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Processo nº 204/2021
(Reclamação para a conferência)

Data do Acórdão: 17 de Junho de 2021

ASSUNTO:
- Infracção administrativa
- Sanção contratual
- Competência do Tribunal de Segunda Instância

SUMÁRIO:
- Em face do quadro legislativo de Macau que prevê transgressões, contravenções e infracções administrativas, as sanções aplicadas no âmbito da formação ou execução de contrato não cabem no âmbito das infracções administrativas;
- O Tribunal de Segunda Instância é o competente para conhecer do recurso contencioso interposto de acto de Secretário que aplica sanção decorrente da inexecução ou execução imperfeita de contrato.


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Rui Pereira Ribeiro



Processo nº 204/2021
(Reclamação para a conferência)

Data: 17 de Junho de 2021
Recorrente: A S.A.
Recorrido: Secretário para os Transportes e Obras Públicas
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ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:

I. RELATÓRIO

  A S.A.,
  com os demais sinais dos autos,
  vem interpor recurso contencioso do Despacho proferido pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 16.11.2020 que decidiu aplicar à Recorrente a multa a MOP50.000,00.
  Por despacho de fls. 85 declarou-se este Tribunal incompetente ordenando a remessa dos autos para o Tribunal Administrativo.
  Não se conformando com aquele despacho veio a Recorrente reclamar para a conferência, sustentando a competência deste Tribunal de Segunda Instância.
  Notificada a parte contrária para se pronunciar veio esta fazê-lo sustentando, também, ser este Tribunal de Segunda Instância o competente.
  
  Foram dispensados os vistos.
  
  Cumpre, assim, apreciar e decidir.
  
II. FUNDAMENTAÇÃO
  
  A multa aplicada e objecto desta acção resultará de uma infracção ao Contrato da Exploração da Indústria de Transportes de Passageiros em Táxis Especiais.
  De acordo com a alínea 5) do nº 5 do artº 30º da LBOJ compete ao Tribunal Administrativo conhecer “dos recursos de actos de aplicação de multas e sanções acessórias e dos restantes actos previstos na lei proferidos por órgãos administrativos em processos de infracção administrativa”.
  Subjacente à norma do artº 30º da LBOJ estão as infracções administrativas.
  Sustentam as partes que a sanção aplicada e contra a qual a Recorrente se insurge resulta de um contrato e não de infracção administrativa.
  Tradicionalmente no Direito Português as infracções penais distinguiam-se em crimes e transgressões, sendo que, para estas últimas mais tarde se veio a usar também a designação de contravenções.
  No caso de Portugal a evolução legislativa levou à consagração de um regime jurídico específico para este tipo de ilícitos culminando no regime geral das contraordenações.
  A evolução legislativa em matéria de ilícitos penais em Macau foi diferente.
  O Código Penal continuou a manter a distinção entre crimes e contravenções, vindo mais tarde a ser criado um regime específico para as infracções administrativas.
  Sobre esta matéria é esclarecedor o Acórdão do TUI de 03.05.2006 proferido no processo 6/2006, o qual na parte que aqui releva se transcreve:
  «3. Direito punitivo ou sancionatório.
  Para qualificar as infracções que estão em causa, convém adiantar algumas considerações sobre a tipologia do direito punitivo ou sancionatório, afastando desde já as sanções cíveis porque manifestamente irrelevantes para o nosso caso.
  Tradicionalmente, tanto no direito português, como no de Macau, que tem a matriz do primeiro, as infracções penais eram de dois tipos, os crimes e as contravenções ou transgressões. Esta distinção relevava do Código Penal de 1886, que vigorou em Portugal até 31 de Dezembro de 1982 e em Macau até 31 de Dezembro de 1995.
  O art. 1.º do Código Penal de 1886 definia o crime como o facto voluntário declarado punível pela lei penal e o art. 3.º considerava contravenção o facto voluntário punível, que consiste na violação, ou na falta de observância das disposições preventivas das leis e regulamentos, independentemente de toda a intenção maléfica.
  Não era fácil a tarefa do intérprete na distinção das duas figuras.
  As duas infracções tinham elementos comuns e elementos próprios. Ambas são factos voluntários puníveis, mas já divergem na fonte da incriminação. Só a lei para os crimes, a lei ou o regulamento no caso das contravenções.
  No caso da contravenção, a lei distingue-a do crime, da seguinte forma:
  - Nas contravenções as normas violadas são de natureza preventiva;
  - As contravenções são punidas independentemente de toda a intenção maléfica.
  Explica MAIA GONÇALVES que “(a) distinção entre estas duas categorias tem vindo predominantemente a fazer-se em torno da doutrina de Carnevale, exposta por este criminalista italiano em dois estudos, publicados em 1906 e 1907. Este autor distinguia a protecção penal concedida aos interesses sociais ou bens jurídicos em si, da que é concedida às condições favoráveis ou de ambiente indispensáveis à existência e desenvolvimento normal desses interesses.
  No primeiro caso, a protecção é defesa dos interesses; no segundo, mera polícia do direito. A infracção das normas que desempenham a função de defesa origina o crime; a das normas de polícia faz nascer a contravenção.
  Esta doutrina, que desenvolve a que distingue entre defesa mediata e defesa imediata dos bens jurídicos, foi perfilhada por notáveis criminalistas (veja-se Manzini, Tratatto, ed. de 1950, vol. I, págs. 580 e segs.).
  Entre nós, aderiu-lhe inteiramente Marcello Caetano, Lições de Direito Penal, 1939, págs. 190-191. Beleza dos Santos, seguindo de perto Caeiro da Matta, considerou normas repressivas aquelas que defendem interesses jurídicos, punindo aqueles factos que atacam ou põem em perigo, directa e imediatamente, certos interesses, e normas preventivas as que protegem interesses jurídicos incriminando factos que só ocasionalmente atacam ou põem em perigo interesses indeterminados. Importa pois, em cada caso, averiguar se a infracção ameaça directa e imediatamente interesses jurídicos, ou se só representa uma ameaça longínqua desses interesses (Lições de Direito Criminal, 1935-1936, pág. 257 e R.L.J., 66.°, pág. 34).
  Assim, estes autores colocam-se dentro da doutrina, desenvolvida por Carnevale, que distingue entre defesa mediata e defesa imediata dos bens jurídicos como critério diferenciador entre normas repressivas e preventivas, e, indirectamente, entre crimes e contravenções”.
  Para outros, a contravenção seria a acção ou omissão contrária ao interesse administrativo do Estado. “O seu campo situava-se no âmbito da própria actividade da Administração, que abrangeria exclusivamente a actividade da polícia de segurança, meramente conservativa de bens ou interesses públicos ou particulares, ou abrangeria o interesse à formação e melhoria das condições de vida social com o alargamento da função administrativa do Estado”.
  4. As contra-ordenações do direito português
  Entretanto, em Portugal, por inspiração do direito alemão (Ordnungswidrigkeit), foi criada uma nova infracção a contra-ordenação, ou ilícito administrativo, cuja violação era sancionada com uma coima, que é essencialmente uma multa. O Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, que criou o novo direito sancionatório (republicado integralmente em anexo ao Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro) ponderou que “o aparecimento do direito das contra-ordenações ficou a dever-se ao pendor crescentemente intervencionista do Estado contemporâneo que vem progressivamente alargando a sua acção conformadora nos domínios da economia, saúde, educação, cultura, equilíbrio ecológico, etc.”. ´
  Pretendeu-se excluir do direito penal esta nova infracção, com a criação de um direito punitivo da Administração. Ao mesmo tempo, anunciou-se que as contra-ordenações iriam substituir progressivamente as contravenções.
  A sanção das contra-ordenações é a coima, que era a designação da multa aplicável à infracção de posturas municipais ou de freguesia, no direito penal antigo (art. 485.º do Código Penal de 1886).
  Além da coima, são previstas sanções acessórias, como a interdição de exercer uma profissão ou uma actividade, perda de objectos, privação do direito a subsídio, etc.
  5. Infracções no direito de Macau: crimes, contravenções e infracções administrativas
  Em Macau, apesar da entrada em vigor do novo Código Penal, em 1 de Janeiro de 1996 (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 58/95/M, de 14 de Novembro), manteve-se a anterior tipologia das infracções penais, crimes e contravenções, sendo que estas continuaram a ter as características anteriores, definidas como “o facto punível que unicamente consiste na violação ou na falta de observância de disposições preventivas de leis ou regulamentos” (art. 123.º, n.º 1 do Código Penal), sendo importante destacar que nas contravenções não pode ser cominada pena de prisão de limite máximo superior a 6 meses (art. 123.º, n.º 3 do Código Penal), e se o for, a infracção é considerada crime (art. 124.º, n.º 2 do Código Penal) e, salvo disposição em contrário, nas contravenções a pena de multa é inconvertível em prisão (art. 125.º, n.º 1 do Código Penal).
  Só bastante mais tarde, o legislador de Macau sentiu a necessidade de regular, com carácter geral, o regime das infracções administrativas, que correspondem à função e ao regime designado em Portugal por contra-ordenações, mas com uma aparente diferença: em Macau, ao que parece, o legislador não pretende substituir as contravenções pelas infracções administrativas, mas antes manter como infracções penais os crimes e as contravenções, ao lado das infracções administrativas.
  6. As infracções administrativas
  Foi o Decreto-Lei n.º 52/99/M, de 4 de Outubro, que veio definir o regime geral das infracções administrativas e o respectivo procedimento.
  No seu preâmbulo fez-se constar que “(o) legislador tem vindo a sentir uma crescente necessidade de prever ilícitos de natureza não penal, civil ou disciplinar, não só em razão da tendência para descriminalizar certas condutas que não merecem tutela penal mas também em função da progressiva tipificação de infracções meramente relacionadas com regulamentação administrativa.
  Existem presentemente no ordenamento jurídico de Macau numerosos diplomas legais que prevêem ilícitos que não podem ser qualificados de crimes ou de contravenções nem têm natureza civil ou disciplinar.
  Tais ilícitos, cuja sanção principal é a multa administrativa, têm actualmente regimes diversos e, por vezes, contraditórios, sendo assim urgente adoptar um regime geral, fixando as respectivas normas substantivas e adjectivas”.
  No diploma em apreciação define-se infracção administrativa como o facto ilícito que unicamente consista na violação ou na falta de observância de disposições preventivas de leis ou regulamentos, que não tenha a natureza de contravenção e para o qual seja cominada uma sanção administrativa pecuniária denominada multa (art. 1.º, n.º 1).
  Por outro lado, o facto ilícito denominado infracção administrativa é considerado crime ou contravenção, conforme os casos, quando lhe corresponda pena de prisão ou pena de multa convertível em prisão (art. 1.º, n.º 2).»
  Como resulta do texto citado e do nº 1 do artº 1º do Decreto-Lei nº 52/99/M a “infracção administrativa é o facto ilícito que unicamente consista na violação ou na falta de observância de disposições preventivas de leis ou regulamentos”.
  Sendo que, a Lei 13/2009 na al. 6) do artº 6º e al. 6) do artº 7º consagra que as infracções administrativas de valor superior a MOP500.000,00 apenas podem ser criadas por lei e as de valor inferior por regulamento.
  Ou seja, à semelhança do que ocorre para os crimes – definido no nº 1 do artº 1º do CP como “o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da sua prática” – e contravenções – nº 1 do artº 123º do CP - em que vigora o princípio da legalidade e da tipicidade1, também para as infracções administrativas, o legislador faz depender as mesmas da prévia previsão e tipificação – do facto ilícito –, consagrando inclusivamente a reserva de lei ou de regulamento para a sua criação.
  
  Já no que concerne aos contratos administrativos a situação é diferente.
  Definindo-se o contrato administrativo no artº 165º do CPA, na al. e) do artº 167º deste diploma vem o legislador atribuir à Administração Pública o poder de aplicar as sanções previstas para a inexecução do contrato.
  «É o contrato administrativo, instituto jurídico que ao preservar certas especificidades próprias da actividade administrativa, reserva à Administração, ainda que enquanto parte contratual, poderes específicos de direito público que permitirá vencer as resistências quanto à contratualização na Administração Pública. Assim, através do contrato administrativo a Administração Pública, mesmo quando contrata, não se torna um particular, não perde o seu ius imperii, mantendo, pelo contrário, prerrogativas exorbitantes.» – Pedro Miguel Matias Pereira em Os Poderes do Contraente Público no Código dos Contratos Públicos, pág. 15 –
  Em termos de direito comparado o regime consagrado no CPA para a possibilidade de aplicar sanções pela inexecução do contrato corresponde ao anterior regime vigente em Portugal, limitando-se o legislador a consagrar uma norma habilitante permitindo o contraente público de aplicar as sanções que hajam sido previstas no contrato ou, caso se aplique, em lei especial.
  «São sanções aplicáveis, porém, desde que «previstas» na lei ou no contrato.
  O preceito referido sujeita a aplicação das sanções às hipóteses de «inexecução do contrato». Porém, isso não significa que o poder sancionatório só possa ser exercitado nos casos em que o contraente privado não executa o contrato. Na expressão estão abrangidas, igualmente, situações de cumprimento defeituoso e tardio. De certo modo, elas traduzem o contrário de uma execução devida e, por isso, pode até dizer-se que representam, em última análise, e em sentido amplo, uma inexecução do contrato.
  Mais comumente tais sanções consistem, em multas (ex: art.º 175.º, do D.L. n.º 48 871, por violação dos prazos contratuais pelo empreiteiro de obra pública; art.º 56.º, do D.L. n.º 63/85/M, de 6/7, por idêntica razão imputável ao adjudicatário para o fornecimento de bens ou prestações de serviços; art.º16.º, da Lei n.º 3/90/M, de 14/5, por incumprimento dos contratos de concessão de obras públicas e de serviços públicos).
  Mas as sanções podem ser de outro tipo.
  É o caso da perda do depósito de garantia (cfr. art.º 54.º, n.º 2, do D.L. n.º 63/85 citado).
  É o que se passa também com o sequestro.
  Sequestro é o direito conferido ao contraente administrativo (público) de se substituir ao contraente privado, através da posse administrativa, executando ele próprio, ou através de terceiro, e à custa do substituído, aquilo a que este estava obrigado.
  Este tipo de sanção (sequestro) reveste as características de uma autêntica execução específica e só é valida para os casos em que a prestação do co-contraente privado é fungível, ou seja, quando o seu objecto pode ser executado por qualquer pessoa e não apenas pelo obrigado inicial.» - José Cândido de Pinho, Manual Elementar de Direito Administrativo de Macau, CFMM, pág. 210 e 211 -.
  Actualmente o regime consagrado em Portugal com o Código dos Contratos Públicos, não só contém a norma habilitante como também prevê e regulamenta as sanções.
  Destarte, resultando as sanções do próprio contrato, não cabem as mesmas de forma alguma na definição do nº 1 do artº 2º do Decreto-Lei nº 52/99/M.
  Pese embora, dada a natureza do contrato aqui em causa, o interesse público esteja subjacente à boa execução do contrato e consequente poder sancionatório em caso de cumprimento defeituoso ou incumprimento, o certo é que, estas sanções resultam da relação contratual, estando aquém da previsão das infracções administrativas.
  Ou seja, enquanto a infracção administrativa é aplicável a qualquer um que incorra na prática do facto ilícito, estando legitimadas pelo poder intervencionista do Estado moderno nos vários sectores da sociedade, a sanção decorrente do incumprimento contratual, por natureza é aplicável apenas inter-partes, no âmbito daquele contrato.
  Destarte, acompanhando a posição das partes impõe-se concluir que a sanção objecto do acto administrativo aqui impugnado não é uma infracção administrativa, pelo que, não cabe no âmbito do artº 30º da LBOJ.
  
  Por fim em reforço da posição agora adoptada, temos o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência de 01.07.2015, processo 126/2014, onde definindo-se que «Não é possível a cumulação de pedidos prevista no art.º 113.º n.º 3 do Código de Processo Administrativo Contencioso se para os respectivos pedidos forem competentes tribunais de grau hierárquico diverso, pelo que o Tribunal Administrativo não tem competência para conhecer do pedido, deduzido em acção sobre contratos administrativos, de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato, cujo julgamento em primeira instância cabe ao Tribunal de Segunda Instância.», tem subjacente à decisão tomada a competência do Tribunal Administrativo em matéria de contratos administrativos – artº 30º nº 3, III) da LBOJ – e a competência deste Tribunal de Segunda Instância para conhecer do pedido de anulação ou declaração de nulidade ou de inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato praticados pelas entidades a que alude a alínea 8) do artº 36º da LBOJ, sendo que, o acto administrativo em causa, seja no Acórdão de Fixação de Jurisprudência, seja no Acórdão fundamento – Acórdão do Tui de 21.05.2003 proferido no Processo 4/2003 -, é sempre um acto de aplicação de sanção contratual2.
  Pelo que, não descurando que em termos de direito a constituir as sanções contratuais possam vir a ser equiparadas às infracções administrativas no que à competência para delas conhecer em primeira instância concerne tendo em consideração que a dignidade da matéria é a mesma, o certo é que, no âmbito do direito constituído outra solução não pode retirar que não seja a da competência deste Tribunal de Segunda Instância.
  
  
III. DECISÃO
  
  Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julgando-se procedente a reclamação, revoga-se o despacho de fls. 85.
  
  Sem custas.
  
  Notifique.
  
  RAEM, 17 de Junho de 2021
  Rui Pereira Ribeiro
  Fong Man Chong
  
No projecto do Acórdão do processo nº 203/2021, de que sou Relator, submetido à conferência de hoje, onde foi tratada a mesma questão que ora apreciada aqui, proponho ao Colectivo a solução nos termos seguintes: .
……
Nos termos do disposto no artº 30º/5-(5) da LBOJM, compete ao Tribunal Administrativo para julgar os recursos dos actos administrativos de aplicação de multas e sanções acessórias e dos restantes actos previstos na lei proferidos por órgãos administrativos em processos de infracção administrativa.

Diz-se infracção administrativa o facto ilícito que unicamente consista na violação ou na falta de observância de disposições preventivas de leis ou regulamentos – o artº 1º do Decreto-Lei nº 52/99/M.

Não obstante a definição legal de infracção administrativa face ao artº 1º do Decreto-Lei nº 52/99/M, cremos que, em face do disposto na LBOJM, ao critério determinativo da distribuição vertical das competências judiciais, ao TSI ou ao TA, para a apreciação dos recursos contenciosos de anulação dos actos administrativos, estão subjacentes as considerações que se prendem ou com a qualidade dos autores dos actos ou com a importância da matéria em que são praticados.

No caso da competência para julgar dos recursos dos actos que sancionem as infracções administrativas, é evidentemente por causa da natureza da bagatela da matéria que levou o legislador a atribuir a competência ao TA.

Assim, se os actos punitivos da violação ou da inobservância de uma norma legal ou regulamentar caem na competência do Tribunal Administrativo, os actos punitivos da violação ou da inobservância de uma mera cláusula estipulada no contrato administrativo celebrado entre a Administração e o particular carecem, por maioria de razão, da dignidade para serem apreciados no TSI.

Creio que é de manter esse entendimento meu e fico assim vencido na votação do presente Acórdão nestes exactos termos acima consignados.
   Lai Kin Hong
 *
   Mai Man Ieng

1 Veja-se Manuel Leal-Henriques, Direito Penal de Macau, 2019, pág.67.
2 Veja-se a propósito a referência que é feita a dado passo no Acórdão ao citar o Parecer do Ministério Público: Importa ter presente a advertência de que «O mesmo TSI, noutras ocasiões, implicitamente, acolheu tranquilamente a sua competência para o recurso contencioso em casos similares ao presente em que igualmente estavam em causa multas contratuais no quadro da execução de contratos públicos. Assim sucedeu com os Acórdãos de 11/07/2013, Proc. n.º 586/2012 e de 17/05/2012, Proc. n.º 101/2011.» (Acórdão do TSI no Processo n.º 159/2014)

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204/2021 RECL P/CONF 3