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Processo n.º 904/2021 Data do acórdão: 2022-9-15 (Autos de recurso penal)
Assuntos:
– art.o 22.o, n.o 3, do Código Penal
– punibilidade da tentativa
– manifesta inaptidão do meio empregado
S U M Á R I O
A tentativa não é punível quando for manifesta a inaptidão do meio empregado pelo agente para a consumação do crime – cfr. o art.o 22.o, n.o 3, do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 904/2021
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por acórdão proferido a fls. 178 a 182v do Processo Comum Colectivo n.° CR5-21-0056-PCC do 5.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, ficou condenado o arguido A, aí já melhor identificado, pela autoria material, na forma tentada, de um crime de burla em valor elevado do art.o 211.o, n.o 3, do Código Penal (CP), na pena de um ano de prisão efectiva.
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir, na motivação apresentada a fls. 187 a 193v dos presentes autos correspondentes, a sua absolvição penal (quer, a montante, devido à defendida aplicabilidade, ao caso dele, do disposto no art.o 22.o, n.o 3, do CP, quer, a jusante, por alegado erro notório na apreciação da prova cometido pelo Tribunal recorrido como vício referido no art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do Código de Processo Penal), e, fosse como fosse, a modificação da pena de prisão efectiva fixada, de modo excessivo, no aresto recorrido, pretendendo também a suspensão da execução da prisão.
Ao recurso respondeu a Digna Delegada do Procurador a fls. 196 a 200v dos autos, no sentido de improcedência do recurso.
Defendeu também a assistente chamada B Casino, S.A. o não provimento do recurso, na sua resposta apresentada a fls. 202 a 205.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer a fls. 216 a 218v, pugnando principalmente pelo reenvio do processo para novo julgamento, por constatação efectiva do vício de erro notório na apreciação da prova.
Em sede de conclusão do processo para efeitos de exame preliminar, o relator mandou, por despacho exarado a fl. 219, notificar o arguido, na pessoa da sua Ex.ma Defensora autora da motivação do recurso, para, querendo, se pronunciar sobre a eventualidade de convolação do crime tentado de burla em valor elevado por que vinha condenado o próprio recorrente no acórdão recorrido para um crime tentado de passagem de moeda falsa, p. e p. pelos art.os 255.o, n.o 1, alínea a), e 21.o, n.os 1 e 2, alínea a), e 22.o, n.os 1 e 2, do CP.
Respondeu subsequentemente o arguido a fls. 221 a 222v que o caso dos autos não satisfaz os requisitos do tipo legal de passagem de moeda falsa, para além de voltar a defender, com veemência, a aplicabilidade do art.o 22.o, n.o 3, do CP.
Concluído o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que o acórdão ora recorrido consta de fls. 178 a 182v, cuja fundamentação fáctica e probatória se dá por aqui integralmente reproduzida.
Segundo essa factualidade provada:
Em 25 de Outubro de 2020, o arguido entregou um maço de notas de dólares de Hong Kong de valor facial de mil dólares à empregada, na altura em turno, da Janela n.o 5 da Tesouraria do Casino B de Macau, para pedir a sua troca por fichas de jogo.
A mesma empregada, depois de receber tal maço de notas, tirou o embrulho (feito por lâmina plástica transparente) do mesmo e descobriu que se tratava de um maço de notas de dólares de Hong Kong de valor facial de mil dólares, com as seguintes palavras em chinês imprimidas, em grande tamanho, em cada uma das notas: “练功券 票样” (significando essas palavras em português: espécime para ensaio) (cfr. também as fotografias constantes dos autos, tiradas sobre as notas apreendidas).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
A começar pela questão principal de alegada aplicabilidade do art.o 22.o, n.o 3, do CP:
Está em causa no presente caso a conduta do arguido de entregar a uma empregada da Tesouraria do Casino B um maço embrulhado de notas de dólares de Hong Kong com características já descritas na parte II do presente acórdão de recurso, para pedir a sua troca por fichas de jogo, tendo a mesma empregada a oportunidade de verificar primeiro tal maço de notas (factualidade essa, frisa-se aqui oficiosamente, por conhecimento obtido no exercício das funções jurisdicionais, que é diferente de muitos outros casos anteriormente julgados neste TSI respeitantes à troca de notas com mesmo tipo de notas falsas de dólares de Hong Kong em que às respectivas pessoas ofendidas, antes da transacção da troca, nunca foi possível verificar ou examinar as notas de dólares de Hong Kong objecto de troca).
Ante essa concreta factualidade provada, para qualquer pessoa adulta com capacidade de ler aquelas palavras imprimidas em grande tamanho em chinês em cada uma das notas em causa, é patente que todas essas mesmas não podem ser verdadeiras notas de dólares de Hong Kong, daí que a tentativa do arguido da burla de acordo com a lógica da acusação (ou, aqui oficiosamente falando, a tentativa dele de eventual acto de passagem de moeda falsa) nunca é punível (por ser manifesta a inaptidão do meio empregado pelo arguido para a consumação do crime – cfr. o art.o 22.o, n.o 3, do CP).
Há, pois, que passar a absolver o arguido, sem mais indagação por desnecessária ou prejudicada.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar provido o recurso, revogando a decisão condenatória penal recorrida, e passando a absolver o arguido A do crime tentado de burla em valor elevado, por força do art.o 22.o, n.o 3, do Código Penal.
Pagará a assistente duas UC de taxa de justiça por ter defendido a improcedência do recurso.
Fixam em mil e oitocentas patacas os honorários da Ex.ma Defensora do arguido que minutou o recurso e em duzentas patacas os honorários do seu actual Ex.mo Defensor, tudo por conta do Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância, passando a quantia de honorários oficiosos fixada no aresto recorrido a ser por conta do mesmo Gabinete.
Macau, 15 de Setembro de 2022.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chao Im Peng
(Segunda Juíza-Adjunta)
  本人認為上訴人的上訴理由不成立。上訴人在明知的情況下將練功券充當真貨幣兌換籌碼,雖然有關“貨幣”上有清晰的“練功券”字樣,但是,一般情況下仍然足以令到他人受騙上當,因此,上訴人的行為符合詐騙罪未遂罪



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