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Processo nº 37/2020 Data: 27.07.2022
(Autos de recurso civil e laboral)

Assuntos : “Terraço (de cobertura)”.
Direito ao uso exclusivo de parte comum.
Regulamento de Condomínio.



SUMÁRIO

1. Os “recursos têm em vista impugnar as decisões judiciais”, e não apenas os seus “fundamentos”, não tendo, por isso, qualquer “legitimidade recursiva” a parte a quem a decisão foi favorável por muito que discorde ou não lhe agrade a lógica invocada e/ou fundamentação seguida e exposta pelo Tribunal recorrido.

2. O “direito de uso exclusivo de parte comum” – terraço de cobertura – de um prédio constituiu um “direito especial”, pelo que não se pode impor a um condómino uma deliberação que o prive se aquele tiver sido adquirido por força do título donde promanou o direito de propriedade sobre a sua parte privativa.

O relator,

José Maria Dias Azedo


Processo nº 37/2020
(Autos de recurso civil e laboral)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, A., propôs, no Tribunal Judicial de Base, acção declarativa de condenação contra, B ou B1 (乙), e mulher C ou C1 (丙), D (丁), E (戊) e F (己), RR., (todos com os restantes sinais dos autos), pedindo, a final, que fossem condenados a:
a) reconhecer o direito do A. e restantes condóminos, na qualidade de comproprietários das partes comuns do [Edifício(1)], ao uso do terraço de cobertura, para fins de utilidade comum, nomeadamente para colocação das unidades externas de ar condicionado, nos termos definidos pelo Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)];
b) permitir a todos os condóminos o livre acesso à parte comum do edifício, constituída pelo terraço de cobertura, e a retirar qualquer elemento de obstrução ao livre acesso ao terraço de cobertura para fins de uso comum e para segurança e prevenção de incêndios; e que fosse,
c) fixada a sanção pecuniária compulsória de MOP$2.000,00 (duas mil patacas) por cada dia que os RR. não acatem a decisão do tribunal e não permitam o acesso ao terraço de cobertura ao A. e demais condóminos; (cfr., fls. 2 a 21 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Oportunamente, proferiu-se “despacho-saneador-sentença” onde foi o peticionado julgado totalmente improcedente, com a consequente absolvição dos RR.; (cfr., fls. 166 a 177).

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Do assim decidido recorreu o A. (impugnando apenas a “decisão de direito”; cfr., fls. 191 a 220), e, por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 26.09.2019, (Proc. n.° 633/2019), foi o recurso julgado parcialmente procedente, decidindo-se – confirmar a decisão recorrida em relação à improcedência do “pedido formulado na alínea a” da petição inicial do A., e – revogar a mesma decisão recorrida relativamente ao “pedido deduzido na alínea b” para ser substituída por outra que determine o prosseguimento dos autos, julgando-se prejudicado o conhecimento do (3°) “pedido deduzido na alínea c” da petição inicial; (cfr., fls. 288 a 302-v).

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Inconformados, vem os RR. recorrer para esta Instância.

Os (1os) RR. B e C, apresentaram as seguintes conclusões:

“A. O direito de uso exclusivo, de parte comum do edifício, porquanto, prevista e regulada no Direito das Coisas do Código Civil de Macau, é um direito objectivo que recai directamente sobre coisas ou realidades a elas juridicamente assimiladas, conferindo ao titular poderes sobre elas, bem como o direito de exigir de todos os outros uma atitude de respeito pela utilização que delas faça, de acordo com os poderes que o direito lhe confere;
B. Trata-se, portanto, de um direito absoluto, isto é, oponível pelo seu titular a todas as pessoas, ou seja, erga omnes.
C. Obviamente, o direito de uso e fruição de coisa alheia, é um direito real na verdadeira assepção da palavra, assim entendido, quer na Lei, quer unânimente na doutrina e na jurisprudência, uma vez que o seu titular tem o ius utendi et fruendi da coisa, ainda que alheia.
D. O Artigo 16.° da Lei n°. 14/2017, publicada a 21 de Agosto de 2017, vigente: desde 21 de Agosto de 2018, regula as "Obras em partes comuns necessárias à fruição de fracção autónoma".
E. E, como tal, determina o seu artigo 1° que "O condómino pode levar a efeito obras em partes comuns do condomínio para execução de benfeitorias necessárias ou úteis ao funcionamento e utilização, na sua fracção autónoma, de equipamentos e instalações de água, electricidade, ar condicionado, aquecimento, gás, comunicações e semelhantes, sem necessidade de autorização da assembleia geral do condomínio, desde que não prejudiquem a utilização das coisas próprias ou das coisas comuns, nem interfiram com interesses relevantes dos restantes condóminos".
F. Obviamente, o próprio legislador da RAEM quis salvaguardar, na parte final desta disposição normativa, os direitos legítimos de terceiros, ao expressamente prever "desde que não prejudiquem a utilização das coisas próprias ou das coisas comuns".
G. O direito de uso e fruição de uma parte comum, constante dos documentos constitutivos da propriedade horizontal, e devidamente registado como tal, é um Direito Real oponível erga omnes, exercido em exclusivo pelo seu titular.
H. Já o direito de condómino, relativamente às partes comuns do prédio, é um direito exercido em co-titularidade com os demais condóminos do prédio, onde cada um tem uma quota ideal correspondente à sua permilagem no edifício, representados por uma Assembleia Geral que delibera a vontade da maioria, ou até da unanimidade, dos presentes na reunião (Vide artigos 1317° e 1318° do CC).
I. O Direito dos Condóminos nas partes comuns do prédio, cessa quando se depara com o "uso exclusivo" de um determinado condómino porque o Direito deste é um Direito distinto e superior ao seu.
J. Todos os actos do condomínio que o A. refere nos Autos, são isso mesmo e tão só.
K. Na verdade, nenhum acto do condomínio pode colidir com o direito real, ainda que de uso exclusivo de coisa comum, pelo que nunca os mesmos podiam suportar ou servir de base para qualquer decisão de Direito privado.
L. Se, porventura, o que nem sequer se admite, tal acontecesse, seriam actos contrários ao sistema jurídico vigente, e por isso nulos e de nenhum efeito.
M. Considera-se parte comum (propriedade comum de todos os condóminos) tudo o que não seja fracção autónoma e/ ou tudo o que não seja parte integrante ou uso exclusivo de fracção autónoma.
N. E não se confunde com compropriedade.
O. Se a afectação da parte comum ao uso exclusivo de um determinado condómino não constar do título constitutivo da propriedade horizontal, só por acordo de todos os condóminos, constante de acta assinada por todos, é que pode este vir a ser modificado, o que não é o caso”; (cfr., fls. 319 a 355).

A (2ª) R. D, por si, e na qualidade de legal representante dos (3° e 4°) RR., E e F, apresentou, por sua vez, as seguintes conclusões:

“A) O Tribunal a quo, para sustentar a sua decisão de provimento parcial do recurso do Autor, diz:
"(…) que o direito de uso exclusivo não é absoluto e só pode ser exercitado sempre que não ofenda o direito de compropriedade sobre ele por parte dos outros condóminos em situações concretas que importem a sua utilização para utilidades comuns, nomeadamente a instalação de ar condicionado,
Que o direito de uso é menor do que o direito de compropriedade sobre a coisa. Enquanto além, o respectivo titular exerce um direito individual, aqui estamos perante um direito colectivo, digamos assim. Logo, o individual tem de ceder perante o colectivo, perante a consideração e utilidade social que é possível extrair da coisa; o egoísmo dos interesses de um não pode cavalgar sobre a solidariedade e contra o lado social da força do conjunto" (cfr. fls. 21).
B) No caso concreto, sem necessidade de esgrimir se é menor o direito de uso exclusivo e maior o direito de compropriedade, entendem os Recorrentes que nem a administração de um condomínio nem qualquer condómino pode decidir retirar o uso exclusivo do terraço de cobertura aos condóminos do 3° andar, sem o fazerem em conformidade com o disposto no artigo 1321° do CC e na alínea c) do n° 1 do artigo 1350°, e
C) Por muito válido que seja o argumento do Tribunal a quo de que o egoísmo dos interesses de um não pode cavalgar sobre a solidariedade e contra o lado social da força do conjunto, o certo é que tal argumento não é fundamento legal para retirar o uso exclusivo do terraço de cobertura e operar a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal
D) No caso concreto, tal argumento seria aplicável, com toda a propriedade, ao aqui Recorrido, pois tem sido o Recorrido que tem cavalgado sobre o direito de compropriedade (partes comuns) de todos os restantes condóminos, pois tem sido o Recorrido quem, ao longo de 10 anos, vem impondo a todos os restantes condóminos do [Edifício(1)] o seu egoísmo e interesses, sendo disso exemplos as situações descritas nos pontos 22-27 das presentes alegações e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.
E) Aqueles exemplos ilustram suficientemente que é o Recorrido, quem de modo egoísta e interesseiro, tem imposto a sua vontade contra a vontade dos restantes condóminos usando, para tanto, os 28% que detém na totalidade do prédio, inclusive para se auto-eleger como Administrador Singular do [Edifício(1)] durante vários anos.
F) A história e documentação de 10 anos de relações crispadas entre o aqui Recorrido e os restantes condóminos do [Edifício(1)] só pôde ser conhecida e compreendida, em toda a sua extensão, muito recentemente, através dos documentos que o Recorrido juntou na acção que propôs contra os Recorrente, logo após ter sido proferido o Despacho Saneador/Sentença nos presentes Autos (PC1-18-672-COP), processo a que o Tribunal pode aceder, nos termos da lei processual, se tiver dúvidas quanto ao aqui alegado pelos Recorrentes.
G) Com o devido respeito, não se vê como a interpretação que o direito de uso exclusivo não é absoluto e só pode ser exercitado sempre que não ofenda o direito de compropriedade, possa ter aplicação no caso concreto dos Autos.
H) Disse o Tribunal a quo: "(…) Repare-se que o Autor, por exemplo, não pode, segundo diz, instalar na frontaria do prédio unidades exteriores de ar condicionado por via de norma urbanística plasmada na Planta de Alinhamento Oficial, (PAO), sendo certo também que de acordo com a deliberação 3 da Assembleia de Condomínio de 12/12/2009 foi decidido que, depois das obras de reparação e pintura levadas a efeito nessa época nas paredes exteriores do edifício, não mais se fariam furos nelas e não mais nelas se colocariam unidades exteriores de ar condicionado (doc. 5, junto com a providência cautelar: Proc. n° 887/2018" (cfr. fls. 21/22 - negrito e sublinhado nosso).
I) Sobre a norma urbanística plasmada na Planta de Alinhamento Oficial, (PAO), os aqui Recorrentes nos pontos 65-71 das suas contra-alegações para o TSI, que aqui dão por reproduzidos para todos os efeitos legais, rebateram, que a PAO impedisse a recolocação dos aparelhos de ar condicionado na fachada do [Edifício(1)],
J) Isto porque, dos "Condicionamentos Urbanísticos" da referida PAO não consta qualquer proibição de recolocação dos aparelhos de ar condicionado na fachada do [Edifício(1)], como ressalta do teor da seguinte transcrição:
"O EDIFÍCIO DEVERÁ PREVER SOLUÇÕES PARA INSTALAÇÃO DE APARELHOS DE AR CONDICIONADO, E DE FORMA A EVITAR A PROJECÇÃO DIRECTA NA VIA PÚBLICA, DA ÁGUA RESULTANTE DO SEU FUNCIONAMENTO (ALÉM DISSO, OS APARELHOS SUPRAMENCIONADOS DEVERÃO SER COBERTUS, CASO ESTES SE CONFRONTEM COM A VIA)" (cfr. Doc. 3, fls. 114 do CV2-18-0027-CAO-A), e
K) Quanto ao doc. 5 a que alude o Tribunal a quo, junto com a providência cautelar: Proc. n° 887/2018, trata-se da Acta da assembleia de condóminos de 12.12.2009, a fls. 119 a 121 do Processo n.º CV2-18-0027-CAO-A, e os Recorrentes pronunciaram-se sobre ele nos pontos 61-62 das suas contra-alegações que dão aqui por reproduzidos para todos os efeitos legais.
L) Como resulta do teor deste doc. 5, só esteve presente o Recorrido: "Quota de presença: os condóminos das 3 fracções autónomas, a quota total é 28%." E, quanto ao ponto 3 da ordem de trabalhos do doc.5, consta a seguinte decisão: "Todos os ar-condicionais na fachada exterior vão ser provisoriamente removidos no período da obra, os proprietários têm necessidade de decidir se os descartarem ou reinstalarem os removidos ar-condicionais separados.", sendo que a votação referida no doc.5 para este ponto da ordem de trabalhos, é a seguinte: "Consenso (28% de quota); Oposição (0% de quota); Abstenção (0% de quota)". Ou seja, este doc.5. comprova que a decisão da assembleia de 12.12.2009, de retirar os aparelhos de ar condicionado da fachada do [Edifício(1)], foi uma decisão tomada apenas pelo Recorrido.
M) O Tribunal a quo continuando a interpretar a possibilidade de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado no terraço de cobertura, diz: "que essa possibilidade expressamente prevista no Regulamento do [Edifício(1)] é fora de dúvida (os proprietários da fracção A3, do 3º andar, B tentaram a anulação da deliberação da Administração de Condomínio que aprovou o referido Regulamento, mas sem sucesso, conforme se pode verificar pela decisão proferida neste TSI, no acórdão de 5/06/2014, lavrado no Proc. 147/2014). Portanto, se o Regulamento prevê a instalação dos aparelhos de ar condicionado no terraço de cobertura, não se vê como possa ele facilmente ser contrariado (cfr. fls. 22/23)
N) Sobre o Regulamento do Condomínio, pronunciaram-se os Recorrentes nos pontos 74-106 das suas contra-alegações de recurso para o TSI, que aqui dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
O) Aqui sublinham e chamam a atenção do Tribunal ad quem, para o facto de os Tribunais nunca se terem pronunciado sobre a validade ou invalidade do teor do Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)], mas tão-somente sobre o validade das deliberações em abstracto e sobre se era suficiente o quórum necessário para serem tomadas essas deliberações. Em concreto:
P) O Tribunal Judicial de Base (TJB) no processo CV2-10-0074-CAO, apenas decidiu e declarou que o modo de funcionamento da assembleia estava ferido de invalidade por assentar numa atitude do presidente da comissão administrativa marcada pelo abuso do direito;
Q) O Tribunal de Segunda Instância (TSI) no processo 147/2014, declarou que a Assembleia de Condóminos tinha quorum deliberativo para funcionar, em segunda convocatória, nos termos do previsto no nº 3 do artigo 1347º do CC, e que por essa razão o TJB não podia ter anulado as deliberações da assembleia-geral com fundamento no abuso do direito. Em consequência declarou: "Revogar a sentença na parte em que, por abuso de direito, anulou as deliberações da assembleia-geral do condomínio tomadas no dia 22/08/2010"
R) Ora, nos presentes Autos, os Recorrentes sempre defenderam que o Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)] deveria ser considerado inválido, por inexistência, já que o processo deliberativo da assembleia de 22.08.2010, não está conforme o nº 3 do artigo 1347º do CC, uma vez que o Regulamento foi aprovado por mais de ⅟4 do valor total do condomínio (28% do Autor), mas este valor de ⅟4 não representava a maioria dos votos dos condóminos presentes, como se exige naquele preceito.
S) Na verdade, no nº 3 do artigo 1347º do CC, em segunda reunião, é exigido um duplo quórum: ⅟4 da totalidade do prédio e que esse ⅟4 pertença à maioria do(s) condómino(s) presente(s), e
T) naturalmente que a lei se refere a condóminos presentes, no plural, porque uma assembleia é, por definição e por natureza, uma reunião de pessoas, composta, no mínimo, por 2 pessoas, e também resulta da letra da lei que o legislador, não consagrou assembleias unipessoais de condóminos.
U) Não se nega, que o que a lei pretende com o disposto no art. 1347°, nº 3 do CC é o bom funcionamento do condomínio, é impedir a paralisação da actividade da respectiva administração, não permitindo que a falta de quórum na segunda reunião seja capaz de evitar a deliberação sobre matérias necessárias à boa administração do condomínio
V) Mas, também é inegável que o legislador ao consagrar o duplo quórum deliberativo no nº 3 do artigo 1347º do CC, pretendeu evitar, precisamente, aquilo que o aqui Recorrido fez no condomínio do [Edifício(1)]: convocou assembleias onde apenas ele esteve presente e, em segunda reunião, tomou as decisões que bem entendeu inclusive auto-elegeu-se como administrador único do prédio e foi como administrador único que durante anos decidiu tudo a seu bel-prazer com o fundamento que detém mais de 1/4 do valor total do prédio.
W) Ora, considerando que não existem, por definição e natureza assembleias com uma só pessoa; considerando que a lei exige um duplo quórum deliberativo no n° 3 do artigo 347º do CC, a Assembleia de Condóminos de 22.08.2010 deve ser considerada inválida, por inexistência, e, consequentemente, inválido o Regulamento de Condomínio, por inexistência.
X) A invalidade, por inexistência, é uma invalidade grave e profunda, que pode ser conhecida a todo o tempo e oficiosamente. Por isso, deve o Mais Alto Tribunal da RAEM dela conhecer, declarar inexistente a assembleia de condóminos de 22.08.2010 e, consequentemente, como inexistentes todas as deliberações nela tomadas, o que inclui o Regulamento de Condomínio do [Edifício(1)].
Y) Caso assim o não entenda o Mais Alto Tribunal, o certo é que o artigo 5º do Regulamento de Condomínio deve ser declarado nulo porque operou uma objectiva e real modificação do título constitutivo da propriedade horizontal do [Edifício(1)], pois retira o direito de uso exclusivo do terraço de cobertura aos condóminos do 3º andar sem o seu consentimento; atribui o direito ao uso exclusivo do pátio por destinação objectiva; destina o uso do terraço de cobertura à colocação das unidades externas dos· aparelhos de ar condicionado; determina modificações da arquitectura do edifício, tudo isso numa clara e ostensiva violação de diversas disposições legais, tais como o artigo 1321º, 1325º, 1334º e alínea c) do nº 1 do artigo 1350º do Código Civil (CC), conforme melhor se especifica nos pontos 54-60 das presentes alegações, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais.
Z) O Tribunal a quo, seguindo o seu entendimento de ser menor o direito de uso e maior o direito de compropriedade, e prevenindo a não colocação dos aparelhos de ar condicionado no terraço de cobertura ao abrigo do Regulamento do Condomínio, veio adiantar que "(…) mesmo que todos os restantes condóminos estejam unidos, nem por isso lhes é possível aceder com inteira liberdade ao terraço, mesmo para a execução de obras de que considerem ser de interesse geral.
Haverá sempre que ser bem preciso e distinguir três situações (…) que identifica.
AA) Mas, com o devido e muito respeito pelo Tribunal a quo, entendem os Recorrentes que, o caso concreto, não configura qualquer uma das três situações hipotéticas adiantadas.
Explicitando:
BB) Quanto à primeira situação já se demonstrou que o Regulamento de Condomínio não é válido, pelo que sempre a instalação dos aparelhos externos de ar condicionado com fundamento neste Regulamento seria inválida; quanto à segunda situação, a instalação dos aparelhos externos de ar condicionado no terraço de cobertura não cabe na noção de uma obra de reparação indispensável e urgente; quanto à terceira situação, a instalação dos aparelhos de ar condicionado no terraço de cobertura não cabe na noção de benfeitorias necessárias ou úteis ao funcionamento e utilização (…), de equipamentos de ar condicionado na fracção autónoma do Recorrido, porque o Recorrido pode instalar os ditos aparelhos noutro local, nomeadamente na fachada do Edifício.
CC) Além disso, no caso concreto, não pode o Recorrido decidir colocar os ditos equipamentos de ar condicionado no terraço de cobertura, sem necessidade de autorização da assembleia geral do condomínio, uma vez que, no caso concreto, a colocação dos aparelhos de ar condicionado no terraço de cobertura implica, imediata e simultaneamente, uma modificação da destinação de um espaço comum e a retirada de um direito especial concedido pelo título constitutivo da propriedade horizontal aos condóminos do 3° andar, e quer a modificação da destinação dos espaços comuns quer a retirada de direitos especiais de condóminos não podem ser feitos ao abrigo do n° 1 do artigo 16º da Lei 14/2017.
DD) Além disso, repete-se, os aparelhos exteriores de ar condicionado estiveram colocados anos a fio na fachada do [Edifício(1)]; foi o Recorrido quem decidiu, sozinho, retirá-los da fachada do edifício; foi o Recorrido quem decidiu, sozinho, que os ditos aparelhos tinham de ser colocados no terraço de cobertura e não existe qualquer proibição de recolocar os aparelhos de ar condicionado na fachada do Edifício, como se demonstrou e está documentadamente provado nos Autos.
EE) Sustenta o douto Acórdão sob recurso que "(…), se é a própria lei que permite que, em certos casos (pelo menos, para realização de benfeitorias necessárias e úteis), é possível utilizar o terraço para obras de interesse comum, isso significa que a condómino do 3° andar não pode manter o portão de acesso ao terraço fechado (…)". (cfr. fls. 26)
FF) Sobre esta questão do portão com fechadura para impedir o acesso ao terraço de cobertura que põe em risco o próprio prédio, em caso de incêndio e sobre os documentos 2A e 3A de fls. 26 a 29 dos Autos, a que faz referência o douto Acórdão Recorrido, os Recorrentes pronunciaram-se nos pontos 40-50 das suas contra-alegações de recurso para o TSI que aqui dão por reproduzidos para todos os efeitos legais
GG) Deve o Tribunal ad quem atentar que o documento 3A, relacionado com a fracção 3º-B dos aqui Recorrentes tem a data de 2010. Os Recorrentes deram imediato cumprimento ao determinado pela DSSOPT, nesse ano de 2010
HH) O único portão ora existente é a porta de origem do edifício que dá acesso ao terraço e a chave dessa porta está acessível a qualquer condómino, em caso de necessidade. A chave foi colocada dentro de uma caixa, junto da parede da referida porta de acesso, e o vidro da caixa pode ser quebrado em caso de necessidade.
II) O douto Acórdão sustentou, por fim, que: "Para já, o que importa assinalar é que o despacho saneador/sentença não pode manter-se na sua totalidade, porque considerou a impossibilidade geral de o autor poder aceder ao terraço para colocação de aparelhos de ar condicionado, o que atenta contra o Regulamento do Condomínio e contra o artigo 16° da Lei nº 14/2017"
Efectivamente, não se sufraga a posição do despacho sindicado porque interpreta, a nosso ver indevidamente, o artigo 16º citado (…)" (cfr. fls. 26/27 - sublinhado nosso)
JJ) Os Recorrentes consideram que o Tribunal a quo, fez uma inadequada interpretação da factualidade e uma errada interpretação da lei substantiva aplicável ao caso concreto.
KK) Ao invés, os Recorrentes consideram que o TJB no seu despacho saneador/sentença fez uma apreciação correcta dos concretos factos alegados e fez uma correcta e acertada interpretação e aplicação da lei substantiva aplicável ao caso concreto.
LL) Salvaguardado o devido respeito, os Recorrentes entendem que o Tribunal a quo, também fez uma inadequada leitura do pedido formulado na p.i., ao considerar a alínea b) daquele pedido, como um pedido autónomo, e ao declarar que os RR devem eliminar qualquer elemento de obstrução de acesso ao terraço, nomeadamente portão ou gradeamento metálico (o que, não obstante, não franqueia o acesso livre do A. e outros eventuais condóminos ao terraço, pois ele apenas pode estar garantido para os efeitos da segunda ou da terceira situações hipotéticas referidas, nos termos acima equacionados) (…) Cremos, então, que a procedência deste pedido não está automaticamente afastado (é necessário admitir todas as soluções plausíveis de direito). Mas, também pensamos que, para tanto, será necessário que os autos voltem à 1ª instância e aí se estabeleça a matéria assente e aquela que se mostre eventualmente controvertida, como é o caso da invocada nos arts. 13°, 21°, 23° da p.i. e 17° da réplica.
MM) Os Recorrentes, com todo o devido respeito, consideram que o pedido b) é um pedido sequencial e consequencial do pedido a). Que o pedido b) não é um pedido autónomo, pelo que não se encontra fundamento fáctico e legal para que os autos baixem e prossigam para Julgamento quanto a este pedido.
NN) Alias, a alegada matéria invocada como necessária a apurar em julgamento não é matéria de facto, como passa a explicitar-se:
i) A matéria do artigo 13º da p.i. está relacionada com a deliberação reiterada no âmbito do Regulamento do Condomínio (cf. Doc. 2), que determinou a colocação dos aparelhos de ar condicionado no terraço de cobertura. Pelo que, esta matéria, tendo em conta tudo quanto foi alegado e arguido sobre a validade/invalidade da deliberação que aprovou o Regulamento de Condomínio, coloca uma questão de direito, e não de matéria de facto a apurar em julgamento;
ii) O artigo 21º da p.i. e 17º da réplica estão relacionados com a destinação objectiva, e a invalidade do uso exclusivo atribuído aos condóminos do 3º andar alegada pelo Recorrido. Por isso, nesta matéria, também, se coloca uma questão de direito, questão a que o TJB, aliás, deu resposta no despacho saneador/sentença (cfr. fls 11/23-12/23). E, sobre esta matéria da destinação objectiva os Recorrentes nos pontos 29-36 das suas contra-alegações de Recurso para o TSI, que aqui dão por reproduzidas para todos os efeitos legais, defenderam e· demonstraram que não era aplicável, ao caso concreto, o previsto na alínea a) do nº 2 do artigo 1324º do CC de 1999. Por isso, o artigo 21º da p.i. e 17º da réplica colocam uma questão de direito e que nada tem a ver se, fisicamente, todos os condóminos podem ou não ter acesso ao terraço de cobertura;
iii) O artigo 23º da p.i., está relacionado com a colocação de portas de acesso ao terraço e no patamar entre o 2º e 3º andar que dificultam operações de salvamento em situação de perigo e de combate a incêndios. Esta é uma falsa questão de matéria de facto a apurar em julgamento, até porque as situações pretensamente documentadas através das fotos, já não existem há alguns anos. Depois, porque as ordens da DSSOPT (docs. 2-A e 3-A) foram cumpridas nas datas determinadas pela DSSOPT.
OO) Não existe nem foi peticionada qualquer matéria fáctica para ser levada a julgamento e susceptível de sustentar o pedido formulado em b) da p.i. que, repete-se não é autónomo, antes sequencial e consequencial do pedido a).
PP) O Acórdão Recorrido deve ser revogado, e confirmado o Despacho Saneador/Sentença que, ele sim, teve em conta os concretos factos e bem fundamentou de direito no que se refere ao caso concreto.
QQ) Porém, o Despacho Saneador/Sentença deve ser complementado pelo Tribunal ad quem que, oficiosamente, deve conhecer e declarar a invalidade do Regulamento do Condomínio, por inexistência da assembleia de condóminos que o aprovou uma vez que se não verificou o duplo quórum deliberativo previsto no nº 3 do artigo 1347º do CC, ou, caso assim o não entenda, declarar a invalidade, por nulidade, do artigo 5º do dito Regulamento de Condomínio com fundamento na alínea c) do nº 1 do artigo 1350º e nº 3 do artigo 1321º, ambos do CC”; (cfr., fls. 358 a 391).

Pelo A., (A), foi também interposto “recurso subordinado”; (cfr., fls. 399 a 437).

*

Cumpre apreciar.

Fundamentação

Dos factos

2. O Mmo Juiz do Tribunal Judicial de Base considerou assente – por acordo das partes – a factualidade seguinte:

“1. O Autor é proprietário de 3 fracções (AR/C, BR/C, A2) do prédio denominado [Edifício(1)], construído em encosta, em regime de propriedade horizontal, sito no [Endereço(1)], descrito sob o no XXXXX, inscrito na Matriz Predial da [Freguesia] sob o no XXXXX, estando as referidas fracções inscritas em nome do A. sob o no XXXXX, a fls. 2 do Livro GXXK, no XXXG e no XXXXXG respectivamente.
2. As fracções A/RC e B/RC, pertencentes ao Autor não têm afectação objectiva a qualquer pátio interior, os quais existem ao nível da cave, dois níveis abaixo do rés-do-chão, com entrada pelo no 9 do [Rua(1)], pátio designado por Saguão, no título constitutivo da propriedade horizontal, que serviu de base à inscrição da propriedade horizontal em 5 de Abril 1967, e estão afectos, por destinação objectiva, ao uso exclusivo das fracções AC/V, BC/V.
3. A constituição do regime de propriedade horizontal do [Edifício(1)], foi registada pela inscrição no XXXX, a fls. XXv do Livro F-X no Registo Predial em 5 de Abril de 1967.
4. Em 7 de Março de 2011, foi requerido pelos proprietários da fracção B3, a completação do registo da propriedade horizontal efectuado em 5 de Abril de 1967. Após o registo de completação do registo original, passou a constar que “A cobertura - terraço é de uso exclusivo das moradias do 3° andar”. O Autor requereu a rectificação judicial do acto de registo mas este improcedeu por douto Acórdão do TSI no 208/2016, de 23 de Março de 2017.
5. O Regulamento de Propriedade Horizontal do referido prédio foi aprovado em Assembleia de Condóminos realizada em 22 de Agosto de 2010 e registado em 17 de Maio de 2011, sob o averbamento no 2 à inscrição no XXXX de constituição de Propriedade Horizontal, na Conservatória do Registo Predial de Macau, deliberação confirmada por douto Acórdão do TSI no 147/2014, de 5 de Junho de 2014.
6. Estatui o art. 5º do referido Regulamento de Propriedade Horizontal, nomeadamente, o seguinte:
“1. Terraço
a) É vedado o uso exclusivo do terraço por parte de qualquer fracção autónoma
b) É vedada qualquer construção no terraço de cobertura para uso exclusivo de qualquer fracção autónoma
2. Pátio
a) É autorizado o uso exclusivo do pátio às fracções ACv e BCv.
b) É vedada qualquer construção no pátio.
…………………………………………………………….
4. Equipamentos de ar condicionado “
a) As unidades exteriores de ar condicionado serão instaladas na cobertura de acordo com a seguinte disposição:

7. Conforme a certidão do registo predial junta aos autos, a inscrição da propriedade horizontal do [Edifício(1)] foi efectuada em 5 de Abril de 1967 sob o no XXXX.
8. O direito ao uso exclusivo das moradias do 3o andar, estava previsto na memória descritiva do projecto de construção do prédio, datada de 8 de Junho de 1966 e foi inscrito por averbamento no X da inscrição no XXXX em 7 de Março de 2011.
9. O Regulamento de Propriedade Horizontal referido no ponto 5) foi aprovado pelo Autor sozinho, na Assembleia do Condomínio realizada em 22 de Agosto de 2010.
10. O artigo 5º do Regulamento do Condomínio aprovado na Assembleia de Condóminos de 22 de Agosto de 2010, não foi aprovado por unanimidade dos condóminos do [Edifício(1)].
11. E não obteve o voto favorável de 2/3 do valor total do condomínio referido no no 2º do artigo 1321º do CC.
12. O artigo 5º do Regulamento, foi aprovado apenas com os votos do Autor, que é proprietário das fracções “AR/c”, “BR/c” e “A2”, as quais correspondem a 28% do valor total do condomínio.
Por constarem dos autos os respectivos elementos, ou por ser do nosso conhecimento em razão das nossas intervenções processuais em processos anteriores, damos por assente a seguinte factualidade:
13. No TJB foi também instaurada uma providência cautelar (Proc. nº CV1-18-0004-CPV) em que pedia que lhe fosse reconhecido, na qualidade de proprietário de três fracções do prédio onde vive, o direito de aceder ao terraço deste a fim de ali permitir colocar unidades externas de ar condicionado.
14. A decisão da 1ª instância foi de indeferir a providência, que o TSI, em recurso jurisdicional para si interposto, manteve por acórdão de 10/01/2019 no Processo nº 887/2018”; (cfr., fls. 168-v a 170 e 293-v a 295).

Do direito

3. Três são os recursos trazidos a este Tribunal de Última Instância.

Dois, “principais”, e um “subordinado”.

O primeiro, pelos (1os) RR. B e C.

O segundo, pela (2ª) R. D, por si e em representação dos (3° e 4°) RR. E e F.

E, o terceiro, (“subordinado”), pelo A., A.

Afigurando-se-nos que os recursos merecem conhecimento, vejamos se merecem provimento, começando-se, como é lógico, pelos “recursos principais”.

3.1 Dos “recursos dos RR.”.

Apresenta-se, desde já, útil, uma “nota prévia”.

Verifica-se existir “desacerto” entre o que pelos RR. é alegado em sede de “alegações”, e o que pelos mesmos vem, (depois), a final, afirmado em sede das suas “conclusões”.

Considerando que são as “conclusões” que identificam as “questões” que os recorrentes querem ver tratadas pelo Tribunal para o qual o dirigem, (cfr., especialmente, o art. 598° e 652° do C.P.C.M.), nesta conformidade se passa a conhecer dos ditos recursos.

3.2 Comecemos pelo “recurso dos (1os) RR. B e C”.

Vejamos.

Como cremos que resulta do que até aqui se deixou relatado, o A. é proprietário de 3 fracções – AR/C, BR/C e A2 – do “[Edifício(1)]”, sendo os (1os e 2os) RR., proprietários de outras duas fracções do (3° andar) mesmo edifício, (A3 e B3, respectivamente).

Confrontando-se o A. com o facto de a “cobertura-terraço do edifício em questão ser de “uso exclusivo” das moradias dos RR. proprietários das fracções do 3° andar”, (cfr., “facto provado n.° 4”), mas, considerando assim não dever ser, propôs o mesmo a presente acção, onde formulou os (3) pedidos constantes das “alíneas a, b e c” que atrás se deixaram transcritos; (cfr., fls. 2 deste aresto, notando-se que requereu também uma “providência cautelar não especificada” pedindo que os requeridos fossem ordenados a reconhecer a necessidade comum de acesso ao terraço de cobertura e que foi indeferida nos termos do decidido nos autos em apenso).

Inconformado com a decisão da (total) improcedência do peticionado na referida acção – onde, (em síntese), entendeu o Tribunal Judicial de Base que nenhum direito lhe assistia e que nada podia fazer contra o “direito de uso exclusivo do terraço” que os RR. eram legalmente legítimos titulares – o A. recorreu para o Tribunal de Segunda Instância que, com o Acórdão ora recorrido, considerou, (também em suma), que embora aos RR. assistisse o “direito ao uso exclusivo do terraço” – e, assim, confirmando a “improcedência do pedido deduzido na alínea a” – entendeu, porém, que este (mesmo direito) não era “absoluto” e que poderia ser condicionado (em certas situações), porém, não contendo os autos “matéria de facto” adequada (por falta de investigação) para apreciar se era o caso, determinou a sua devolução ao Tribunal Judicial de Base para que com o seu prosseguimento se procedesse em conformidade, proferindo-se, oportunamente, nova decisão.

Contestando o assim decidido, e tanto quanto resulta do que pelos (1os) recorrentes B e C produziram em sede das “conclusões” do seu recurso, verifica-se que é seu entendimento que correcta é antes a decisão (de total “absolvição dos RR.”) pelo Tribunal Judicial de Base proferida, já que, apurado estando o seu “direito de uso exclusivo ao terraço”, e sendo este um direito que se deve ter como “absoluto e oponível erga omnes”, nada mais importa para se negar total procedência a pretensão do A., necessário não sendo assim o decretado prosseguimento dos autos para apuramento de matéria de facto e nova decisão.

Mostrando-se-nos de deixar claro que a “pretensão” do A. tem como justificação a sua alegada necessidade de instalar no terraço em questão várias unidades exteriores de ar condicionado que, tanto quanto diz, não podem ser instaladas noutro local do edifício, (cfr., art. 9° da p.i., a fls. 6), vejamos a quem assiste razão.

Pois bem, é inquestionável – e nem tal foi negado pelo Tribunal de Segunda Instância – que aos RR., (os 1os, ora recorrentes, como os 2os), assiste o “direito ao uso exclusivo do terraço do prédio” em causa.

Por sua vez, é também sabido que o “terraço” é, por sua natureza e função, uma “parte (necessariamente) comum” de qualquer edifício em regime de propriedade horizontal, como é o dos autos.

E, então, quid iuris?

Pois bem, in casu, cabe dizer que provado está que:

“O Regulamento de Propriedade Horizontal do referido prédio foi aprovado em Assembleia de Condóminos realizada em 22 de Agosto de 2010 e registado em 17 de Maio de 2011, sob o averbamento no 2 à inscrição no XXXX de constituição de Propriedade Horizontal, na Conservatória do Registo Predial de Macau, deliberação confirmada por douto Acórdão do TSI no 147/2014, de 5 de Junho de 2014”, e que, no art. 5° deste mesmo “Regulamento” se preceitua o seguinte:

“1. Terraço
a) É vedado o uso exclusivo do terraço por parte de qualquer fracção autónoma
b) É vedada qualquer construção no terraço de cobertura para uso exclusivo de qualquer fracção autónoma
2. Pátio
a) É autorizado o uso exclusivo do pátio às fracções ACv e BCv.
b) É vedada qualquer construção no pátio.
…………………………………………………………….
4. Equipamentos de ar condicionado “
a) As unidades exteriores de ar condicionado serão instaladas na cobertura de acordo com a seguinte disposição:

”; (cfr., “pontos 5 e 6 da matéria de facto provada”, a fls. 17 deste aresto).

E, perante tal “factualidade”, seria caso para se dizer que resolvido devia – ou podia – estar o presente “dissenso” entre o A. e os RR..

Porém, (infelizmente), não sendo a “situação” em causa – digamos que assim – tão simples, vejamos.

Como se deixou dito, o Tribunal de Segunda Instância:
- confirmou a improcedência do “pedido deduzido na alínea a”;
- revogou o pelo Tribunal Judicial de Base decidido quanto ao “pedido formulado na alínea b” e, (considerando que havia matéria de facto por apurar, devolveu o processo ao Tribunal Judicial de Base e);
- declarou prejudicado o conhecimento do recurso relativamente ao “pedido da alínea c”.

Ora, esta foi, (essencialmente), a fundamentação pelo Tribunal de Segunda Instância exposta, e que, agora, em sede da apreciação do presente recurso, interessa ponderar:

“Quanto ao pedido em b) (desobstrução do acesso ao terraço aos restantes condóminos), diremos que o facto de os RR terem uso exclusivo do terraço, não lhes dá o direito de bloquear o acesso dos restantes condóminos a ele, por exemplo, para as situações de reparações necessárias e urgentes que se mostrem necessárias e sejam de utilidade para o condomínio, pois isso corresponderia a eliminar a compropriedade dos restantes condóminos sobre ele. Deverão, por isso, eliminar qualquer elemento de obstrução de acesso ao terraço, nomeadamente portão ou gradeamento metálico (o que, não obstante, não franqueia o acesso livre do A e outros eventuais condóminos ao terraço, pois ele apenas pode estar garantido para os efeitos da segunda ou da terceira situações hipotéticas referidas, nos termos acima equacionados). Neste sentido, ver, v.g., Ac. da RL, de 26/03/2015, Proc. nº 2656/10.
Cremos, então, que a procedência deste pedido não está automaticamente afastado (é necessário admitir todas as soluções plausíveis de direito). Mas, também pensamos que, para tanto, será necessário que os autos voltem à 1ª instância e aí se estabeleça a matéria assente e aquela que se mostre eventualmente controvertida, como é o caso da invocada nos arts. 13º, 21º, 23º da p.i. e 17º da réplica.
*
Tendo em atenção o que se acaba de concluir, julga-se prejudicado o conhecimento do 3º pedido”; (cfr., fls. 301-v a 302).

E, em sede do “recurso” agora em apreciação – dos 1os RR. – (e como atrás já se referiu), colhe-se que não obstante em sede das suas “alegações” consideraram os recorrentes que a decisão padece de “nulidade” e “errada aplicação de lei substantiva”, em sede das suas “conclusões”, limitam-se a defender que “o direito de uso e fruição de uma parte comum, constante dos documentos constitutivos da propriedade horizontal, e devidamente registado como tal, é um Direito Real oponível erga omnes, exercido em exclusivo pelo seu titular”, que “o direito dos condóminos nas partes comuns do prédio cessa quando se depara com o “uso exclusivo” de um determinado condómino porque o direito deste é um direito distinto e superior aos dos demais”, sustentando, ainda, que nenhum acto do condomínio pode colidir com o direito real, ainda que de uso exclusivo de coisa comum, pelo que nunca os mesmos podiam suportar ou servir de base para qualquer decisão de direito privado, (cfr., concl. A a C., e G a K), afirmando, ainda que o art. 16°, n.° 1, da Lei n.° 14/2017, (ou seja, a Lei que aprovou o “Regime Jurídico da Administração das Partes Comuns do Condomínio”), salvaguardou, (na sua parte final), os “direitos legítimos de terceiros” ao prever, expressamente, “desde que não prejudiquem a utilização das coisas próprias ou das coisas comuns”; (cfr., concl. F).

E, a terminar, afirmam, ainda, que “Se a afectação da parte comum ao uso exclusivo de um determinado condómino não constar do título constitutivo da propriedade horizontal, só por acordo de todos os condóminos, constante de acta assinada por todos, é que pode este vir a ser modificado, o que não é o caso”, (cfr., concl. O), peticionando, assim, a revogação da decisão proferida pelo Tribunal de Segunda Instância e a integral manutenção do “despacho/sentença” do Tribunal Judicial de Base.

Pois bem, como já se deixou dito, (sendo, também tanto quanto se julga saber ser doutrina e jurisprudência unânimes), são as “conclusões” que delimitam o “objecto do recurso”, (cfr., pois o art. 598° do C.P.C.M.).

E, percorrendo as “conclusões” do presente recurso, (que atrás se deixaram integralmente transcritas), verifica-se que não indicam os ora recorrentes, por uma – única – vez, quais as “normas jurídicas que consideram violadas”, qual o “sentido com que as normas que constituem fundamento da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas”, sendo certo que tão pouco invocam qualquer “erro na determinação da norma aplicável”; (cfr., o cit. art. 598°, n.° 2, al. a, b e c).

Aliás, os ora recorrentes, não fazem a mais pequena referência à “decisão recorrida” ao longo das suas “conclusões”, limitando-se, tão só e apenas, a tecer considerações (totalmente) “genéricas” e “abstractas” sobre matéria jurídica, nomeadamente, quanto à “natureza dos direitos reais” e do “direito de propriedade horizontal”, enquanto “direito real”…

E, (para além do referido, e) ressalvado o muito respeito devido a melhor opinião, cremos que decorre também do alegado no dito recurso em apreciação uma deficiente compreensão e consequente (incorrecta) interpretação do (verdadeiro) sentido da decisão proferida pelo Tribunal de Segunda Instância, (veja-se, por exemplo, o alegado nos pontos 49, 50, e 56 a 58 do corpo das alegações).

Como cremos que resulta do trecho do Acórdão recorrido que atrás se deixou transcrito, o Tribunal de Segunda Instância não decidiu no sentido de se dever entender, ou de proceder, a qualquer alteração do – pelo Tribunal Judicial de Base reconhecido – “direito de uso exclusivo” dos RR. em relação ao terraço de cobertura do edifício já identificado, (cfr., pontos 49 e 50), nem tão pouco considerou, e muito menos decidiu, que as unidades externas de ar condicionado deviam ser colocadas na aludida parte comum de uso exclusivo dos RR.; (cfr., pontos 56 a 58).

E, então, que dizer?

Ora, em conformidade com o estatuído nos art°s 581° e 585° do C.P.C.M., os recursos têm em vista “impugnar decisões judiciais”, (e não apenas os seus fundamentos), não tendo, por isso, qualquer “legitimidade recursiva” a parte a quem a decisão foi favorável, por muito que discorde da lógica (e eventual fundamentação) seguida pelo Tribunal.

Como na – boa – doutrina se nota: “O que adquire força e autoridade de caso julgado é a posição tomada pelo juiz quanto aos bens ou direitos litigados pelas partes e a concessão ou denegação da tutela jurisdicional para esses bens ou direitos e já não a motivação da sentença, as motivações que determinaram o juiz, as soluções por ele dadas aos vários problemas que teve de resolver para chegar àquela conclusão final”; (cfr., v.g., Alberto dos Reis in, “C.P.C. Anotado”, Vol. III, 3ª ed., 1950, pág. 139, e, no mesmo sentido, os Acs. deste T.U.I. de 05.12.2012, Proc. n.° 77/2012 e, mais recentemente, de 06.07.2022, Proc. n.° 23/2022, e em cujo sumário se consignou nomeadamente que: “O caso julgado incide sobre a decisão e não sobre os fundamentos”.

In casu, (e como sem esforço se colhe do atrás transcrito excerto do Acórdão agora recorrido), o Tribunal de Segunda Instância limitou-se a manter, ainda que com diferente fundamentação, a decisão do Tribunal Judicial de Base, tendo tão só revogado o aí decidido no que dizia respeito à parte do “pedido constante da alínea b da petição inicial”, quanto à pretendida “desobstrução do acesso ao terraço aos restantes condóminos”, sendo até de salientar que este mesmo “pedido constante da alínea b” foi, em nossa opinião, apenas “parcialmente acolhido”, visto que o que o A. aí peticionou foi que fossem “b) Os RR. [serem] condenados a permitir a todos os condóminos o livre acesso à parte comum do edifício, constituída pelo terraço de cobertura, e [serem condenados] a retirar qualquer elemento de obstrução ao livre acesso ao terraço de cobertura para fins de uso comum e para segurança e prevenção de incêndios”, sendo que quanto à “primeira parte” do assim peticionado afirmou o Tribunal de Segunda Instância (peremptoriamente) que: “Deverão, por isso, eliminar qualquer elemento de obstrução de acesso ao terraço, nomeadamente portão ou gradeamento metálico (o que, não obstante, não franqueia o acesso livre do A. e outros eventuais condóminos ao terraço, pois ele apenas pode estar garantido para os efeitos da segunda ou da terceira situações hipotéticas referidas, nos termos acima equacionados)”, acabando, a esse propósito por decidir que “os autos voltem à 1.ª instância e aí se estabeleça a matéria assente e aquela que se mostre eventualmente controvertida, como é o caso da invocada nos art°s 13°, 21°, 23° da p.i. e 17° da réplica”.

E, quanto a este “trecho decisório”, o certo é que o “recurso” dos ora recorrentes, (1os RR.), não apresenta qualquer – concreto – fundamento ou argumento para defender a existência de qualquer “vício” ou “erro de julgamento”, mais parecendo uma peça processual em que se “defende a confirmação do decidido”…

De facto, como em recente Acórdão tivemos oportunidade de considerar:

“Como se nos apresenta evidente, um “recurso”, (como é o presente), visa a “apreciação de uma decisão judicial” – como nota V. Lima, “os recursos são meios destinados a submeter a uma nova apreciação jurisdicional certas decisões proferidas pelos tribunais”, in “Manual de Direito Processual Civil”, pág. 659 – cabendo ao recorrente o “ónus de alegar” (de forma clara, objectiva e explícita) as “razões” e motivos do seu inconformismo e do que entende ser o “desacerto da decisão recorrida”, devendo, concluir, (de forma sintética), “pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”; (cfr., n.° 1 do art. 598° do C.P.C.M.).
Se não o faz – inobservando o aludido ónus – natural e imperativo é então concluir-se que “nenhuma questão” coloca ao Tribunal ad quem, e que, então, nada há a decidir…”; (cfr., v.g., o Ac. de 01.06.2022, Proc. n.° 13/2022).

Dest’arte, em face da assinalada vacuidade, à vista se nos apresenta a solução a adoptar em relação ao recurso dos (1os) RR. B e C.

Continuemos.

3.3 Do (segundo) recurso em que são recorrentes a (2ª) R. D, por si, e pelos (3° e 4°) RR., E e F.

Afirma-se no presente recurso que: “Por muito válido que seja o argumento do Tribunal a quo de que o egoísmo dos interesses de um não pode cavalgar sobre a solidariedade e contra o lado social da força do conjunto, o certo é que tal argumento não é fundamento legal para retirar o uso exclusivo do terraço de cobertura e operar a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal”; (cfr., concl. C), e que “(…) não se vê como a interpretação que o direito de uso exclusivo não é absoluto e só pode ser exercitado sempre que não ofenda o direito de compropriedade, possa ter aplicação no caso concreto dos Autos”; (cfr., concl. G, outras “críticas” havendo também à fundamentação do Acórdão recorrido e que constam das concl. A a M, Z a DD, e II).

Por outro lado, defende-se, também, no presente recurso, que a decisão recorrida é “nula por omissão de pronúncia quanto à invalidade do Regulamento de Condomínio”, também designado por “Regulamento de Propriedade Horizontal”, argumento que parece resultar do corpo das alegações, (cfr., pontos 12 e 13), mas que, da análise efectuada, e, em especial, das respectivas “conclusões”, verifica-se que o que se pretende invocar não é uma “nulidade da sentença” nos termos do art. 571° do C.P.C.M., mas antes, que se venha a considerar que é o próprio Regulamento de Condomínio que é inválido, dada inexistência da assembleia de condóminos onde foi aprovado, em virtude de presente apenas ter estado o A., e, por isso, que não houve uma verdadeira e efectiva “Assembleia” em termos jurídicos, a que acresce o facto de, por outro lado, ser nulo o art. 5° do Regulamento de Condomínio por frontal violação dos “direitos de uso exclusivo” do terraço de cobertura que aos RR. assiste; (cfr., concl. O a Y e QQ).

Defendem, igualmente, que o Tribunal de Segunda Instância incorreu em “erro de julgamento” porque foi dado (imediato) cumprimento ao determinado pela D.S.S.O.P.T., inexistindo qualquer portão a obstruir o acesso ao terraço de cobertura, estando a chave de acesso colocada dentro de uma caixa, junto da parede da referida porta, (cfr., concl. FF a HH), sustentando também que se fez uma inadequada leitura do pedido pelo A. formulado, considerando-se a “alínea b” do peticionado como um “pedido autónomo” (e ao declarar que os RR. devem eliminar qualquer elemento de obstrução de acesso ao terraço, nomeadamente portão ou gradeamento metálico), sendo que em causa está um “pedido sequencial e consequencial do pedido da alínea a”, (cfr., concl. LL a MM), referindo-se, ainda, que a “factualidade” invocada como necessária e a apurar em julgamento não constitui “matéria de facto”; (cfr., concl. NN e OO).

A final, pedem a revogação do Acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância e a confirmação do “despacho-saneador-sentença”, que “(…) deve ser complementado pelo Tribunal ad quem que, oficiosamente, deve conhecer e declarar a invalidade do Regulamento do Condomínio por inexistência da assembleia de condóminos que o aprovou uma vez que se não verificou o duplo quórum deliberativo previsto no n.º 3 do artigo 1347.º do CC, ou, caso assim o não entenda, declarar a invalidade, por nulidade do artigo 5.º do dito Regulamento de Condomínio com fundamento na alínea c) do n.º 1 do artigo 1350.º e n.º 3 do artigo 1321.º, ambos do CC”.

Pois bem – certo sendo que como já se decidiu no Acórdão deste TUI de 23.05.2001, (Proc. n.° 5/2001), no sentido de que pode esta Instância “sindicar o uso que o Tribunal de Segunda Instância faça do poder de anulação (oficiosa ou não) de despacho saneador-sentença (ou a anulação da decisão do colectivo) por este Tribunal ter entendido indispensável a ampliação da matéria de facto, faculdade essa prevista no art. 712.º, n.º 2, do Código de Processo Civil de 1961 e no art. 629.º, n.º 4, do actual Código de Processo Civil”, sendo igualmente de notar que “apurar se um facto é ou não destituído de relevância jurídica para a decisão da causa constitui, manifestamente, matéria de direito e não de facto” – eis o que se nos parece de dizer.

Quanto ao alegado “retirar do uso exclusivo do terraço de cobertura”, (cfr., concl. A a M, Z a DD, e II), cabe dizer que – tal como sucedeu com o recurso dos 1os RR. – vêm os ora recorrentes insurgir-se contra a “fundamentação” do Tribunal de Segunda Instância, sem cuidar de verificar que de forma alguma e em momento algum, se decidiu “retirar o uso exclusivo do terraço de cobertura e operar a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal”.

Pelo que, (e como já se deixou dito), há que não olvidar que nos termos dos art°s 581° e 585° do C.P.C.M., que os “recursos têm em vista impugnar as decisões judiciais”, e não apenas os seus “fundamentos”, não tendo, por isso, qualquer “legitimidade recursiva” a parte a quem a decisão foi favorável por muito que discorde ou não lhe agrade a lógica invocada e/ou fundamentação seguida e exposta pelo Tribunal recorrido.

No que toca à alegada “invalidade do Regulamento de Condomínio”, (cfr., concl. O a Y e QQ), dizem os recorrentes que o mesmo Regulamento de Condomínio é “inexistente” ou, pelo menos, “nulo” (e de nenhum efeito), sustentando que se trata de vícios que podem ser conhecidos a todo o tempo.

Na óptica dos recorrentes, a dita “invalidade” do Regulamento de Condomínio assenta na (própria) inexistência jurídica da Assembleia de condóminos em que o Regulamento de Condomínio foi aprovado, pois que presente apenas esteve o A., e, por isso, não houve uma “verdadeira assembleia”.

Por outro lado, o art. 5° do Regulamento de Condomínio seria da mesma forma “nulo” por “violação dos direitos de uso exclusivo do terraço de cobertura” que aos RR. assiste em termos legais.

Ora, sem prejuízo do respeito devido a diversa opinião, não partilhamos do assim considerado.

De facto, ainda que, (por hipótese), fosse de admitir que em causa estivesse uma “excepção peremptória” que ao Tribunal cabia conhecer oficiosamente, (cfr., art. 415° do C.P.C.M.), haveria (desde logo) que referir que não se vislumbra qualquer vício de “inexistência” que possa, (legalmente), afectar o Regulamento de Condomínio ou a deliberação que o aprovou.

Na verdade, e tanto quanto nos parece, a “inexistência”, enquanto “vício jurídico”, apenas surge na Lei Civil em matéria de “direito matrimonial”, (cfr., art. 1501° do C.C.M.), pelo que o referido Regulamento de Condomínio pode (eventualmente) ser nulo, anulável ou ineficaz, mas não nos parece que possa estar viciado por “inexistência jurídica”, (salvo no caso da sua própria “inexistência” em termos factuais).

Quanto ao “art. 5° do dito Regulamento de Condomínio”, e à invocada “nulidade por violação dos direitos de uso exclusivo do terraço de cobertura” que aos RR. assiste, importa referir – salientar, e repetir – que a decisão do Tribunal de Segunda Instância, (independentemente dos respectivos fundamentos), não provocou, (nesta matéria), qualquer alteração ao trecho decisório constante da decisão do Tribunal Judicial de Base onde se consignou que:

“(…) No caso em apreço, a matéria regulada no art. 5º, nº 4, al. a) do Regulamento não é mero uso, fruição, segurança nem conservação das partes comuns, mas sim, de facto, limitação do direito dos Réus e a criação de direito de uso aos restantes condóminos num sítio onde estes não têm direito de usar, sem a concordância de quem goza do direito de uso exclusivo, o que, como já vimos, não é legal por ofensivo da exclusividade desse direito (…). Por outro lado, nos termos do disposto no art. 1350.º n.º 1 al. c) do CC, o referido art. 5º n.º 4 al. a) do Regulamento também não pode ser invocado contra os Réus. (…) No caso em apreço, o artigo 5º do Regulamento, foi aprovado apenas com os votos do Autor, que é proprietário das fracções “AR/c”, “BR/c” e “A2”, as quais correspondem a 28% do valor total do condomínio. Daqui se infere que, como é natural, os Réus nunca concordaram nem votaram na aprovação dessa regra destinada a limitar os seus direitos exclusivos.
Desta feita, e nos termos do disposto no art. 1350.º, n.º 1, al. c) do CC, o art. 5º, n.º 4º al. a) do Regulamento também não pode ser invocado para a satisfação da pretensão do Autor. (…)
Como nem as normas legais nem o Regulamento de Condomínio do [Edifício(1)] facultam ao Autor o direito de acesso, por forma abstracta e geral, (…) é de concluir pela procedência da excepção peremptória invocada pelos Réus e a improcedência dos pedidos do Autor”; (cfr., fls.174-v a 176).

Aqui chegados, adequado se mostra de notar que, em sede da sua “contestação”, os RR. defenderam-se – por “excepção peremptória” – invocando a nulidade do art. 5° do Regulamento de Propriedade Horizontal por violação do direito de uso exclusivo, tendo sido, como se viu, dada por verificada essa mesma excepção pelo Tribunal Judicial de Base, decisão esta que em nada foi alterada pelo Acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância.

E, assim, sem necessidade de mais alongadas considerações, evidente se nos apresenta que na parte em questão, aos ora recorrentes não assiste “interesse (ou legitimidade) processual” para recorrer e “impugnar” uma decisão que, bem vistas as coisas, até lhes foi favorável, (e que nada alterou, consignando-se, desde já, que, de todo o modo, será a questão apreciada mais adiante, em sede do “recurso subordinado” do A.).

Quanto à “procedência de parte do pedido relativo à alínea b da petição inicial”, (cfr., concl. FF a HH e LL a OO), vejamos.

Aqui, alega-se que o Tribunal de Segunda Instância incorreu em “erro de julgamento” porque foi dado (imediato) cumprimento ao determinado pela D.S.S.O.P.T., inexistindo qualquer portão a obstruir o acesso ao terraço de cobertura, estando a chave de acesso colocada dentro de uma caixa, junto da parede da referida porta; (não se deixando de observar tratar-se de “factos” que não constam da “matéria dada como assente”).

Por outro lado, diz-se, também, que se fez uma inadequada leitura do pelo A. peticionado na sua petição inicial, considerando-se a “alínea b” como um “pedido autónomo” e declarando-se que os RR. deviam eliminar qualquer elemento de obstrução de acesso ao terraço, nomeadamente portão ou gradeamento metálico, sendo que em causa estava um “pedido sequencial e consequencial do constante na alínea a”; (cfr., concl. LL a MM).

Por último, e como já se referiu, afirma-se ainda que a suposta “factualidade” cujo apuramento se entendeu necessário não é “matéria de facto”; (cfr., concl. NN e OO).

Pois bem, cabendo-nos emitir pronúncia sobre as questões que nos termos que se deixou exposto nos são trazidas para apreciação e decisão, cabe consignar que em relação à alegada “inexistência de qualquer portão a obstruir o acesso ao terraço de cobertura” têm os RR. razão, (embora, como se referiu, tal não resulte da “matéria de facto assente”, não constituindo esta “circunstância” qualquer obstáculo ao que se deixou considerado).

Na verdade, importa ter presente que na sequência da impugnação dos 1os RR., (art. 32° da respectiva contestação), veio o A. na sua réplica dizer (precisamente) o contrário do que tinha afirmado na petição inicial, alegando que “Acontece que o uso exclusivo pelos RR do terraço de cobertura, tem sido exercido de forma abusiva e ilegal ao longo dos anos, e tem sofrido limitações sérias pelos poderes públicos competentes, exactamente por ter existido esse uso ilegal, nomeadamente com construções clandestinas no terraço de cobertura (…) tendo os 1ºs RR sido intimados à sua demolição e desimpedimento e desobstrução das portas de acesso ao terraço de cobertura do [Edifício(1)]”; (cfr., art. 23° da réplica), para, seguidamente, reconhecer e concluir que, “Hoje, a via de acesso ao terraço de cobertura está desobstruída com portas destrancadas e para desimpedimento da passagem sendo que aquele edital ordena que: “(…) devem os mesmos conservar-se permanentemente desobstruídos e desimpedidos, de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 10.º do RSCI, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/95/M, de 9 de Junho”; (cfr., art. 24° da dita réplica, com sub. nosso).

Além disso, cabe também aqui consignar que em sede da motivação de recurso apresentada contra a decisão do Tribunal Judicial de Base refere, expressamente, o A. que “(…) Edital da DSSOPT n.º 12-E-BC/2018, de 26 de Março de 2018, o qual impõe aos RR a obrigação de manter o livre acesso ao terraço de cobertura do [Edifício(1)]. O terraço de cobertura, apesar de ser de uso exclusivo dos RR constitui um caminho de evacuação, que tem de estar desimpedido e de livre acesso a todos os condóminos, estando os RR obrigados a manter as portas abertas e sem qualquer possibilidade de as mesmas estarem trancadas e fechadas à chave e de existirem quaisquer construções no terraço de cobertura, impondo a demolição das existentes.
Restrições que os RR obedeceram e executaram”.

Ora, nos termos do art. 649°, n.° 2, do C.P.C.M. (relativamente ao “âmbito do julgamento do recurso para este Tribunal de Última Instância”): “A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo se houver ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”.

E, atento o teor dos art°s 562°, n.° 3, e 631°, n.° 2 (in casu aplicáveis por força do art. 652°, todos) do C.P.C.M., cabe pois observar que: “Na fundamentação da sentença, o juiz toma em consideração os factos admitidos por acordo ou não impugnados, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer”; (sub. nosso).

Dest’arte, se é o – próprio – A. que afirma na sua réplica que “Hoje, a via de acesso ao terraço de cobertura está desobstruída com portas destrancadas e para desimpedimento da passagem”; (cfr., art. 24° da réplica), está feita uma “confissão judicial espontânea” por escrito, (cfr., art. 349°, n.° 1 do C.C.M.), visto que tal facto é-lhe desfavorável e contraditório a parte do pedido formulado na alínea b da petição inicial, tendo, desta forma, “força probatória plena”; (cfr., art. 351°, n.° 1 do C.C.M.).

E, assim, não se nos afigura existir qualquer controvérsia sobre a “matéria dos quesitos 13°, 21°, 23° da petição inicial e 17° da réplica” – sobre o “acesso ao terraço” – que justifique a determinada “ampliação da base instrutória e a realização de um novo julgamento”, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito.

Nesta conformidade, e em face do que se deixou consignado, visto está que, na parte em questão, tem os ora recorrentes razão.

Avancemos.

3.4 Decididos que ficaram os “recursos principais” dos RR., é chegado o momento de se apreciar do “recurso subordinado do A.” em sede do qual vem produzidas as conclusões seguintes:

“I - Dado como assente no Acordão recorrido, e pela generalidade da doutrina e jurisprudência que o direito de uso exclusivo de parte comum de um edifício construído em regime de propriedade horizontal, por um ou alguns condóminos, não assume no nosso ordenamento jurídico a natureza de direito real, absoluto, oponível erga omnes.
II - E o direito de uso exclusivo de parte comum por um ou alguns condóminos, não pode afastar e ofender o direito dos comproprietários, retirando ou diminuindo drasticamente a utilidade social do direito de propriedade que aqueles detêm relativamente à sua própria fracção e às partes comuns de que são comproprietários.
III - E naturalmente um direito de uso nunca se poderá sobrepor, no nosso ordenamento jurídico, ao direito real máximo de propriedade, quer individual, quer em regime de compropriedade.
IV - Citando o arresto recorrido "Como se sabe, o uso exclusivo por algum dos condóminos não impede que do terraço outros possam retirar algumas utilidades, desde que tal não afecte e desvirtue aquela exclusividade. Ou seja, o uso exclusivo não pode afectar a propriedade, nem ser mais forte do que o direito de propriedade, do qual todos os condóminos são titulares. Dito de outra maneira, nenhum condómino só porque é usuário exclusivo da parte comum, não pode ficar em melhor posição do que os seus vizinhos condóminos, impedindo-lhes a extracção da função social da propriedade.
O uso exclusivo apenas permite ao respectivo titular do direito de gozar e extrair as utilidades normais e próprias da parte comum, enquanto tal. Apenas esse titular (e nenhum outro condómino) pode estender uma toalha na superfície para se bronzear ao sol; apenas ele pode fazer churrasco com os amigos; apenas ele pode beneficiar do direito de vistas e da paisagem que ele proporciona; apenas ele numa noite de verão pode gozar do avistamento do movimento supersónico e espectacular das estrelas cadentes, etc., etc."
V - E continua "Todavia, o titular do uso exclusivo já não pode usar o terraço a seu bel-talante, nem exercê-lo como se fosse dono, visto que o direito de uso não lhe confere nenhum direito absoluto, como é o do proprietário único.
Por essa razão, o usuário exclusivo do terraço não pode livremente, e sem permissão da assembleia de condóminos, ampliar, por exemplo, o seu espaço útil através da instalação de uma marquise ou de um anexo, criar uma arrecadação, construir uma estufa para plantas de interior, construir um muro, montar uma cozinha, implantar um jardim, montar um fogão de sala cuja chaminé atravesse a placa e o telhado, etc. (Abílio Neto, Manual da Propriedade Horizontal, 4° edição, 2015, pg 337).
Se o fizer a sanção será a demolição das obras inovatórias, além de poder ter de indemnizar os restantes, nos termos gerais (Abílio Neto, ob. e loc. cits; também, Ac. do STJ, de 1/06/2010, Proc. n° 95/2000; Ac. do STJ, de 31/05/2012, Proc. n° 678/10; Ac. da RL, de 1/04/2014, Proc. n° 2031/10).
VI - É esta a linha de construção jurídica da natureza do direito de uso exclusivo de parte comum de prédio constituído em regime de propriedade horizontal, seguida pelo acórdão recorrido, que sufragámos totalmente e que emana da generalidade da doutrina e da jurisprudência.
VII - O Acordão em crise dá por assente que a deliberação que aprovou o Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)] - em Assembleia de Condomínio de 22 de Agosto de 2010 e depositado na Conservatória do Registo Predial, Averbamento n°2 à Constituição da Propriedade Horizontal, AP. n°177, de 17/05/2011 - está em vigor, e não procedeu a acção de anulação intentada pelos RR, ora recorrentes, conforme decisão proferida pelo TSI, no Acordão n°147, de 5/06/2014.
VIII - Aquele Regulamento de Condomínio não fere princípios de interesse e ordem pública, nem as normas vigentes sobre propriedade horizontal do Código Civil e legislação complementar, pelo que não padece de nulidade como vêm arguir os RR, recorrentes.
IX - O Regulamento de Condomínio o [Edifício(1)], aprovado em 22.08.2010, não deixou de vigorar, e tão só deve ter por não escrita somente a norma do no1 do artigo 5°, que proíbe o uso exclusivo de partes comuns, em virtude de só em 07.03.2011, se ter efectuado, a requerimento dos proprietários da fracção B3, a completação da inscrição da propriedade horizontal, sob a Apresentação n° 92 de 7/03/2011, que veio estabelecer que o terraço de cobertura é do uso exclusivo das moradias do 3° andar. (cf, Doc n°1 e n°2 da PI
X - Por seu turno, a constituição do regime de propriedade horizontal do [Edifício(1)] foi registada na Conservatória do Registo Predial (CRP) em 5 de Abril de 1967 e requerida a sua completação em 7 de Março de 2011, em que passou a constar "A cobertura - terraço é de uso exclusivo das moradias do 3° andar". O Autor requereu a rectificação judicial do acto de registo mas este improcedeu por douto Acordão do TSI n° 208/2016, de 23 de Março de 2017;
XI - Foi dado por assente, no Acordão recorrido, o facto que o dito regulamento se encontra em vigor (consta dos autos prova da deliberação da Assembleia de Condóminos, que não foi anulada judicialmente, e nos últimos 9 anos não foi convocada nenhum Assembleia de Condóminos para proceder à sua revogação ou substituição por outro, nem foi intentada pelos condóminos ou pela administração nenhuma acção judicial para declarar a sua nulidade.
XII - Contudo o acórdão ora em crise enuncia 3 situações que considera terem de ir à especificação do Tribunal de 1ª. Instância, que, no seu douto entender, interpretou mal o disposto na Lei n°14/2017, mas que sem uma resposta às 3 situações enunciadas, não poderá o Tribunal de recurso dar provimento ao pedido do Autor/recorrente.
XIII - Mas a prova das 3 situações de facto que o Acordão recorrido considera essencial estarem estabelecidas e firmadas nos autos, encontra-se no próprio Regulamento de Condomínio e na deliberação que o aprovou.
XIV - De facto, pela simples análise do lay-out da colocação das unidades exteriores dos ares condicionados, desenho que consta do Regulamento em vigor (cf. Doc. n°2 da PI), o qual está nos elenco dos factos dados como provados, verifica-se como na prática iria ser executada a obra de colocação dos mesmos no [Edifício(1)].
XV - Assim o primeiro conjunto de questões que o acordão diz necessitar de resposta, já se encontra dada nos autos, a saber a colocação das unidades externas dos aparelhos de ar condicionado tem um local definido no Regulamento para serem colocados no terraço de cobertura, na parte interior do muro de protecção do terraço, sem contender com as regras da Lei n°14/2017.
XVI - E fica demonstrado pelo desenho e local de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado (parte interior do muro de protecção do terraço de cobertura) que aquele modo de colocação não viola as regras impostas pelo artigo 14° da Lei n°14/2017, não constitui uma obra de inovação (pelo que nem necessita de deliberação da Assembleia de Condóminos), a saber:
4) não é visível do exterior e não modifica a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
5) não altera colunas, pilares, paredes mestras e outras partes da estrutura do edifício;
6) não altera a destinação da parte comum.
XVII - Devia o V. Tribunal a quo ter subsumido os factos provados às normas e regulamentos aplicáveis, e decidir pelo reconhecimento do direito do A./recorrente.
XVIII - Com efeito, o desenho de pormenor sobre o local e o modo de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionados no terraço de cobertura do [Edifício(1)], constante do Regulamento do Condomínio, aprovado pela Assembleia de Condóminos, dá resposta integral e cabal às 3 situações que o Acordão recorrido considera deverem ser provados para decidir sobre o direito peticionado pelo A., ora recorrente.
XIX - De referir ainda que o lay-out constante do Regulamento, evidencia que os aparelhos de exteriores de ar condicionado seriam colocados ordenadamente do lado interior do muro de protecção do terraço de cobertura, que constitui parte forçosamente comum do [Edifício(1)], propriedade de todos os condóminos, na percentagem das respectivas permilagens, e sem que alguém ou alguma assembleia de condóminos possa reservar o direito de uso exclusivo daquele muro de protecção ao uso exclusivo de qualquer condómino, incluindo os RR, ora recorrentes.
XX - O [Edifício(1)] dispõe ainda de um outro espaço comum que se eleva no interior do terraço de cobertura, que, não pode ser afecta ao uso exclusivo de qualquer condómino, na qual se pode executar a obra de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado, que é a parede exterior da torre da caixa de escada, que se eleva no terraço de cobertura a partir das escadas comuns do prédio, sem possibilidade legal ou contratual de afectação exclusiva, por ser parte estruturante e de protecção da construção edificada.
XXI - Estas paredes, partes forçosamente comuns no âmbito da propriedade horizontal, podem ser objecto de uso por todos os condóminos, porque são compropriedade de todos os condóminos, podem nelas serem fixadas as unidades externas dos aparelhos de ar condicionado, quer do ora recorrente, quer dos demais condóminos, sem prejuízo e sem afectar o direito de uso exclusivo do terraço de cobertura pelos RR/Recorrentes.
XXII - O acordão ora recorrido, podia e devia ter conhecido dos factos que constam do Regulamento de Condomínio e deles extrair as conclusões necessárias para decidir, averiguando, através desses factos subsumidos às normas de direito aplicáveis ao caso, o preenchimentos dos requisitos positivos e negativos do direito peticionado pelo A./recorrente, sem necessidade de remeter os autos para o tribunal de primeira instância para novo julgado.
XXIII - Deixou assim de conhecer factos que devia ter conhecido, factos provados nos autos, por documento, que o Tribunal tomou deles conhecimento, avaliou da sua validade, factos que se ponderados pelo Tribunal a quo e compulsados com as normas em vigor, teriam como consequência lógica uma decisão favorável com provimento integral do pedido do A./Recorrente.
XXIV - Não se entende, que partindo a decisão do Tribunal a quo, das normas do Código Civil e da Lei n°14/2017, de 21 de Agosto, normativo que regula o regime jurídico da administração das partes comuns do condomínio, e considerando-se ainda na fundamentação do arresto a existência do Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)], de 2010, cuja deliberação de aprovação foi confirmada pelo V. TSI (Acordão de 05/06/2014, lavrado no Proc. 147/2014), no qual está estabelecido a colocação dos aparelhos externos de ar condicionado, e afirmando-se que dificilmente se pode negar tal colocação, venha decidir pelo não provimento do direito do A recorrente.
XXV - Provada que está que o Regulamento do [Edifício(1)] está em vigor, não devia o Tribunal a quo remeter os autos para o tribunal de primeira instância para quesitar e julgar as 3 situações que reputou fundamentais serem. objecto de quesitos e prova pelo TJB para aferir do direito do A. ora recorrente.
Tais questões estavam respondidas nos autos, e eram decorrência dos factos dados como provados:
- A obra de colocação das unidades exteriores de ar condicionado estava aprovada por deliberação de Assembleia de Condóminos que aprovou o Regulamento do [Edifício(1)], no qual se determinava o local de execução da obra no interior do muro de protecção do terraço de cobertura, direito inerente à natureza da propriedade horizontal regulada no Código Civil e mais tarde regulamentada pelo n°1 do artigo 16° da Lei n°14/2017, que se passa a citar:
Artigo 16°
Obras em partes comuns necessárias à fruição de fracção autónoma
"1. O condómino pode levar a efeito obras em partes comuns do condomínio para execução de benfeitorias necessárias ou úteis ao funcionamento e utilização, na sua fracção autónoma, de equipamentos e instalação de água, electricidade, ar condicionado, aquecimento, gás, comunicações e semelhantes, sem necessidade de autorização da assembleia geral do condomínio, desde que não prejudiquem a utilização das coisas próprias ou das coisas comuns, nem interfiram com interesses relevantes dos restantes condóminos."
XXVI - Verifica-se que o legislador no supra descrito normativo quis consagrar o direito dos comproprietários/ condóminos, na propriedade horizontal, poderem retirar toda a utilidade social do direito de propriedade inerente à sua própria fracção, bem como usufruir da utilidade comum inerente ao direito de compropriedade, mesmo quando este incida sobre partes comuns afectas ao uso exclusivo de um ou mais condóminos.
XXVII - A decisão do tribunal a quo estava adstrita a conhecer, face às normas do Código Civil, à Lei n°14/2017 e à aprovação em Assembleia do Regulamento do [Edifício(1)], que estavam reunidas as condições de facto e de direito peticionadas pelo A./Recorrente para o reconhecimento do seu direito à realização da obra pretendida;
- Pré-existia ao presente processo judicial e à completação do registo de uso exclusivo dos RR do terraço de cobertura uma deliberação da Assembleia Geral, que apesar de impugnada, foi confirmada pelo TSI (Acordão 147 de 5/06/2014) e que dispunha do modo de colocação dos aparelhos de ar condicionada na parede interior do muro de protecção do terraço de cobertura;
- Pré-existia um Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)] que determinava no seu artigo 5° o local de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado que cada condómino poderia utilizar, na parte comum do terraço de cobertura, sem que os RR pudessem ser prejudicados.
- Não constituía obra de inovação e, desde Agosto de 2018, data da entrada em vigência da Lei n° 14/2017, não necessitava de aprovação em Assembleia de Condóminos, por a obra de colocação das unidades externas de ar condicionado, prevista no artigo 5° 4. a) do Regulamento:
1) pão ser visível do exterior e não modificar a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
2) não alterar colunas, pilares, paredes mestras e outras partes da estrutura do edifício;
3) não alterar a destinação da parte comum.
XXVIII - PROVA DE FACTOS NEGATIVOS
O Acordão do Tribunal a quo não conheceu factos provados por documento, que devia conhecer e violou as regras da prova constantes do artigo 335° n°1 do Código Civil, ao imputar ao A., ora recorrente, o ónus da arguição e prova do prejuízo dos RR e da interferência negativa em interesses relevantes dos RR, que eventualmente seriam causados pela realização da obra de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado no terraço de cobertura, afecto ao uso exclusivo daqueles.
XXIX - Quanto à prova do requisito negativo, ínsito na norma do artigo 16° a Lei n" 14/2017, " desde que não prejudiquem a utilização das coisas próprias ou das coisas comuns, nem interfiram com interesses relevantes dos restantes condóminos.", diz o arresto em crise,
"E a solução de deferimento total ou parcial do pedido depende da extensão da prova concreta dos factos acerca da interferência que a obra importar nos interesses do condóminos ou nos eventuais prejuízos que delas resultem para as coisas próprias ou comuns."
XXX - Como afirmamos supra, a obra, colocação dos aparelhos externos de ar condicionado no terraço de cobertura, está aprovada por Regulamento de Condomínio, em vigor para o [Edifício(1)], desde 22.08.2010, depositado na Conservatória do Registo Predial de Macau sob a apresentação n°177, de 17/05/2011 - facto provado.
XXXI - Da parte do A./Recorrente não há lugar à produção de mais prova, por aquelas obras permitidas por lei, sem necessitarem de deliberação da assembleia de condóminos, constarem do Regulamento de condomínio e não infringirem norma legais imperativas nem quaisquer interesses ou direitos de ordem pública.
XXXII - In casu, as obras estão duplamente autorizadas, pela lei e pelo regulamento, não necessitando de nova autorização, pois o Regulamento do [Edifício(1)], nesta matéria, seguiu as orientações do Governo de Macau, que estavam já consagradas no Plano Urbanístico da [Rua(3)] e constam de orientações urbanísticas do Governo da RAEM para a concessão de financiamento de obras de recuperação de prédios antigos, com a consequente obrigação de retirada dos aparelhos externos de ar condicionado das fachadas dos prédios, ou se possível, neles colocar compartimentos integrados na fachada para a colocação daqueles aparelhos.
XXXIII - Já no que concerne à articulação e prova do facto de não prejuízo e do requisito negativo para realização da obra "desde que não prejudiquem a utilização das coisas próprias ou das coisas comuns, nem interfiram com interesses relevantes dos restantes condóminos", ele foi sempre articulado como pressuposto do reconhecimento do direito do A. que não colide, a executar nos termos do Regulamento, com o direito de uso exclusivo do terraço e cobertura pelos RR.
XXXIV - Com efeito, pretendendo o A./Recorrente ver reconhecido o seu direito, consagrado na lei e no regulamento do [Edifício(1)], direito que a lei atribui a todos os condóminos, para efectivar o exercício desse direito, está implícito que cada um usará da utilidade comum do terraço de cobertura para colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado, e só para esse fim, nos termos do Regulamento do [Edifício(1)], utilidade que lhe é conferida por serem titulares do direito de propriedade da sua fracção e de compropriedade das partes comuns, sem prejudicar os demais condóminos e os RR, ora recorrentes, no seu direito de uso exclusivo.
XXXV - Não competia ao A./recorrente, articular na PI que o exercício do direito que queria ver reconhecido não causava prejuízo aos RR, mas sim os RR arguirem tal prejuízo na Contestação.
XXXVI - Desde logo existindo Regulamento e estando o mesmo em vigor, o exercício de um direito de um condómino nele previsto é facto demonstrativo da ausência de prejuízo, bastando a sua invocação para o Tribunal deduzir que foi invocado um direito regulado quer por Regulamento do Condomínio quer pela Lei, e quem se considerar prejudicado pelo exercício de tal direito terá que invocar o prejuízo e carrear prova dos mesmo para os Autos e usar dos meios legais ao seu alcance para evitar o prejuízo.
XXXVII - Não competia ao A. carrear a prova dos factos negativos, factos extintivos ou modificativos do seu direito, mas sim aos RR fazer a prova dos mesmos, ou seja prova que os prejuízos causados pela utilidade que o A. pretendia usufruir perturbava o seu direito de uso exclusiva. E nessa medida fê-lo.
XXXVIII - Nos termos do artigo 335° n° 1 do Código Civil, o ónus da prova do facto negativo, modificativo ou extintivo do direito do A. - prejuízo para os RR decorrente da realização da obra de colocação dos aparelhos exteriores de ar condicionado no terraço de cobertura e interferência nos seus interesses relevantes - incumbe aos RR e não ao Autor, ora Recorrente.
XXIX - Estamos no âmbito da chamada prova de difícil ou impossível realização para o Autor, até porque envolve uma situação subjectiva, in casu, prova do eventual prejuízo e afectação negativa de interesses relevantes dos RR, ora recorrentes, compete aos RR e, só eles o podem provar. Ao A./Recorrente não compete nos termos da lei substantiva fazer prova que o exercício do seu direito não causa prejuízos na esfera jurídica dos RR!
XXX - Mas os RR./Recorrentes não invocaram quaisquer prejuízos decorrentes do exercício do direito do A./recorrente.
XXXI - O Acórdão recorrido, em violação das regras substantivas da prova, tenta repartir o ónus da prova do prejuízo dos RR salomonicamente pelo A. e pelos RR!
XXXII - Podia e devia ter decidido e não o fez, antes remeteu parte da matéria dos autos para o Tribunal de Primeira Instância quesitar e decidir, sobre factos dados como provados no processo, com prova documental, nomeadamente o Edital do Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes da RAEM (v. Doc. n° 2A PI), que em 2018 determinou que as portas de acesso ao terraço de cobertura têm que estar desempedidas e desobstruidos para cumprimento do Regulamento de Prevenção de Incêndios vigente na RAEM.
XXXIII - Reenvia igualmente para o TJB, especificar matéria provada nos autos por documento de autoridade pública administrativa, constante do Edital n°12/E-BC%2018 de 21 de Março de 2018 da DSSOPT (Doc. n° 2A da PI), notificado aos RR./Recorrentes publicado no diário, Hoje Macau, de 26 de Março de 2018, que determina no seu n°2; "Sendo as escadas, corredores comuns e terraço do edifício considerados caminhos de evacuação, devem os mesmos conservar-se permanentemente desobstruídos e desimpedidos, de acordo com o disposto no no4 do artigo 10° do RSCI, aprovado pelo Decreto-Lei n° 24/95/M, de 9 de Junho. As alterações introduzidas pelos infractores (RR da fracção 3 B) nos referidos espaços, descritas no n° 1 do presente edital, contrariam a função desses espaços enquanto caminhos de evacuação e comprometem a segurança de pessoas e bens. Em caso de incêndio.
Assim a obras ilegais executadas não são susceptíveis de legalização, pelo que a DSSOPT terá necessariamente de determinar a sua demolição a fim de ser reintegrada a legalidade urbanística violada."
XXXIV - Por esse Edital, os RR do 3° andar estão intimados, sob pena de crime de desobediência, a manter desobstruídas e desimpedidas as 2 portas de acesso ao terraço de cobertura (para o qual as fracções dos RR não têm acesso directo, por falta de destinação objectiva, e acedem pelas escadas como os restantes condóminos) para livre acesso e circulação a todos os condóminos ou utentes do [Edifício(1)], no âmbito do Regulamento de Prevenção contra Incêndios, acima referido.
XXXV - O douto Acordão recorrido estava adstrito a retirar as consequências do facto preclusivo dos RR não terem provado que sofriam prejuízo pelo facto do A./recorrente ou qualquer outro condómino poder usufruir de uma utilidade comum do terraço de cobertura, para aí exercer o direito, que lhe é conferido pelo Regulamento do Condomínio do [Edifício(1)], direito actualmente reforçado pelo n°1 do artigo 16° da Lei n°14/2017, para aí instalar os seus aparelhos exteriores de ar condicionado, e não tinha razões para ordenar a remessa dos autos para reapreciação pelo TJB, pois neles estavam contidas as provas necessárias para o reconhecimento do direito peticionado pelo A./Recorrente, pelo que omitiu pronúncia sobre factos que devia conhecer, estando ainda os fundamentos do acordão do V. Tribunal a quo, em contradição com a decisão proferida no mesmo, pelo que é nulo por violação do disposto no n°1, alínea c) e d) do artigo 571° do Código do Processo Civil e ainda por violação e errada aplicação das normas substantivas, constantes do artigo 335° n°1 do Código Civil.
E, nestes termos e nos mais de direito que V. Exas doutamente suprirão, deve o presente recurso ter integral provimento, reconhecendo o direito do A. peticionado na PI, estando o Venerando TUI habilitado a decidir, sem remessa dos autos para o Tribunal de Primeira Instância, revogando o Acordão recorrido, substituindo-o por outro que dê provimento integral ao pedido do A./Recorrente”; (cfr., fls. 399 a 437).

Pois bem, se bem ajuizamos, com o seu “recurso subordinado” impugna o A. a “totalidade” da decisão do Tribunal de Segunda Instância, nela se incluindo a parte em que o recurso foi “parcialmente procedente”, (“parte do pedido contido na alínea b da petição inicial”), pois que se entende que o Tribunal possuía todos os elementos para proferir uma decisão de mérito, (sem qualquer necessidade de remessa dos autos ao Tribunal Judicial de Base).

Imputa-se, também, ao Acórdão recorrido, os vícios de “nulidade por omissão de pronúncia” e “contradição entre os fundamentos e a decisão”, vícios que se alegam, (essencialmente), em virtude de se entender que o Regulamento de Condomínio acautelar as “3 situações hipotéticas” descritas no Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, a saber, as “inovações”, as “duas de reparações indispensáveis ou urgentes”, e as “benfeitorias necessárias ou úteis”; (cfr., Ac. recorrido, a fls. 299 a 300-v), nada obstando assim as “obras” que o A., ora recorrente, queria efectuar.

Cumulativamente ainda, considera-se existir uma “violação do art. 335° do C.C.M.”, porque, supostamente, o Tribunal de Segunda Instância teria feito impender sobre o A. a alegação de matéria factual que, afinal, deveria ser alegada e provada pelos RR..

Ponderada toda a decisão recorrida, (aqui se incluindo o aí consignado e considerado sobre as ditas “3 situações hipotéticas”), e reflectindo sobre o que nas (transcritas) “conclusões” de recurso vem referido, passa-se a decidir, adiantando-se, desde já, que não se nos mostra de reconhecer razão ao ora recorrente, apresentando-se-nos, pois, que o presente “recurso subordinado” não prospera.

Passa-se a (tentar) expor este nosso ponto de vista.

Vejamos.

Diz o A. que apenas o art. 5°, n.° 1 do Regulamento de Condomínio se deve ter por “não escrito”, mantendo-se em vigor todas as demais normas do mesmo, nomeadamente, a que prevê a instalação das unidades externas de ar condicionado no terraço de cobertura (de uso exclusivo dos RR.), sustentando, que nada mais lhe caberia provar, pois que as “três situações” (de facto) descritas pelo Tribunal de Segunda Instância estão previstas e acauteladas pelo Regulamento.

Assim, antes de se examinar do (eventual) enquadramento da situação do A. em alguma das aludidas “situações hipotéticas” referidas pelo Tribunal de Segunda Instância, cumpre – agora – apreciar da “validade do Regulamento de Condomínio”, (e que atrás se referiu que mais adiante o viríamos a fazer).

Antes, porém – e para boa e cabal compreensão das (verdadeiras) razões do presente litígio – cabe sublinhar que (toda) a acção pelo A. proposta assenta num alegado “direito de instalação de unidades externas de ar condicionado” que, tal como afirma, legalmente lhe assiste, (nos termos do dito Regulamento de Condomínio, do C.C.M. e da Lei n.° 14/2017; cfr., art°s 8° e 9° da petição inicial).

E, assim, importa desde já referir – novamente – que o Tribunal de Segunda Instância não alterou a decisão do Tribunal Judicial de Base que deu como procedente a “excepção peremptória” quanto à nulidade do art. 5° do Regulamento de Condomínio, designadamente no que concerne aos respectivos n°s 1 e 4 por “violação do direito de uso exclusivo dos RR.”, cabendo, igualmente, notar que, não obstante a “qualificação da questão do litígio” dos autos como sendo uma (mera) questão de “uso” ou “utilização” do terraço, a verdade é que o art. 5°, n.° 4 do dito Regulamento contém uma norma que remete para a “realização de inovações”; (cfr., anterior art. 1334° do C.C.M. e, actualmente, previstas no art. 14° da Lei n.° 14/2017).

Com efeito, é dito na mencionada norma do n.° 4 do art. 5° do Regulamento que:

“4. Equipamentos de ar condicionado “
a) As unidades exteriores de ar condicionado serão instaladas na cobertura de acordo com a seguinte disposição: (…)”; (cfr., “ponto 6 da matéria de facto assente”, com sub. nosso).

Ora, tem-se entendido que “O termo “inovação” convoca a ideia de uma mudança, de uma novidade num domínio específico, de uma actualização, modernização ou renovação, ou seja, é algo de dinâmico em contraposição a estático, de tal modo que a coisa deixou de ser o que era e passou a ser diferente, supostamente melhor. Aplicado este conceito às partes comuns de um edifício submetido ao regime da propriedade horizontal, dir-se-á que é inovadora toda a obra da qual resulte uma alteração quer material, de forma ou de substância, quer quanto à afectação ou destino, nomeadamente económico, de uma qualquer parte comum, tal como constava da concepção originária do prédio e existia à data da emissão da licença de utilização, que serviu de base à constituição da propriedade horizontal”; (cfr., v.g., Abílio Neto in, “Manual da Propriedade Horizontal”, 4ª ed., pág. 365).

Sobre a matéria, assim se pronunciou também o S.T.J. de Portugal em Acórdão de 01.06.2010, (Proc. n.° 95/2000, aqui citado como mera referência):

“(…) Por sua vez, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria de condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio – art. 1425, nº1.
As inovações a que este preceito se refere respeitam às que são introduzidas nas partes comuns de um edifício em propriedade horizontal, não sendo aplicável às inovações introduzidas nas fracções pertença exclusiva dos condóminos. (…)”; (sendo, ainda, de salientar que o anterior art. 1334°, n.° 3, do C.C.M., dispunha que “Não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, das coisas próprias ou das coisas comuns”).

Mais recentemente, (citando Aragão Seia in, “Propriedade Horizontal”, pág. 135), considerou-se também no Acórdão do S.T.J. de 22.02.2017, Proc. n.° 2064/10 que: “são inovações apenas as obras que trazem algo de novo em benefício das coisas comuns já existentes, ou que as melhoram e, ainda, as que levam ao seu desaparecimento ou a modificações do seu uso”, e que, porém, segundo o mesmo autor, “Estas obras não podem prejudicar a utilização, por parte de qualquer condómino, tanto das coisas próprias como das coisas comuns. Mas mesmo que a parte comum esteja afecta ao uso exclusivo de um condómino, como um terraço de cobertura, por exemplo, ele não poderá efectuar aí qualquer construção sem autorização de todos os outros, nos termos legais.
Qualquer alteração que um condómino pretenda introduzir nas partes comuns para benefício da sua fração terá de obter a aprovação das entidades legais e o acordo de todos os condóminos para alteração do título constitutivo – artigo 1419.º”.

Ora, considerando o assim exposto, (e independentemente do demais, especialmente, e como já se referiu, que o Tribunal de Segunda Instância não alterou a decisão no que concerne à procedência da excepção peremptória invocada pelos RR.), mostra-se ainda adequado consignar que tem-se entendido que, “O n.° 3 do art. 1421°, estabelece que o título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um dos condóminos certas zonas de partes comuns. A lei refere-se aqui a uma afectação em termos de um direito de gozo que não o direito de propriedade.
(…)
A afectação no título constitutivo terá de ser respeitada enquanto estatuto da coisa e resulta como direito real de uso. Se o título atribuir a algum ou a alguns condóminos direitos especiais de uso sobre determinadas partes comuns, não poderão estes direitos ser suprimidos ou coarctados pela assembleia. A sua força vinculativa decorre da natureza real do título, sem prejuízo de, por unanimidade, as partes acordarem na sua modificação. (…)”; (cfr., v.g., Sandra Passinhas in, “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2ª ed., pág. 49 a 51).

Dest’arte, bastante evidente resulta, segundo cremos, que o “direito de uso exclusivo de parte comum” reporta-se a “(…) um direito especial, pelo que não pode impor-se a um condómino uma deliberação que o prive dum direito que adquiriu por força do título donde promanou o direito de propriedade sobre a sua parte privativa”, (cfr., v.g., Mota Pinto in, “Direitos Reais”, Lições publicadas por Álvaro Moreira e Carlos Fraga, Coimbra, 1972, pág. 116, apud Sandra Passinhas in, ob. cit., pág. 50), não se podendo assim concordar com o A., ora recorrente, que considera que o n.° 4 do art. 5° do Regulamento de Condomínio não padece de nulidade, pois que o aí preceituado “colide”, “afecta” e “priva”, manifestamente, o direito ao “uso exclusivo” dos RR., sem que para tanto se tenha obtido o (necessário) consentimento expresso dos mesmos, conforme exigia o art. 1350°, n.° 1, al. c) do C.C.M., vigente à data da realização da referida Assembleia, (cabendo também consignar que a “questão” não deve ser colocada – como parece pretender o recorrente – numa dicotomia onde “prevalece a propriedade comum sobre o direito de uso exclusivo”, já que, em boa verdade, ambos estes direitos operam, ou podem operar, em “patamares distintos”, só assim se compreendendo como é que uma “parte comum” pode ser de “uso exclusivo” de um dos “comproprietários”).

Não se olvida também que defende o A., ora recorrente, que a medida aprovada no Regulamento de Condomínio, (cfr., art. 5°, n.° 4), não estava sujeita ao consenso ou à liberdade de decisão dos proprietários das fracções, porque a Planta de Alinhamento Oficial do referido prédio n.° 22 do [Rua(2)] “inscreve-se no Plano da [Rua(3)] onde os edifícios devem prever soluções para instalação de aparelhos de ar condicionado de forma a não exporem esses aparelhos na via pública (…)”; (cfr., art. 14° da petição inicial).

Porém, sem prejuízo do muito respeito por melhor opinião, cremos que se joga com meras aparências e artifícios linguísticos, pois que nem a dita “Planta de Alinhamento Oficial” nem o “Plano da [Rua(3)]” impõem a instalação de aparelhos de ar condicionado no “terraço do Prédio n.° 22 do [Rua(2)]”, nem, por outro lado, proíbem a sua instalação em fachadas que confrontem com a via pública, estabelecendo, tão só, que os mesmos “não devem estar expostos”…

Não está assim em causa uma “imposição” de qualquer autoridade administrativa, mas, antes, uma justificação pelo A., ora recorrente, considerada para a aprovação do Regulamento de Condomínio nos termos em que ocorreu, sem observar, (como se referiu), a (necessária) “maioria qualificada” prevista no art. 1334° do C.C.M. exigida para a realização de “inovações” nas partes comuns do prédio, (e a impossibilidade de realizar “inovações” que prejudicam a utilização das partes comuns por parte de outros condóminos).

Como se retira da própria petição inicial, a “causa de pedir” resulta do art. 5°, n.° 4 do Regulamento de Condomínio que, no entendimento do A., permite a instalação de unidades externas de ar condicionado no terraço; (cfr., art°s 29° a 32° da petição inicial).

Sucede, porém, que, no seguimento do que se vem a expor, assim como do teor do art. 1350°, n.° 1, al c) e d) do C.C.M. (vigente à data), não podia o mesmo A., por sua vontade, aprovar – unilateralmente – um Regulamento de Condomínio com normas que aprovam “inovações” sem as maiorias qualificadas exigidas e que prevêem a utilização do terraço para funções laterais e secundárias que põem em causa o direito de uso exclusivo de outros condóminos, (cfr., art. 1334°, n.° 3 do C.C.M., aplicável à data, não se podendo esquecer que em causa está um “direito especial” que foi concedido pelo “título constitutivo da propriedade horizontal”).

Aqui chegados, cremos pois que não se pode acompanhar o Tribunal de Segunda Instância quando considera que “(…) se o Regulamento prevê a instalação dos aparelhos de ar condicionado no terraço de cobertura, não se vê como possa ele facilmente ser contrariado”.

De facto, e como se deixou exposto, são (efectivamente) “nulas” as normas dos n°s 1 e 4 do art. 5° do Regulamento de Condomínio, (por violação das alíneas c) e d) do n.° 1 do art. 1350°, bem como da norma do art. 1334°, n.° 3, todos do C.C.M.), pelo que, como evidente se mostra, não constituem “fonte legal” de qualquer “direito”, não podendo também ser invocadas para efeitos de qualquer tipo de “pretensão” nelas previstas.

Apresenta-se-nos, assim, claro, que nem o “Regulamento de Condomínio” nem as regras – à época – previstas no C.C.M. concediam ao A. qualquer direito, geral e abstracto, “ao uso do terraço de cobertura para fins de utilidade comum, nomeadamente para colocação das unidades externas de ar condicionado”, (pedido formulado sob a “alínea a” da petição inicial), ou ao “livre acesso à parte comum do edifício, constituída pelo terraço de cobertura”, (pedido formulado sob a “alínea b” da petição inicial).

E, nesta conformidade, evidente se apresentando também que a pretensão de “colocação de unidade externas de ar condicionado” não constituem nenhuma das “3 situações hipotéticas” descritas no Acórdão recorrido – ou seja, “inovações”, obras de “reparações indispensáveis ou urgentes”, ou qualquer “benfeitoria necessária ou útil” – visto cremos estar que nem o regime anteriormente previsto no C.C.M., nem a Lei n.° 14/2017 acomodam qualquer direito à pretendida instalação das ditas unidades no terraço de cobertura, (pois que não se pode confundir o caso dos autos com nenhuma das aludidas “situações” descritas no Acórdão recorrido).

Dest’arte, forçoso é concluir pela (total) “inconcludência jurídica” dos pedidos quanto aos supostos direitos de “uso de parte comum para fins de utilidade comum” e de “livre acesso ao terraço de cobertura”; (cfr., os pedidos deduzidos nas “alíneas a e b” da petição inicial, o que, implica, também, a necessária improcedência do pedido deduzido “na alínea c”).

Por sua vez, e pelos mesmos motivos, não se mostra igualmente de reconhecer qualquer razão ao ora recorrente quando considera que o “Tribunal a quo não conheceu de factos provados por documento, que devia conhecer”, e que violou “as regras da prova constantes do artigo 335.°, n.° 1, do Código Civil”, porque, efectivamente, a matéria pelo mesmo alegada é “manifestamente insuficiente” para ultrapassar as “objecções jurídicas” que se deixaram explicitadas, não estando em causa qualquer “desrespeito pelo ónus de alegação e prova de qualquer facto”.

Na verdade, é a própria “versão dos factos” apresentada que afasta o seu possível enquadramento nas referidas “três situações”, em causa não estando qualquer “matéria de facto”, inexistindo também qualquer “violação do art. 335° do C.C.M.”, (o mesmo sucedendo com qualquer nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, nem omissão de pronúncia, vícios estes próprios das sentenças, e que não se confundem com a mera “discordância da decisão”).

Finalmente, quanto à desnecessidade de remessa dos autos ao Tribunal Judicial de Base para apuramento da matéria de facto em relação à segunda parte do pedido da “alínea b” da petição inicial, valem as considerações que atrás se teve oportunidade de fazer sobre o recurso da 2ª R., pois que, é o próprio A. que confessa na sua réplica, (no seu art. 24°, e também no recurso para o Tribunal de Segunda Instância), que, “actualmente, não existe qualquer elemento de obstrução no acesso ao terraço”.

Apreciadas que assim se nos apresentam ter ficado todas as questões colocadas na presente lide recursória, cumpre decidir como segue.

Decisão

4. Em face do que se deixou exposto, em conferência, acordam:
1) negar provimento ao recurso (principal) dos (1os) RR. B e C;
2) conceder parcial provimento ao recurso (principal) em que são recorrentes a (2ª) R. D, por si, e pelos (3° e 4°) RR., E e F, revogando-se o Acórdão recorrido na parte que determinou devolução dos autos ao Tribunal Judicial de Base para prosseguimento e nova decisão; e,
3) negar provimento ao recurso (subordinado) do A., A.

Custas pelos recorrentes na proporção dos seus decaimentos.

Registe e notifique.

Macau, aos 27 de Julho de 2022


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei
Proc. 37/2020 Pág. 24

Proc. 37/2020 Pág. 25