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Processo n.º 466/2021
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 16 de Setembro de 2021

ASSUNTOS:

- Competência do TJB quando a causa de pedir consiste no cumprimento dum acordo celebrado entre a RAEM e uma sociedade comercial em pé de igualdade


SUMÁRIO:

I – Quando a Autora formulou um pedido principal, consistente em restituição do terreno pela Ré para a Autora, com base no conteúdo dum compromisso escrito em que intervieram as partes (junto com a p.i. como doc. 9), não se alcança que alguma das cláusulas não pudessem ser estabelecida entre particulares, não se vislumbra que encerrem poderes ou prerrogativas para a RAEM ou restrições, encargos ou sujeições para o particular que o direito privado não permita, realidade esta que demonstra claramente que as negociações estabelecidas, materializadas na contratação, foram avessas à criação de relações jurídicas administrativas, portanto, é de considerar que estamos perante um contrato de direito civil tipificado: o comodato previsto no artigo 1057º do CCM, eventualmente, visto o teor do artº3 do compromisso consubstanciado no documento junto com a p.i., de um contrato de arrendamento, uma vez que se insere nele um valor que se dispensa a Autora de pagar à R (como era sua obrigação), e que pode consubstanciar renda (será neste caso um arrendamento à R. de um espaço entregue à A. por aquela e no quadro de uma outra relação jurídica, esta de natureza administrativa: concessão por arrendamento).
II - Em relação ao pedido principal, por a demanda dos autos se caracterizar como acção sobre a responsabilidade contratual versando um contrato de direito privado, é competente o TJB em razão da matéria para dirimir o litígio nascido neste âmbito.




O Relator,

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Fong Man Chong





Processo nº 466/2021
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 16 de Setembro de 2021

Recorrente : Região Administrativa Especial de Macau (澳門特別行政區)

Objecto do Recurso : Despacho que julgou improcedente a excepção dilatória de incompetência e omitiu a conhecer a excepção peremptória da caducidade (裁定無管轄權的延訴抗辯理由不成立及遺漏審理失效的永久抗辯的批示)

Ré : A Limitada (A有限公司)

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    A Região Administrativa Especial de Macau (澳門特別行政區), Recorrente, representada pelo MP, devidamente identificada nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datada de 20/11/2020 (fls. 328 a 345) que julgou competente o TJB para conhecer do pedido da restituição do terreno e incompetente para o pedido da indemnização (pedido subsidiário), dele veio, em 18/12/2020, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 14, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. Na presente acção a sociedade que gira sob a firma A Limitada pretende que seja a Região Administrativa Especial de Macau condenada a restituir à Autora "... o terreno no estado inicial, sito na Estrada XX, com a área de 2.967m2, descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 2XXX9, no livro BXX6, fls. 1XXv., e inscrito em nome da Autora, sob o n.º 2XXX1, no Livro FXX, fls. 1XXv.", assim como que, e subsidiariamente, que " ... seja a Ré condenada, a efectuar à Autora, a título de indemnização, a entrega do direito concessionário de um lote em condições equivalentes".
     2. Fundamentando tais pretensões na concessão que, a 26 de Dezembro de 1989, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, o então Governo de Macau lhe concedeu por referência àquele terreno.
     3. Entendendo a Autora que está em causa uma relação de direito privado e que foi nesse âmbito e em resultado de vicissitudes várias que, a 18 de Marco de 2010, celebrou com a ora Ré um "termo de compromisso", pelo qual a Ré passou a utilizar aquele mesmo terreno para efeitos de instalação de um depósito provisório de distribuição de combustíveis,
     4. Estabelecendo o mesmo "termo de compromisso" um prazo de utilização do terreno em questão por três anos, sendo renovável, mediante o respectivo consentimento antes de findo o prazo e com o compromisso de o terreno lhe ser devolvido no seu estado inicial, mais se comprometendo o governo da Região Administrativa Especial de Macau a ponderar o tempo de utilização provisória quando apreciasse o pedido de prorrogação de prazo de aproveitamento do terreno em questão.
     5. E não obstante, para além do mais, o Mmº Juiz a quo reconhecer que "... não existe qualquer dúvida que o contrato em causa visou a afectação do prédio à realização do interesse público ... ", entendeu que "... não se alcança qualquer associação ou compromisso deliberado por parte do particular (A.), no contrato em causa à prossecução do fim público. Ademais, mesmo que houvesse, esse facto por si só, cremos nós, não materializaria qualquer marca determinante - muito menos agravante por, como vimos, não existir qualquer cláusula exorbitante - de administratividade do contrato", assim concluindo que "Temos pois por certo a competência deste tribunal para conhecer o pedido principal" (sublinhados no original).
     6. Todavia, e ressalvado o devido respeito, entende a Ré que devia ter sido acolhida a excepção dilatória da incompetência material dos juízos cíveis, suscitada em sede de contestação, pois que a relação estabelecida e mantida entre a ora Autora e a Região Administrativa Especial de Macau é uma relação do âmbito jurídico-administrativo, assim competindo ao Tribunal Administrativo dirimir o presente conflito!
     7. Na realidade, o termo de compromisso em referência nos autos, assim como toda a actuação quer da Recorrente, quer da Ré, não poderá ser desassociada do indeclinável facto de que a respectiva actuação resulta ou deriva, ainda e sempre, do âmbito – retius, da execução - do contrato de concessão entre ambas anteriormente celebrado,
     8. Sendo tal contrato, afinal e exactamente, o elemento que, de alguma forma, concede "legitimidade" à ora Autora para, agora e ainda que em foro impróprio, pretender demandar judicialmente a Ré, após se terem gorado as negociações que manteve com a Ré, tendo em vista o aproveitamento do terreno referido nos autos e cuja concessão lhe fora atribuída, por arrendamento, pois que se tem como manifesto que se não actuasse no estrito âmbito de uma relação jurídico-administrativa previamente estabelecida, não teria a ora Autora qualquer possibilidade de interagir corri a Região Administrativa Especial de Macau relativamente ao terreno em questão, máxime em termos de "entabular negociações" e/ou celebrar com a Ré um termo de compromisso como o constante do Doc. n.º 9 pela própria Autora junto aos autos.
     9. Na realidade e como ensina Freitas do Amaral, "Muitas vezes ... a Administração Pública actua ... em colaboração com os particulares, usando a via do contrato, que é uma via bilateral, para prosseguir os fins de interesse público que a lei põe a Seu cargo. Isso significa que, nestes casos a Administração Pública, em vez de definir unilateralmente a sua vontade, necessita de chegar a acordo com aqueles para constituir, modificar ou extinguir relações jurídicas administrativas" (sublinhado do signatário), escrevendo o mesmo Professor que "Parafraseando Barbosa de Melo e Alves Correia, pode dizer-se que o interesse público, que constitui o fim do contrato administrativo, penetra no seu interior, modela as prestações e atualiza-as pari passu de acordo com as suas variações" (destaque e sublinhado do signatário)
     10. Também Marcello Caetano escrevia já que "Dizer que nos acordos celebrados pelo Estado nunca há senão a sucessão de actos administrativos a que corresponde a submissão voluntária do particular, é fechar os olhos à realidade", mais acrescentando que ''Nos contratos de Direito público a relação nasce do encontro de vontades, resulta de verdadeiro acordo livre sobre um objecto determinado: nenhum dos sujeitos considera definida e constituída a relação sem se verificar o mútuo consenso".
     11. E afirmando que "A reciprocidade dos interesses é na verdade possível no contrato administrativo na medida em que a um maior interesse privado corresponda um acréscimo de interesse público", concluía o mesmo Mestre que "Claro que se o benefício privado for conseguido à custa do sacrifício do interesse público, o contrato não está sendo interpretado segundo o seu espírito, mas, por outro lado, não será correcto o entendimento segundo o qual se procure realizar o interesse público sem consideração pelo mínimo de satisfação do interesse privado que deve presumir-se sempre atendido no contrato, mesmo quando não ressalte das suas cláusulas".
     12. Tendo presentes tais ensinamentos, e ressalvado o devido respeito, resulta nítido não poder ser sufragado o entendimento assumido na douta sentença de que ora se recorre, máxime quando, após leitura do artigo 167.° do CPAM, se declara que "Com efeito, não obstante ser a prossecução do interesse público que levou a RAEM à celebração do contrato (depósito de combustíveis com vista a salvaguarda da segurança pública - vide infra al. J a M dos factos assentes), o que é facto é que não se perscruta a associação ou compromisso que é "pedra de toque" do referido critério por parte do particular, mais se acrescentando que "Na verdade a associação ou compromisso tem subjacente como desiderato a ideia de participação, de "cumplicidade", na realização de algo, sendo essa participação um dos motivos ponderáveis ao impulso à contratação por parte do particular" (sublinhado no original),
     13. Pois que quer-se crer que, com efeito e de forma cristalina, o que os autos demonstram é que na sequência da concessão à Autora do terreno referido nos autos se vieram a verificar diversas vicissitudes que levaram a que a Autora não só tivesse solicitado a alteração das finalidades inicialmente consideradas, como também , num segundo momento, se comprometesse em ceder à ora Ré a utilização desse mesmo terreno, para que ali fossem armazenados produtos combustíveis, de forma a garantir a segurança da população local,
     14. O que não só demonstra o manifesto interesse público perseguido pela Ré, como evidencia a inequívoca adesão da Autora à prossecução de tal finalidade!
     15. Assim tendo sido celebrado a 18 de Março de 2010 o supra aludido termo de compromisso, no qual são intervenientes não só o legal representante da Autora, como também o Director da DSSOPT da Região Administrativa Especial de Macau, tendo o mesmo termo de compromisso sido aprovado por despacho do Chefe do Executivo da Região Administrativa Especial de Macau,
     16. Elementos estes que demonstram bem a natureza da relação jurídico-administrativa estabelecida entre as partes!
     17. Relação essa que as partes tentaram moldar, subsequentemente e de harmonia com a dinâmica da realidade que se foi apresentando, tendo sempre em atenção, para além do mais, a prossecução do interesse público consubstanciado no armazenamento em condições seguras de combustíveis, de forma a que o mesmo não constituísse um risco acrescido para a população em geral.
     18. Não tendo, todavia, Autora e Ré logrado alcançar uma plataforma de entendimento que permitisse o subsistir da relação entre ambas previamente existente, pois que, mesmo no âmbito da relação jurídico-administrativa e seguindo os ensinamentos dos Mestres anteriormente citados, não foi possível manter a "reciprocidade de interesses", assim não se tendo alcançado o "mútuo consenso", o que nada de "dramático" tem, em termos de caracterização da natureza administrativa ou meramente civilística da relação estabelecida entre a Autora e a Região Administrativa Especial de Macau, pois que, como melhor resulta do que se disse já, a busca de consenso ou de equilíbrio entre as partes não é, de todo, incompatível com o estabelecer - ou em casos como o dos autos, com o manter - de uma relação jurídico-administrativa,
     19. Antes sendo a busca de tal consenso característica das administrações modernas, que não só não consideram os particulares como "súbditos" aos quais se impõe "a vontade régia", como apreenderam já que os resultados obtidos na sequência de uma solução consensualizada são muito mais eficazes em termos de efectiva satisfação do interesse público.
     20. Assim devendo ser (ter sido) considerada procedente a excepção dilatória da incompetência material-cfr. artigos 10.°, n.os 1 e 2, 21.°, e 30.°, n.ºs 1, 2.1§3 e 2.3§3, da Lei de Bases da Organização Judiciária, e artigos 13.°, n.º 1, 30.° e 31.° do CPC - em momento oportuno suscitada pela Ré, com o consequente envio dos autos para o foro administrativo.
     21. Acresce, todavia, que a decisão ora sob recurso padece do vício de omissão de pronúncia, na medida em que não conheceu da excepção peremptória da caducidade pela Ré invocada (cfr. artigos 38.° a 55.° da contestação junta aos autos).
     22. Caducidade derivada do facto de a Autora se ter tomado concessionária do terreno referido nos autos, pelo prazo de 25 (vinte e cinco) anos contados da data da celebração da escritura pública do respectivo contrato, o que aconteceu a 11 de Maio de 1990, assim se mantendo aquele contrato até 10 de Maio de 2015.
     23. Sucedendo, todavia, que conforme o disposto nos artigos 44.° e 47.º, n.º1, da Lei n.° 10/2013 - Lei de Terras - a concessão, por arrendamento, é inicialmente dada a título provisório, por um prazo que não pode exceder 25 anos, só se convertendo em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente,
     24. Sendo que, nos termos do artigo 48.° do mesmo diploma legal, a concessão provisória, por arrendamento, não pode ser renovada, com excepção dos casos em que, a requerimento do concessionário e com autorização prévia do Chefe do Executivo, o respectivo terreno se encontre anexado a um terreno concedido a título definitivo e ambos estejam a ser aproveitados em conjunto.
     25. Importando sublinhar a este propósito que dos autos resulta nítido que, desde a concessão do terreno, por arrendamento, até ao vencimento do prazo de concessão, em 10 de Maio de 2015, a Autora nunca aproveitou, nos termos do contrato de concessão, o terreno ora em discussão, nem conseguiu alterar esse dito contrato.
     26. E encontrando-se o referido terreno ainda na fase de concessão provisória no dia de vencimento do respectivo prazo de arrendamento, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, pelo Despacho n.º 349/DSODEP/2015, aprovou o início do procedimento de declaração de caducidade, tendo, na sequência de reunião efectuada a 25 de Fevereiro de 2016, a Comissão de Terras emitido parecer no sentido de se encontrar caducada a concessão do referido terreno por decurso do prazo de arrendamento em 10 de Maio de 2015.
     27. E apesar de o Chefe do Executivo não ter, ainda, proferido qualquer despacho de declaração que visasse a caducidade da concessão do terreno, no que concerne à natureza do acto da declaração da caducidade da concessão do terreno e sua concessão provisória, e no caso de não conclusão do aproveitamento desse terreno, concedido a título provisório antes do termo do prazo de arrendamento, a jurisprudência dominante em Macau tem entendido que a concessão caduca automaticamente nos termos legais, sem precisar de depender do despacho de declaração de caducidade da concessão, proferido pelo governador ou pelo Chefe do Executivo - cfr., por todos, Acórdão n.º 743/2016, proferido pelo TSI em 13 de Julho de 2017 e Acórdão n.º 7/2018, proferido pelo TUI em 23 de Maio de 2015.
     28. Tendo mais recentemente e por decisões proferidas a 29 de Abril e 6 de Maio de 2020 (respectivamente, recursos n.ºs 28/2020 e 31/2020), o TUI assumido o entendimento, à luz do disposto no artigo 48.°, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 10/2013, de que "caso não consiga concluir o aproveitamento do terreno antes do decurso do prazo de concessão, a administração tem a obrigação de declarar a caducidade da concessão de terreno. Não são importantes as várias situações ocorridas durante o prazo de concessão, relativas ao aproveitamento do terreno, uma vez que no caso de declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento do terreno, não é importante a questão de culpa por não aproveitamento do terreno. Isso porque desde que não sejam situações excepcionais previstas por lei, a concessão não é renovável se o recorrente não tiver concluído o aproveitamento do terreno antes do vencimento do prazo máximo de concessão provisória".
     29. Assim se impondo a conclusão de que a concessão, por arrendamento do terreno referido nos autos caducou por decurso do prazo de arrendamento tendo, consequentemente, a autora perdido o direito ao aproveitamento do mesmo terreno que lhe havia sido concedido pelo Despacho n.º 37/SATOP/89, não dispondo, também, do direito de pedir a respectiva restituição.
     30. Sendo que conforme resulta do referido, pressuposto essencial para a autora ser parte do termo de compromisso consistia, exactamente, na subsistência do contrato de concessão daquele terreno, pois que tal compromisso/acordo incidia, exactamente, sobre a respectiva utilização dentro do prazo de validade do contrato de concessão.
     31. E tendo aquele contrato cessado por efeito da caducidade não só a autora deixou de ter direito à concessão anteriormente como, também e consequentemente, tornou-se impossível concretizar qualquer compromisso de restituição do terreno, no seu estado inicial, tal como estabelecido no termo de compromisso celebrado aos 18 de Março de 2010.
     32. Sendo igualmente manifesto que, atento também o princípio da separação de poderes, extravasa a competência dos tribunais reconhecer ou atribuir à ora Autora qualquer direito de concessão sobre um lote de condições equivalentes ao terreno referido nos autos.
     33. E ao não conhecer da excepção peremptória invocada pela Ré e a qual conduziria à absolvição da Ré do pedido, a decisão recorrida enferma de nulidade, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 571.° do Código de Processo Civil,
     34. Pois que, como se escreveu no Acórdão do STJ português de 16 de Outubro de 2002, proferido no Processo n.º 02S1599, com o número convencional JSTJ000, «A nulidade das decisões judiciais por omissão de pronuncia, previstas no artigo 688.°, n.º 1, alínea d), primeira parte, do Código de Processo Civil, "quando o deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ... constitui cominação ao incumprimento do disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 660.º do citado Código, segundo o qual "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja apreciação esteja prejudicada pela solução dada a outras"»,
     35. Sendo tal entendimento plenamente transponível para o ordenamento jurídico da Região Administrativa Especial de Macau, pois que as normas ali indicadas correspondem, respectivamente, à alínea d) do n.º 1 do artigo 571.° e ao n.º 2 do artigo 563.° do Código de Processo Civil de Macau.
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    A Limitada (A有限公司), Ré, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 32 a 44, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. 上訴人在2020年12月1日針對上訴批示提交了上訴聲請,沒有指出就原審法院的清理批示的哪一部分提出上訴,也沒有詳細說明上訴的有關依據。
     2. 根據《民事訴訟法典》第593條之規定:「一、提起上訴係透過聲請為之,該聲請須向作出上訴所針對裁判之法院之辦事處提交,而上訴人應指出所提起之上訴之類別;如屬第五百八十三條第二款a項及c項所規定之情況,亦應詳細說明有關依據...」
     3. 經分析上訴人在2020年12月18日提交的上訴之陳述,其中第I-XLV條所主張的上訴理據是原審法院的清理批示違反管轄權規則。
     4. 就管轄權事宜之上訴部分,基於上訴人在2020年12月1日提交上訴聲請時,並未詳細說明有關依據,因此,這部分上訴應不予考慮。
     5. 倘有不同理解,謹慎起見,被上訴人亦補充答覆如下:
     6. 根據《司法組織綱要法》第30條第2款3項(3)的規定,行政法院對關於行政合同的訴訟擁有管轄權。
     7. 本案的關鍵點是判斷涉案的「承諾書」是否屬於行政合同。
     8. 原審法院清理批示中對「承諾書」是否屬於行政合同做出了清楚的說明。
     9. 上訴人在上訴陳述中所重複提到的原告亦「追求公共利益之目的」,原審法院也已做出了審理。
     10. 關於涉案的「承諾書」的簽署,被上訴人要強調的是,一方面,該合同內並沒有賦予上訴人特權,或強加給被上訴人負擔的條款—該合同是在平等協商的情況下,上訴人向被上訴人提供相關「對價」的情況下,雙方自願簽署的;另一方面,追求公共利益是上訴人的職責(正如《行政程序法典》第四條所規定的),但不是被上訴人的職責,被上訴人簽署相關合同並不是為了追求公共利益之目的。
     11. 法院處理的「承諾書」和先前的批地合同,是兩個不同的行為。
     12. 在獲批給相關土地後,被上訴人取得的租賃批給而產生的權利,屬於一項私人權利,被上訴人如果行使此項權利,並不限於謀求公共利益。
     13. 綜上所述,關於無管轄權之延訴抗辯的上訴理由不成立,相關請求應予駁回。
     關於失效的永久抗辯之遺漏審理
     14. 上訴人在上訴陳述第XLV-LXIV條提出原審法院清理批示遺漏審理關於失效的永久抗辯,應宣告其無效。
     15. 對此部分,被上訴人並不能認同。
     16. 對於是否在清理批示中立即審理實體問題或永久抗辯,取決於「狀況容許無需更多證據已可全部或部分審理」。
     17. 在被訴清理批示中,原審法院明顯認為並不符合做出清理—判決批示的前提,因為仍有部分事實需要透過審判聽證來確定「A existência de factos controvertidos, cujo apuramento é necessário ao conhecimento do pedido, determia o prosseguimento dos autos para a produção de prova」。
     18. 在清理批示中,原審法院列出了起訴狀及答辯狀中需要透過審判聽證來確定的調查基礎事實。
     19. 因此,本案清理批示階段,並不符合第419條第1款b項的前提,原審法院無條件也無需立即審理上訴人提出的永久抗辯。
     20. 此外,上訴人在上訴陳述中,也並沒有就原審法院是否需要在清理批示中就永久抗辯做出審理提出任何說明。
     21. 因此,並不存在上訴人提出的遺漏審理的瑕疵,其相關請求應被駁回。
     22. 謹慎起見,倘有不同理解,被上訴人援引卷宗中的反駁狀中第30條至第52條的論述作為答覆,被上訴人的請求無論是在法律上還是物理上均屬可行的。
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    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.

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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – FACTOS ASSENTES:
- Em 12/12/2019 foi interposto pela Autora/Recorrida contra a RAEM/Ré uma acção declarativa sob forma ordinária, em que pediu a restituição do terreno e subsidiariamente a indemnização;
    - O MP, em representação da Ré apresentou contestação em 22/06/2020, invocando excepções dilatória e peremptória, advogando a improcedência de todos os pedidos formulados pela Autora;
    - No saneador foi decidida a excepção da incompetência material do TJB conforme o teor do despacho de fls. 328 a 336 dos autos;
    - Contra tal decisão veio em 18/12/2020 o MP interpor recurso ordinário para este TSI (fls. 2 a 14 dos autos).
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IV – FUNDAMENTAÇÃO
    É o seguinte despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
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     O Tribunal é competente em razão da nacionalidade.
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     Da excepção da incompetência material.
     A Ldª intentou a presente acção contra a RAEM, alegando que é concessionária de terreno que id., terreno esse que foi objecto de cedência à RAEM através de compromisso escrito e com a obrigação desta o devolver a termo.
     Porque tal devolução não ocorreu quando vencida a obrigação de devolução, pede a sua restituição.
     Subsidiariamente pede a condenação da RAEM na entrega de outro terreno, a título de indemnização e em substituição daqueloutro, fundando-se na circunstância alegada de que foi essa sua intenção informada a R. através de carta dirigida à DSSOPT – doc.11
     Citada, a R. invoca a incompetência material do tribunal por, segundo se crê, na sua óptica, o supra referido compromisso consubstanciar um contrato administrativo.
     Cumpre decidir a presente questão.
     A determinação da competência do tribunal em razão da matéria, tal como a decisão das excepções dilatórias de natureza processual, deve ser decidida face à petição inicial e tomando em conta, por um lado, a pretensão formulada ou a medida jurisdicional requerida e, por outro, a relação jurídica ou situação factual descrita nessa peça processual - Cfr. Ac. do STJ de 12.10.82 e de 3.2.87, in BMJ 320 -389 e 364 - 591, respectivamente. No mesmo sentido Manuel de Andrade. Noções Elementares de Processo Civil, pag. 90 e 91: a competência do tribunal “afere-se pelo quid disputatum (quid decidendum, em antítese com aquilo que será mais tarde o quid decisum”
     Isto posto, buscando a norma que estabelece a competência residual dos Tribunais Comuns, ou seja, o artº28 da Lei 9/1999 (LBOJ), dispõe-se nela que “competem aos juízos cíveis as causas de natureza cível que não sejam da competência de outros juízos, bem como as causa de outra natureza que não caibam na competência de outros juízos ou tribunais, incluindo todos os seus incidente e questões»”.
     Nos termos da presente acção a A. peticiona a restituição de um terreno, que pela R. lhe foi concessionado por arrendamento, terreno esse cedido à R. através de compromisso escrito junto com a p.i. como doc.9.
     Porque a A. deduz a presente acção em Tribunal Comum, fá-lo na pressuposição de que este é o Tribunal competente para conhecer o objecto dos presentes autos e, por conseguinte, convicta que o contrato que identifica como estando em crise tem natureza civil.
     Já a R., classificando o referido contrato como administrativo, vem pôr em causa a competência deste Tribunal.
     De facto, em princípio, só por esta via, ou seja, pela consideração de que o contrato em crise é um contrato administrativo, é que se descortina a “desafectação” do conhecimento do objecto dos presentes a este Tribunal e a competente “adjudicação” ao Tribunal Administrativo, atento o disposto no artº28 e 30 nº2 al.3) (3) da LBOJ: “compete ao Tribunal Administrativo conhecer das acções sobre contratos administrativos”.
     Como bem se vê, a dilucidação da competência material deste Tribunal, ou da medida da respectiva jurisdição, competência aquela definida no confronto com as competências dos restantes tribunais inseridos na ordem jurisdicional de Macau, passa, exclusivamente, pela classificação jurídica do contrato posto em crise.
     Vejamos então, e por ora, tão só a competência em relação ao pedido principal.
     Dispõe o nº1 do artº 165 do CPAM que o contrato administrativo é o acordo de vontades pelo qual é constituída, modificada ou extinta uma relação jurídica administrativa.
     Por seu turno estabelece o número 2 que são contratos administrativos, designadamente (enumeração exemplificativa), os contratos de: a) Empreitada de obras públicas; b) Concessão de obras públicas; c) Concessão de serviços públicos; d) Concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar; e) Fornecimento contínuo; f) Prestação de serviços para fins de imediata utilidade pública.
     Decomposto o conceito supra enunciado, detecta-se como elementos do contrato administrativo: o acordo de vontades; acordo esse visando constituir, modificar ou extinguir uma relação jurídica; relação jurídica essa de Direito Administrativo.
     Desta noção, o que é distintivo e decisivo é o facto de ela ter como efeito a constituição (a modificação ou a extinção) de uma relação jurídica administrativa. No resto, a noção de contrato não se afasta da noção do direito privado, sendo de compreensão linear.
     A grande dificuldade na distinção entre contratos civis e administrativos reside, efectivamente, no que se entenda por relação jurídico-administrativa.
     A este propósito, nomeadamente naquelas “zonas de fronteira”, nem sempre se tem logrado, de forma indubitavelmente segura, a respectiva distinção, ainda que com a ajuda de mecanismos elevados a critérios pela doutrina e jurisprudência.
     Desde as teses negativistas, surgidas na esteira de Otto Mayer - e nos termos da quais o critério assentava na valoração da igualdade jurídica entre a Administração e o co-contratante -, passando pelas que defendiam o critério da jurisdição competente - serão administrativos aqueles contratos da administração que o legislador sujeita ao conhecimento dos tribunais administrativos -, da forma - são administrativos os contratos cuja formação e celebração está sujeita a formalidades a que a contratação em regra não tem que respeitar -, do critério do objecto - são administrativos os contratos que versem sobre o serviço (entre nós, o interesse) público, fazendo o particular participar na execução de um serviço e desde que seja ele mesmo a executá-lo (mais tarde, alargado o critério em causa, veio a considerar-se que bastava que o particular fornecesse os meios necessários para que o Estado prosseguisse as suas atribuições e, segundo Prof. Marcelo Caetano, desde que essa associação fosse duradoura) -, até às teses que defendem o critério da cláusula exorbitante, todas elas têm procurado traçar as fronteiras entre os contratos privados e administrativos - Cfr. por todos, Maria João do Rosário Estorninho, in Princípios da Legalidade e Contratos e Administração, BMJ 368, p. 83 a 90 e Mário Esteves de Oliveira, in Direito Administrativo, V.I, pag.638 a 651.
     De todos os critérios supra elencados, o último dos referidos, critério da cláusula exorbitante, é o que actualmente reúne mais consenso, estando de resto subjacente a sua adopção, no direito português, a seu tempo, na redacção do nº1 do artº9º do ETAF na versão aprovado pelo Dec-Lei 129/84, de 27/4, e depois, no nº1 do artº178º (e 180) do C.P.A., este entretanto revogado pelo artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 18/2008 de 29 de Janeiro, em vigor a partir de 2008-07-30 (que aprovou o Código dos Contratos Públicos, estabelecendo a disciplina aplicável à contratação pública e o regime substantivo dos contratos públicos que revistam a natureza de contrato administrativo).
     A adopção no nosso sistema jurídico resulta do artº165 (e 167) do CPAM.
     Na formulação deste critério, a nota qualificativa de contrato administrativo reside no facto de este, para ser como tal classificado, dever conter cláusulas que reservem “poderes, direitos, prerrogativas a uma das partes (a Administração) ou” imponham “à outra (particular) sujeições, encargos, sacrifícios que não são consentidos pelas normas de direito privado, (...) ” - Cfr. Mª Estorninho, op. cit. p.90 e p.100 quanto às cláusulas exorbitantes normalmente referidas como mais significativas / Barbosa de Alves Correia, in Contrato Administrativo, 1984, policopiado / Mário Esteves de Oliveira, in C.P. Administrativo anotado, p.339 in fine e 340 / Mário E. Oliveira, in Direito Administrativo, V.I, p.644 e 645 quanto à enunciação de algumas cláusulas exorbitantes.
     É este o conjunto de poderes que a dogmática a seu tempo identificou para que se conclua pela existência de um contrato administrativo que, efectivamente, a lei prevê no artº167 do CPAM: «Salvo quando outra coisa resultar da lei ou da natureza do contrato, a Administração Pública pode: a) Modificar unilateralmente o conteúdo das prestações, desde que seja respeitado o objecto do contrato e o seu equilíbrio financeiro; b) Dirigir o modo de execução das prestações; c) Rescindir unilateralmente os contratos por imperativo de interesse público devidamente fundamentado, sem prejuízo do pagamento de justa indemnização; d) Fiscalizar o modo de execução do contrato; e) Aplicar as sanções previstas para a inexecução do contrato.»
     Posto isto, reconduzindo-nos ao nosso caso e em relação ao pedido principal, respigando o conteúdo do compromisso escrito em que intervieram as partes e junto com a p.i. como doc. 9, tendo por assente o que se deixa dito, não se alcança que alguma das cláusulas não pudessem ser estabelecida entre particulares, não se vislumbra que encerrem poderes ou prerrogativas para a RAEM ou restrições, encargos ou sujeições para o particular que o direito privado não permita.
     Em suma, não se vislumbra qualquer cláusula exorbitante, qualquer cláusula derrogatória do direito comum.
     Certo que, à luz do entendimento doutrinário e jurisprudência actual, a inexistência de qualquer cláusula exorbitante, por si só, não inviabiliza a qualificação de determinado contrato como administrativo.
     Com efeito, pode não haver qualquer cláusula exorbitante e, não obstante, dever qualificar-se como administrativo o contrato por o mesmo se enquadrar num “ambiente regulamentar” exorbitante, ou o seu objecto a tal determinar. - Cfr. Mário Esteves de Oliveira, in Direito Administrativo, V. I p. 646 e C.P.A. anotado, p.341 / Ac. do STA de 27 de Abril de 1990, in BMJ 396.
     Ora, não existe qualquer dúvida que o contrato em causa visou a afectação do prédio à realização do interesse público. Todavia, daí a concluir que o mesmo se enquadra num “ambiente regulamentar” exorbitante, num ambiente de direito público, é conclusão que os dados patenteados não nos permitem alcançar.
     O que de substancial se constata é que as negociações estabelecidas, materializadas na contratação, foram avessas à criação de relações jurídicas administrativas.
     Estamos perante um contrato de direito civil tipificado: o comodato previsto no artº1057 do CC, eventualmente, visto o teor do artº3 do compromisso consubstanciado no doc.9 junto com a p.i., de um contrato de arrendamento uma vez que se insere nele um valor que se dispensa a A. de pagar à R (como era sua obrigação), e que pode consubstanciar renda (será neste caso um arrendamento à R. de um espaço entregue à A. por aquela e no quadro de uma outra relação jurídica, esta de natureza administrativa: concessão por arrendamento).
     Dir-se-á: mas existe um outro critério - de resto caro a alguma da nossa jurisprudência e doutrina - para avalizar da natureza administrativa dos contratos, critério esse que se reporta ao objecto do contrato.
     Com efeito.
     Tal critério permite “chegar” à administratividade dos contratos na exacta medida em que os mesmos sejam celebrados com vista à tutela de interesses públicos, associando de forma duradoura e contra remuneração um particular à prossecução daqueles interesses.
     Neste contexto, e no nosso caso, só estaríamos perante contratos administrativos de colaboração na medida em que a A. se tivesse associado ou comprometido no desempenho regular de atribuições administrativas.
     Não é o caso.
     Com efeito, não obstante ser a prossecução do interesse público que levou a RAEM à celebração do contrato (depósito de combustíveis com vista a salvaguarda da segurança pública – vide infra al. J a M dos factos assentes), o que é facto é que não se perscruta a associação ou compromisso que é “pedra de toque” do referido critério por parte do particular.
     Na verdade a associação ou compromisso tem subjacente como desiderato a ideia de participação, de “cumplicidade” na realização de algo, sendo essa participação um dos motivos ponderáveis ao impulso à contratação por parte do particular.
     Todavia, no nosso caso, essa intenção ou motivação directa por parte do particular, auscultada de acordo com a teoria da impressão do destinatário (artº228 ºnº1 do C.C.), é coisa que não se alcança na análise da adesão do particular à contratação. O que se alcança é que A RAEM pretendia a utilização do terreno para depósito de combustíveis e o particular aceitou a proposta.
     De resto, se o mecanismo da cláusula exorbitante por si só não logra em determinadas situações a qualificação de determinado contrato como administrativo, também o critério agora em análise é ainda menos idóneo a, isoladamente, consegui-lo.
     Ao considerá-lo isoladamente e ao levá-lo ao extremo, dificilmente um contrato com a AP, de duração mais ou menos duradouro, não teria natureza administrativa. Por exemplo, não haveria contrato de arrendamento em que o Estado assumisse a posição de arrendatário - para no locado instalar um qualquer serviço público - ex. tribunais, repartições das finanças, serviços da segurança social, etc.. - que não fosse administrativo, e isso independentemente do recurso ao mercado, seleccionando dentre os prédios disponíveis o que mais se adequasse às respectivas necessidades, em termos exactamente iguais à actuação de qualquer particular.
     Conclui-se, por conseguinte, que não se alcança qualquer associação ou compromisso deliberado por parte do particular (A.) no contrato em causa à prossecução do fim público. Ademais, mesmo que houvesse, esse facto por si só, cremos nós, não materializaria qualquer marca determinante – muito menos agravante por, como vimos, não existir qualquer cláusula exorbitante - de administratividade do contrato.
     Temos pois por certo a competência deste tribunal para conhecer o pedido principal
     E relativamente ao pedido subsidiário?
     O que se pretende com ele é que se reconheça que a RAEM está obrigada a conceder novo terreno em substituição do que lhe foi concessionado por arrendamento e objecto destes autos.
     Ora essa questão implicará, necessariamente, que se reconheça a obrigação da RAEM concessionar por arrendamento à A. outro terreno e uma vez que tal jamais pode consubstanciar a medida de uma indemnização.
     É clara a natureza administrativa da relação que se pretende ver constituída e em face de tudo quanto se disse.
     Face ao exposto, em relação ao pedido principal, por a demanda dos autos se caracterizar como acção sobre a responsabilidade contratual versando um contrato de direito privado, é este Tribunal Comum competente em razão da matéria.
     Relativamente ao pedido subsidiário, é este Tribunal materialmente incompetente.
     Porque é inviável a remessa do processo ao TA (artº33ºn1 do CPC) uma vez que este Tribunal continua competente para apreciar o pedido principal, absolve-se a Ré da instância em relação ao pedido subsidiário - art.30 da LAOJ, artº30, 31ºnº1, 32, 413 al.a)230 nº1 ala) do CPC.
     Custas pela A., relevando 2/10 como valor da acção.
     *
     O Tribunal é absolutamente competente em relação ao pedido principal.
     Não existem causas de incompetência relativa de que se deva conhecer oficiosamente.
     O processo não enferma de nulidade total.
     As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
     Não existem outras excepções, nulidades e questões processuais de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito.
     *
     A existência de factos controvertidos, cujo apuramento é necessário ao conhecimento do pedido, determina o prosseguimento dos autos para a produção de prova.
     FACTOS ASSENTES
     (…).”
     
    Quid Juris?

    O Recorrente/MP veio a defender que o litígio nasce de um contrato administrativo e como tal é competente o Tribunal Admnistrativo, enquanto o Exmo. Juiz do TJB entende que não se trata de um contrato administrativo, mas sim um contrato privado e como tal é competente o TJB!
    Ora, salvo melhor respeito, o contrato de concessão de terreno é um contrato marcadamente administrativo, sem prejuízo de que ele possa conter algumas cláusulas de carácter jus-privatístico.
    No caso dos autos, a causa de pedir consiste no incumprimento de um acordo celebrado pela Autora e Ré/RAEM, com base no qual aquela veio a pedir a restituição do terreno que foi facultado para o uso desta última.
    É do seguinte teor o acordo em causa:
    
承諾書
考慮到:
- 因土地周圍存有多個燃料儲存庫,一幅位於XX馬路,鄰近XX廠,面積2,967平方米,透過一九九零年五月十一日公證契約批予A有限公司的土地並未具備條件按相關建築計劃興建一幢住宅樓宇;
- B有限公司的燃料儲存庫因鄰近興建中的C社屋,其風險會對將入住社屋的居民造成心理不安;
- 位於XX馬路,批予A有限公司的土地具備條件用作燃料儲存庫;
- 澳門特區政府有意暫時將B有限公司燃料儲存庫遷往批予A有限公司的土地;
- 在知悉特區政府的意向後,A有限公司表示接受特區政府臨時使用其上述批地,用作搬遷B有限公司燃料儲存庫及該區的其他儲存庫,

因此,
澳門特別行政區政府,由土地工務運輸局局長代表,

A有限公司,由D先生代表,
雙方同意:

Termo de Compromisso
Considerando que:
- O terreno com 2.967 m2, situado em Macau, na Estrada XX, anexo à Fáblica de XX, concedido a favor da A, Lda. pela escritura pública outorgada em 11 de Maio de 1990, não reúne as condições para ser aproveitado com a construção de um edifício habitacional, de acordo com o respectivo projecto de construção, porque se encontram vários depósitos de combustíveis na zona circundante do referido terreno;
- O depósito de combustíveis da Agência Comercial B, Lda., sito junto ao novo edifício do Bairro Social da C em construção, é associado ao risco, o que poderá dar origem ao factor perturbador psicológico aos futuros moradores do edifício social;
- O terreno concedido à A, Lda., situado na Estrada XX, reúne as condições para depósito de combustíveis;
- O Governo da RAEM pretende transferir temporariamente o depósito de combustíveis da Agência Comercial B, Lda. para o terreno concedido à A, Lda.;
- A A, Lda., após ter conhecimento da intenção do Governo da RAEM, manifestou a sua aceitação de utilização temporária do aludido terreno concedido para viabilizar a transferência do depósito de combustíveis da Agência Comercial B, Lda., e de outros depósitos instalados na zona envolvente.
Ficou então acordado entre:
o Governo da Região Administrativa Especial de Macau, representado pelo Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes,

1. A有限公司接受澳門特別行政區政府臨時使用位於澳門XX馬路,面積2,967平方米,透過一九九零年五月十一日公證契約規範的土地,用作臨時設置B有限公司燃料儲存庫,以及倘若尚有利用空間及燃料的類型容許在該地儲存,會臨時設置其他的青洲燃料儲存庫。
2. 上述批地的臨時使用期限由簽署本承諾書日起計為期三年,在期限屆滿前經A有限公司同意可續期,此外,澳門特區政府承諾在期限屆滿後,將土地按原貌歸還予A有限公司。
3. 在澳門特區政府臨時使用土地的期間,按一九九零年五月十一日公證契約第四條款規定,金額為澳門幣14,835.00的每年租金,在A有限公司遞交已繳付的證明文件後,將於修改土地批給合同溢價金中扣減。
4. 澳門特區政府承諾,在將來審批土地利用期的延期申請時,將考慮澳門特區政府臨時使用土地的時間。
5. A有限公司承諾在二零一零年二月二十八日前騰空上述土地,並移走其上可能存在的所有建築物、物料及基礎設施。
澳門特別行政區,於二零一零年三月十八日。

代澳門特別行政區政府
澳門土地工務運輸局局長
E
代表A有限公司
經理的受權人
D
    É um acordo das vontades das partes, em pé de igualmente, não exercendo nenhuma delas o poder de autoridade, e como tal ele deve ser regido por disposições do Código Civil.
    
    Por outro lado, as partes não acordaram expressamente um foro competente para dirimir todos os litígios emergentes desse mesmo acordo, havendo lugar, assim, à aplicação da norma que estabelece a competência residual dos Tribunais Comuns, ou seja, do artº28 da Lei 9/1999 (LBOJ), dispõe-se nela que “competem aos juízos cíveis as causas de natureza cível que não sejam da competência de outros juízos, bem como as causa de outra natureza que não caibam na competência de outros juízos ou tribunais, incluindo todos os seus incidente e questões”.
    
    Pelo que, salvo o merecido respeito, é da nossa posição que o Tribunal recorrido fez uma correcta interpretação dos dados, razão pela qual a decisão recorrida deve ser mantida.
*
    Quanto à excepção peremptória da caducidade da concessão do terreno, não é pacífico o entendimento sobre a natureza desta caducidade, sendo certo que o venerando TUI defende que o Tribunal não pode declarar ex officio a caducidade da concessão de terreno, tal competência é do Chefe do Executivo – vidé o acórdão proferido no processo nº 81/2016 do TUI, de 20/02/2017.
    Seguido este raciocínio, improcede o argumento invocado pelo MP.

*
    Síntese conclusiva:
    I – Quando a Autora formulou um pedido principal, consistente em restituição do terreno pela Ré para a Autora, com base no conteúdo dum compromisso escrito em que intervieram as partes (junto com a p.i. como doc. 9), não se alcança que alguma das cláusulas não pudessem ser estabelecida entre particulares, não se vislumbra que encerrem poderes ou prerrogativas para a RAEM ou restrições, encargos ou sujeições para o particular que o direito privado não permita, realidade esta que demonstra claramente que as negociações estabelecidas, materializadas na contratação, foram avessas à criação de relações jurídicas administrativas, portanto, é de considerar que estamos perante um contrato de direito civil tipificado: o comodato previsto no artigo 1057º do CCM, eventualmente, visto o teor do artº3 do compromisso consubstanciado no documento junto com a p.i., de um contrato de arrendamento, uma vez que se insere nele um valor que se dispensa a Autora de pagar à R (como era sua obrigação), e que pode consubstanciar renda (será neste caso um arrendamento à R. de um espaço entregue à A. por aquela e no quadro de uma outra relação jurídica, esta de natureza administrativa: concessão por arrendamento).
    II - Em relação ao pedido principal, por a demanda dos autos se caracterizar como acção sobre a responsabilidade contratual versando um contrato de direito privado, é competente o TJB em razão da matéria para dirimir o litígio nascido neste âmbito.
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    Tudo visto e analisado, resta decidir.
* * *

V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida, declarando-se competente o TJB para conhecer do pedido da restituição do terreno identificado nos autos.
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    Sem custas por isenção subjectiva.
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    Registe e Notifique.
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RAEM, 16 de Setembro de 2021.

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Fong Man Chong
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Ho Wai Neng
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Tong Hio Fong





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