contrapartida monetária pela prestação de serviço a esta, então, a reclamante deve ser considerada como contribuinte do ICR.
13. Contudo, de qualquer maneira, só a B pode ter a qualidade de beneficiário da referida isenção.
14. Importa reafirmar que “a Lei não deixa á entidade tributária uma margem de discricionariedade aquando da fixação ou não do rendimento colectável do imposto complementar de rendimento.”2
15. Verificada a incidência objectiva e subjectiva do imposto complementar de rendimentos, na medida em que, a Sociedade é uma contribuinte normal, e não investida de alguma qualidade que permita a exclusão da integração do seu rendimento na matéria colectável - cfr. artigos 2.º, 4.º, 9.º, 10.º, 19.º do RICR - a Administração Tributária, no exercício de uma competência vinculada, sujeita ao princípio da legalidade - cfr. art. 3º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aplica à Sociedade “A Limited” as consequências jurídicas, que, do ponto de vista fiscal, se impõe perante a ocorrência dos pressupostos de facto subjacentes às normas do RICR.
16. A actividade comercial exercida pela Sociedade “A Limited” está registada, classificada e descrita no cadastro das Finanças como Sociedade Prestadora de Serviços a Empresas.
17. A CRIC considera na apreciação dos Contratos celebrados pela “A Limited” com a “B”, que não importa o nomen juris para a definição da natureza jurídica dos contratos celebrados, que deve resultar sim do respectivo clausulado dos mesmos, que de resto se auto-definem como Contratos de Prestação de Serviços e de Ocupação e Uso do Espaço, onde funciona o Casino explorado pela B.
18. Resulta claro que a “A Limited” não está investida na qualidade de sujeito tributário que determine tratamento especial ou excepcional junto à Administração Tributária. Não estando reunidos os critérios que atribuem a isenção, pelo que, os rendimentos estão sujeitos à tributação do imposto e ao cumprimento das obrigações fiscais inerentes.
19. Em conclusão afigura-se expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da deliberação conducentes à aplicação dos fundamentos de tributação previstas na lei, para efeitos de liquidação do imposto complementar de rendimentos da contribuinte reclamante.…”
Não é equívoco que a recorrente fica ciente da sua qualidade de contribuinte do Grupo “A” aludido nos art.ºs 2.º e 3.º da Lei n.º 21/78/M «Regulamento do Imposto Complementar de Rendimentos» (RICR), de 9 de Setembro, de cujos rendimentos auferidos da actividade comercial são determinados através de contabilidade devidamente organizada, in casu, veio apresentar a respectiva declaração abatido do rendimento global no exercício de 2014 os lucros provenientes do contrato celebrado com a “B”, no valor de MOP261.173.915,00 (cfr. fls. 36 a 37 e verso do P.A.), ao abrigo do n.º 2 do art.º 4 do mesmo Regulamento. A recorrente não se impugna quanto à não legitimação da isenção subjectiva prevista no art.º 9.º do RICR, nem à sua falta da qualidade de concessionária ou subconcessionária. O que se dispute é mormente a legalidade ou não da incidência objectiva sobre os referidos lucros em sede de imposto complementar de rendimentos, em face do alegado “contrato de associação” e entendimento assumido pela Administração Fiscal no passado.
Não se pode deixar anotar no Direito Fiscal, vigora rigorosamente o princípio da legalidade. Diz o autor Alberto Pinheiro Xavier, na sua obra «Conceito e Natureza do Acto Tributário» (Livraria Almedina, Coimbra, 1972, cfr. fls. 291 a 293) o seguinte:
“…No Direito Tributário, o princípio da legalidade revestiu sempre um conteúdo bem mais restrito. Com vista a proteger a esfera de direitos subjectivos dos particulares do arbítrio e do subjectivismo do órgão de aplicação do direito - juiz ou administrador - e, portanto, a prevenir a aplicação de «tributos arbitrários», optou-se neste ramo do Direito por uma formulação mais restritiva do princípio da legalidade, convertendo-o numa reserva absoluta de lei, no sentido de que a lei, mesmo em sentido material, deve conter não só o fundamento da conduta da Administração, mas também o próprio critério da decisão no caso concreto 36.
117. Se o princípio da reserva de lei formal contém em si a exigência da lex scripta, o princípio da reserva absoluta coloca-nos perante a necessidade de uma lex stricta: a lei deve conter em si mesma todos os elementos da decisão no caso concreto, de tal modo que não apenas o fim, mas também o conteúdo daquela decisão sejam por ela directamente fornecidos. A decisão do caso concreto obtém-se, assim, por mera dedução da própria lei, limitando-se o órgão de aplicação a subsumir o facto na norma, independentemente de qualquer livre valoração pessoal.
A regra constitucional de reserva absoluta representa, pois, um duplo ditame: ao legislador e ao órgão de aplicação do direito. Ao primeiro, enquanto o obriga - sob pena de inconstitucionalidade - a formular os comandos legislativos em matéria tributária em termos de rigorosa reserva absoluta; ao segundo, por excluir o subjectivismo na aplicação da lei, a criação judicial ou administrativa do Direito Tributário, o que envolve, de um lado, a proibição da analogia 37 e, de outro, a proibição da discricionariedade,… ”
Desde já, em véspera de reserva absoluta da lei inserida no princípio da legalidade, todos os tributos são obrigações ex legis cuja regulamentação necessita ser por forma expressa e é matéria fora da dispositiva por vontade ou discricionariedade da Administração. Neste sentido, na falta da lei habilitante não é permitida quer a imposição de incidência objectiva ou subjectiva quer a respectiva alteração ou mesmo isenção.
Segundo este raciocínio carece do fundamento para o sustento da invocada ofensa dos princípios da justiça e da imparcialidade, dos quais se relevam para efeitos da fiscalização da actividade administrativa no exercício do poder discricionário. De outro lado, não justifica para a recorrente defender o seu gozo da isenção fiscal por analogia aos outros contribuintes cujos lucros resultam da mesma actividade de jogos por contratos celebrados com a “B”, com apelo ao princípio da igualdade.
Aliás, parece ser manifesta que a recorrente, pessoa colectiva referida no n.º 2 do art.º 3.º do RICR e desprovida da legitimidade de isenção dada à concessionária “B”, através dos Despachos do Chefe do Executivo n.ºs 30/2004, 333/2007 e 378/2011, proferidos através da utilização permanente do Governo da faculdade prevista no art.º 28.º da Lei n.º 16/2001, nem satisfeito o pressuposto da isenção subjectiva prevista no art.º 9.º do RICR, deve ser tributado como um contribuinte normal em sede de imposto complementar de rendimentos por qual se incide sobre os lucros liquidados derivados do exercício de actividade comercial e calculado nos termos legais do ano económico em causa.
Pese embora não chegou a apurar do acto recorrido a análise sobre o contrato ou acordo celebrado entre a recorrente e a “B”, em particular, como se conclui dos respectivos clausulados que se não respeitam ao alegado “contrato de associação” ou contrato como lido por epígrafe, ou em que termos se avaliou a situação da recorrente com as situações de outros contribuintes que detêm contrato celebrado com a B e autorizado pela Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ), nem se pode aceitar a autorização como suporte bastante para se distinguir dos outros contribuintes que beneficiam da respectiva isenção fiscal2, tal como bem explicado pelo Digno Delegado Coordenador do Ministério Público junto deste Tribunal, no seu douto parecer, “…estando assegurada a validade substantiva do acto recorrido por alguns dos fundamentos invocados, sempre será inoperante, caso exista, a ilegalidade derivada da chamada motivação superabundante (neste sentido, pode ver-se, na jurisprudência comparada, o Ac. do STA de 5.5.2007, processo n.º 0730/06, disponível em www.dgsi.pt).…”
Pelas considerações acima referidas, não é de verificar a alegada ilegalidade no acto recorrido por erros nos pressupostos de facto e de direito e por violação dos princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade.
Por conseguinte, o entendimento assumido pela entidade recorrida e mostrado na sua conduta anterior, pela não consideração para efeitos de incidência em sede de imposto complementar dos rendimentos os lucros da recorrente provenientes da actividade de jogos titulada por contrato celebrado com a “B” nos exercícios anteriores, não iria conduzir à própria ilegalidade do acto recorrido, em particular, no que tocante à ofensa do princípio da boá fé e da confiança legítima da recorrente referida no art.º 8.º do «Código do Procedimento Administrativo».
Daí, é de improceder o presente argumento.
*
Da dupla tributação
Para sustentar este argumento da dupla tributação, suscita a recorrente que há uma pluralidade de normas a tributar sobre os rendimentos gerados no casino, tendo as receitas brutas da exploração de jogos de fortuna ou azar sujeitas ao imposto especial de jogos previsto no art.º 27.º da Lei n.º 16/2001, e os rendimentos líquidos anuais da concessionária ou subconcessionária resultantes da actividade comercial ou industrial sujeitos ao imposto complementar de rendimentos estatuído no art.º 3.º do RICR, o que implica uma identidade do facto tributário objectivo por haver sobreposição dos valores a considerar como material colectável na medida em que o valor das receitas brutas resultantes da exploração de jogos de fortuna ou azar pela concessionária ou subconcessionária contempla já o seu lucro líquido anual proveniente da exploração da concessão.
Como tal, na alegada qualidade da associada à concessionária de jogos de fortuna ou azar “B”, pode beneficiar-se da mesma isenção tributária concedida nos Despachos do Chefe do Executivo n.ºs 30/2004, 333/2007 e 378/2011, proferidos através da utilização permanente do Governo da faculdade prevista no art.º 28.º da Lei n.º 16/2001 com a intenção de eliminar dupla tributação, como se vislumbra nos casos de que os contratos foram autorizados.
Anota-se que “…Em direito fiscal a dupla tributação pode ocorrer quando o mesmo facto que se pretende tributar é objecto da previsão de duas normas de tributação diferentes, quer estas pertençam ao mesmo ordenamento jurídico-tributário (dupla tributação interna), quer de ordenamentos jurídico-tributários distintos (dupla tributação interterritorial e internacional16). A dupla tributação não se confunde com a duplicação de colecta que se verifica “quando, estando paga por inteiro uma contribuição ou imposto, se exigir da mesma ou de diferente pessoa uma outra de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo”17..…”3
Rezam os art.ºs 27.º e 28.º da Lei n.º 16/2001 que:
“Artigo 27.º
Imposto especial sobre o jogo
1. As concessionárias ficam obrigadas ao pagamento de imposto especial sobre o jogo, o qual incide sobre as receitas brutas de exploração do jogo.
2. A taxa do imposto especial sobre o jogo é de 35%.
3. O imposto especial sobre o jogo é pago em duodécimos na Recebedoria da Repartição de Finanças de Macau até ao décimo dia do mês seguinte a que respeitar.
4. Pode ser estabelecido contratualmente entre a Região e as concessionárias um valor de garantia mínimo do imposto especial sobre o jogo.
5. O Governo pode exigir que seja prestada garantia bancária adequada que garanta o pagamento de montante igual aos valores mensais prováveis do imposto especial sobre o jogo.
6. As dívidas relativas ao imposto especial sobre o jogo são cobradas em execução fiscal.
Artigo 28.º
Regime fiscal
1. Independentemente da sujeição ao pagamento do imposto especial sobre o jogo, as concessionárias ficam obrigadas ao pagamento dos impostos, contribuições, taxas ou emolumentos estabelecidos na lei.
2. Quando motivo de interesse público o justifique, o Chefe do Executivo pode isentar, temporária e excepcionalmente, total ou parcialmente, as concessionárias do pagamento do imposto complementar de rendimentos.”
Conforme as normas citadas, manifesta é a intenção legislativa que os rendimentos provenientes da exploração de jogos de fortuna ou azar devem sujeitos à tributação especial de jogos, bem como ao imposto complementar de rendimentos, sem prejuízo que o Senhor Chefe do Executivo, com apelo à faculdade concedida no n.º 2 do art.º 28.º da Lei n.º 16/2001, determine isentar à concessionária do respectivo pagamento do imposto complementar de rendimentos, como se verifica nos Despachos do Chefe do Executivo n.ºs: 30/2004, de 23/02/2004, 333/2007, de 08/12/2007 e 378/2011, de 23/11/2011, em favor da “B”.
Neste sentido, não se pode acolher o argumento de o imposto especial de jogos ser um imposto de substituição ou imposto in lieu do imposto complementar de rendimentos (cfr. art.º 9.º, n.º 1, alínea e) da Lei n.º 21/78/M, de 9 de Setembro), nem se pode concluir essa dupla tributação, de modo que os rendimentos provenientes da exploração de jogos de fortuna ou azar pela concessionária ou subconcessionária dentro do mesmo período são tributados, quer em sede de imposto especial de jogos quer de imposto complementar de rendimentos, constitui-se a violação do estipulado do art.º 106.º da «Lei Básica» onde diz “O regime tributário das empresas concessionárias é regulado por lei especial.”
Além disto, tal como bem explicado no douto parecer do Digno Delegado Coordenador do Ministério Público junto deste Tribunal, “…De resto, a existência da previsão constante do n.º 2 do artigo 28.º da Lei n. º 16/2001 (cujo teor é o seguinte: «Quando motivo de interesse público o justifique, o Chefe do Executivo pode isentar, temporária e excepcionalmente, total ou parcialmente, as concessionárias do pagamento do imposto complementar de rendimentos») é demonstração bastante de que, em princípio, não há obstáculo legal à tributação de rendimentos em sede de imposto especial sobre o jogo e de imposto complementar de rendimentos, na medida em que o mecanismo de eliminação da tributação do mesmo sujeito passivo através de impostos diferentes mas incidentes sobre o mesmo rendimento ali contemplado não é de funcionamento automático, antes depende de uma apreciação casuística e justificada com base no concreto interesse público…” Donde, não se pode retirar dos referidos Despachos do Chefe do Executivo o sentido de fazer eliminar a sujeição das concessionárias ou subconcessionárias à dupla tributação, isto é, os rendimentos derivados da exploração de jogos de fortuna ou azar sujeitam aos dois regimes de tributação distintos.
Efectivamente, embora que a matéria colectável da recorrente referente ao exercício de ano em causa incide-se sobre os lucros provenientes da execução do contrato celebrado com a B, S.A., concretamente, mediante o seu acordo relativo à exploração da actividade de jogos de fortuna ou azar no lugar determinado dentro do mesmo período temporal, salvo o devido respeito por entendimento diverso, não é de considerar os respectivos lucros da recorrente e da B se tratam de um facto tributário juridicamente idêntico por qual diz respeito a dois sujeitos jurídicos distintos.
Pelos expostos, não parece que haja suporte legal bastante para a recorrente imputar a ilegalidade da dupla tributação ao acto recorrido, nem se pode beneficiar da isenção do pagamento do imposto complementar de rendimentos, por faltar à recorrente quer da qualidade da concessionária de jogos de fortuna ou azar, quer da isenção do respectivo pagamento do imposto complementar de rendimentos expressamente atribuída tal como se verifica no caso da Sociedade de Investimento Predial C, S.A..
Pelo que, é de improceder o presente argumento.
*
Pelos expostos, deve ser julgado improcedente o presente recurso contencioso com a consequente absolvição da entidade recorrida do pedido.
***
III. Decisão
Por tudo o que fica expendido e justificado, o Tribunal julga-se improcedente o presente recurso contencioso interposto pela recorrente, absolvendo a entidade recorrida do pedido.
Custas pela recorrente na taxa de justiça de 7UC.
Registe e notifique.
*

Quid Juris?
É do entendimento uniforme que as conclusões do recurso delimitam o âmbito cognoscitivo do Tribunal ad quem (cfr. artigo 598º do CPC). Neste recurso jurisdicional pela Recorrente foram levantadas as seguintes questões que importa analisar e decidir:
1) - Erro nos pressupostos de facto e direito, por entender que, relativamente ao rendimento proveniente da B, ela não está sujeita ao pagamento do imposto complementar de rendimentos, por não se verificarem os pressupostos exigidos pelo ICR;
2) – O contrato celebrado entre a Recorrente e a B é um contrato de associação e como tal o rendimento percebido pela Recorrente ao abrigo do referido acordo não está sujeito ao pagamento do IRC por tal já ser objecto de imposto especial de jogo, pago pela B;
3) – Representa uma dupla tributação ao exigir que a ora Recorrente paga o ICR.
*
Comecemos pela primeira questão.
Para tal alegou o seguinte:
“(…)
7) A Recorrente sempre defendeu que a remuneração que lhe é paga vem já tributada em Imposto Especial sobre o Jogo (doravante, "IEJ") à taxa de 35% (cfr. artigo 28.º da Lei n.º 16/2001) e demais contribuições obrigatórias exigíveis às concessionárias, ao abrigo das alíneas 7) e 8) do artigo 22.º da mesma Lei.
8) Ao abrigo do contrato de associação em participação, a Recorrente recebe da sua parceira B uma prestação mensal correspondente a 55% do rendimento gerado na zona afecta ao mercado de massas do casino, 57% do rendimento emergente do jogo das salas VIP e 40% do rendimento emergente de jogos em slot machines, tudo de acordo com a contagem efectuada pela DICJ.
9) A entidade recorrida fez uma errada qualificação do contrato ao considerar que estava em causa um contrato de prestação de serviços para assim considerar a situação da Recorrente em moldes diferentes do que faz para as demais associadas da B.
5) Como se disse, é o próprio acto recorrido que faz verter na sua fundamentação que "comparando a situação da reclamante com as situações de outros contribuintes, designadamente cujo contrato com a B tenha sido autorizado, estamos perante situações diferentes, e em consequência, não há violação do princípio da igualdade, nem tal pode ser aferido nesta sede.".
10) E isto porque o entendimento da DSF nesta matéria, desde 2006 e mantido recentemente em 2013, tem sido o de considerar que os montantes pagos pela B, no âmbito da sua actividade do jogo, como remuneração às suas associadas através de Acordos de natureza idêntica ao que celebrou com a ora Recorrente, não estão sujeitos a ICR porque já vêm pagos em sede de Imposto Especial do Jogo!
11) Só que, no caso da Recorrente, a Entidade Recorrida limita-se a considerar que é uma situação diferente das outras associadas da B (oferecidas a título de exemplo pela Recorrente), tudo para não dar o mesmo tratamento fiscal à Recorrente.
12) A Recorrente não reclama, ao contrário que é dito no acórdão recorrido, um tratamento fiscal privilegiado, mas antes um tratamento fiscal idêntico ao das suas concorrentes comerciais, em idênticas posições contratuais de associação em participação com a B.
(…)”.
Ora, nesta parte do recurso são as seguintes questões que importa analisar e decidir:
- Os Rendimentos percebidos pela Recorrente estão sujeitos ou não ao ICR?
- A existência do contrato entre a Recorrente e a B afasta a tributação incidente sobre a ora Recorrente?
- O não tributar pela Administração Fiscal sobre os rendimentos da mesma natureza durante certo período de tempo é razão bastante para continuar a tributar agora?
*
Importa realçar algumas ideias básicas para perceber quem afinal tem razão neste recurso.
1) – Comecemos pelo imposto sobre rendimentos. O que este é?
A este propósito escreveu-se:
     Nos impostos sobre o rendimento o facto gerador do imposto é a percepção de um rendimento no decurso de um determinado período - período de imposto ou período de tributação -, em geral correspondendo a um período de um ano, verificando-se (ou convencionando-se) o nascimento da obrigação de imposto no último dia do período de tributação. Esta noção de percepção de rendimento necessita, por vezes, de ser mais precisa, de acordo com a natureza dos rendimentos, podendo o facto gerador do imposto ser a realização do rendimento ou o facto de ser posto à disposição dos beneficiários.
     De uma maneira geral, em matéria de impostos sobre o rendimento derivados de actividades comerciais e industriais, o facto jurídico que dá origem à obrigação de imposto é a realização do rendimento, não se tornando necessário investigar se o contribuinte dispõe desse rendimento. Em sentido diverso é o que se passa com a tributação dos vencimentos e salários, que geralmente só ficam sujeitos a tributação depois de serem postos à disposição dos contribuintes, quer, seja por pagamento em espécie, quer, seja por transferência ou depósito bancário.
     Nos impostos sobre o rendimento a definição do facto gerador do imposto - realização ou disposição - é um elemento muito importante na aplicação da lei no tempo. Como as datas de realização e de disposição de um rendimento podem não coincidir, as condições de tributação podem variar, no caso de haver alterações legislativas entre as referidas datas, conforme o facto jurídico que for considerado como dando origem à obrigação de imposto.
     Do mesmo modo, este facto tributário tem também importância na aplicação da lei no espaço sendo um elemento da aplicação territorial da lei fiscal ou das convenções internacionais, verificando-se na generalidade regras distintas de tributação relativas à realização e à disposição. Se num espaço fiscal o facto tributário é a realização do rendimento, o rendimento de um estabelecimento pertencente a uma empresa local produzido noutro espaço fiscal não é, em princípio, tributado; por outro lado e em regra geral, o residente de um país, quer seja nacional ou estrangeiro, está sujeito a imposto sobre o rendimento pelo conjunto dos rendimentos de origem interna e externa de que dispõe. (in Apontamentos de Direito Fiscal, José Hermínio Paulo Rato Rainha, Faculdade de Direito da UM e Fundação Macau, 1996, pág. 207 e seguintes.)
2) - O que a ora Recorrente verdadeiramente aqui discute não é essa fixação stricto sensu, ou seja, não é a quantificação da matéria colectável, o que, na realidade questiona é a legalidade da própria tributação em sede de imposto complementar de rendimentos, uma vez que, em seu entender, os rendimentos que obteve no exercício em causa não estão sujeitos a essa tributação.
3) - Ora, a obrigação tributária é uma obrigação ex lege e não ex voluntate, o que quer dizer que a obrigação nasce pela mera concretização de um dado pressuposto legal, sendo irrelevante ao seu conteúdo e validade a vontade da administração ou do contribuinte (cfr. nestes termos, SÉRGIO VASQUES, Manual…, p. 420).
4) - Olhando para a situação em apreço, não parece que possam suscitar-se grandes dúvidas quanto à verificação dos pressupostos de incidência subjectiva e objectiva do imposto complementar tal como se encontram legalmente definidos.
5) - Na verdade, é incontroverso que a Recorrente é uma pessoa colectiva (sociedade comercial) que, no exercício correspondente ao ano de 2014, auferiu na RAEM rendimentos provenientes de uma actividade comercial que aqui desenvolveu, pelo que, nos termos do artigo 2.º e do artigo 3.º, n.º 1, alínea a) do RICR, estão preenchidos aqueles pressupostos legais positivos de incidência tributária em sede de imposto complementar (sempre se diga que a ora Recorrente é, fora de dúvida, uma empresária comercial e a actividade que desenvolveu e da qual provieram os rendimento tributados é uma actividade comercial, nos termos resultantes do disposto nos artigos 1.º, alínea b), 2.º, n.º 1 e 3.º do Código Comercial. Tanto assim que a ora Recorrente apresentou em devido tempo a sua declaração de rendimentos para efeitos de imposto complementar modelo M/1).
6) - Não se vislumbra, por outro lado, como se salientou no acto recorrido, que a Recorrente se enquadre em qualquer previsão normativa que consagre uma isenção fiscal, nomeadamente, a Recorrente não se enquadra na previsão do n.º 2 do artigo 28.º da Lei n.º 16/2001 (regime jurídico da exploração de jogos de fortuna ou azar em casino), pois que esta apenas abrange as concessionárias da exploração de jogo de fortuna ou azar, qualidade que a Recorrente manifestamente não detém, nem se enquadra em qualquer das alíneas elencadas no artigo 9.º do RICR, nomeadamente na da alínea e) do seu n.º 1.
7) – O imposto pago pelo B no âmbito do artigo 28º da Lei nº 16/2001, não tem nada a ver com a ora Recorrente, porque tal imposto é um imposto especial, que incide sobre as concessionárias de exploração de jogos de fortuna e azar nos termos da lei citada, com lucro ou sem lucro as concessionárias estão sujeitas a tal imposto de jogo! Uma espécie de retenção na fonte sui generis, ex lege e automática!
8) - Relativamente ao imposto que agora recai sobre a Recorrente, é um imposto sobre rendimentos por ela percebidos. Neste ponto, importa recapitular o que o RICR manda.
O artigo 2.º do RICR dispõe:
“O imposto complementar incide sobre o rendimento global definido nos termos do artigo 3.º, que as pessoas singulares ou colectivas, qualquer que seja a sua residência ou sede, aufiram no Território.”

E no art.º 3.º, do mesmo diploma, estabelece-se o seguinte:
“1.O rendimento global das pessoas singulares é a soma dos rendimentos a seguir mencionados, deduzida dos competentes encargos:
a) Rendimentos da actividade comercial ou industrial;
2. O rendimento global das pessoas colectivas é o lucro líquido anual derivado do exercício de actividade comercial ou industrial e calculado nos termos deste regulamento.
3. Tratando-se de sociedades comerciais e civis sob forma comercial, abater-se-á ao rendimento global, a importância dos lucros repartidos pelos sócios ou dos dividendos distribuídos aos accionistas relativamente ao ano a que o imposto respeitar.
4. Exceptuam-se do rendimento global referido nos n.ºs 1 e 2 deste artigo, os rendimentos de prédios urbanos.”
9) – Nesta óptica, o que a Recorrente recebe da B é, sem dúvida, um rendimento! Mas, este não é objecto de tributação no seu todo, porque o artigo 3º acima citado permite deduções (ex. lucros e dividendos distribuídos aos sócios), o remanescente é que está sujeito à tributação a título de imposto complementar de rendimentos.
10) - Pelo que, estando verificados os pressupostos de incidência subjectiva e objectiva do imposto complementar tal como se encontram legalmente definidos, improcede o argumento da Recorrente nesta parte.
*
Segunda questão:
Um outro argumento que a Recorrente invoca para tentar convencer que não estão verificados os pressupostos subjectivos e objectivos do imposto complementar de rendimentos é o de que entre ela e a B foi celebrado um contrato.
Se bem alcançamos o sentido da alegação da Recorrente, esta considera que o contrato que celebrou com a B (B), é um contrato de associação em participação, enquadrável no artigo 551.º do Código Comercial, nos termos do qual a Recorrente, como associada, participa nos lucros da B, enquanto associante, restringindo-se essa associação a uma remuneração mensal por participação nas receitas da B na actividade de jogos de fortuna ou azar no casino situado num espaço localizado dentro do Hotel XXX (cfr. artigo 52.º e seguintes da petição de recurso), sendo que, ainda de acordo com a alegação da Recorrente, a proprietária do dito hotel lhe concedeu uma autorização para o uso do espaço afecto à actividade de casino, consistindo a contribuição patrimonial da Recorrente em facultar à B o acesso a esse espaço e, adicionalmente, a assunção de todos os encargos inerentes ao marketing, promoção, publicidade, gestão e angariação de clientes e coordenação de todas as actividade do casino (cfr. artigo 18.º da petição de recurso).
Ora, a figura do contrato de associação em participação está prevista no artigo 551º (Noção e regime) do CCOM, que tem o seguinte teor:
     1. Contrato de associação em participação é aquele pelo qual uma pessoa é associada a uma empresa comercial exercida por outra, ficando a primeira a participar nos lucros ou nos lucros e perdas que desse exercício resultarem para a segunda.
     2. É elemento essencial do contrato a participação nos lucros; a participação nas perdas pode ser dispensada.
     3. As matérias não reguladas nos artigos seguintes são disciplinadas pelas convenções das partes e pelas disposições reguladoras de outros contratos, conforme a analogia das situações.
Depois, o artigo 554º (Contribuição do associado) do CCOM manda:
     1. O associado deve prestar ou obrigar-se a prestar uma contribuição de natureza patrimonial que, quando consista na constituição de um direito ou na sua transmissão, deve ingressar no património do associante.
     2. A contribuição do associado pode ser dispensada no contrato, se aquele participar nas perdas.
     3. No contrato pode estipular-se que a contribuição prevista no n.º 1 seja substituída pela participação recíproca em associação entre as mesmas pessoas, simultaneamente contratada.
     4. À contribuição do associado deve ser contratualmente atribuído um valor em dinheiro; a avaliação pode, porém, ser feita judicialmente, a requerimento do interessado, quando se torne necessária para efeitos do contrato.
     5. Salvo convenção em contrário, a mora do associado suspende o exercício dos seus direitos legais ou contratuais, mas não prejudica a exigibilidade das suas obrigações.
É de verificar que o alegado contrato celebrado entre a Recorrente e a B não é um contrato de associação em participação, por não se verificarem as notas caracterizadoras da figura em causa, nomeadamente as previstas no artigo 551º/1, acima citada, e ainda as referentes ao exercício dos direitos de informação, de fiscalização e de intervenção na gestão pelos associados (artigo 552º do CCOM). O que existe entre eles é um contrato de promoção de jogos, ou seja, a B autoriza que a Recorrente desenvolve actividades de promoção de jogos de fortunas e azar e depois explora estas actividades nas instalações da B. Pois, é uma actividade que só pode ser exercida por quem está legalmente licenciada e no espaço devidamente autorizado.
Ou seja, há diplomas legais de carácter especial que regulam especificadamente as actividades de exploração de jogos e de promoção dos mesmos, nomeadamente a Lei nº 16/2001, de 24 de Setembro, o Regulamento Administrativo nº 6/2002, de 1 de Abril (em matéria de promoção de jogos).
Logo, é irrelevante o argumento de que tais contratos fossem “chacelados” pelo Governo ou não, por não terem nenhum efeito sobre a tributação em causa.
Pelo que, improcede o argumento da Recorrente nesta parte do recurso, julgando-se improcedente o mesmo.
Perante os argumentos acima produzidos, julga-se igualmente infundado o argumento da existência de dupla tributação no caso da Recorrente.

*
Terceira questão:
Um outro argumento invocado pela Recorrente neste recurso tem a ver com a ideia de que, no passado, até 2013, a Administração Fiscal considerava que os rendimentos provenientes das concessionárias de exploração de jogos de fortuna e azar nas condições tal como as que está a ora Recorrente, não estava sujeitos ao ICR, e como tal a Entidade Recorrida agiu mal.
A circunstância de a Administração Fiscal, alegadamente, não ter seguido, no caso da Recorrente o entendimento que anteriormente definira para casos semelhantes, não gera a ilegalidade do acto recorrido, quando se constata que este resultou de uma correcta aplicação vinculada da lei.
Aliás, as isenções fiscais, por isso que representam despesa fiscal, estão sujeitas ao princípio da legalidade e portanto, a Administração só pode isentar um contribuinte do pagamento de imposto quando, em relação a ele se verifiquem, os pressupostos legais para conceder tal isenção (neste mesmo sentido de que a Administração carece de lei habilitante para poder isentar os contribuintes de impostos ou de taxas, veja-se o Ac. do Tribunal de Última Instância de 22.6.2016, processo n.º 20/2016). Ora, manifestamente, isso não sucede no caso presente, isto é, não se verifica que a Recorrente preencha pressupostos legalmente previstos de qualquer isenção fiscal de imposto complementar de rendimentos, pelo que resulta deslocada, com todo o respeito o dizemos, a invocação dos princípios gerais da actuação administrativa para, com base numa alegada violação dos mesmos, sustentar a ilegalidade do acto recorrido (de resto, como é sabido e tem sido continuamente reafirmado pelos nossos tribunais, a violação de tais princípios só assume relevância autónoma quando está em causa o exercício de poderes discricionários por parte da Administração, o que, no caso, não sucede: entre muito outros e por último, veja-se o Ac. do Tribunal de Última Instância de 18.9.2019, processo n.º 26/2019).
Pelo que, é de julgar também improcedente o argumento nesta parte do recurso invocado pela Recorrente.

Face ao expendido, não se verificando o vício de erro nos pressupostos e de direito, nem o de violação dos princípios gerais da actividade administrativa invocados pela Recorrente, julga-se improcedente o recurso jurisdicional interposto pela Recorrente.

*
Síntese conclusiva:
I – O imposto de rendimento complementar (IRC) é imposto sobre o rendimento, cujo facto gerador é a percepção de um rendimento no decurso de um determinado período - período de imposto ou período de tributação -, em geral correspondendo a um período de um ano.
II – O IRC, quando incide sobre o rendimento derivado de actividades comerciais e industriais, o facto jurídico que dá origem à obrigação de imposto é a realização do rendimento, dispensando-se investigar se o contribuinte dispõe ou não desse rendimento.
III - A Recorrente, uma sociedade comercial constituída em Macau, no exercício correspondente ao ano de 2014, auferiu na RAEM rendimentos provenientes de uma actividade comercial (pagos pela B) que aqui desenvolveu, nos termos do artigo 2.º e do artigo 3.º, n.º 1, alínea a) do RICR, reúne os pressupostos legais positivos de incidência tributária em sede de imposto complementar.
IV - O imposto pago pelo B no âmbito do artigo 28º da Lei nº 16/2001, não tem nada a ver com a ora Recorrente, porque tal imposto é um imposto especial, que incide sobre as concessionárias de exploração de jogos de fortuna e azar nos termos da lei citada, com lucro ou sem lucro as concessionárias estão sujeitas a tal imposto de jogo! Uma espécie de retenção na fonte sui generis, ex lege e automática!
V – O alegado contrato celebrado entre a Recorrente e a B não é um contrato de associação em participação, por não se verificarem as notas caracterizadoras da figura em causa, nomeadamente as previstas no artigo 551º/1 do CCOM, e ainda as notas referentes ao exercício dos direitos de informação, de fiscalização e de intervenção na gestão pelos associados (artigo 552º do CCOM). O que existe entre eles é um contrato de promoção de jogos, ou seja, a B autoriza que a Recorrente desenvolva actividades de promoção de jogos de fortuna e azar e depois explora estas actividades nas instalações da B. Pois, é uma actividade que só pode ser exercida por quem está legalmente licenciada e no espaço devidamente autorizado.
VI – Nestes termos, tal contrato não altera a natureza de rendimentos, pagos pela B, que está sujeito ao ICR, nos termos do artigo 2º do RICR.

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Tudo visto, resta decidir.
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    V – DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida do TA.
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Custas pela Recorrente que se fixam em 7 Ucs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 17 de Setembro de 2020.

Fong Man Chong
Ho Wai Neng
Tong Hio Fong
Mai Man Ieng
1 É do conhecimento público a “F Limited” é uma sociedade listada na bolsa da RAEHK e é titular da “Sociedade de Investimento Predial C, S.A.”.
2 É imaginável que todos os outros casos semelhantes, digamos em comum “satellite casinos” da “B”, cujos contratos celebrados entre os interessados e a “B”, para efeitos de dar em execução como um do leque dos casinos operados pela “B”, não foram objectos de apreciação e autorizadas pela autoridade competente. O que se distingue é apenas, no caso da “Sociedade de Investimento Predial C, S.A.”, existe um despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças de deferimento do pedido de isenção fiscal sobre os lucros de jogos provenientes do contrato celebrado com a “B” (não consta nos autos dados referentes às outras duas sociedades, i.e, “D S.A.” e “E Lda.”, cujos contratos celebrados com a “B” foram também autorizadas pela DICJ, o que obviamente não se pode aplicar à recorrente por analogia.
3 Cfr. «Apontamentos de Direito Fiscal», Hermínio Rato Rainha, Faculdade de Direito da Universidade de Macau e Fundação Macau, 1996, p. 144.
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