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ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA
DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
   
   
Recurso em processo penal
Processo n.º 14/2000

Recorrente: A
Tribunal recorrido: Tribunal de Segunda Instância


   I. RELATÓRIO
   1.1. A, com os sinais dos autos;
   Acusado inicialmente pelo Ministério Público pela prática de:
   - um crime de associação ou sociedade secreta p. e p. pelos arts. 2.º, n.os 1, 2 e 3, com referência ao art.º 1.º, alíneas d), j), l) e v), da Lei n.º 6/97/M, de 30 de Julho;
   - um crime de uso de documento de especial valor falsificado p. e p. pelas disposições combinadas dos arts. 244.º, n.º 1, al. c), e 245.º do Código Penal de Macau (CP);
   - um crime de importação de arma proibida, p. e p. pelo art.º 262.º, n.º 1, do CP, com referência aos arts. 11.º, alínea a), e 8.º, § único, alínea a), do Diploma Legislativo n.º 21/73, de 19 de Maio, na redacção introduzida a este último preceito pelo Decreto-Lei n.º 23/80/M, de 2 de Maio;
   - um crime de conversão de bens ou produtos ilícitos, p. e p. pelo art.º 10.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 6/97/M, de 30 de Julho; e
   - um crime de preparação de explosão, p. e p. pelos arts. 266.º e 264.º, n.º 1, al. b), do CP;
   (cfr. a acusação pública de 31 de Maio de 1999, a fls. 6112 a 6192);
   
   Posteriormente julgado presencialmente pelo Tribunal Colectivo competente do 6.º Juízo do então Tribunal de Competência Genérica como 1.º arguido no âmbito do Processo Penal Comum Colectivo n.º 618/99, em conjunto com os restantes 21 arguidos do mesmo processo (alguns deles à revelia, a saber: o 2.º arguido B, o 3.º arguido C, o 4.º D, o 5.º E, o 6.º F, o 7.º G, o 8.º H, o 9.º I, o 10.º J, o 11.º K, o 12.º L, o 13.º M, o 14.º N, o 15.º O, o 16.º P, a 17.ª arguida Q, a 18.ª R, o 19.º S, o 20.º T, o 21.º U e o 22.º V);
   
   E afinal vindo condenado em primeira instância por acórdão proferido em 25 de Novembro de 1999, pela prática de:
   - um crime de importação de arma proibida, p. e p. pelo art.º 262.º, n.º 1, do CP, com referência aos arts. 11.º, alínea a), e 8.º, § único, alínea a), do Diploma Legislativo n.º 21/73, na redacção introduzida a este último preceito pelo Decreto-Lei n.º 23/80/M, na pena de 3 (três) anos de prisão;
   - um crime de exercício de funções de chefia de associação ou sociedade secreta, p. e p. pelo art.º 2.º, n.º 3, da Lei n.º 6/97/M, na pena de 10 (dez) anos de prisão;
   - em cúmulo jurídico, na pena única de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de prisão;
   - com declaração da perda a favor do Território do veículo automóvel de matrícula MF-XX-XX registado em nome dele, e respectivos acessórios, e da pistola semi-automática de calibre 9mm [Marca X], examinada de fls. 6078 a 6087;
   - para além da condenação em custas, com 5 UC de taxa de justiça individual (cfr. o acórdão da Primeira Instância a fls. 7503 a 7632);
   
   E após ter visto o recurso então por ele interposto desse aresto da Primeira Instância rejeitado por acórdão proferido a fls. 7955 a 7996, em 2 de Junho de 2000, pelo Tribunal de Segunda Instância (no âmbito dos autos de Recurso em Processo Penal desse Tribunal n.º 36/2000);
   
   Veio afinal recorrer agora deste veredicto da Segunda Instância para este Tribunal, para tal concluiu na sua motivação de recurso a fls. 8121 a 8152, de seguinte maneira:
   “(...)
   a) A rejeição de um recurso resulta de uma simplificação da análise do objecto do mesmo feita pelo Tribunal “ad quem”, determinada por razões de economia processual.
   b) O acórdão em apreço, reiterando a matéria de facto provada e não provada, tomou conhecimento de todos os recursos, nomeadamente do então interposto pelo ora requerente, rebatendo, ponto por ponto, o respectivo objecto e, a final, rejeitando-os.
   c) Se o recurso é para rejeitar não se conhece o seu objecto porque, para conhecer do mesmo, há que passar obrigatoriamente à fase de audiência.
   d) Nesta audiência (artigo 414.º do C.P.P.), à qual se aplicam subsidiariamente as regras da audiência de julgamento em 1.ª instância, poderia o recorrente expor e requerer o que tivesse por conveniente, a bem da sua defesa, alegando factos e contraditando posições, em suma, procedendo de uma forma oral, directa e pública à defesa dos factos alegados na sua motivação de recurso.
   Mostra-se violado o princípio do contraditório, previsto nas disposições conjugadas dos arts. 414.º, n.º 5, e 283.º do CPP.
   e) No recurso oportunamente interposto e motivado para o Tribunal de Segunda Instância o recorrente afirmou expressamente que tal decisão estava assente em factos insuficientes e que a motivação do Tribunal havia sido insuficiente.
   f) Perante aquela motivação que, passo a passo, se rebateu e perante a matéria de facto assente nunca poderia o Tribunal de primeira instância concluir que o recorrente havia integrado a sociedade secreta em causa e, muito menos, que nela exercia funções de chefia.
   g) Não está o recorrente, ao contrário do que afirma o acórdão em apreço, “a pôr em causa a livre convicção dos julgadores.” O que afirmou, diversamente, é que os factos provados, elencados a fls. 75 a 77 do acórdão ora recorrido, são insuficientes para permitir a decisão de direito, necessitando de ser completados.
   h) E disse, ainda, que os factos assentes que basearam a decisão de pertença do recorrente à sociedade secreta “X” não tinham a devida motivação por parte do Tribunal “a quo”; e que, o que se lhe afigurava inaceitável, era que dos mesmos factos se pudesse concluir que o recorrente, à data da sua prisão, exercesse funções de chefia naquela sociedade secreta.
   i) Chefiar é dirigir; é comandar; é ter o poder de dar ordens ou instruções determinando aos chefiados (ou comandados) a adopção de condutas dirigidas à prossecução de uma ou mais finalidades (no caso em apreço, finalidades criminosas).
   j) Chefiar uma associação secreta é um conceito de direito definido no n.º 3 do art.º 2.º da dita Lei.
   k) Mas, também, expressamente invocou o então recorrente manifesta contradição entre os factos provados e os não provados e, mesmo, contradição entre os factos não provados. Contradições essas que, no seu entender, seriam insanáveis, comprometendo definitivamente uma decisão racional.
   l) SE a sociedade secreta X é uma organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas; SE o recorrente a integrou, MAS não se concertou com outros indivíduos da “X”, NEM se associou para a prática de fins ilícitos; RESPONDA-SE, então, de forma clara: HÁ ou NÃO contradição insanável entre a matéria de facto provada e a não provada?
   m) Os factos provados e os não provados contêm contradições, que não passam despercebidas ao comum dos observadores e que, conjugadas com as regras de experiência, motivaram, salvo o devido respeito, uma decisão ilógica.
   n) Pelo exposto, entende o recorrente que, resultando do próprio texto da decisão recorrida, existe uma incorrecta motivação no que toca à sua condenação por um crime de pertença a sociedade secreta; existe uma manifesta insuficiência de factos provados para justificar a decisão assumida, pelo menos, no que à condenação do recorrente por um crime de chefia de sociedade secreta concerne; e que existe contradição insanável entre a matéria de facto provada e a não provada e, mesmo, contradição insanável dentro da matéria de facto não provada, o que, tudo conjugado com as regras de experiência, motivaram uma decisão ilógica, o que é fundamento de recurso (art.º 400.º, n.º 2, als. a) e b), do CPP).
   o) O Tribunal de Última Instância pode considerar que a matéria de facto deve ser ampliada para fundamentar a decisão de direito ou que ocorrem contradições na decisão de facto que inviabilizam a decisão de direito, mandando, nestes casos, julgar novamente a causa no Tribunal de Segunda Instância (art.º 650.º do CPC).
   p) Deverá, pois, o Tribunal de Última Instância analisar, nos termos a que supra se referiu, a matéria de facto e concluir que a mesma é insuficiente e está ferida de contradições que impossibilitariam a condenação do recorrente pela prática de um crime de pertença a sociedade secreta e, muito menos, pela sua incriminação pela chefia desta sociedade secreta, como consta do n.º 3 do art.º 2.º da Lei n.º 6/97/M.
   Mostram-se violadas as normas da citada Lei n.º 6/97/M, mais concretamente, esta última referida e as previstas nos art.º 1.º n.º 1 e 2.º n.os 1 e 2.
   q) O acórdão recorrido deu como provado que o arguido recorrente importou de Espanha, em 12/6/98, uma arma proibida.
   Contudo, e salvo o devido respeito, erradamente, porquanto, ficou patente nos autos e no decurso da audiência que a arma em causa não chegou a ser levantada pelo recorrente na fronteira aduaneira do Aeroporto Internacional de Macau.
   r) Só é punido pelo crime de importação de arma proibida quem, mesmo que a não detenha, possa vir a detê-la; possa vir a dispor dela.
   Ora, a arma proibida dos autos nunca esteve à disposição do recorrente, o qual foi condenado por um crime – não obstante tratar-se de crime de perigo comum – cuja execução nunca poderia ter sido consumada; por impossível.
   Mostra-se aqui violada a norma expressa no art.º 262.º n.º 1 do C.Penal.
   s) Ainda, o acórdão recorrido decretou a perda do veículo automóvel de matrícula MF-XX-XX registado em nome do recorrente e a ele pertencente, pois, este veículo terá sido utilizado na sua actividade de chefia da sociedade X.
   t) Concluiu-se que o veículo automóvel do recorrente foi equipado com uma câmara de filmar e uma televisão “[Marca X]”.
   Trata-se de um acessório do automóvel que o recorrente terá utilizado na prática de um crime.
   u) Era este equipamento (câmara de filmar e televisão) e não o veículo automóvel que permitia, nos termos do acórdão, “captar imagens passadas na retaguarda do automóvel” “vigiar e controlar veículos, agentes das forças de segurança e outras pessoas”.
   v) Em processo penal, o confisco de bens pode ser decretado apenas quanto aos instrumentos, produtos e vantagens do crime, dado que são só estes os casos previstos na lei (art.º 101.º n.º 1 do C.P.).
   w) Quanto aos instrumentos do crime – é disto que tratará o acórdão – o confisco exige que estes sejam em si perigosos, ou seja, intrinsecamente aptos à criminalidade.
   x) Entende o recorrente que o equipamento em causa não era apto à finalidade que se indicou no acórdão recorrido.
   Mas, mesmo que o fosse, o que se admite sem conceder, seria o equipamento de filmar e a televisão que se adequariam àquela finalidade e não o veículo em si.
   y) O equipamento em causa é um acessório do automóvel confiscado, dele perfeitamente destacável, pelo que, salvo melhor opinião, o confisco, a proceder eventualmente, deveria incidir sobre aquele equipamento e não sobre o automóvel (com o equipamento).”
   
   Tendo pedido a final que em provimento do recurso:
   - seja absolvido do crime de importação de arma proibida, p. e p. pelo art.º 262.º, n.º 1, do CP;
   - mais seja revogada a decisão que decretou o confisco de bens dele ou apenas aquela que decretou a perda a favor do Território do veículo automóvel MF-XX-XX;
   - e finalmente, seja mandado julgar novamente a causa no Tribunal de Segunda Instância quanto ao crime de chefia de sociedade secreta (nos termos do art.º 650.º do CPC, aplicável por força do art.º 4.º do CPP), fixando logo o regime jurídico aplicável ao caso (por opinando ele – no esclarecimento posteriormente apresentado a fls. 8204 acerca do alcance do seu pedido no recurso – que face à cindibilidade dos recursos em matéria penal, as duas outras questões suscitadas relativamente ao crime de importação de arma proibida e ao confisco de bens, como puramente questões de direito, poderiam já ser apreciadas por este Tribunal).
   
   1.2. Contramotivou a fls. 8154 a 8160 o Digno Magistrado do Ministério Público junto da Segunda Instância, pugnando pela rejeição do recurso por manifesta improcedência, para tal concluiu que:
   “(...)
   1 – O douto Acórdão ora em recurso, para além da mera transcrição dos factos dados como provados e não provados na decisão da 1.ª Instância e das alegações do Recorrente, limita-se a uma análise meramente perfunctória de cada uma das questões levantadas, com a especificação sumária dos fundamentos de tal decisão, nos estritos termos do previsto no n.º 3 do art.º 410.º do C.P.P.
   2 – Essa análise não sofre qualquer contestação, já que os factos dados como provados em 1.ª Instância não são susceptíveis de alteração pelo Tribunal de 2.ª Instância quando não exista documentação das provas produzidas na audiência.
   3 – Sendo certo que a indagação sobre a verificação dos vícios previstos no n.º 2 do art.º 400.º do C.P.P. exige que os mesmos resultem dos elementos constantes dos autos, por si só, ou conjugados com as regras de experiência comum.
   4 – Ao apontar à decisão da 1.ª Instância vícios de contradição insanável da fundamentação, erro notório na apreciação da prova e insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito, o Recorrente mais não pretendeu que pôr em causa a livre convicção dos julgadores.
   5 – A falta de fundamento do recurso interposto pelo Recorrente da decisão da 1.ª instância é, pois, clara e notória, bem tendo agido o tribunal “a quo” ao rejeitá-lo por manifesta improcedência, o que, em nosso critério, deverá acontecer também neste Tribunal.”
   
   1.3. Nesta Instância, e em sede de vista dada a fls. 8176, o Digno Representante do Ministério Público aderiu-se às considerações já aduzidas na contramotivação acima referida, opinando que o acórdão ora recorrido se mostrava suficiente e correcta.
   
   1.4. Feito o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir agora do recurso sub judice.
   *
   * *
   II. DOS FACTOS
   A matéria de facto fixada pela Primeira Instância, e não alterada pela Segunda Instância, é a seguinte:
   Julgaram-se provados os seguintes factos:
   Desde há vários anos que existe em Macau uma sociedade secreta denominada "X", organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas, particularmente praticando crimes de homicídio, sequestro, rapto, ameaça, coacção, extorsão, a pretexto ou não de protecção, usura criminosa, entre outros.
   O modelo organizacional desta sociedade estrutura-se em torno de um líder ou líderes, sendo estes conhecidos por chefes de primeira linha.
   A relação com os líderes é sustentada através do cumprimento rigoroso de códigos de honra e lealdade, acautelados com o recurso a sistemas punitivos de auto-protecção que quase sempre envolvem crimes de sangue.
   No território de Macau, a sociedade clandestina referida é constituída por facções, grupos e subgrupos, com uma estrutura hierárquica complexa que se inicia nos denominados soldados/cavalos, passa pelos soldados principais, depois pelos membros de direcção (chefes de 2.ª linha, chefes de grupos operacionais) e acaba no chefe ou chefes de primeira linha.
   Esta cadeia hierárquica não é fixa pois um soldado principal pode estar subordinado a um membro de direcção e ao mesmo tempo, ser chefe de soldados/ cavalos.
   Os 1.º e 6.º arguidos A e F, passaram a integrar a referida sociedade secreta denominada "X", em datas não concretamente apuradas, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, o arguido A exercia funções de chefia e o arguido F, no decurso do ano de 1995, era membro da mesma.
   Visavam obter rendimentos económicos com a sua pertença à referida sociedade.
   Y era reconhecido como chefe máximo da "X", pelo arguido A.
   A íntima amizade entre os dois data dos anos oitenta e manteve-se até ao presente, encontrando-se frequentemente os dois em sítios públicos e em locais reservados, designadamente em casa de Y.
   O arguido A foi funcionário da Polícia Judiciária desde 1966 até 1996, onde ingressou como servente, sendo Investigador há mais de vinte anos.
   Na conversa telefónica registada às 13.17 horas do dia 19/3/99, entre os arguidos A e M, o primeiro dá instruções ao segundo para bater num determinado indivíduo.
   O arguido A esteve em diversas ocasiões, designadamente com Y, na [Discoteca (1)], no concerto musical de Andy Lau em 13/11/96, patrocinado por Y.
   Esteve presente na festa de aniversário de Y que se realizou no "Restaurante" em 29/7/96, inicialmente esteve para efectuar uma viagem à Tailândia (Bangkok) com outros arguidos, num voo da Air Macau de 3/9/96, mas num último momento desistiu.
   E, enquanto elemento da Polícia Judiciária, até 1996, serviu-se desse facto para dar cobertura a actividades ilícitas, chegando mesmo a omitir os deveres do seu cargo para deixar fugir indivíduo conotado com aquela sociedade secreta, em 26/2/96, na sequência da detenção de AA, conhecido por "Z", na [Sala VIP (1)] do Casino [Hotel (1)], conotado como pertencendo a tal sociedade secreta.
   Na verdade, naquele dia, o referido indivíduo foi detido no Casino [Hotel (1)] por um inspector da Direcção de Inspecção e Contrato de Jogos (DICJ), por estar proibido de entrar nos Casinos, tendo injuriado o referido inspector.
   O arguido A conduziu-o ao Posto da PJ no Casino.
   Durante a madrugada, o arguido foi contactado por várias pessoas das relações do detido, tendo recebido dinheiro de uma delas, AB, conotado como pertencendo a tal sociedade secreta.
   Mais tarde, o arguido libertou o detido sem para tal estar autorizado por ninguém.
   Por causa destes factos foi-lhe instaurado processo disciplinar, que terminou com a aplicação de pena disciplinar de aposentação compulsiva.
   O arguido B é o sócio principal da [Discoteca (2)], um dos locais onde se encontram membros da "X".
   Esteve presente na festa de aniversário de Y que se realizou no "Restaurante" em 29/7/96, e efectuou uma viagem à Tailândia (Bangkok) com outros arguidos, num voo da Air Macau de 3/9/96.
   O arguido F em 1995 era membro da "X" e é sócio da [Discoteca (2)].
   Esteve presente nos concertos musicais de Jackie Cheung que se realizou no Forum de Macau, em 28/6/96 e de Andy Lau em 13/11/96, patrocinados por Y e na festa de aniversário deste em 29/7/96.
   O arguido I foi acusado no processo n.º 504/97 (IP), em co-autoria, com Y e com os arguidos L e G pela prática de factos ocorridos em 26 e 27/10/96, no Casino [Hotel (1)], consubstanciadores de crimes de coacção.
   Neste processo, por sentença de 29.4.99, todos os arguidos foram absolvidos.
   O arguido G foi acusado no processo n.º 504/97 (IP), em co-autoria, com Y e com os arguidos L e I pela prática de factos ocorridos, em 26 e 27/10/96, no Casino [Hotel (1)], consubstanciadores de crimes de coacção.
   O arguido C esteve presente no concerto musical de Jackie Cheung que se realizou no Forum de Macau, em 28/6/96, patrocinado por Y e na festa de aniversário deste em 29/7/96.
   Explora duas oficinas de automóveis no Território de Macau, sendo uma delas a AC.
   O arguido H é amigo de Y.
   Esteve presente na festa no Aniversário de Y que se realizou no "Restaurante", em 29/7/96, e efectuou uma viagem à Tailândia (Bangkok) com outros arguidos, num voo da Air Macau de 3/9/96.
   Em 28/3/97 estava na [Discoteca (3)], convivendo com os 2.º e 6.º arguidos.
   Ainda como funcionário da Polícia Judiciária, na noite de 29 para 30/4/97, estava juntamente com o 5.º arguido no parque de estacionamento do [Hotel (2)].
   O arguido L está proibido de frequentar os casinos do território pelo período de 10 anos a contar de 7/10/92, de acordo com lista da SICG.
   Foi acusado no processo n.º 504/97 (IP), em co-autoria, com Y e com os arguidos G e I pela prática de factos ocorridos, em 26 e 27/10/96, no interior do Casino [Hotel (1)], consubstanciadores de crimes de coacção.
   O arguido D esteve presente, no concerto musical de Andy Lau em 13/11/96, patrocinado por Y e na festa de aniversário deste em 29/7/96.
   O arguido E efectuou uma viagem à Tailândia (Bangkok) com outros arguidos, num voo da Air Macau de 3/9/96.
   O arguido A importou de Espanha, em 12-6-98, uma pistola semi-automática, com 6 estrias, de calibre 9mm [Marca X], examinada de fls. 6078 a 6087.
   O arguido N detinha também uma pistola, de marca "X", de calibre .32ACP examinada a fls. 4283 a 4290.
   O veículo automóvel de matrícula MF-XX-XX registado em nome do arguido A e a ele pertencente, já após ter deixado de exercer funções na Polícia Judiciária, estava equipado com uma câmara de filmar e uma televisão "Marca X", servindo este equipamento para captar imagens passadas na retaguarda do referido automóvel de modo a que pudessem ser vigiados e controlados veículos, agentes das forças de segurança ou quaisquer outras pessoas, sendo assim utilizado na sua actividade de chefia da sociedade X.
   Tal equipamento foi apreendido a fls. 845 e examinado a fls. 2084/2085.
   Ao arguido M, em 19/3/99, foi apreendida uma carta de condução de veículos automóveis (cfr. 2428) que este utilizava em Macau, sabendo que fora forjada na República Popular da China.
   Tal carta de condução, examinada de fls. 4292 a 4302, tinha aposta a fotografia do arguido M, mas estava emitida a favor de AD e apresentava, face às cartas verdadeiras, as irregularidades apontadas a fls. 4294/4295.
   O arguido A veio referido na "Magazine" de 26/6/98 como cérebro da "X" e conselheiro militar de Y, ligado à área operacional desta.
   E o facto de ter sido funcionário da Polícia Judiciária permite-lhe ter um conjunto de conhecimentos sobre uma série de procedimentos operacionais dessa polícia, que lhe torna possível evitar o confronto directo com a mesma ou com outras forças e serviços policiais.
   No EPC, alguns dos arguidos figuram em fotografias com Y, tiradas no interior daquele estabelecimento prisional.
   E A e B, contactaram com alguns dos arguidos referidos de 13 a 22, enquanto estes se mantiveram em liberdade.
   Houve a apreensão de telemóveis e de outros objectos a fls. 2388 e v.º e 2390/2391, que se verificou no E.P.Coloane, no dia 19/3/99, na cela n.º X, do bloco X, do piso X, onde se encontravam os arguidos A, B, F, D e H.
   O arguido A obteve do exterior três fotografias tiradas na sequência do assassinato do dito AF, conhecido por "AE", na Tailândia.
   No dia 12 de Março de 1999, o arguido M, telefonou para o arguido detido A dizendo-lhe que tem uma ideia para pôr em prática na semana seguinte aquando da vinda do Presidente da República a Macau.
   Ao que o arguido A diz ter percebido e que iria contactar com o "AG", nome do código do arguido N, para este pôr o plano em marcha.
   No dia 16 do mesmo mês de Março, pelas 15.52 horas, o arguido M recebe um telefonema do arguido A para se avistar com ele, nesse dia, no interior do E.P.C., dando-lhe instruções (nesse telefonema e noutros posteriores) sob o modo de iludir o controlo efectuado pelos elementos da UTIP na entrada do estabelecimento prisional, onde aquele chegaria cerca das 18 horas.
   Ainda no citado dia 16 de Março de 1999, pelas 17.42 horas, o arguido M telefona para um indivíduo desconhecido, dando-lhe conta de ter morto um tal "AH", não localizando, porém, esta acção criminosa, nem no tempo nem no espaço.
   No dia 18 de Março de 1999, pelas 16:10 horas, o arguido M, numa chamada telefónica proveniente do clube nocturno, pede ajuda para lhe arranjarem, com muita urgência, panchões, acrescentando que os mesmos deveriam estar preparados, visto que iriam ser utilizados por não profissionais.
   Pelas 23 horas do mesmo dia 18, o arguido M telefonou para o arguido A, ordenando-lhe este que avisasse o "AG" (arguido N) para avançar.
   No dia 19 de Março de 1999, pelas 01.36 horas, o arguido A telefonou para o arguido M, que passa o telemóvel a outro indivíduo tendo o arguido A acrescentado que iria examinar a escala dos guardas que estariam de serviço naqueles dias e que depois daria as suas ordens.
   O arguido A foi transferido do E.P.C. para UTIP - o que ocorreu em 19/3/99 - ficando sob apertadas medidas de vigilância, tendo também sido detido o arguido M, em 20/3/99 e, posteriormente, os referenciados de 14 a 18.
   O arguido A detinha e utilizava: um aparelho de recados de marca "Telecom", que lhe foi apreendido a fls. 847 e examinado a fls. 1988, um telefone celular de marca "Motorolla", modelo NAMPS/AMPS, apreendido a fls. 1279 e examinado de fls. 6070 a 6077, um telemóvel de marca "Nokia", um telemóvel de marca "Philips", um aparelho de recados de marca "Kong Seng", um aparelho de recados de marca "Telecom" e um aparelho de recados sem marca, modelo KW9000, todos apreendidos a fls. 2388/2389 e examinados e avaliados a fls. 3062 a 3064.
   O arguido B detinha e utilizava: um telemóvel de marca "Nokia", um aparelho de recados sem marca modelo CP766, apreendidos a fls. 865 e examinados a fls. 1992 e ainda um outro telemóvel de marca "Nokia" e um telemóvel de marca "Philips" apreendidos a fls. 2390/2391 e examinados a fls. 3047/3048.
   O arguido H detinha e utilizava um telemóvel de marca "Nokia" que foi apreendido a fls. 853 e examinado a fls. 1989.
   O arguido M detinha e utilizava dois telemóveis, um de marca "Nokia" e outro de marca "Motorola", e um aparelho de recados de marca "Avon", que lhe foram apreendidos a fls. 2426 e que se encontram examinados a fls. 3374.
   A arguida R detinha e utilizava dois telemóveis, um de marca "Nokia" e outro de marca "Motorola", que lhe foram apreendidos a fls. 4050 e que se encontram examinados a fls. 5384.
   O arguido E detinha e utilizava um telemóvel de marca "Ericsson" e um aparelho de recados de marca "Motorola", que lhe foram apreendidos a fls. 2700 e que se encontram examinados a fls. 3456.
   O arguido N detinha e utilizava um telemóvel de marca "Samsung" e um aparelho de recados de marca "EX", que lhe foram apreendidos, respectivamente, a fls. 3489 e 3485 e que se encontram examinados a fls. 5142.
   O arguido P detinha e utilizava um telemóvel de marca "Ericsson" que lhe foi apreendido a fls. 3608 e que se encontra examinado a fls. 5204.
   O arguido O detinha e utilizava um telemóvel de marca "Ericsson" e um aparelho de recados de marca "Pantech", que lhe foram apreendidos a fls. 3662 e que se encontram examinados a fls. 5273.
   A arguida Q detinha e utilizava um telemóvel de marca "Motorola" que lhe foi apreendido a fls. 3750 e que se encontra examinado a fls. 5734.
   O arguido C detinha e utilizava um telemóvel de marca "Panasonic" que lhe foi apreendido a fls. 3894 e que se encontra examinado a fls. 5276.
   Ao arguido A foram apreendidos a fls. 847 (cfr. fls. 1288) os seguintes valores que consigo trazia: uma ficha de jogo de fortuna ou azar de 500 HKD da AZ de Macau, 5940 HKD, 810USD e 82.550 patacas e na cela onde se encontrava preso no E.P.C. as seguintes quantias em dinheiro: 42 200 HKD e 8190 patacas (cfr. fls. 2600) e várias garrafas de bebidas alcoólicas, a fls. 2388/2389, avaliadas em 840 patacas (vide fls. 3062 a 6064).
   Ao arguido F foram apreendidos a fls. 831 a 834 os objectos de joalharia e de relojoaria examinados a fls. 1995 a 1996, avaliados na sua globalidade em 81 500 patacas e ainda apreendidos os objectos constantes em dois cofres do [Banco (1)] com o n.º XXXXX e XXXXX (vide fls. 831 a 834, 1239 a 1242) examinados a fls. 2025 a 2031, no valor total de 319 960HKD e foram apreendidas as quantias em dinheiro de 3 HKD e de 136.8 patacas e apreendido ainda na cela onde se encontrava no E.P. Coloane um telefone de marca "Commax" (fls. 2390) que se mostra examinado a fls. 3047, no valor de 200 patacas, que não se prova (este último) que lhe pertencesse ou que o detivesse.
   Ao arguido H foram apreendidos, a fls. 853 e 854 e a fls. 857 a 860, os objectos de joalharia e de relojoaria examinados a fls. 1990 a 1991, avaliados na sua globalidade em 4 350 patacas e foram apreendidas também, a fls. 853 e 854, as quantias em dinheiro de 8 120 HKD, de 1USD e de MOP11 910 e apreendidas ainda, na cela, onde se encontrava no E.P.Coloane, duas baterias para telemóvel de marca "Philips" (fls. 2390) que se mostram examinadas a fls. 3047 e 3048, no valor total de MOP$200, mas que não se provam que lhe pertencessem ou que as detivesse.
   Ao arguido B foram apreendidos, a fls. 865, 868 e 869 v.º e a fls. 874 e 875, os objectos de joalharia e de relojoaria examinados a fls. 1993 e 1994 v.º, avaliados na sua globalidade em MOP65 950, e foram apreendidas também, a fls. 865, 868 e 869 v.º e a fls. 874 e 875, as quantias em dinheiro de 58 400HKD, de 353,5 remimbis e de MOP23 530 e fichas de jogo da AZ, sendo 2 de 500 HKD, 8 de 100HKD e de 4 de 10 HKD e foram apreendidas as quantias em dinheiro de 3,30HKD e de MOP34,60 e apreendidos ainda, na cela, onde encontrava no E.P.Coloane, um carregador de baterias para telemóvel e respectivo transformador de marca "Nokia", uma bateria para telemóvel de marca "Scud", dois articulares, sendo um de marca "Nokia" e outro de Marca "Philips" (fls. 2390/2391) que se mostram examinadas a fls. 3047 e 3048, no valor de MOP500.
   Ao arguido E foram apreendidos, a fls. 2708, objectos de joalharia, examinados a fls. 3458 e avaliados, na sua globalidade em MOP$11 450 e ainda a fls. 3460, no veículo automóvel de matricula MD-XX-XX, registado a favor do arguido D, diversos objectos, examinados a fls. 3462 e avaliados, na sua globalidade em MOP$4 705.
   À arguida Q foram apreendidas, a fls. 3750, as quantias de HKD$9 700 e MOP18 800 (cfr. 3968/3969).
   Quanto aos móveis sujeitos a registo, os arguidos a seguir referidos eram proprietários de veículos automóveis registados em seu nome.
   Em nome do arguido A e propriedade deste encontra-se registado o seguinte veículo:
   - de matrícula MF-XX-XX, marca Toyota, modelo Estima Lucida, apreendido a fls. 845, examinado a fls. 2097, registado fotograficamente a fls. 2101, no valor de MOP $200 000;
   Registados em nome de AI (cfr. fls. 2011) encontram-se os seguintes veículos:
   - de matrícula MG-XX-XX, marca Mercedes Benz, modelo C280, apreendido a fls. 845, examinado a fls. 2098, registado fotograficamente a fls. 2105, no valor de MOP$200 000;
   - de matrícula ME-XX-XX, alterada, legalmente, para MG-XX-XX, de marca Mercedes Benz, modelo SL 500, desconhecendo-se, actualmente, o local onde o mesmo se encontra.
   Em nome do arguido F e propriedade deste encontram-se registados os seguintes veículos:
   - de matrícula MG-XX-XX, marca Mercedes Benz, modelo C220, apreendido a fls. 834, examinado a fls. 2095, registado fotograficamente a fls. 2099, no valor de MOP$400 000;
   - de matrícula ME-XX-XX, marca BMW, modelo 325I, apreendido a fls. 831, examinado a fls. 2095, registado fotograficamente a fls. 2100, no valor de MOP$200 000;
   Propriedade do arguido H, mas registado provisoriamente em nome de terceiro, no caso AJ, encontra-se o seguinte veículo:
   - de matrícula ME-XX-XX, marca BMW, modelo 318IS, apreendido a fls. 1309, examinado a fls. 2098, registado fotograficamente a fls. 2106, no valor de MOP $150 000;
   Em nome do arguido B e propriedade deste encontram-se registados os seguintes veículos automóveis:
   - de matrícula ME-XX-XX, marca Toyota, modelo Harrier 3.0 four A/T, apreendido a fls. 871, examinado a fls. 2094, registado fotograficamente a fls. 2102, no valor de MOP$150 000;
   - de matrícula MF-XX-XX, marca Toyota, modelo Lexus Ls 400, apreendido a fls. 871, examinado a fls. 2096/2097, registado fotograficamente a fls. 2102-A, no valor de MOP$350 000;
   Propriedade do arguido B, mas registado em nome de terceiro, no caso, de AK, encontra-se o seguinte veículo automóvel:
   - de matrícula MF-XX-XX, marca Ferrari, modelo F-355 Spider, apreendido a fls. 871, examinado a fls. 2096, registado fotograficamente a fls. 2103, no valor de MOP $1 000 000;
   Registado em nome de AL, encontra-se o seguinte veículo automóvel:
   - de matrícula EX-XX, marca Mitsubishi, modelo Super Exceed, apreendido a fls. 2020, examinado a fls. 2021, registado fotograficamente a fls. 2104, no valor de MOP$250 000;
   Em nome do arguido M e propriedade deste encontra-se registado o seguinte motociclo:
   - de matrícula MC-XX-XX, marca Yamaha, modelo XC 150D, apreendido a fls. 2247, examinado a fls. 3374, registado fotograficamente a fls. 3376, no valor de MOP $5 000;
   Propriedade do arguido D e registado em seu nome encontra-se o seguinte veículo automóvel:
   - de matrícula MD-XX-XX, marca Toyota, modelo Aristo V 300, apreendido a fls. 2708, examinado a fls. 2096, registado fotograficamente a fls. 3466, no valor de MOP $300 000;
   Em nome do arguida Q e propriedade desta encontra-se registado o seguinte veículo automóvel;
   - de matrícula MD-XX-XX, marca Mazda, modelo 121 LX, apreendido a fls 3817, examinado a fls. 5734, registado fotograficamente a fls. 5736, no valor de MOP$35 000;
   Encontram-se registados na Conservatória do Registo Predial a favor do arguido B os imóveis com as seguintes inscrições:
   - n.º XXXX (Lº X XXX, fls. 81);
   - n.º XXXX (Lº X XXX, fls. 355);
   - n.º XXXX (Lº X XXX, fls. 356);
   - n.º XXXX (Lº X XXX, fls. 357);
   - n.º XXXX (Lº X XXX, fls. 358);
   Encontra-se registada na Conservatória do Registo Predial a favor do arguido H o imóvel com a seguinte inscrição:
   - n.º XXXX (Lº XXXX, fls. 289);
   Por escritura pública de 5/5/97, a arguida Q adquiriu um imóvel inscrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º XXXXX (Lº X XX) - cfr. fls. 3837.
   Alguns dos arguidos eram e são titulares de contas em diversas instituições bancárias.
   A era titular das seguintes contas:
   - conta n.º HKD S/A XXXXXXX/XX do [Banco (2)] cujo saldo em 8/10/98 era de HKD2 205 758.11, congelada por despacho judicial de fls. 976;
   - conta n.º Fix Dep A/C XXXX do [Banco (2)] cujo saldo em 8/10/98 era de USD397 714.09, congelada por despacho judicial de fls. 976;
   - conta n.º XXXXXXXXXX do [Banco (3)], congelada por despacho judicial de fls. 976 a 928 verso (cfr. fls. 1544);
   - conta n.º XXXXXX-XXX do [Banco (4)], congelada por despacho judicial de fls. 1085/1087 (cfr. fls. 1538);
   B era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo em 8/10/98 era de HKD17 806.13, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 vº;
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo em 8/10/98 era de HKD8 532.11, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 vº;
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)], congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXX-XXXXXX-XXX do [Banco (6)] cujo saldo em 16/11/98 era de MOP160 544,18 congelada por despacho judicial de fls. 1651 (cfr. fls. 1676);
   - conta n.º XXX-X-XXXXX-X do [Banco (7)], congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 verso (cfr. fls. 1535);
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo em 31/12/98 era de HKD2 751 732.14, congelada por despacho judicial de 19/5/99 (cfr. fls. 5104, 5985 e 5997);
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo em 31/12/98 era de MOP923 207,75, congelada por despacho judicial de 19/5/99 (cfr. fls. 5104, 5985 e 5997);
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo em 22/5/99 era de MOP4 044,98, congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   F era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XXXXXXXXXXXX do [Banco (8)], congelada por despacho judicial de fls. 1503 a 1504 verso (cfr. fls. 1657);
   - conta n.º XXXXXXXXXXXX do [Banco (8)], congelada por despacho judicial de fls. 1503 a 1504 verso (cfr. fls. 1657);
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)], congelada por despacho judicial de fls. 1503 a 1504vº em 12/11/98 (cfr. fls. 1541);
   - conta n.º XXX-X-XXXXX-X do [Banco (7)] cujo saldo em 11/10/98 era de HKD458.43, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº (cfr. fls. 1073);
   - conta n.º XXX-X-XXXXX-X do [Banco (7)] cujo saldo em 11/10/98 era de HKD599.70, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº (cfr. fls. 1073);
   - conta n.º XXX-X-XXXXX-X do [Banco (7)] cujo saldo em 11/10/98 era de MOP1,81 congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº (cfr. fls. 1073);
   I era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XXXX.XXXXXX.XXX do [Banco (9)] cujo saldo era de HKD1035,00, congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)], congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   G era titular da seguinte conta:
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   P era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)] cujo saldo é de 154,47, congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXXX-XXX do [Banco (4)] cujo saldo é de MOP61,70, congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098).
   K era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XXXX.XXXXXX.XXX do [Banco (9)] com o saldo de MOP20 236,38 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098).
   - conta n.º XXX XXXXXXXXX do [Banco (8)], com o saldo de HKD39,171,86
   em 12/10/98 congelada por despacho judicial de fls. 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098).
   C era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   H era titular das seguintes contas:
   - conta n.º HKD S/A do [Banco (2)] cujo saldo em 8/10/98 era de HKD 575.92 congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 verso;
   - conta n.º XXX-X-XXXXXX-XXX do [Banco (9)], congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 verso;
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (8)], congelada por despacho judicial de fls. 1503/1504 (cfr. fls. 1657);
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)] congelada por despacho judicial de 926 a 928 verso;
   - conta n.º XX-XXX-XXXXXX-X do [Banco (11)], congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 vº;
   - conta n.º XXXXXX-XXX do [Banco (4)] congelada por despacho judicial de fls. 1085/1087 (cfr. fls. 1538).
   L era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XXX-XXXXXX-XXX do [Banco (5)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)] congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   E era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo é de HKD438,71 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] cujo saldo é de HKD8 411,95 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXX-XXXXXXXXX do [Banco (8)], com o saldo de MOP2355,23 em 12/10/98 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXXX-XXX do [Banco (4)], congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   M era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], com o saldo de HKD109,51;
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], com o saldo de HKD50084,29;
   N era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], com o saldo de MOP7384,54 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XX-XX-XXXXXXXX do [Banco (8)], com o saldo de USD$17.38 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-X do [Banco (10)], com o saldo de MOP348,77 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXXXXXXX do [Banco (3)], com o saldo de MOP34 507,96 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   O era titular da seguinte conta:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)] com o saldo de MOP411,87 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXXXXXXX do [Banco (3)] com o saldo de MOP32,66 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   Q era titular da seguinte conta:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], com o saldo de MOP144772,99 em 10/05/99 congelada por despacho judicial de fls. 3985;
   R era titular das seguintes contas:
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], com o saldo de MOP5 105,53 em 18/5/99 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], com o saldo de MOP100,00 em 18/05/99 congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   As seguintes contas bancárias em nome de AM (cônjuge do arguido H) são bens comuns do casal:
   - conta n.º XXXX/XXXX/XXXX/XXXXX do [Banco (1)], em nome de AM (cônjuge do arguido) congelada por despacho judicial de 28/5/99 (cfr. fls. 6098);
   - conta n.º XXXXX-XXXXXX-XXX do [Banco (9)], em nome de AM (cônjuge do arguido), cujo saldo em 9/10/98, era de MOP$522,26, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928 vº;
   - conta n.º XXXX-XXXXXX-XXX do [Banco (9)], em nome de AM (cônjuge do arguido) cujo saldo em 9/10/98 era de HKD3620,00, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XXXX-XXXXXX-XXX (XXXXXX-depósito da prazo) do [Banco (9)], em nome de AM (cônjuge do arguido) cujo saldo em 9/10/98 era de MOP$50000,00, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XX-XXXXXX-XX do [Banco (5)], em nome de AM (cônjuge do arguido), congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XXXXXX-XXX do [Banco (4)], em nome de AM (cônjuge do arguido) cujo saldo em 9/10/98 era de HKD$5,01, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XXXXXX-XXX do [Banco (4)], em nome de AM (cônjuge do arguido) cujo saldo em 9/10/98 era de MOP$26,95, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XXXX-XXXXXXXXXXXX do [Banco (4)], em nome de AM (cônjuge do arguido), congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XXXX-XXXXXXXXXXXX do [Banco (4)], em nome de AM (cônjuge do arguido) congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº;
   - conta n.º XXX-X-XXXXXX do [Banco (7)], em nome de AM (cônjuge do arguido), congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº com o saldo de HKD993,12;
   A conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], em nome de AN cujo saldo em 8/10/98 era de HKD298,81 congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº, são bem comum do casal formado pela referida e pelo arguido F;
   A conta n.º XXXXX-XXXXXX-X XXXXXX do [Banco (8)], em nome de AN, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº são bem comum do casal formado pela referida e pelo arguido F;
   A conta n.º XXX-X-XXXXX-X do [Banco (7)], em nome de AN cujo saldo em 11/11/98 era de HKD26 174,85, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº /cfr. fls. 1535) são bem comum do casal formado pela referida e pelo arguido F;
   O arguido M, sabia que a carta de condução n.º XXXXXX, examinadas de fls. 4292 a 4302, era forjada e que não a poderia usar, como o fez.
   E, ao detê-la e ao exibi-la, actuou com intenção de pôr em causa a fé pública e confiança inerentes a esse tipo de documento, com prejuízo para o território e para terceiros.
   O arguido A, sabia não lhe ser permitida a importação da arma de [Marca X], com as características ilustradas no exame de fls. 6079 a 6087.
   Os arguidos A, F e M agiram de forma voluntária e consciente nas acções referidas.
   Bem sabendo serem proibidas porque puníveis por lei as suas condutas.
   Após ter deixado de exercer funções na Polícia Judiciária, o 1.º arguido A trabalhava no Casino [Hotel (2)] e na [Sala VIP (2)] do [Hotel (1)], em actividade ligada à segurança.
   Tem quatro filhos menores a seu cargo e duas mulheres.
   O 2.º arguido B tem boa situação económica, exercendo funções de gerência no Casino [Hotel (2)].
   Tem filhos menores a seu cargo, dois da mulher com quem está casado e dois de outra relação que mantém.
   Em Junho de 1993, o arguido ganhou no casino a quantia de HKD$16 000000,00.
   Tem filhos menores a seu cargo.
   O 3.º arguido C explora duas oficinas de automóveis.
   Os 4.º e 5.º arguidos D e E são gerentes no Casino [Hotel (2)].
   O arguido E é casado com uma senhora tailandesa. Tem dois filhos menores, AO e AP, de 6 e 2 anos de idade, respectivamente, a seu cargo.
   O 6.º arguido F tem mulher e suas filhas a seu cargo. Tem uma outra filha de anterior casamento, a cargo da mãe.
   Desconhece-se qual a sua actividade à data da prisão.
   O 8.º arguido, após ter deixado de exercer funções na PJ trabalhava para um advogado.
   A mulher é professora e tem dois filhos menores a seu cargo.
   O 13.º arguido M teve várias profissões, sendo bate-fichas ultimamente e tem três filhos a seu cargo. Confessou os factos relativos à falsidade da carta de condução.
   O 14.º arguido, N era da PMF e vivia com os pais.
   O 15.º arguido O era professor de informática e vivia sozinho.
   O 16.º arguido P explorava loja de chá.
   A 17.ª arguida Q era amiga do 1.º arguido.
   Era sócia de um bar.
   A 18.º arguida R é casada e reside em Macau desde 1995.
   O 21.º arguido trabalha numa loja de uma tia, auferindo mensalmente cerca de cinco mil patacas.
   
   Não se provaram os seguintes factos:
   Que os arguidos, com excepção dos 1.º e 6.º, A e F passaram a integrar a sociedade secreta X, em datas não concretamente apuradas mas anteriores a 1993, com excepção dos arguidos Q e U, cuja aderência ocorreu, pelo menos, no início de 1996.
   Que todos os arguidos, com excepção dos 1.º e 6.º, A e F, face aos factos provados (com excepção dos arguidos Q e U que só o fizeram a partir do início de 1996) e outros indivíduos, alguns adiante identificados, no início de 1993, estavam agrupados entre si, de livre vontade e perfeitamente conscientes, com intenção por todos partilhada de darem concretização a um plano, que foi engendrado por uns, e aceite pelos outros, todos agindo concretamente na concretização desse projecto de forma articulada e estruturada e continuada no tempo.
   Desde, pelo menos, 1993 os arguidos, com excepção dos 1.º e 6.º, (com excepção dos arguidos Q e U que só o fizeram a partir do início de 1996) e outros indivíduos, alguns que referiremos mais à frente, faziam parte duma facção dentro da sociedade "X" que, assumindo a liderança dessa sociedade clandestina, visava obter altos rendimentos com as actividades ilícitas adiante descritas e colocar em crise o funcionamento das instituições governamentais do território de Macau.
   Que Y era reconhecido por todos os arguidos, designadamente pelos referidos de 2 a 12, como líder da aludida facção da sociedade clandestina "X", os quais, para demonstrarem a sua lealdade e fidelidade, o acompanhavam quer em momentos íntimos da sua vida privada quer em situações públicas por ele patrocinadas, como aconteceu na sua festa de aniversário em 29/7/96 e no concerto de Andy Lau, em 13/11/96.
   Como chefes da primeira linha dessa facção da referida seita estavam os arguidos I e K.
   Esse subgrupo ou facção para atingir as finalidades referidas praticou e previa a execução de actos criminalmente proibidos, nomeadamente na área do jogo ilícito e das actividades a ele ligadas, como por exemplo a agiotagem ou a usura criminosa e apostas clandestinas e paralelas e a extorsão.
   E sempre que necessário, para conseguirem os fins ilícitos que se propunham, recorriam à intimidação e à agressão física.
   E obtinham também junto dos jogadores que ganhavam, por meios intimidatórios, quantias variáveis.
   Assim, o arguido A está na cúpula da organização "X", cérebro e estratega desta, ligado à área operacional, sendo um dos elementos mais importantes na esfera de influência de Y, controlando um grupo de menores de 18 anos que frequentemente o acompanhavam.
   Que o arguido A esteve no concerto musical de Jackie Cheung que se realizou no Forum de Macau, em 28/6/96.
   O arguido B surge como membro da direcção ou chefe em segunda linha da sociedade referida, considerado elemento activo, sendo apoiante do arguido A.
   O arguido F considerado chefe de segunda linha e membro da direcção da "X", pertence ao grupo de Y (soldado directo deste) e posteriormente seguidor e apoiante do arguido A, liderava um grupo de soldados/ cavalos.
   Esteve presente em reuniões da seita "X", nos dias 15/10/95 e 12/10/96, na [Discoteca (1)].
   F em 17/1/97 estava, juntamente com Y e com os arguidos AQ e I no interior da [Discoteca (4)] quando se verificaram disparos de arma de fogo na pista de dança.
   Agrediu um funcionário do tribunal no interior da [Discoteca (2)], em 21/7/97, conforme processo crime n.º 151/97.
   O arguido I é considerado um oficial de guerra da "X", estando na cúpula da organização como chefe operacional e homem de grande confiança de Y, tendo sob o seu comando um grupo de soldados/cavalos preparados para a prática de acções contra a vida e integridade física.
   Em 17/1/97 estava, juntamente com Y e com os arguidos AQ e F no interior da [Discoteca (4)] quando se verificaram disparos de arma de fogo na pista de dança, havendo indicações de que terá sido um soldado do arguido I que terá feito o disparo.
   O arguido G é chefe operacional e homem de confiança de Y, desde 1993, tendo sob o seu comando um grupo de soldados/cavalos preparados para a prática de acções contra a vida e integridade física, sendo chefe da facção fukinense, composta por cerca de 80 indivíduos que opera na zona norte de Macau, cometendo acções preenchedoras dos tipos legais de sequestro, roubo, rapto e extorsão.
   Dedica-se à agiotagem na [Sala VIP (1)] do Casino [Hotel (1)], aí emprestando a diversos indivíduos, para o jogo de fortuna e azar, quantias elevadas a juros superiores aos legais.
   O arguido J é um dos soldados favoritos de Y, chefe do grupo operacional constituído para a prática de acções contra a vida e integridade física, sendo, actualmente seguidor do arguido A.
   O arguido K é um oficial de guerra da "X", estando na cúpula da organização como chefe operacional e homem de grande confiança de Y e apoiante e seguidor do arguido A, tendo sob o seu comando um grupo de soldados/cavalos preparados para a prática de acções contra a vida e integridade física.
   Está encarregado, através dos seus soldados/cavalos, de efectuar cobranças coercivas e de dar protecção a bate fichas e agiotas ligados à "X" que operam nos casinos de Macau.
   Controla na República Popular da China, onde se encontra refugiado, um grupo de 60 indivíduos vocacionados para a prática de acções violentas em Macau, sempre que, a apelo dos dirigentes que se encontram no território, haja necessidade de agir em defesa dos interesses da "X" ou de alguns dos seus membros.
   O arguido C é considerado um dos soldados preferidos de Y, sendo membro da direcção e chefe de um grupo especial de operações da "X", cujos elementos se encontram ligados ao automobilismo, motociclismo e "Karting" de Macau, é também apoiante do arguido A.
   Esteve presente numa reunião da seita "X", no dia 15/10/95, na [Discoteca (1)].
   Na oficina denominada "AC" são reparados e guardados muitos veículos automóveis pertencentes a membros da "X".
   Que o arguido controle ou explore a oficina denominada "AR", sita à [Endereço (1)].
   Numa busca, em 29/4/98, efectuada a uma dessas oficinas, denominada "AR", sita à [Endereço (1)] foram encontradas e apreendidas três cargas de material explosivo.
   O arguido H é apoiante de Y, mantendo um relacionamento estreito com a "X", mesmo antes do seu afastamento como funcionário da Polícia Judiciária, em 1997, é um dos seguidores do arguido A e principal apoiante deste.
   Ainda como funcionário da Polícia Judiciária, na noite de 29 para 30/4/97, estava integrado num grupo de indivíduos da "X" que se encontrava no parque de estacionamento do [Hotel (2)] quando denunciou a presença de elementos daquela polícia que procediam a uma operação de vigilância e de perseguição de um veículo, abortando, assim o êxito de tal acção policial.
   O arguido L é considerado soldado de Y, pertencendo a um grupo operacional causador de distúrbios no interior dos casinos de Macau e atentatório da integridade física dos cidadãos.
   O arguido D é um dos operacionais mais activos liderados por Y e posteriormente pelo arguido A, figurando como chefe de segunda linha ou membro da direcção da "X", sendo chefe de um grupo de bate-fichas ligado a esta sociedade.
   É sócio de facto da [Discoteca (2)].
   Esteve presente numa reunião da seita "X", no dia 15/10/95, na [Discoteca (1)] .
   O arguido E é considerado soldado de Y e posteriormente do arguido A, figurando como chefe de segunda linha ou membro da direcção da "X", tendo à sua ordem diversos soldados/cavalos.
   É sócio de facto da [Discoteca (2)].
   Esteve presente numa reunião da seita "X", no dia 12/10/96, na [Discoteca (1)] .
   Para concretização do seu projecto, os arguidos, conjuntamente com os restantes elementos do grupo, reuniam assiduamente, em vários locais de Macau, designadamente na [Discoteca (1)] (entre outras vezes tal ocorreu em 15/10/95 e 12/10/96), na casa de Y (até à prisão deste, em 1/5/98, à ordem do processo n.º 1074/98.9PJIMA), na [Discoteca (2)] (como aconteceu em 15, 16 e 19/4/97) e na associação desportiva, a fim de em conjunto e concertadamente, pensarem e assentarem nas acções a levar a cabo para a execução dos seus desígnios.
   No âmbito de tal projecto e para a sua execução, os arguidos levaram à prática, voluntariamente, actos de intimidação contra pessoas, designadamente, no interior de casinos, como no casino [Hotel (1)], em 26 de Outubro de 1996, pelas 4.25 horas, e em 27 de Outubro de 1996, pelas 18.45 horas, gerando nelas e nas respectivas famílias medo e insegurança, tendo estes factos sido objecto do processo crime n.º 504/97(IP).
   Os arguidos e o grupo de que faziam parte previram, para alcançar os seus objectivos, o recurso à violência.
   E previram também praticar actos de intimidação contra agentes de autoridade pública por forma gerar nestes medo e insegurança.
   Estas condutas intimidatórias implicavam a importação (ou a entrada no Território por qualquer meio) e a utilização de armas de fogo, designadamente espingardas metralhadoras, pistolas, granadas de fumo e munições.
   E que os arguidos e a organização de que fazem parte pretenderam deter e usaram.
   A pistola, de [Marca X], de calibre .32ACP examinada a fls. 4283 a 4290, detida pelo arguido N era destinada ao uso em acções criminosas levadas a cabo pela associação "X".
   Os arguidos previam também, com o propósito de ganho, introduzir pessoas, vindas da República Popular da China, no território de Macau, em situação de clandestinidade ou não, com vista ao exercício da prostituição.
   Os arguidos e o seu grupo previam igualmente proceder ao controlo das acções das forças e serviços policiais ou de segurança para melhor enganarem e fugirem à acção policial.
   Os arguidos previam também, no âmbito do jogo de fortuna ou azar, proceder a empréstimos de dinheiro a pessoas, cobrando destas o capital acrescido de juros vultuosos acima do juro legal e privando-as da sua liberdade sem o seu consentimento, para as constrangerem a obter o dinheiro, caso não pagassem o estipulado.
   A sociedade clandestina "X", através de todos os arguidos, previu e executou documentos para os seus membros com dados de identificação que não correspondiam aos verdadeiros para que aqueles aparecessem com identidades falsas e, assim, pudessem escapar ao controlo policial.
   Com a detenção de Y, em 1 de Maio de 1998, e sua posterior prisão preventiva, fica delegada por este no arguido A o controlo real da associação "X".
   O arguido A começa a criar a divisão do grupo de Y, de modo a ter ele o papel de maior preponderância não só na área operacional, mas também na própria direcção do citado grupo clandestino.
   Para o efeito, rodeia-se de todos os arguidos e de outros indivíduos.
   Para tal recorre à operacionalidade do arguido C e de AS, indivíduo sob o qual pendem mandados de detenção no processo n.º1074/98.9PJIMA, no qual foi acusado, pelo menos, pela prática de um crime de associação ou sociedade secreta.
   A sociedade secreta "X" não perdeu, assim, eficácia mesmo a nível operacional, uma vez que o arguido A assumiu a sua liderança nessa área com a colaboração directa de todos os arguidos e de outros indivíduos.
   Por outro lado, a posição activa na sociedade clandestina "X" dos arguidos referidos de 1 a 12 manteve-se, mesmo após as prisões de alguns destes arguidos.
   Na verdade, mesmo no EPC, os arguidos continuaram a manter relações com elementos da sociedade clandestina "X" que aí já se encontravam presos, como é o caso de Y.
   Com efeito através de telemóveis que os arguidos lograram introduzir e utilizar no Estabelecimento Prisional de Coloane, foram mantidos contactos entre os membros da sociedade clandestina que estavam presos e os que se encontravam no exterior da prisão, pelo menos, no período de 4/10/98 a 30/4/99.
   Esses contactos serviam para:
   a) manter os arguidos presos ao corrente de toda a situação vivida pela sociedade "X" no exterior, como por exemplo, quando tiveram conhecimento, com suporte fotográfico e jornalístico pormenorizado, da morte de AF, conhecido por "AE", pessoa ligada à sociedade clandestina referida;
   b) proporcionar aos arguidos presos, designadamente a A (enquanto não foi transferido, por razões de segurança do E.P. Coloane para as instalações prisionais da UTIP) e a B (a partir da aludida transferência) o comando das operações, dando ordens para a preparação de acções criminosas;
   c) permitir aos arguidos presos a obtenção de apoio logístico, de modo a receberem, mesmo na prisão, objectos, dinheiro e documentos propiciadores não só de bem estar mas também do conhecimento e do consequente controlo efectivo e real da situação da sociedade, ao nível dos "negócios", relacionados, por exemplo, com a agiotagem nos casinos do território.
   d) proporcionar aos arguidos presos a possibilidade de continuarem a movimentar as suas contas bancárias, de realizarem os seus negócios ilícitos e de planearem fugas e acções terroristas.
   Os arguidos que se encontravam na cela n.º X do E.P. de Coloane, isto é B, F, H e E, obtiveram do exterior três fotografias tiradas na sequência do assassinato do dito AF, conhecido por "AE", na Tailândia.
   Para controlarem as operações no exterior do E.P.Coloane os arguidos que aí se encontravam presos à ordem deste processo, mormente A e B, contavam no exterior com o apoio directo e activo de diversos membros da sociedade clandestina "X".
   Entre estes assumiam especial preponderância os arguidos M e N, pois era com eles que os arguidos A e B directamente contactavam para transmitir aos arguidos referidos de 15 a 22 as ordens e directivas tomadas no interior do estabelecimento prisional.
   Assim, em diversos momentos, os arguidos, depois de presos, para poderem contactar entre si e planearem à distância as acções criminosas que se propuseram realizar, utilizaram vários telefones, telemóveis e fax, entre os quais os números XXXXXX (fax), XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXX, XXXXXXX, XXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXX, XXXXXX, XXXXXX, XXXXXX, XXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX.
   E deste modo os arguidos A e B, embora detidos, continuaram a transmitir as suas ordens aos outros membros da seita "X", a movimentar as suas contas bancárias, a transmitir recados aos advogados, a solicitar e a obter toda a espécie de apoio logístico, dirigindo a referida sociedade secreta, planeando até a fuga do primeiro e uma acção terrorista por ocasião da visita do Presidente da República ao Território.
   Normalmente era o arguido A que do interior do E.P.C. contactava o arguido M, o qual, por sua vez, transmitia as directivas ao arguido N que tratava de as veicular para os restantes membros da "X".
   Outras vezes essas ordens eram dadas pelo arguido B, do interior do E.P.C., através da cadeia hierárquica referida no artigo anterior ou directamente a outros membros da "X".
   Entre outras acções ordenadas ou planeadas por este meio, a partir do interior do E.P.C., destacam-se o projecto de uma acção terrorista a realizar durante a última visita a Macau do Presidente da República (através do atentado a levar a efeito com explosivos) e o plano de evasão do arguido A.
   No dia 16 do mesmo mês de Março, são interceptados diversos telefonemas do arguido M para vários membros da sociedade "X", convocando-os para uma reunião a realizar no café.
   "AT" é nome de código para designar explosivos.
   Que o clube nocturno é local conotado com actividades da sociedade clandestina "X".
   Que o arguido A deu o sinal ao arguido M para se iniciar o plano terrorista referenciado no art.º 89.º.
   No dia 19 de Março de 1999, pelas 01.36 horas, o arguido A telefonou para o arguido M, que passa o telemóvel a outro indivíduo o qual refere que já tinha "cópia" de documentos de Singapura para ele, A (ou seja, que havia conseguido a falsificação de alguns documentos que a fuga daquele), os quais lhe seriam entregues no dia 20 ou 21 (sábado ou Domingo) durante o horário de visitas na prisão.
   Tais planos (acção terrorista e evasão) só abortaram porque, em face das escutas efectuadas, foi decidido, em 18/3/99 (cfr. despacho judicial de fls. 2364 a fls. 2366vº.), transferir o arguido A do E.P.C. para UTIP.
   Os arguidos, para poderem contactar entre si e planearem à distância as acções criminosas a que se propuseram, detinha vários telemóveis e aparelhos de recados.
   Todos os objectos e valores apreendidos aos arguidos e ainda os telemóveis referidos resultaram dos proventos obtidos com a prática delituosa, referida supra, desenvolvida por todos os arguidos.
   Com a actividade ilícita, supra descrita, os arguidos obtiveram vultuosos proventos económicos que nalguns casos destinaram ao aforro em diversas instituições bancárias e noutros aplicaram na aquisição de imóveis e de móveis sujeitos a registo.
   Os arguidos eram proprietários de veículos automóveis que registaram em nome de terceiros para despistarem as autoridades quanto ao conhecimento dos verdadeiros proprietários de tais veículos.
   Que os seguintes veículos:
   - de matrícula MG-XX-XX, marca Mercedes Benz, modelo C280, apreendido a fls. 845, examinado a fls. 2098, registado fotograficamente a fls. 2105, no valor de MOP $200 000;
   - de matrícula ME-XX-XX, alterada, legalmente, para MG-XX-XX, de marca Mercedes Benz, modelo SL 500, pertençam ao arguido A.
   Que o seguinte veículo automóvel:
   - de matrícula EX-XX, marca Mitsubishi, modelo Super Exceed, apreendido a fls. 2020, examinado a fls. 2021, registado fotograficamente a fls. 2104, no valor de MOP$250 000;
   E ainda de dois veículos automóveis de marca Mercedes Benz, cujas matrículas e outros dados se desconhecem, sejam propriedade do arguido G.
   Que o veículo automóvel:
   - de matrícula ME-XX-XX, marca Honda, modelo Acura, apreendido a fls. 4037, examinado a fls. 5383, registado fotograficamente a fls. 5385, no valor de MOP$50 000; seja propriedade da arguida R.
   Os arguidos detinham também quantias monetárias em contas tituladas por outros indivíduos em diversos bancos.
   A conta n.º XXXXXX do [Banco (1)], em nome de AU congelada por despacho judicial de 28/5/99 (fls. 6098) pertence ao arguido F;
   A conta n.º XXX-X-XXXXX-X do [Banco (7)], em nome de AV cujo saldo em 11/11/98 era de HKD540,07, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº (cfr. fls. 1535) pertence ao arguido F;
   Que a conta n.º XX-XX-XX-XXXXXX do [Banco (1)], em nome da Empresa AX Imp. Exp. cujo saldo em 8/10/98 era de HKD10 792,93, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº e a conta n.º XXXX-XXXXXX-XXX do [Banco (9)], em nome de AY, cujo saldo em 9/10/98 era de HKD520,95, congelada por despacho judicial de fls. 926 a 928vº pertencessem ao arguido B.
   Os arguidos ao procederem à aquisição dos imóveis, dos móveis sujeitos a registo e dos outros móveis referidos foram convertendo os proventos ilicitamente obtidos em bens aparentemente lícitos para a generalidade das pessoas.
   Os arguidos só com a actividade ilícita referida obtiveram os objectos, valores, veículos automóveis apreendidos e os imóveis, uma vez que a condição social de cada um deles retratada nos autos não permitia, por si, a acumulação da riqueza patenteada, sendo certo que todos eles, com excepção dos dois referidos no artigo seguinte, não tinham actividade profissional, comercial ou industrial donde pudessem obter rendimentos compatíveis.
   Por sua vez, a actividade profissional dos únicos arguidos empregados, H (funcionário de advogado) e N (guarda da P.M.F.), também não lhes permitia os proventos e a riqueza que ostentavam.
   Os arguidos, bem como os outros indivíduos referidos e outros não identificados, assim concertados entre si num grupo, decidiram, voluntariamente, levar à prática, o que fizeram, a factualidade referida, tendo distribuído, como foi aludido, entre si as várias tarefas necessárias para o efeito, por forma a todos quererem, aceitarem e determinarem reciprocamente as actuações de cada um, sempre executadas em nome de todos e só por isso praticadas.
   Na verdade, os arguidos e demais elementos da referida facção da sociedade secreta "X" actuavam articuladamente entre si, representando e conhecendo, querendo e aceitando os crimes levados à prática, executados no âmbito, em nome e no interesse do grupo, conformando-se claramente com essa realizações.
   Tais acções criminosas, como as dos presentes autos e outras investigadas noutros processos, com na Instrução Preparatória n.º 39/98 e nos Processos de Querela n.º 876/96 do 4.º Juízo do TCG, nos processos n.os 504/97 e 482/97 do 2.º Juízo do TIC e no processo n.º 1074/98.9PJIMA, executadas por alguns, foram queridas, conhecidas, representadas e aceites por todos e levadas à prática em nome de todos os elementos da facção da sociedade clandestina "X", no seio da qual foram deliberadas e determinadas.
   Os arguidos, ao associarem-se, sabiam que actuavam com perfeita coordenação de vontades para fins ilícitos.
   Os arguidos (exceptuando o arguido M), sabiam que a carta de condução n.º XXXXXX, examinadas de fls. 4292 a 4302, era forjada e que não a poderiam usar, como o fizeram, em proveito da sociedade clandestina a que pertenciam.
   E, ao deterem-na e ao exibirem-na, actuaram com intenção de pôr em causa a fé pública e confiança inerentes a esse tipo de documento, com prejuízo para o território e para terceiros.
   Os arguidos agiram com o propósito de prepararem uma explosão que bem sabiam, atentas as circunstâncias, o tempo e especial momento, poder atingir um sem número de pessoas e a estas provocar ofensas no corpo ou até a morte.
   Os arguidos (com excepção do arguido A), sabiam não lhes ser permitida a importação da arma de [marca X], com as características ilustradas no exame de fls. 6079 a 6087.
   O 2.º arguido B é oriundo de uma família de comerciantes que sempre gozou de um nível de vida acima da média, dedicando-se o seu pai a vários negócios, como a importação e exportação, o fomento predial e a diversos ramos da indústria.
   Aos dezasseis anos, após concluir o ensino secundário, manifestou pouco interesse em prosseguir os seus estudos, pelo que, com a anuência do pai, passou a gerir a loja de carnes, um dos negócios da família, desfrutando de todas as receitas provenientes daquele negócio, que chegavam a atingir as MOP$300 000,00.
   Em 1986, o arguido associado a alguns amigos decidiu abrir uma casa de penhores muito embora o seu nome não tenha ficado a constar da sociedade, negócio esse que, mais uma vez produziu os seus frutos na sua esfera patrimonial.
   E porque o arguido rapidamente conseguiu excelentes resultados na gestão da loja de carnes e se mostrou um hábil comerciante, o seu pai decidiu incumbi-lo da administração da totalidade do mencionado negócio e passou a contar com ele para gestão e participação em outras áreas e actividades comerciais.
   De modo que, além de gerir o negócio das carnes, o arguido foi ajudando nos outros negócios, fazendo todos os trabalhos que se afigurassem necessários ao bom desempenho das empresas da família.
   Urge ainda acrescentar que o arguido criou depois uma sociedade de importação - exportação, mas por falta de tempo para liderar o negócio, devido aos seus muitos afazeres, a sociedade ficou apenas em nome da mulher.
   Em 1992, os seus negócios, que já eram prósperos, passaram a ser geridos pela sua mulher, sogro e irmãos, sem que o arguido os abandonasse, pois, continuava muito empenhado em desenvolvê-los, dedicando-lhes pelo menos metade de cada dia.
   Com receio de gastar todo aquele dinheiro no jogo, e aproveitando o "boom" que então se registou no mercado imobiliário em Macau, o arguido investiu parte dos HKD$ 16.000.000 ganhos no jogo, no negócio do fomento predial e, ora associado ao pai ou a amigos de confiança, adquiriram vários imóveis e terrenos que depois revenderam.
   Por essa forma o arguido rapidamente multiplicou a fortuna de que naquela altura já era detentor, quer por via dos negócios familiares, quer por via do prémio milionário que ganhou e do qual sabiamente soube retirar os melhores dividendos, demonstrando uma invulgar capacidade de liderança e gestão.
   Em 13 de Agosto de 1997, o arguido foi contratado pela AZ para exercer as funções de gerente do Casino [Hotel (2)], auferindo o salário mensal meramente simbólico de MOP$4 000,00.
   Com efeito, o arguido recebia também mais 40% de todas as gorjetas realizadas pelo casino, o que equivale a um vencimento anual de HKD$1 130 000,00.
   Concomitantemente, o arguido continuou a desenvolver intensa actividade comercial em outras áreas, nomeadamente, ampliou o negócio das carnes, abriu uma casa de penhores.
   Por o 5.º arguido ser casado com uma senhora tailandesa isso leva-o frequentes vezes a deslocar-se à Tailândia, de visita aos seus sogros e familiares da sua mulher.
   *
   * *
   III. DA FUNDAMENTAÇÃO DO TRIBUNAL RECORRIDO
   A Segunda Instância teceu a seguinte fundamentação aquando da apreciação e decisão do recurso então interposto pelo arguido do aresto da Primeira Instância (cfr. fls. 7988 a 7994v, equivalentes a pág. 67 a 80 do acórdão ora recorrido):
   “(...)
   
   3. O recurso do arguido A
   Conforme as conclusões do recurso do arguido A, o seu objecto limitou-se às seguintes partes:
   - Na parte respeitante ao crime de associação criminosa o acórdão recorrido incorreu nos vícios de insuficiência de matéria de facto para a decisão de direito, contradição insanável da fundamentação, violando o disposto nos artigo 355.º n.º 2 e 400.º n.º 2 al. a) e b) do Código de Processo Penal de Macau;
   - Na incriminação de armas proibidas o acórdão recorrido violou o disposto do artigo 262.º n.º 1 do Código Penal de Macau, por a arma ainda não ter sido levantada e entrada nos limites fiscais do Território de Macau (leia-se a R.A.E.M.); e
   - Por ter declarado perdido a favor do Território de Macau (leia-se R.A.E.M.) o veículo MF-XX-XX, porque só é o equipamento de filmar e a televisão, que se adequariam à prática dos crimes.
   Com tais alegações pediu o recorrente a sua absolvição pelos crimes condenados, ou subsidiariamente o reenvio para novo julgamento nos termos do artigo 418.º do Código de Processo Penal de Macau.
   Vamos ver concretamente.
   
   3.1. Crime de chefia da associação ou sociedade secreta
   Nesta parte o recorrente alegou duas questões, uma é do vício de contradição insanável de fundamentos da matéria de facto, e a outra é o vício de insuficiência de matéria de facto para a decisão de direito.
   
   3.1.1. Contradição insanável de fundamentação de matéria de facto
   O recorrente alegou que nos autos foram dados provados os seguintes factos:
   - “Desde há vários anos que existe em Macau uma sociedade secreta denominada "X", organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas, particularmente praticando crimes de homicídio, sequestro, rapto, ameaça, coacção, extorsão, a pretexto ou não de protecção, usura criminosa, entre outros.
   - Os 1.º e 6.º arguidos A e F, passaram a integrar a referida sociedade secreta denominada "X", em datas não concretamente apuradas, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, o arguido A exercia funções de chefia e o arguido F, no decurso do ano de 1995, era membro da mesma.”
   E entende haver contradição insanável como se deu não provados os factos pelos quais se retiraram as seguintes conclusões:
   - Que, de todos os arguidos, apenas o recorrente e o F integravam a X; (fl. 7586)
   - Que, o F, conquanto membro da X, não reconhecia o Y como líder de um facção da X e não seguia nem apoiava o recorrente (fls. 7587 e 7589);
   - Que, o recorrente, embora reconhecesse o Y como líder de um facção da X não estava na cúpula desta sociedade secreta, não era seu cérebro e estratega, não estava ligado à área operacional, não era um dos elementos mais importantes na esfera de influência de Y, nem controlava um grupo de menores de 18 anos (fls. 7587 e 7588);
   - Que, nenhum dos arguidos no processo, seguia ou apoiava o recorrente (fls. 7589 e ss.);
   - Que, nenhum dos arguidos (no que se inclui o recorrente), praticava actos de intimidação contra pessoas à violência; intimidava agentes de autoridades pública; importava e utilizava armas de fogo; explorava o exercício da prostituição através de clandestinos no território de Macau; procedia ao controlo das acções das forças e serviços policiais; procedia a empréstimos usuários a pessoas, privando-os de liberdade até ao seu pagamento; executava documentos de identidade falsas para escapar ao controlo policial (fls. 7593 e ss.);
   - Que, o recorrente não assumiu o controlo real da sociedade secreta X após a detenção de Y, nem criou a divisão no grupo deste, de modo a ter uma maior preponderância nas suas áreas operacional e de direcção (fl. 7595);
   - Que, como tal, o recorrente não assumiu a liderança da X com a colaboração dos restantes arguidos (fls. 7596);
   - Que, uma vez detido, o recorrente não assumiu o comando de acções criminosas no exterior, aqui contando com o apoio directo de diversos membros da sociedade clandestina X (fls. 7596 e 7598);
   - Que, todos os arguidos ( no que inclui o recorrente), outros indivíduos referidos nos autos e outros não identificados não se concertaram num grupo, para levar à prática actividades delituosas, que todos quiseram e aceitaram em nome de todos (fl. 7603);
   - Que, todos os arguidos (no que se conclui o recorrente), e demais elementos da referida facção da sociedade secreta X, não actuaram articuladamente entre si, não representaram, não quiseram, nem aceitaram quaisquer crimes, em nome e no interesse do grupo (fl.7604); e
   - Que, todos os arguidos (no que se conclui o recorrente), não se associaram, coordenando vontades para a prática de fins ilícitos (fl. 7604).
   É de jurisprudência uniforme que só existe a contradição insanável quando se verifica a incompatibilidade entre os factos dados como provados, bem como entre os factos dados como provados e os não provados, como entre a fundamentação probatória da matéria de facto.4 [4 Cita-se para todos, o Ac. de 16 de Março de 2000 do Processo 25/2000.]
   A incompatibilidade entre os factos dados como provados e os dados como não provados deve ser absoluta e evidente, em face ao padrão de um homem médio.
   Quando os julgadores não deram por provados os factos:
   “- … , o arguido A está na cúpula da organização "X", cérebro e estratega desta, ligado à área operacional, sendo um dos elementos mais importantes na esfera de influência de Y, controlando um grupo de menores de 18 anos que frequentemente o acompanhavam;
   “- Que o arguido A esteve no concerto musical de Jackie Cheung que se realizou no Fórum de Macau, em 28/6/96;
   “- O arguido B surge como membro da direcção ou chefe em segunda linha da sociedade referida, considerado elemento activo, sendo apoiante do arguido A;
   “- O arguido F considerado chefe de segunda linha e membro da direcção da "X", pertence ao grupo de Y (soldado directo deste) e posteriormente seguidor e apoiante do arguido A, liderava um grupo de soldados/cavalos,
   Tal não implica o afastamento dos seguintes factos dados como provados:
   - “Desde há vários anos que existe em Macau uma sociedade secreta denominada "X", organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas, particularmente praticando crimes de homicídio, sequestro, rapto, ameaça, coacção, extorsão, a pretexto ou não de protecção, usura criminosa, entre outros;
   - Os 1.º e 6.º arguidos A e F, passaram a integrar a referida sociedade secreta denominada "X", em datas não concretamente apuradas, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, o arguido A exercia funções de chefia e o arguido F, no decurso do ano de 1995, era membro da mesma.”
   O erro do recorrente consiste na indevida conclusão retirada dos factos dados como não provados pelo Tribunal a quo, segundo o seu próprio critério de julgar.
   Como se sabe, a contradição tem que resultar dos próprios autos, nomeadamente, da fundamentação de matéria de facto, quer entre os factos dados como provados ou entre os factos dados como não provados, quer entre os factos dados como provados e os dados como não provados, mas já não entre os factos dados como provados e a conclusão dada pelo recorrente com o seu critério e indução dos factos dados como não provados.
   Não resultando provados determinados factos não implica automaticamente que se possa considerar provado o contrário daqueles factos.
   Como no recurso do 6.º arguido atrás apreciado, basta comparar os factos provados com os não provados para se concluir que não resulta de forma notória qualquer contradição.
   Assim sendo, não se verifica o vício de contradição insanável alegado pelo recorrente.
   
   3.1.2. Insuficiência de matéria de facto para a decisão de direito
   Ao apontar o vício de contradição insanável de fundamentação de matéria de facto, o recorrente suscitou também a questão de insuficiência de matéria de facto para a decisão de direito.
   Porém, quando afirma, por exemplo, não existir o “menor suporte fáctico” para provar o facto de amizade do recorrente com Y, como ser “estranho que aqueles que, durante vários anos trabalharam lado ao lado com o recorrente, só agora, após a prisão de Y, tenham verificado que a conduta do recorrente era indiciadora da sua pertença à X e, pasme-se, mesmo na qualidade de chefe dessa sociedade secreta”, está uma vez mais a pôr em causa a livre convicção dos julgadores.
   A falta de fundamento do recurso desta parte também é evidente, no qual o recorrente confundiu essencialmente a insuficiência de matéria de facto para a decisão de direito com a insuficiência de provas para a comprovação de matéria de facto.
   Dizemos que só existe a insuficiência da matéria de facto para decisão do direito quando os factos provados forem insuficientes para justificar a decisão de direito assumida e não também quando há insuficiência da prova para decidir, ou seja, tão só quando se verifique uma lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para boa decisão de direito.
   Vamos ver se existe uma lacuna referida.
   O recorrente A foi condenado pela prática de um crime de exercício de funções de chefia de associação ou sociedade secreta, previsto e punível pelo artigo 2.º, n.º 3 da Lei n.º 6/97/M.
   Diz o seu artigo 1.º, ao definir a associação ou sociedade secreta:
   “1.Para efeitos do disposto na presente lei, considera-se associação ou sociedade secreta toda a organização constituída para obter vantagens ou benefícios ilícitos cuja existência se manifeste por acordo ou convenção ou outros meios, nomeadamente pela prática, cumulativa ou não, dos seguintes crimes:
   a) Homicídio e ofensas à integridade física;
   b) Sequestro, rapto e tráfico internacional de pessoas;
   c) Ameaça, coacção e extorsão a pretexto de protecção;
   d) Exploração de prostituição, lenocínio e lenocínio de menores;
   e) Usura criminosa;
   f) Furto, roubo e dano;
   g) Aliciamento e auxílio à migração clandestina;
   h) Exploração ilícita de jogo, de lotarias ou de apostas mútuas, e cartel ilícito para jogo;
   i) Ilícitos relacionados com corridas de animais;
   j) Usura para jogo;
   l) Importação, exportação, compra, venda, fabrico, uso, porte e detenção de armas e de munições proibidas e substâncias explosivas ou incendiárias, ou de quaisquer engenhos ou artefactos adequados à prática dos crimes a que se referem os artigos 264.º e 265.º do Código Penal;
   m) Ilícitos de recenseamento e eleitorais;
   n) Especulação sobre títulos de transporte;
   o) Falsificação de moeda, de títulos de crédito, de cartões de crédito e de documentos de identificação e de viagem;
   p) Corrupção activa;
   q) Extorsão de documento;
   r) Retenção indevida de documentos de identificação e de viagem;
   s) Abuso de cartão de garantia ou de crédito;
   t) Operações de comércio externo fora dos locais autorizados;
   u) Conversão, transferência ou dissimulação de bens ou produtos ilícitos;
   v) Posse ilegal de meios técnicos susceptíveis de intromissão activa ou passiva nas comunicações das forças e serviços policiais ou de segurança.
   2. Para a existência da associação ou sociedade secreta referida no número anterior não é necessário que:
   a) Tenha sede ou lugar determinado para reuniões;
   b) Os membros se conheçam entre si e se reunam periodicamente;
   c) Tenha comando, direcção ou hierarquia organizada que lhe dê unidade e impulso; ou
   d) Tenha convenção escrita reguladora da sua constituição ou actividade, ou da distribuição dos seus lucros ou encargos.”
   Por seu turno diz artigo artigo 2.º ao definir e punir o crime de associação ou sociedade secreta
   “… …
   3. Quem exercer funções de direcção ou chefia em qualquer grau em associação ou sociedade secreta, nomeadamente utilizando senhas, códigos ou numerais característicos dessas funções, é punido com pena de prisão de 8 a 15 anos.“
   Na esfera doutrinal, ensina o Prof. Figueiredo Dias que, sendo os crimes de associação, tipicamente, crimes "permanentes", eles estão a cada momento e de forma ininterrupta a ser cometidos pelos respectivos agentes, o que permite que a detenção destes - sejam quais forem as circunstâncias em que se opera - possa sempre ser considerado prisão em flagrante delito para efeitos legais.5 [5 Prof. Doutor J. de Figuei-redo Dias, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 119, n.º 3751 e seguintes.]
   O tipo de ilícito das associações criminosas se assume como um verdadeiro crime de perigo abstracto todavia assente num substrato irrenunciável: a altíssima perigosidade desta espécie de associações, derivado do forte poder de ameaça de organização e dos mútuos estímulos e contra-estímulos de natureza criminosa que aquela cria nos seus membros.
   A simples existência de associação vale já como uma declaração de guerra à ordem estadual.
   Na posse do conceptualismo descrito, vamos apreciar o enquadramento jurídico dos factos dados como provados, entre outros, que se seguem:
   - "Os 1.º e 6.º arguidos A e F, passaram a integrar a referida sociedade secreta denominada "X", em datas não concretamente apuradas, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, o arguido A exercia funções de chefia e o arguido F, no decurso do ano de 1995, era membro da mesma.
   - Visavam obter rendimentos económicos com a sua pertença à referida sociedade.
   - Y era reconhecido como chefe máximo da "X", pelo arguido A.
   - A íntima amizade entre os dois data dos anos oitenta e manteve-se até ao presente, encontrando-se frequentemente os dois em sítios públicos e em locais reservados, designadamente em casa de Y.
   - Na conversa telefónica registada às 13.17 horas do dia 19/3/99, entre os arguidos A e M, o primeiro dá instruções ao segundo para bater num determinado indivíduo.
   - O arguido A esteve em diversas ocasiões, designadamente com Y, na [Discoteca (1)], no concerto musical de Andy Lau em 13/11/96, patrocinado por Y.
   - Esteve presente na festa de aniversário de Y que se realizou no "Restaurante" em 29/7/96, inicialmente esteve para efectuar uma viagem à Tailândia (Bangkok) com outros arguidos, num voo da Air Macau de 3/9/96, mas num último momento desistiu.
   - E, enquanto elemento da Polícia Judiciária, até 1996, serviu-se desse facto para dar cobertura a actividades ilícitas, chegando mesmo a omitir os deveres do seu cargo para deixar fugir indivíduo conotado com aquela sociedade secreta, em 26/2/96, na sequência da detenção de AA, conhecido por "Z", na [Sala VIP (1)] do Casino [Hotel (1)], conotado como pertencendo a tal sociedade secreta.
   - Na verdade, naquele dia, o referido indivíduo foi detido no Casino [Hotel (1)] por um inspector da Direcção de Inspecção e Contrato de Jogos (DICJ), por estar proibido de entrar nos Casinos, tendo injuriado o referido inspector.
   - O arguido A conduziu-o ao Posto da PJ no Casino.
   - Durante a madrugada, o arguido foi contactado por várias pessoas das relações do detido, tendo recebido dinheiro de uma delas, AB, conotado como pertencendo a tal sociedade secreta.
   - Mais tarde, o arguido libertou o detido sem para tal estar autorizado por ninguém."
   Sem necessidade de citar os restantes factos provados, é de concluir que é correcta a qualificação jurídica feita pelo Tribunal a quo, sendo patentemente improcedente o recurso desta parte.
   
   3.2. O crime de importação de arma proibida
   O recorrente A ainda foi condenado pela prática do crime de importação de arma proibida previsto e punível pelo artigo 262.º n.º 1 do Código Penal de Macau, com referência aos artigos 11.º al. a) e 8.º único al. a) do Diploma Legislativo n.º 21/73, na redacção introduzida a este preceito pelo D.L. n.º 23/80/M.
   Diz o artigo 262.º n.º 1 do Código penal de Macau que:
   “1. Quem importar, fabricar, guardar, comprar, vender, ceder ou adquirir a qualquer título, transportar, distribuir, detiver, usar ou trouxer consigo arma proibida ou engenho ou substância explosivos, ou capazes de produzir explosão nuclear, radioactivos ou próprios para fabricação de gases tóxicos ou asfixiantes, fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.”
   A arma examinada a fls. 6078 a 6087 é qualificada, sem dúvida, como arma proibida conforme os dispostos nos artigos 11.º al. a) e 8.º, único, al. a) do Diploma Legislativo n.º 21/73, na redacção introduzida a este preceito pelo D.L. n.º 23/80/M.
   E a importação desta arma também, sem dúvida, ocorreu “fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente”.
   O arguido recorrente alegou que, por um lado, a arma proibida ainda não entrou nos limites fiscais do Território de Macau (leia-se a R.A.E.M), sendo uma “operação de comércio externo”, dependente da autorização do Governador; por outro, quanto muito estar-se-ia de uma tentativa do crime.
   Mas não tem razão.
   Dos autos constam provados os seguintes factos:
   - “O arguido A importou de Espanha, em 12-6-98, uma pistola semi-automática, com 6 estrias, de calibre 9mm [marca X], examinada de fls. 6078 a 6087.
   - O arguido A, sabia não lhe ser permitida a importação da arma, com as características ilustradas no exame de fls. 6078 a 6087.”
   Dizemos que a “importação” pressupõe a compra-prévia e introdução no Território, e nos autos consta que o arguido fez com o que fosse enviada do exterior para o Território de Macau tal arma.
   Cremos que o legislador, com a expressão “importação”, não pode ter querido equipará-la a uma operação do comércio externo, nem a efectiva posse física da arma, para isso, reserva a expressão “detenção”.
   Sendo um crime de perigo comum para a consumação de um crime de importação de arma proibida, basta a sua introdução, precedida de, precedida de aquisição, do exterior, independente da sua posse física.
   Assim sendo, dúvidas não há cometeu crime.
   
   3.3. A declaração da perda o veículo
   Relativamente a esta parte, o recorrente pretendeu fazer a divisão entre o veículo e os seus equipamentos acessórios.
   No acórdão recorrido, foram declarados perdidos a favor do Território (leia-se R.A.E.) de Macau o veículo MF-XX-XX e os seus acessórios, pertencente ao recorrente.
   Entende o recorrente que eram estes acessórios, câmara de filmar e televisão, e não o veículo automóvel que permitia, nos termos do acórdão, “captar imagens passadas na retaguarda do automóvel” “vigiar e controlar veículos, agentes das forças de segurança e outras pessoas”.
   E nem era este equipamento intrinsecamente apto à criminalidade, quanto muito era apenas este em si perigoso para o efeito, nos termos do artigo 101.º n.º 1 do Código Penal de Macau.
   Não tem razão o recorrente.
   Já está assente no acórdão recorrido que o equipamento era apto à criminalidade (fl. 7564), sendo também certo que a câmara não só era transportada no veículo, mas instalada no mesmo. Em relação ao “haver sérios riscos de serem utilizados para o cometimento de novos ilícitos”, o tribunal não considerou separadamente o veículo e o seu equipamento. Dúvida também não há que os mesmos se encontravam funcionalmente dependentes, sem o veículo o equipamento não podia ser utilizado da mesma maneira ou para os fins designados, nomeadamente para ser utilizado na sua actividade de chefia de sociedade “X”.
   Assim que o veículo não pode ser separado do equipamento acessório para o efeito de declaração da sua perda.
   (...)”
   *
   * *
   IV. FUNDAMENTAÇÃO
   4.1. Antes do mais, cabe tecer as seguintes notas prévias:
   A. Tal como já se deixou explícito na doutrina do Prof. Alberto dos Reis: “Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” - in “Código de Processo Civil anotado”, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, Lim., 1984, pág. 143 (cfr. ainda, o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, proferido em 21 de Setembro de 2000 no Processo n.º 127/2000).
   Assim sendo, só nos limitaremos a resolver as questões concretamente postas pelo recorrente e delimitadas pelas conclusões da sua motivação de recurso, transitando em julgado as questões nelas não contidas, pois “uma conclusão que verse matéria não tratada ou desenvolvida especificadamente na minuta do recurso é de considerar como inexistente e não escrita”, “sendo irrelevante que algum tema não focado nas conclusões tenha sido abordado no texto da motivação ou que esse tema seja desenvolvido em alegações posteriores” – por todos, apud o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância (TSI), de 27/1/2000, in Processo n.º 1220; e os Acórdãos do então Tribunal Superior de Justiça de Macau (TSJ), de 3/7/1996 e de 21/6/1995, in Processos n.º 431 e n.º 311, respectivamente; e, a título de referência académica, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal (STJ), de 12/12/1995, in BMJ 452-385, de 29/2/1996, in Processo n.º 46740.
   
   B. Quanto ao poder de cognição em recurso penal correspondente a terceiro grau de jurisdição, há que atentar a que este Tribunal de Última Instância apenas conhece da matéria de direito, bem como dos vícios elencados no art.º 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (CPP) e de qualquer nulidade não considerada sanada, nos termos do n.º 3 do mesmo art.º 400.º, sendo certo que por força do art.º 47.º, n.º 2, da Lei n.º 9/1999, de 20 de Dezembro (Lei de Bases da Organização Judiciária da Região Administrativa Especial de Macau), nunca procede a renovação da prova, mesmo na hipótese prevista no art.º 415.º, n.º 1, do CPP, havendo lugar antes a reenvio do processo para novo julgamento, nos termos do art.º 419.º, n.º 1, do CPP. (cfr. o Acórdão deste Tribunal de Última Instância, proferido em 29/9/2000 in Processo n.º 13/2000. Neste sentido, aliás já se pronunciou o STJ de Portugal, nomeadamente no Acórdão de 19/9/1991 no Processo n.º 41837 (in “http://www.dgsi.pt/ jstj.nsf/6500...”), aqui invocado meramente para efeitos de referência académica: Da conjugação dos arts. 433.º e 410.º do Código de Processo Penal (de Portugal), resulta que o Supremo Tribunal de Justiça só julga, habitualmente, matéria de direito nas causas criminais de que conhece por via de recurso e, dentro de certos condicionalismos, só pode apreciar a matéria de facto quando se invoquem, como fundamento do recurso, a contradição insanável da fundamentação, ou o erro notório da apreciação da prova, mas apenas, em tais casos, quando o vício de que se invoca resultar do texto da decisão recorrida, quer por si só, quer quando conjugada com as regras da experiência comum.)
   Assim sendo, aos eventuais casos de verificação da “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada” e/ou de “contradição insanável da fundamentação” no acórdão recorrido nos termos do art.º 400.º, n.º 2, als. a) e/ou b), do CPP, nunca se aplica, a título subsidiário, o art.º 650.º do Código de Processo Civil de Macau (CPC), com a epígrafe de “Insuficiência da matéria de facto e contradição na decisão de facto”, que preceitua que: “1. Se entender que a matéria de facto pode e deve ser ampliada para fundamentar a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão de facto que inviabilizam a decisão de direito, o Tribunal de Última Instância manda julgar novamente a causa no Tribunal de Segunda Instância.// 2. O Tribunal de Última Instância fixa logo o regime jurídico aplicável ao caso; se, por insuficiência da matéria de facto, ou contradição na decisão de facto, o não puder fazer, fica a nova decisão que o Tribunal de Segunda Instância proferir sujeita a recurso para o Tribunal de Última Instância, nos mesmos termos que a primeira.”, dada a auto-suficiência do processo penal nesta matéria nos termos acima observados (cfr. o art.º 4.º do CPP).
   
   4.2. São, pois, as seguintes questões postas pelo recorrente a resolver:
   A. Do princípio do contraditório no caso de rejeição do recurso.
   B. Do crime de associação ou sociedade secreta.
   1) Da insuficiência da motivação devido à falta de indicação de provas.
   2) Da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
   3) Da contradição insanável da fundamentação.
   C. Do crime de importação de arma proibida.
   D. Do “confisco”.
   *
   A. – Do princípio do contraditório no caso de rejeição do recurso (i.e. da alegada violação do princípio do contraditório, previsto nos arts. 414.º, n.º 5, e 283.º do CPP, devido ao conhecimento do objecto do recurso sem realização de audiência no caso de rejeição).
   O recorrente defende que o Tribunal a quo não poderia ter decidido o recurso então por ele interposto do acórdão da Primeira Instância, por via da figura de rejeição por manifesta improcedência, se ao mesmo tempo tivesse rebatido, ponto por ponto, o objecto do recurso.
   É que, na sua opinião, o rebater, ponto por ponto, o objecto do recurso, equivale ao conhecimento do seu objecto, o que só é possível através da realização da audiência, em sede da qual ele poderia, em suma, proceder de uma forma oral, directa e pública, à defesa dos factos alegados na motivação de recurso, contraditando posições a bem da sua defesa.
   Assim sendo, como houve conhecimento do objecto do seu recurso mas sem realização da audiência, a Segunda Instância violou o princípio do contraditório, previsto nas disposições conjugadas dos arts. 414.º, n.º 5, e 283.º do CPP - cfr. os pontos a) a d) das conclusões da motivação do recurso do recorrente.
   Ora, quanto a esta questão, entendemos que:
   A rejeição de um recurso, com fundamento na sua manifesta improcedência, pressupõe o conhecimento do objecto do mesmo, se bem que se trate de uma simplificação do processo decisório perante a manifesta improcedência do recurso tendo em conta os respectivos fundamentos, rejeição esta que não justifica, quer pela letra quer pelo espírito da lei processual penal vigente, a prossecução dos autos com a realização da audiência, com prejuízo às celeridade e economia processuais (cfr. os arts. 410.º, n.º 1, e 411.º, n.º 1, do CPP, comparativamente).
   É que não se pode confundir, aqui, a rejeição do recurso por manifesta improcedência do mesmo, permitida pelo art.º 410.º, n.º 1, parte final, do CPP, com a rejeição do recurso por falta de motivação, prescrita pela primeira parte do n.º 1 deste preceito, nem com a rejeição do recurso por falta de indicação, nas conclusões da motivação de recurso que versem matéria de direito, dos elementos exigidos nas diversas alíneas do n.º 2 do art.º 402.º do CPP. No primeiro caso, há autêntico conhecimento do objecto do recurso, enquanto nos últimos dois, não pode haver conhecimento do objecto do recurso, dada a falta da motivação ou da indicação dos elementos em causa nas conclusões da motivação que versem matéria de direito (cfr. o art.º 402.º, n.os 1 e 2, do CPP).
   Daí se vê que manifestamente improcedem as considerações do recorrente de que o Tribunal a quo ““conheceu sem conhecer” o objecto do recurso; ou conheceu e rejeitou” (a pág. 7 da motivação de recurso, a fls. 8127 dos autos).
   E mesmo no conhecimento do objecto do recurso no caso da sua rejeição por manifesta improcedência, não está preterido o princípio do contraditório dos sujeitos processuais em causa, se não vejamos:
   - a regra do art.º 414.º, n.º 5, do CPP só tem validade quando se está em sede da audiência, convocada e realizada nos termos dos arts. 411.º e 414.º do mesmo diploma legal, pelo que nunca se pode falar da vigência, ainda que subsidiária, do art.º 283.º, o qual, aliás, nem sequer diz respeito à audiência de julgamento em primeira instância, mas sim ao debate instrutório dirigido pelo juiz de instrução;
   - o princípio do contraditório encontra-se sempre salvaguardado:
   - quer essencialmente no tribunal a quo, através do cumprimento do disposto no art.o 401.º, n.º 4, que preceitua que “o requerimento de interposição ou a motivação de recurso são notificados aos restantes sujeitos processuais afectados pelo recurso, devendo ser entregues no número de cópias necessário”, a fim de “os sujeitos processuais afectados pela interposição do recurso podem responder no prazo de 10 dias ...”, nos termos facultados pelo n.º 1 do art.º 403.º, sendo certo que, por sua vez, a resposta assim apresentada deve ser objecto de notificação aos sujeitos processuais por ela afectados, nos termos do n.º 2 do art.º 403.º do CPP;
   - quer ainda no tribunal ad quem, por meio do art.º 407.º, n.º 2, a aplicar no caso de o Ministério Público ter suscitado, na vista a dar nos termos do art.º 406.º, questão que agrave a posição processual do arguido, hipótese em que este é previamente notificado para, querendo, responder, nos termos do art.º 407.º, n.º 2;
   Por fim, não se pode socorrer a critérios puramente matemáticos ou quantitativos para justificar coisas de juízo qualitativo, sob pena de se cair em petição de princípio: não se pode partir do “quantum” das páginas de uma sentença, ou, rectius, do volume da fundamentação da mesma, para daí se concluir por um juízo de verificação ou não da manifesta improcedência do recurso.
   É que, para além do dever de se acatar os requisitos exigidos pela lei nomeadamente no art.º 355.º do CPP (alguns dos quais cuja inverificação é cominada com o vício de nulidade da sentença, nos termos do art.º 360.º, al. a) do CPP), não há critérios uniformes ou estandardizados de elaborar sentenças, tudo dependendo, antes, do estilo do seu relator ou juiz que elabore a sentença, que tanto pode ser mais sintético na sua exposição escrita, ou tanto ser mais analítico;
   Assim, o que leva à rejeição de um recurso por manifesta improcedência do mesmo nunca é o estilo sumário na enumeração dos fundamentos da decisão de rejeição ou o pequeno número de fundamentos para a decisão de rejeição, mas, sim, a verificação
   - em moldes manifestos (ou seja, como que ressaltando logo à vista)
   - da improcedência do recurso, examinados os fundamentos alegados na motivação de recurso.
   Aliás, para compensar o carácter abreviado do processo decisório no caso da rejeição do recurso, o legislador processual penal exige a unanimidade de votos na deliberação (art.º 410.º, n.º 2), ao contrário da apreciação e decisão do objecto do recurso só após a realização da audiência nos termos do art.º 411.º, caso em que é permitida a declaração de voto vencido em tribunal superior (cfr. o art.º 417.º, n.º 2, ao contrário do princípio do segredo da votação plasmado no art.º 348.º, a observar na Primeira Instância).
   Por outra banda, a audiência a realizar nos termos do art.º 414.º do CPP, tirando o caso de renovação da prova e/ou o caso de o arguido ter sido julgado à revelia na Primeira Instância, não serve mais do que para o relator fazer proceder aos debates do objecto do recurso, através da exposição sumária sobre o objecto do recurso, e da subsequente apresentação de alegações orais por outros sujeitos processuais, nos termos do art.º 414.º, n.os 1, 3 e 4, mas necessariamente sempre dentro do âmbito do objecto do processo, delimitado pelas conclusões da motivação de recurso (cfr. o art.º 402.º, n.os 1 e 2, e a nota prévia acima consignada em 4.1.A.).
   É certo que rigorosamente falando, in casu, a Segunda Instância pode ter-se limitado a elaborar o acórdão recorrido, através da indicação do tribunal recorrido, do processo, dos seus sujeitos, e da especificação sumária dos fundamentos da decisão, tal como assim exige apenas o art.º 410.º, n.º 3, do CPP.
   Entretanto, nunca constitui pecado o ter elaborado uma sentença de rejeição do recurso, em moldes eventualmente mais analíticos ou elaborados, com inserção nomeadamente no seu texto, do relatório, dos factos pertinentes à decisão, e da exposição, de forma completa, dos fundamentos da decisão, seguindo analogicamente a regra geral do art.º 355.º.
   Face a todo o acima exposto, improcede manifestamente o recurso nesta parte, não havendo, pois, violação do princípio do contraditório.
   *
   B. – Do crime de associação ou sociedade secreta.
   O recorrente pretende impugnar o acórdão ora recorrido que lhe rejeitou o recurso interposto do acórdão da Primeira Instância, na parte em que a Segunda Instância refere expressamente que:
   “Os factos dados como provados não são susceptíveis de alteração pelo Tribunal de recurso quando não tenham documentação das provas produzidas em audiência.
   É manifestamente improcedente o recurso que, apontando ao acórdão recorrido vícios da contradição insanável de fundamentação, do erro notório na apreciação de prova e da insuficiência de matéria de facto para a decisão de direito, pretende apenas pôr em causa a livre convicção dos julgadores.
   É suficiente a matéria de facto para condenar o agente pela prática de um crime de exercício das funções de chefia ou dirigente de associação secreta, da mesma consta que integra uma sociedade secreta e nela exercer funções de chefia.”
   Opinando assim o recorrente que essas afirmações do Tribunal recorrido, “a procederem, esvaziariam por completo o conteúdo e o alcance do disposto no n.º 2 do art.º 400.º do CPP” (cfr. a pág. 9 da sua motivação de recurso, correspondente à fls. 8129 dos autos).
   
   Quanto a isto, desde já cabe notar que as três afirmações acima indicadas pelo recorrente correspondem aos pontos 5, 6 e 7 da parte “IV. Concluindo:” do acórdão recorrido, respectivamente, onde a Segunda Instância se esforçou por resumir as ideias por ela defendidas na fundamentação da sua decisão dada aos recursos então sub judice (i.e. o recurso do Ministério Público, o recurso do arguido F, e o recurso do próprio A), através de nove conclusões (cfr. as págs. 80 a 81 do Acórdão recorrido, a fls. 7994v a 7995 dos autos).
   Ora, quanto ao ponto 5 das conclusões do Tribunal recorrido, está o mesmo correcto, pois tal como reza o art.º 418.º .do CPP, se não ter havido documentação da prova produzida em audiência, mesmo que a Segunda Instância vier a denotar qualquer dos vícios elencados no n.º 2 do art.º 400.º do CPP, não lhe resta outra via senão o reenvio do processo para novo julgamento, a ser feito pela Primeira Instância, isto por uma razão formal muito simples:
   - Se não houve documentação das declarações prestadas oralmente perante o tribunal singular ou o tribunal colectivo de Primeira Instância, nos termos do art.º 345.º do CPP, como é que seria possível ao Tribunal de Segunda Instância proceder em sede própria do art.º 414.º, n.º 2, à renovação da prova quando o mesmo Tribunal de recurso tivesse constatado, através da decisão preliminar ou interlocutória tomada nos termos do art.º 415.º, n.º 2, qualquer dos vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do art.º 400.º que resultasse dos elementos dos autos, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum, e houvesse razões para crer que a renovação da prova viria a permitir evitar o reenvio do processo?
   - É que consabidamente, a documentação da prova produzida na Primeira Instância é condição sine qua non para um eventual juízo de realização da renovação da prova na Segunda Instância.
   - Neste sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, incidentalmente proferido em 14/9/2000 no Processo n.º 132/00, em que se afirmou nomeadamente que: “De acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 415.º do Código de Processo Penal, só é de admitir a renovação da prova se tiver havido documentação das declarações prestadas oralmente perante o Tribunal Colectivo, se ocorrer qualquer dos vícios do n.º 2 do art.º 400.º e, cumulativamente, se se perfilarem razões que criem a convicção de que a renovação irá evitar o reenvio do processo.// São pressupostos de verificação simultânea e conjunta.// Requerida a renovação, há uma fase incidental prévia consistente no apuramento da concorrência daqueles pressupostos.// A questão coloca-se no visto preliminar e é decidida em conferência (n.º 3 e n.º 4 da al. a) do art.º 407.º e n.º 1 do art.º 409.º).”.
   Assim sendo, a impossibilidade a priori de renovação da prova com a falta de documentação da prova, conduz necessariamente à impossibilidade a priori de alteração da matéria de facto fixada pela Primeira Instância.
   E por conseguinte, é inimpugnável o ponto 5 das conclusões tecidas pela Segunda Instância no acórdão recorrido.
   
   Quanto ao ponto 6 das mesmas conclusões do Tribunal recorrido, e desde já abstractamente falando, também se nos mostra escorreito, porquanto há que evitar que o mecanismo de recurso que verse sobre matéria de facto seja aproveitado abusivamente para apenas pôr em causa a livre convicção do julgador, formada nos termos do art.º 114.º do CPP, sob pretexto – mas injustificado – de ocorrência de qualquer dos três vícios referidos no n.º 2 do art.º 400.º do mesmo diploma.
   Entretanto, ir-nos-emos debruçar infra e em concreto sobre a questão de saber se o recorrente, ao invocar alguns dos vícios previstos no n.º 2 do art.º 400.º, está ou não a pôr efectiva e somente em causa a livre convicção dos julgadores. E o mesmo se diga no que tange à aplicabilidade do ponto 7 das mesmas conclusões do Tribunal recorrido ao recurso ora sub judice.
   Assim, vejamos em concreto:
   O recorrente defende que perante a matéria de facto dada por assente e a respectiva motivação insuficiente dada pela Primeira Instância, “nunca poderia o Tribunal de primeira instância concluir que o recorrente havia integrado a sociedade secreta em causa e, muito menos, que nela exercia funções de chefia” – cfr. o ponto e) e f) das conclusões da motivação de recurso.
   Alegando, em concreto, que os factos provados e elencados a pág. 75 a 77 do acórdão da Segunda Instância ora recorrido (a fls. 7992 a 7993 dos autos), são insuficientes para permitir a decisão de direito, necessitando de ser completados.
   E em especial, é-lhe inaceitável que dos mesmos factos dados por assentes “se pudesse concluir que ele, à data da sua prisão, exercesse funções de chefia naquela sociedade secreta” (cfr. os pontos g) e h) das mesmas conclusões na motivação de recurso), “já que, recorde-se, nenhum dos co-arguidos do processo seguia ou apoiava o recorrente e mais ninguém foi condenado por qualquer normativo p. p. na citada Lei 6/97/M.” (cfr. a pág. 12 da motivação de recurso, a fls. 8132 dos autos.)
   Com essas imputações, o recorrente não pretende mais que suscitar a questão de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” condenatória no crime de exercício de funções de chefia em associação secreta, como vício elencado na al. a) do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, bem como almeja atacar a alegada insuficiência da motivação do Tribunal Colectivo da Primeira Instância para essa sua decisão, por ele reputada como “ilógica e arbitrária, notoriamente violadora das regras de experiência comum” (cfr. a pág. 11 da motivação de recurso, correspondente à fls. 8131 dos autos), já que segundo ele, a Primeira Instância não cumpriu a imposição normativa do n.º 2 do art.º 355.º do CPP, devido à falta de indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal.
   *
   B.1) – Da insuficiência da motivação devido à falta de indicação de provas.
   Ora, desde já, começando pela apreciação do alegado incumprimento da imposição normativa do n.º 2 do art.º 355.º do CPP, devido à falta de indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, há-de seguir as seguintes ideias com valor académico explanadas pelo STJ de Portugal, perante norma processual penal homóloga ao art.º 355.º, n.º 2, do CPP de Macau, nomeada e exemplificativamente nos seguintes arestos:
   – Acórdão de 11/2/1998, no Processo n.º 1323/97 – 3.ª Secção, in BMJ 474 (1998), pág. 309 a 320: “A indicação das provas em que o tribunal recorrido se fundou para formar a sua convicção satisfaz plenamente a obrigatoriedade estabelecida no artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal [de Portugal, homólogo ao art.º 355.º, n.º 2, do CPP de Macau], destinada a garantir que na sentença se seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, sem necessidade de referência expressa às testemunhas ouvidas a cada facto considerado provado”;
   – Acórdão de 15/6/1994, no Processo n.º 45950, in BMJ 438 (1994), pág. 210 a 221, onde se defende que a exigência de “indicação de provas”, a que se refere o n.º 2 do artigo 374.º do Código de Processo Penal de Portugal [homólogo ao art.º 355.º, n.º 2, do CPP de Macau], não vai ao ponto de reclamar a reprodução integral e casuística de todas as provas produzidas e relativas a cada um dos factos provados, mas basta-se com a indicação das provas que serviram ou funcionaram de suporte à convicção do tribunal, não se verificando, no caso, qualquer nulidade de sentença;
   – e Acórdão de 29/1/1992, no Processo n.º 42111 (in Colectânea de Jurisprudência, ano XVII, tomo I, p. 24 e segs.): a indicação das provas visa não principalmente a fiscalização do tribunal, por esta ser difícil, se não de impossível execução (salvo no que se refere a prova vinculada) em face da livre apreciação da prova conferida ao tribunal pelo artigo 127.º do CPP de Portugal (homólogo ao art.º 114.º do CPP de Macau), mas antes fazer incidir a atenção do Tribunal no momento de avaliar e decidir sobre as provas concretamente produzidas e ao tribunal de recurso nessa parte só é permitido intervir para verificar se ocorre algum dos vícios constantes do artigo 410.º, n.os 2 e 3 do CPP de Portugal (homólogo ao art.º 400.º, n.os 2 e 3, do CPP de Macau), vícios que hão-de resultar apenas do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.
   Outrossim, é de acolher também o entendimento do então TSJ de Macau (TSJ), vertido no seu Acórdão de 10/3/1999, no Processo n.º 991/99 (in Jurisprudência 1999, I tomo, pág. 479), também afastador de uma perspectiva maximalista no cumprimento do art.º 355.º, n.º 2, do CPP: “Se tivermos presente ... com o sentido de que a decisão deve reflectir a verdade material e permitir à instância de recurso um controlo efectivo da avaliação de todos os factos relevantes para a decisão da causa, parece óbvio que se essa verdade e esse controle puderem ser atingidos ainda que sobre uma decisão menos perfeita, não devemos ser tão puristas que exijamos um desnecessário e cego respeito pela letra da lei.”
   Tomando como padrão de decisão os critérios orientadores acima citados, é manifesto que a fundamentação de facto da decisão, dada pela Primeira Instância no que toca à indicação das provas em que esse mesmo Tribunal se fundou para a formação da sua convicção, deixada expressa nas pág. 104 a 110 do respectivo acórdão (a fls. 7607 a 7613 dos autos), satisfaz o imperativo do art.º 355.º, n.º 2, do CPP de Macau, não se mostrando deficiente, mas sim suficiente, racional, clara e congruente.
   E para o caso concreto sub judice, até podemos transplantar para aqui, como comentário final acerca da indicação das provas feita pela Primeira Instância, as seguintes considerações doutamente defendidas pelo STJ de Portugal, eminentemente com valor académico para nós, no seu Acórdão de 16/10/1997, no Processo (Recurso Penal) n.º 97P394, in “http://www.dgsi.pt/ jstj.nsf/6500...”:
   - Verificando-se que o tribunal não se serviu de meios ilegais de prova e que a sua convicção resulta de um processo lógico, racional, com base em dados concretos, não sendo a decisão arbitrária e porque a indicação das provas não significa que o tribunal recorrido tenha de mencionar o seu conteúdo, tem de se concluir que o acórdão recorrido se encontra fundamentado, nos termos do artigo 374.º, n.º 2, do CPP de Portugal [homólogo ao art.º 355.º, n.º 2, do CPP de Macau], não ocorrendo, portanto, a nulidade do artigo 379.º, al. a), do citado diploma legal [homólogo ao art.º 360.º, al. a), do CPP de Macau].
   E, finalmente, como demonstrativo dessa conclusão, basta transcrever as seguintes considerações da Primeira Instância a respeito da indicação das provas em que se fundou a formação da sua convicção, em especial relativamente ao crime de associação secreta por que vinha condenado o ora recorrente (cfr. as págs. 104 a 107 do respectivo acórdão, a fls. 7607 a 7610 dos autos):
   “Indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal:
   Relativamente às considerações gerais sobre a sociedade secreta X os depoimentos das testemunhas de acusação pertencentes às forças policiais e de investigação, particularmente o BA, o Chefe da PSP BB, o Sub-Intendente BC, os Inspectores BD, BE, BF e BG, os Investigadores BH, BI e BJ.
   Relativamente à prova de que o 1.º arguido A passou a integrar a referida sociedade secreta denominada “X”, em data não concretamente apurada, sabendo-se que à data da sua prisão exercia funções de chefia, temos fundamentalmente os seguintes meios de prova:
   O arguido A é funcionário da Polícia Judiciária desde 1966, onde ingressou como servente, sendo Investigador há mais de vinte anos.
   Y era reconhecido como chefe máximo da “X” pelo arguido A.
   A íntima amizade entre os dois data dos anos oitenta e manteve-se até ao presente, encontrando-se frequentemente os dois em sítios públicos e em locais reservados, designadamente em casa de Y.
   Pois bem, não está em causa neste processo saber se Y era ou não chefe máximo da “X”.
   O que releva para apurar da conduta do arguido A é que este o reconhecia como tal.
   Ora é um indício forte da pertença do arguido a tal tríade ou pelo menos do seu apoio à mesma que, sendo Investigador policial e tendo travado conhecimento com alguém que viria a reconhecer como chefe máximo da mais importante seita do Território, mantenha uma amizade íntima com o mesmo (declarações do próprio arguido).
   Como a mulher de César, não basta ser sério, também é necessário parecer.
   Em segundo lugar, o depoimento dos Colegas do arguido na Polícia Judiciária (BA, os Inspectores BD – segundo este, o arguido dizia frequentemente que era o “avô” de Y – BE, BF, BK e BG, os Investigadores BI e BJ, são particularmente importantes no sentido de o reconhecerem como um dos chefes da mesma sociedade secreta.
   Não se trata aqui de invocar vagas informações anónimas, como fizeram os agentes policiais relativamente a outros arguidos, mas do depoimento de pessoas que trabalharam lado a lado com o arguido durante vários anos.
   Em terceiro lugar, os factos relacionados com a libertação de AA, conhecido por “Z”, na [Sala VIP (1)] do Casino [Hotel (1)], conotado como pertencendo a tal sociedade secreta e que estava detido.
   Em quarto lugar, o facto de o veículo automóvel de matrícula MF-XX-XX registado em nome do arguido A e a ele pertencente, já após ter deixado de exercer funções na Polícia Judiciária, estar equipado com uma câmara de filmar e uma televisão “marca X”, servindo este equipamento para captar imagens passadas na retaguarda do referido automóvel de modo a que pudessem ser vigiados e controlados veículos, agentes das forças de segurança ou quaisquer outras pessoas.”
   
   Face ao exposto, improcede patentemente o recurso na parte delimitada pela Questão ora analisada.
   *
   B.2) – Da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
   Quanto a este alegado vício de “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”, há que fazer relembrar que, tal como os restantes dois vícios taxativamente elencados no n.º 2 do art.º 400.º do CPP (i.e. a “contradição insanável da fundamentação” e o “erro notório na apreciação da prova”), para poder permitir a reapreciação da matéria de facto considerada pelo Tribunal recorrido, ele tem que decorrer da própria decisão recorrida, sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, e há-de ser tão notoriamente evidente que não passe despercebido ao comum dos observadores, que o homem médio facilmente dê conta dele – neste sentido, cfr. o Acórdão da Relação de Lisboa, de 29/11/1994, no Processo n.º 79085, in “http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/333182...”, citado aqui a título de mera referência académica.
   Por outro lado, há que distinguir o vício de “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada” da “mera insuficiência da prova”, nos termos a seguir aliás já feitos pelo TSI, no seu Acórdão proferido em 15/6/2000 no Processo n.º 92/2000:
   “(...) A insuficiência só ocorre quando há “uma lacuna no apuramento da matéria de facto necessária a uma decisão de direito” (Prof. Germano Marques da Silva, apud “Curso de Processo Penal”, III, 325.
   O vício prende-se com a verificação de serem, ou não, bastantes os factos para, subsumidos à lei aplicável, poderem gerar a conclusão lógica.
   Não tem a ver com a mera insuficiência de prova. (...)
   (...) Ainda ... recentemente, este Tribunal de Segunda Instância decidiu que: “Só há insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, quando se verifica uma lacuna no apuramento desta matéria que impede a decisão de direito” – Ac. de 3 de Fevereiro de 2000 – P. 1261 – ou “quando se puder concluir que sem ela não é possível chegar-se à conclusão de direito encontrada (...)”.
   Assim, diferentemente da “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”, “a insuficiência da prova” para a matéria dada por assente está fora do âmbito do reexame por contender com o princípio da livre convicção do julgador, firmado no art.º 114.º do CPP (apud o já atrás citado Acórdão do TSI, de 15/6/2000), cuja formação depende necessariamente da apreciação global e crítica dos elementos de prova, segundo as regras da experiência e sob a égide da oralidade e imediação permitidas pelo confronto directo do julgador com os arguidos se julgados presencialmente com prestação de declarações.
   Ora bem, após analisados todos os elementos decorrentes do próprio acórdão ora recorrido, é-nos manifesto que não houve nenhuma lacuna na matéria de facto fixada pelas Instâncias anteriores, para a decisão condenatória do arguido ora recorrente no crime de exercício de funções de chefia em associação ou sociedade secreta.
   Pois, como demonstrativos disto, vigoram os seguintes factos considerados provados e constantes do acórdão recorrido, que por si só são suficientes para a condenação do ora recorrente no crime em causa:
   - Desde há vários anos que existe em Macau uma sociedade secreta denominada "X", organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas, particularmente praticando crimes de homicídio, sequestro, rapto, ameaça, coacção, extorsão, a pretexto ou não de protecção, usura criminosa, entre outros.
   - O modelo organizacional desta sociedade estrutura-se em torno de um líder ou líderes, sendo estes conhecidos por chefes de primeira linha.
   - A relação com os líderes é sustentada através do cumprimento rigoroso de códigos de honra e lealdade, acautelados com o recurso a sistemas punitivos de auto-protecção que quase sempre envolvem crimes de sangue.
   - No território de Macau, a sociedade clandestina referida é constituída por facções, grupos e subgrupos, com uma estrutura hierárquica complexa que se inicia nos denominados soldados/cavalos, passa pelos soldados principais, depois pelos membros de direcção (chefes de 2.ª linha, chefes de grupos operacionais) e acaba no chefe ou chefes de primeira linha.
   - Esta cadeia hierárquica não é fixa pois um soldado principal pode estar subordinado a um membro de direcção e ao mesmo tempo, ser chefe de soldados/ cavalos.
   - Os 1.º e 6.º arguidos A e F, passaram a integrar a referida sociedade secreta denominada "X", em datas não concretamente apuradas, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, o arguido A exercia funções de chefia e o arguido F, no decurso do ano de 1995, era membro da mesma.
   - Visavam obter rendimentos económicos com a sua pertença à referida sociedade.
   - Y era reconhecido como chefe máximo da "X", pelo arguido A.
   - A íntima amizade entre os dois data dos anos oitenta e manteve-se até ao presente, encontrando-se frequentemente os dois em sítios públicos e em locais reservados, designadamente em casa de Y.
   - O arguido A esteve em diversas ocasiões, designadamente com Y, na [Discoteca (1)], no concerto musical de Andy Lau em 13/11/96, patrocinado por Y.
   - Esteve presente na festa de aniversário de Y que se realizou no "Restaurante" em 29/7/96, inicialmente esteve para efectuar uma viagem à Tailândia (Bangkok) com outros arguidos, num voo da Air Macau de 3/9/96, mas num último momento desistiu.
   - E, enquanto elemento da Polícia Judiciária, até 1996, serviu-se desse facto para dar cobertura a actividades ilícitas, chegando mesmo a omitir os deveres do seu cargo para deixar fugir indivíduo conotado com aquela sociedade secreta, em 26/2/96, na sequência da detenção de AA, conhecido por "Z", na [Sala VIP (1)] do Casino [Hotel (1)], conotado como pertencendo a tal sociedade secreta.
   - Na verdade, naquele dia, o referido indivíduo foi detido no Casino [Hotel (1)] por um inspector da Direcção de Inspecção e Contrato de Jogos (DICJ), por estar proibido de entrar nos Casinos, tendo injuriado o referido inspector.
   - O arguido A conduziu-o ao Posto da PJ no Casino.
   - Durante a madrugada, o arguido foi contactado por várias pessoas das relações do detido, tendo recebido dinheiro de uma delas, AB, conotado como pertencendo a tal sociedade secreta.
   - Mais tarde, o arguido libertou o detido sem para tal estar autorizado por ninguém.
   - Por causa destes factos foi-lhe instaurado processo disciplinar, que terminou com a aplicação de pena disciplinar de aposentação compulsiva. (factos todos estes constantes de fls. 7558 a 7561 dos autos.)
   - Os arguidos A, F e M agiram de forma voluntária e consciente nas acções referidas (cfr. fls. 7584).
   - Bem sabendo serem proibidas porque puníveis por lei as suas condutas (cfr. fls. 7584).
   
   Sendo certo que os primeiros sete factos acima transcritos e os últimos dois, já preenchem, quer objectiva quer subjectivamente, a autoria material, por parte do arguido recorrente A, do tipo legal do crime de exercício de funções de chefia em associação ou sociedade secreta, previsto e punível pelo art.º 2.º, n.º 3, da Lei da Criminalidade Organizada (Lei n.º 6/97/M, de 30 de Julho), com referência, no caso concreto dos autos, ao art.º 1.º, n.º 1, als. a), b), c) e e), da mesma Lei.
   É que:
   - no 1.º desses factos, considera-se provada a existência desde há vários anos, em Macau, de uma sociedade secreta denominada “X”, formada por diversas pessoas, particularmente praticando crimes de homicídio, sequestro, rapto, ameaça, coacção, extorsão, a pretexto ou não de protecção, usura criminosa, entre outros (cfr. o art.º 1.º, n.º 1, als. a), b), c) e e), da Lei da Criminalidade Organizada);
   - nos 2.º a 5.º desses factos, fala-se do modelo organizacional da mesma sociedade secreta, nomeadamente constituída por facções, grupos e subgrupos, com uma estrutura hierárquica complexa (que se inicia nos denominados soldados/cavalos, passa pelos soldados principais, depois pelos membros de direcção e acaba no chefe ou chefes), a qual, porém, não é fixa, pois um soldado principal pode estar subordinado a um membro de direcção e ao mesmo tempo, ser chefe de soldados/cavalos (isto apesar de a citada Lei, no seu art.º 1.º, n.º 2, al. c), dispor que para a existência da associação ou sociedade secreta não é necessário que tenha comando, direcção ou hierarquia organizada que lhe dê unidade e impulso);
   - no 6.º desses factos, prova-se que o arguido ora recorrente passou a integrar essa sociedade secreta, em data não concretamente apurada, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, exercia o mesmo funções de chefia (ou seja, à data da sua detenção pela polícia, em 3 de Outubro de 1998 – cfr. fls. 839 dos autos), o que preenche objectivamente o tipo legal de “crime de associação ou sociedade secreta”, na modalidade qualificada de “exercício de funções de chefia”, previsto no art.º 2.º, n.º 3, da referida Lei, que preceitua precisamente que: “Quem exercer funções de direcção ou chefia em qualquer grau em associação ou sociedade secreta, nomeadamente utilizando senhas, códigos ou numerais característicos dessas funções, é punido com pena de prisão de 8 a 15 anos” (sublinhado nosso).
   - no 7.º desses factos, prova-se que o arguido ora recorrente visou obter rendimentos económicos com a sua pertença à referida sociedade secreta (cfr. o elemento de finalidade como integrador do tipo legal em causa, exigido no corpo do n.º 1 do art.º 1.º da acima referida Lei: “para obter vantagens ou benefícios ilícitos”);
   - e através dos últimos dois factos acima transcritos, está afirmado comprovadamente o dolo arguido recorrente na prática do crime de exercício de funções de chefia em associação secreta.
   Enquanto os restantes factos provados e acima transcritos são tidos pela Primeira Instância como “factos-indícios fortes” da integração pelo arguido recorrente da associação secreta “X”, nos termos explanados e constantes das págs. 105 a 107 do respectivo acórdão, na parte de “indicação das provas”, a fls. 7608 a 7610 dos autos, e aliás já por nós transcritos acima aquando da apreciação e resolução da Sub-Questão “B.1) - Da insuficiência da motivação devido à falta de indicação de provas”, a págs. 97 a 99 do presente acórdão.
   Assim sendo, andou bem a Segunda Instância ao concluir que é suficiente a matéria de facto para condenar o agente pela prática de um crime de exercício das funções de chefia de associação secreta, da mesma consta que integra uma sociedade secreta e nela exercer funções de chefia (cfr. o ponto 7 da parte “IV. Concluindo:”do
   acórdão recorrido, a fls. 7995 dos autos), tendo, pois, o recorrente confundido efectiva-mente o vício de “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”, elencado no art.º 400.º, n.º 2, al. a), do CPP, com a mera insuficiência da prova, e, consequentemente, pretendido apenas pôr em causa a livre convicção dos julgadores, já que, da nossa parte, não se afigura haver qualquer lacuna no apuramento da matéria de facto necessária à decisão condenatória do arguido ora recorrente na prática do crime de exercício de funções de chefia em associação ou sociedade secreta, p. e p. pelo art.º 2.º, n.º 3, da Lei da Criminalidade Organizada, sendo de realçar que o exercício de funções de chefia em associação secreta já absorve a conduta ilícita de pertença a associação secreta.
   Improcede, assim, manifestamente o recurso nesta parte, dada a inexistência do alegado vício de “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”.
   *
   B.3) – Da contradição insanável da fundamentação.
   Mais adiante, o recorrente avança com a alegada manifesta contradição insanável entre os factos provados e os não provados e, mesmo, entre os factos não provados.
   E em concretizaçao dessas imputações, defende de modo seguinte:
   - “Recorde-se que, como factos essenciais à procedência da acusação quanto ao arguido recorrente, o acórdão recorrido deu como provado:
   * a existência, no território de Macau de uma sociedade secreta denominada X, organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas, particularmente praticando crimes de homicídio, sequestro, rapto, ameaça, coacção, extorsão, a pretexto ou não de protecção, usura criminosa, entre outros;
   * a integração do arguido recorrente e de F (6ºarguido) na referida sociedade secreta denominada X, em datas não concretamente apuradas, sabendo-se que à data da sua prisão, em 3 de Outubro de 1998, o recorrente exercia funções de chefia e o arguido F, no decurso de 1995, era membro da mesma.
   Afirma-se, pois, no acórdão de 1.ª instância, que o arguido recorrente era chefe da sociedade secreta X à data da sua detenção.
   Nada mais se diz quanto a esse eventual exercício de funções de chefia, para além dessa isolada afirmação; nada mais sustente objectiva e seguramente tal conclusão.”
   (Cfr. as págs. 13 a 14 da motivação de recurso, correspondentes às fls. 8133 a 8134 dos autos).
   
   E quanto à alegada contradição insanável mesmo dentro dos factos não provados, opina em concreto o recorrente nas págs. 14 a 18 da motivação de recurso (a fls. 8134 a 8138 dos autos) que da análise dos factos não provados de maior relevância, é de “retirar as seguintes conclusões:
   * Que, de todos os arguidos, apenas o recorrente e o F integravam a X (cfr. fls. 7586);
   * Que, o F, conquanto membro da X, não reconhecia o Y como líder de uma facção da X e não seguia nem apoiava o recorrente (cfr. fls. 7587 e 7589);
   * Que, o recorrente, embora reconhecesse o Y como líder de uma facção da X, não estava na cúpula desta sociedade secreta, não era seu cérebro e estratega, não estava ligado à área operacional, não era um dos elementos mais importantes na esfera de influência de Y, nem controlava um grupo de menores de 18 anos (cfr. fls. 7587 e 7588);
   * Que, nenhum dos arguidos no processo, seguia ou apoiava o recorrente (cfr. fls. 7589 e segs.);
   * Que, nenhum dos arguidos (no que se inclui o recorrente), praticava actos de intimidação contra pessoas; recorria à violência; intimidava agentes de autoridade pública, importava e utilizava armas de fogo; explorava o exercício da prostituição através de clandestinos no território de Macau; procedia ao controlo das acções das forças e serviços policiais; procedia a empréstimos usurários a pessoas, privando-os de liberdade até ao seu pagamento; executava documentos de identidade falsos para escapar ao controlo policial (cfr. fls. 7593 e segs.);
   * Que, o recorrente não assumiu o controle real da sociedade secreta X após a detenção de Y, nem criou a divisão no grupo deste, de modo a ter uma maior preponderância nas suas áreas operacional e de direcção (cfr. fls. 7595).
   * Que, como tal, o recorrente não assumiu a liderança da X com a colaboração dos restantes arguidos (cfr. fls. 7596);
   * Que, uma vez detido, o recorrente não assumiu o comando de acções criminosas no exterior, aqui contando com o apoio directo e activo de diversos membros da sociedade clandestina X (cfr. fls. 7596, 7597 e 7598)
   * Que, todos os arguidos (no que se inclui o recorrente), outros indivíduos referidos nos autos e outros não identificados NÃO se concertaram num grupo, para levar à prática actividades delituosas, que todos quiseram e aceitaram em nome de todos (cfr. fls. 7603);
   * Que, todos os arguidos (no que se inclui o recorrente), e demais elementos da referida facção da sociedade secreta X, NÃO actuaram articuladamente entre si, NÃO representaram, NÃO quiseram, NEM aceitaram quaisquer crimes, em nome e no interesse do grupo (cfr fls. 7604);
   * Que, todos os arguidos (no que se inclui o recorrente), NÃO se associaram, coordenando vontades para a prática de fins ilícitos (cfr. fls. 7604)”;
   
   Para a partir daí, insistir na existência de manifesta contradição entre os factos provados e os não provados, pois:
   “O arguido recorrente era o chefe de quem?
   De que facção da X?
   Na verdade,
   Os arguidos absolvidos não o apoiavam nem o seguiam;
   O F também não;
   O Y não o tinha como um dos elementos mais importantes na sua esfera de influência;
   Não era cérebro nem estratega da X, nem estava na cúpula desta organização secreta;
   Não substituiu Y na liderança da X quando este foi detido;
   Não se concertou com os arguidos e com outros indivíduos identificados e não identificados numa facção da X; e
   Não se associou para a prática de fins ilícitos.
   Em que ficamos então?
   SE a sociedade secreta X é uma organização clandestina formada por diversas pessoas que, de forma concertada, estruturada e articulada vem desenvolvendo as suas actividades ilícitas; SE o recorrente a integrou, MAS não se concertou com outros indivíduos da “X”, NEM se associou para a prática de fins ilícitos; RESPONDE-SE, então, de forma clara: HÁ ou NÃO contradição insanável entre a matéria de facto provada e a não provada?”
   Por fim, para secundar o seu ponto de vista acima, considera ainda que chefiar uma associação secreta é um conceito de direito definido no n.º 3 do art.º 2.º da dita Lei (cfr. o ponto j) das conclusões da motivação de recurso, a fls. 8149 dos autos).
   
   Ora, como se sabe, a contradição insanável da fundamentação pode ocorrer entre a matéria de facto dada como provada, ou entre a dada como provada e a não provada, ou até entre a fundamentação probatória da matéria de facto, e tem de se apresentar insanável ou irredutível, ou seja, que não possa ser ultrapassada com o recurso à decisão recorrida no seu todo e às regras da experiência comum, sendo certo que não se podem incluir no âmbito deste vício, previsto na al. b) do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, as eventuais contradições entre a decisão e outras peças processuais das quais não é possível fazer uso, nem é possível a consideração de quaisquer elementos que lhe sejam externos, já que o recurso tem por objecto a decisão recorrida e não a questão sobre que incide esta decisão. – cfr. o Acórdão do então TSJ de Macau, de 14/10/1998, no Processo n.º 900, in Jurisprudência, 1998, II tomo, págs. 517 a 527.
   Nesta óptica, é-nos evidente que não se verifica o alegado vício de contradição insanável da fundamentação, visto que:
   -1.º) Já acima vimos aquando da apreciação do alegado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, que para afirmar que o arguido ora recorrente “era chefe da sociedade secreta X à data da sua detenção”, a Primeira Instância já teceu os seus fundamentos quer através de um conjunto de “factos-indícios fortes” quer por meio das suas considerações deixadas expressas na parte de “indicação das provas” do respectivo acórdão, tendo-se a Segunda Instância aderido a essa motivação de facto e de direito dada pela Primeira Instância no que concerne a este ponto concreto (cfr. a parte final da pág. 75 a pág. 77 do acórdão da Segunda Instância, a fls. 7992 a 7993 dos autos, ou seja, desde “Na posse do conceptualismo descrito, vamos apreciar o enquadramento jurídico dos factos dados como provados, entre outros, que se seguem: (...)” até “(...)// Sem necessidade de citar os restantes factos provados, é de concluir que é correcta a qualificação jurídica feita pelo Tribunal a quo, sendo patentemente improcedente o recurso desta parte”), pelo que improcede manifestamente a imputação do recorrente de que “Nada mais de diz quanto a esse eventual exercício de funções de chefia, para além dessa isolada afirmação; nada mais sustente objectiva e seguramente tal conclusão.”;
   -2.º) Por outro lado, as seguintes conclusões que o recorrente retirou “da análise dos factos não provados de maior relevância” não são correctas:
   - “Que, de todos os arguidos, apenas o recorrente e o F integravam a X (cfr. fls. 7586)”, pois o próprio recorrente também integrava a associação secreta X, segundo a matéria de facto provada fixada pelas duas Instâncias anteriores;
   - “Que, nenhum dos arguidos (no que se inclui o recorrente), praticava actos de intimidação contra pessoas; recorria à violência; intimidava agentes de autoridade pública, importava e utilizava armas de fogo; explorava o exercício da prostituição através de clandestinos no território de Macau; procedia ao controlo das acções das forças e serviços policiais; procedia a empréstimos usurários a pessoas, privando-os de liberdade até ao seu pagamento; executava documentos de identidade falsos para escapar ao controlo policial (cfr. fls. 7593 e segs.)”, pois nesta conclusão não se pode fazer incluir o ora recorrente, apesar de a Primeira Instância não ter feito inserir expressamente a correspondente excepção em relação a ele, na redacção/descrição dos factos não provados em causa, ao contrário do que se fez em relação à redacção/descrição dos primeiros três factos julgados não provados, nas págs. 83 a 84 do respectivo acórdão, a fls. 7586 a 7587 dos autos (i.e. “Não se provaram os seguintes factos:// Que os arguidos, com excepção dos 1.º e 6.º, A e F, passaram a integrar a sociedade secreta X, ... // Que todos os arguidos, com excepção dos 1.º e 6.º, A e F, face aos factos provados ... e outros indivíduos, alguns adiante identificados, ... // Desde, pelo menos, 1993 os arguidos, com excepção dos 1.º e 6.º, ... e outros indivíduos, alguns que referiremos mais à frente, faziam parte duma facção dentro da sociedade “X”...”);
   - “Que, todos os arguidos (no que se inclui o recorrente), outros indivíduos referidos nos autos e outros não identificados NÃO se concertaram num grupo, para levar à prática actividades delituosas, que todos quiseram e aceitaram em nome de todos (cfr. fls. 7603)”, pois não se pode fazer incluir o ora recorrente, pelas mesmíssimas razões acabadas de referir acima, atento o teor dos primeiros três factos não provados em causa, sendo certo que o mesmo fenómeno patológico sucede também em relação às seguintes conclusões retiradas pelo recorrente:
   - “Que, todos os arguidos (no que se inclui o recorrente), e demais elementos da referida facção da sociedade secreta X, NÃO actuaram articuladamente entre si, NÃO representaram, NÃO quiseram, NEM aceitaram quaisquer crimes, em nome e no interesse do grupo (cfr fls. 7604)”;
   - e “Que, todos os arguidos (no que se inclui o recorrente), NÃO se associaram, coordenando vontades para a prática de fins ilícitos (cfr. fls. 7604).”;
   -3.º) Pois, para nós, quando muito, só se verifica in casu uma eventual contradição literalmente aparente entre esses factos não provados referidos pelo recorrente e dos quais ele retirou as conclusões erradas acima, com aqueles três primeiros factos julgados não provados e descritos nas págs. 83 a 84 do acórdão da Primeira Instância (a fls. 7586 a 7587 dos autos), dada a já acima referida omissão de colocação de “excepção” em relação aos arguidos A e F, contradição aparente cuja eliminação é fácil de alcançar através de uma interpretação global e conjugada daqueles factos não provados com os três primeiros factos não provados, necessariamente à luz do teor da “indicação das provas” e da motivação de direito quanto ao crime de associação secreta, respectivamente dadas pela Primeira Instância a págs. 109 e 116 do seu acórdão (correspondentes às fls. 7612 e 7619 dos autos), onde se diz que:
   - (a fls. 7612:) “Quanto à falta da prova dos demais factos, particularmente de os restantes arguidos serem membros da X, a “prova” resumiu-se a rumores públicos e a informações, algumas vezes contraditórias entre si, alegadamente prestadas aos agentes policiais que depuseram.// Estes, porém, não estavam em condições de revelar as suas fontes, pelo que de acordo com o disposto nos arts. 117.º, n.º 1 e 116.º, n.os 1 e 3 do Código de Processo Penal, tais depoimentos não têm qualquer valor. (...)” (sublinhado nosso);
   - (a fls. 7619:) “Pois bem, face aos factos provados, três conclusões importa, imediatamente, extrair:// O 1.º arguido A praticou um crime de exercício de funções de chefia em associação ou sociedade secreta, previsto e punível pelo art.º 2.º, n.º 3, da Lei n.º 6/97/M.// O 6.º arguido F praticou um crime de membro de associação ou sociedade secreta.// Quanto aos restantes arguidos não se fez prova de facto atinente aos crimes em questão, pelo que nesta parte a acusação é improcedente e devem ser, como serão, absolvidos. (...)” (sublinhado nosso).
   4.º) E de resto, para o preenchimento do tipo legal do crime de “exercício de funções de chefia em associação ou sociedade secreta”, p. e p. pelo art.º 2.º, n.º 3, da Lei da Criminalidade Organizada, não é relevante apurar, no caso dos autos, as seguintes questões: “O arguido recorrente era o chefe de quem?” e “De quê facção da X?”, pois:
   - desde logo, como o tipo legal em causa basta objectivamente com o exercer de funções de direcção ou chefia em qualquer grau em associação ou sociedade secreta, assim, desde que esteja provado, como o caso dos autos no que tange ao recorrente, que alguém (ele) exerce funções de direcção ou chefia no seio da associação ou sociedade secreta, independentemente do grau da direcção ou chefia e/ou da identificação em concreto da facção ou facções em causa se existentes, já se acciona o mesmo tipo-de-ilícito;
   - aliás, resulta dos primeiros dos factos provados (a págs. 56 do acórdão da Primeira Instância, a fls. 7559 dos autos) que em Macau, a sociedade secreta “X” é constituída por facções, grupos e subgrupos, com uma estrutura hierárquica complexa que abrange soldados/cavalos, soldados principais, chefes de 2.ª linha e chefe ou chefes de primeira linha, cadeira hierárquica essa que não é fixa, pois um soldado principal pode estar subordinado a um membro de direcção e ao mesmo tempo, ser chefe de soldados/cavalos;
   - assim sendo, não faz sentido prático fazer insinuar, tal como faz agora o recorrente, que se “os arguidos absolvidos não o apoiavam nem o seguiam; o F também não; o Y não o tinha como um dos elementos mais importantes na sua esfera de influência; (o próprio recorrente) não era cérebro nem estratega da X, nem estava na cúpula desta organização secreta; não substituiu Y na liderança da X quando este foi detido; não se concertou com os arguidos e com outros indivíduos identificados e não identificados numa facção da X”, então há contradição insanável entre a matéria de facto provada e a não provada, uma vez que desses factos correspondentemente julgados não provados não se pode retirar a prova de que o recorrente não tenha exercido funções de chefia na sociedade secreta “X”, nomeadamente no seio de algum grupo ou subgrupo, e sobre outros membros da mesma sociedade não identificados que não fossem os restantes co-arguidos do presente processo penal, já que não se pode partir do teor da acusação pública dos presentes autos a lógica hipotética de que a “X” é formada apenas pelos arguidos do processo (e eventualmente também pelo Sr. Y e Sr. AA, reconhecido o primeiro pelo recorrente como líder da “X” e o segundo conotado como ligado à “X”);
   - aliás, a própria Lei da Criminalidade Organizada, ao proceder no seu art.º 1.º, à definição de associação ou sociedade secreta para efeitos do seu disposto, não exige que os membros da associação ou sociedade secreta se conheçam entre si para se poder considerar a existência da mesma – cfr. o art.º 1.º, n.º 2, al. b), dessa Lei.
   Assim sendo, não se verifica, de modo manifesto, nenhuma contradição irredutível da fundamentação no caso presente, ficando patentemente prejudicada também a tese do recorrente de que chefiar uma associação ou sociedade criminosa é um conceito de direito, tese esta defendida por ele próprio para secundar a questão da alegada contradição insanável da fundamentação.
   Por fim, importa notar que a expressão “à data de prisão, em 3 de Outubro de 1998” deve ser entendido no sentido de “no momento imediatamente anterior à data de detenção pela polícia em 3 de Outubro de 1998”, já que por um lado, quanto à data de prisão/detenção, é assim que resulta dos próprios elementos decorrentes do acórdão e constantes dos autos (cfr. fls. 839 dos autos), e por outro, só se provou efectivamente nos autos que o arguido recorrente exerceu funções de chefia “a” essa data, no sentido de “no momento imediatamente anterior a” essa data ou de “ao tempo dessa data.
   (Cfr. os seguintes dois factos não provados descritos na pág. 95 do acórdão da Primeira Instância, a fls. 7598 dos autos:
   - “Para controlarem as operações no exterior do E.P.Coloane os arguidos que aí se encontravam presos à ordem deste processo, mormente A e B, contavam no exterior com o apoio directo e activo de diversos membros da sociedade clandestina “X””; e
   - “E deste modo os arguidos A e B, embora detidos, continuaram a transmitir as suas ordens aos outros membros da seita “X”, ...”.)
   Face ao exposto, há que concluir que o recorrente limitou-se efectivamente, pois, e sob a cobertura do vício em causa, a fazer impor a sua perspectiva meramente subjectivista em relação à prova produzida nos autos, nada tendo, pois, a ver com os elementos constantes da decisão recorrida, ou seja, limitou-se a interpretar à sua maneira – pelo aquilo que lhe aprouver – a matéria de facto fixada pelas duas Instâncias anteriores, tendo partido de pressupostos errados acima observados, daí que não podemos deixar de concordar com a conclusão da Segunda Instância:
   – “O erro do recorrente consiste na indevida conclusão retirada dos factos dados como não provados pelo Tribunal a quo, segundo o seu próprio critério de julgar.” (cfr. a pág. 71 do acórdão recorrido, correspondente à fls. 7990 dos autos.)
   Improcede, assim necessariamente e de modo manifesto, o recurso nesta parte, sendo consequentemente também frustrada a pretensão do recorrente veiculada no ponto o) das conclusões da sua motivação de recurso (cfr. págs. 19 a 20 da motivação de recurso, correspondentes às fls. 8139 a 8140 dos autos) acerca da possibilidade de se mandar julgar novamente a causa no Tribunal de Segunda Instância, nos termos do art.º 650.º do CPC, tese esta que, aliás, já foi apreciada em abstracto na nota prévia consignada no ponto 4.1.B. do presente acórdão.
   *
   C. – Do crime de importação de arma proibida.
   O recorrente imputa à Segunda Instância a violação da norma expressa no art.º 262.º, n.º 1, do Código Penal de Macau (CP), por o ter punido pela prática do crime de importação de arma proibida, enquanto “ficou patente nos autos e no decurso da audiência que a arma em causa não chegou a ser levantada pelo recorrente na fronteira aduaneira do Aeroporto Internacional de Macau”, com o que “a arma proibida dos autos nunca esteve à disposição do recorrente”, pelo que lhe foi impossível consumar a execução desse crime, de perigo comum (cfr. a tese defendida nos pontos q) e r) das conclusões da motivação de recurso, a fls. 8150 dos autos).
   Ora, é - nos nítido que nesta Questão, o recorrente está a fazer discutir materialmente uma questão de direito, relacionada com o preenchimento do tipo legal em causa.
   Se não, vejamos:
   O art.º 262.º, n.º 1, do CP preceitua que:
   “Quem importar, fabricar, guardar, comprar, vender, ceder ou adquirir a qualquer título, transportar, distribuir, detiver, usar ou trouxer consigo arma proibida ou engenho ou substância explosivos, ou capazes de produzir explosão nuclear, radioactivos ou próprios para fabricação de gases tóxicos ou asfixiantes, fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.” (sublinhado nosso, por ser pertinente à Questão sub judice.)
   Efectivamente, o tipo-de-ilícito em causa traduz-se num conjunto de condutas ilícitas de perigo comum e abstracto (neste sentido, veja-se PAULA RIBEIRO DE FARIA, in “Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II”, Coimbra Editora, 1999, págs. 889 e 891, respectivamente:
   - “As condutas descritas por este tipo legal não lesam assim de forma directa e imediata qualquer bem jurídico, apenas implicam a probalidade de um dano contra um objecto indeterminado, dano esse que a verificar-se será não raras vezes gravíssimo. Por isso mesmo se usa também para qualificar estes crimes a expressão de “crimes vagos” ou “crimes com objecto de agressão indeterminado (cf. FIGUEIREDO DIAS, Sumários 1975 146, caracterizando os crimes de perigo abstracto como todos aqueles em que o perigo não constitui ele próprio elemento do tipo mas “motivo de proibição” ... (...))”;
   - “O bem jurídico protegido é por conseguinte a segurança da comunidade face aos riscos (em última instância para bens jurídicos individuais), da livre circulação e detenção de armas proibidas, engenhos e matérias explosivas.”
   Sendo certo que o “Agente do tipo legal em causa pode ser qualquer pessoa, uma vez que o seu preenchimento não depende de particulares qualidades ou características do sujeito. Agente será aquele que em cada momento proceda à venda, importação ou detenção de armas (para não falar nos outros tipos de actividade previstos) ....” “Trata-se de um tipo legal de realização permanente cujo preenchimento se inicia com qualquer um dos comportamentos descritos, e se mantém enquanto durar qualquer uma dessas formas de actuação” – ainda cfr. PAULA RIBEIRO DE FARIA, ibidem, pág. 899, com sublinhado nosso.
   Assim, como está provado que:
   - “O arguido A importou de Espanha, em 12-6-98, uma pistola semi-automática, com 6 estrias, de calibre 9mm [Marca X], examinada de fls. 6078 a 6087.” (cfr. o Acórdão da Primeira Instância, pág. 60 a 61; fls. 7563 a 7564 dos autos).
   - “O arguido A, sabia não lhe ser permitida a importação da arma de [marca X], com as características ilustradas no exame de fls. 6079 a 6087.
   Os arguidos A, ..., agiram de forma voluntária e consciente nas acções referidas.
   Bem sabendo serem proibidas porque puníveis por lei as suas condutas.” (cfr. o Acórdão da Primeira Instância, pág. 81; fls. 7584 dos autos).
   Então – ao contrário do que defende o recorrente – basta a mera iniciação do processo de importação da arma proibida em causa para se considerar preenchido o tipo legal do art.º 262.º, n.º 1, do CP, devendo entender-se a importação, para os efeitos deste preceito incriminador, no sentido de “aquisição no exterior e posterior transporte para o país”, segundo LEAL-HENRIQUES e SIMAS SANTOS, in “Código Penal – Anotado”, 2.º Volume, 1996, Editora Rei dos Livros, pág. 822 (cfr. ainda PAULA RIBEIRO DE FARIA, ibidem, pág. 895).
   Daí se vê que o Tribunal recorrido decidiu bem ao afirmar que: “Dizemos que a “importação” pressupõe a compra-prévia e introdução no Território ..// Cremos que o legislador, com a expressão “importação”, não pode ter querido equipará-la a uma operação do comércio externo, nem a efectiva posse física da arma ....” (cfr. as págs. 78 a 79 do Acórdão recorrido, a fls. 7993v a 7994 dos autos).
   Face ao exposto, nem é de acolher a alegação pelo recorrente a pág. 22 da sua motivação de recurso (fls. 8142), de que quando muito se estaria na presença de uma tentativa do crime, e aliás, impossível, no caso concreto dos autos.
   Isto tudo também independentemente do alegado pelo recorrente a pág. 21 da sua motivação de recurso (fls. 8141) de que “a arma em causa não chegou a ser levantada pelo recorrente na fronteira aduaneira do Aeroporto de Macau.//Isto é, não chegou a entrar nos limites fiscais do Território de Macau”, pois o recorrente foi condenado pela prática do crime do art.º 262.º, n.º 1, do CP pela importação da mesma. Daí a justeza da conclusão da Segunda Instância, ao afirmar que: “... para a consumação de um crime de importação de arma proibida, basta a sua introdução, precedida de ... aquisição, do exterior, independente da sua posse física.” (cfr. a pág. 79 do Acórdão recorrido, a fls. 7994 dos autos). (E ainda paralelamente, apesar de não respeitar à importação da arma, mas apenas a título de referência académica, cfr. o Acórdão do STJ, de 19/6/1996, no Processo n.º 96P352, in “http://www.dgsi.pt/...”, cujo sumário aponta que constitui crime consumado e não tentado, a importação ilícita de estupefacientes, embora estes não hajam chegado à posse dos seus destinatários, por haverem sido apreendidos na alfândega).
   E trata-se efectivamente, no caso, de uma arma proibida, por ser uma pistola semiautomática de calibre igual a 9mm, ou seja, superior a 7,65 mm – cfr. o art.º 8.º, § único, al. a), ex vi do art.º 11.º, al. a), ambos do Diploma Legislativo n.º 21/73, de 19 de Maio, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 23/80/M, de 2 de Agosto.
   Daí que a Primeira Instância concluiu correctamente ao afirmar que:
   - “O 1.º arguido A praticou um crime de importação de arma proibida previsto e punível pelo artigo 262.º n.º 1 do Código Penal, com referência aos arts. 11.º, al. a) e 8.º [§] único alínea a), do Diploma Legislativo n.º 21/73, de 19/5, na redacção introduzida a este último preceito pelo Decreto-Lei n.º 23/80/M, na medida em que importou uma pistola semi-automática com calibre de 9mm e, portanto, proibida.” (cfr. as págs. 112 a 113 do Acórdão da Primeira Instância, a fls. 7615 a 7616 dos autos.).
   Aliás, segundo a Primeira Instância na indicação das provas em que se fundou a formação da sua convicção quanto ao crime de importação de arma proibida, até foi o próprio arguido (ora recorrente) que admitiu “ter importado uma arma, embora alegasse que foi uma arma com características legais que encomendou” – cfr. as linhas 7 a 16 da pág. 107 do acórdão da Primeira Instância, a fls. 7610 dos autos.
   Improcede, pois, também manifestamente o recurso sub judice nesta parte, por obviamente estar verificado o crime de importação de arma proibida, previsto e punível pelo art.º 262.º, n.º 1, do CP.
   *
   D. – Do “confisco” (Da alegada violação do art.º 101.º do Código Penal com o “confisco” do veículo automóvel MF-XX-XX e do equipamento deste constituído por uma câmara de filmar e uma televisão [marca “X”]).
   O recorrente entende nomeadamente nos pontos s) a y) das conclusões da sua motivação de recurso que o veículo automóvel MF-XX-XX, a ele pertencente, e a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] instaladas no mesmo, não eram aptos à finalidade criminosa entendida pela Primeira Instância, pelo que não podem ser “confiscados” nos termos do art.º 101.º, n.º 1, do CP; e mesmo que o fosse, seria apenas o equipamento de câmara de filmar e de televisão como equipamento perfeitamente destacável do veículo, e não o veículo em si.
   
   Quanto a isto, está provado nos autos que (cfr. a pág. 61 do Acórdão da Primeira Instância, a fls. 7564 dos autos):
   - “O veículo automóvel de matrícula MF-XX-XX registado em nome do arguido A e a ele pertencente, já após ter deixado de exercer funções na Polícia Judiciária, estava equipado com uma câmara de filmar e uma televisão [marca “X”], servindo este equipamento para captar imagens passadas na retaguarda do referido automóvel de modo a que pudessem ser vigiados e controlados veículos, agentes das forças de segurança ou quaisquer outras pessoas, sendo assim utilizado na sua actividade de chefia da sociedade X.
   Tal equipamento foi apreendido a fls. 845 e examinado a fls. 2084/2085.”
   Ora, quanto a nós, este facto assim expresso não pode ser interpretado no sentido pretendido pelo recorrente de que só era “este equipamento (câmara de filmar e televisão) e não o veículo automóvel que permitia, nos termos do acórdão, “captar imagens passadas na retaguarda do automóvel” “vigiar e controlar veículos, agentes das forças de segurança e outras pessoas” (cfr. a pág. 26 da motivação de recurso, a fls. 8146 dos autos), visto que:
   - Se bem que a câmara de filmar e a televisão em causa sirvam para captar imagens que estejam ao alcance das objectivas da câmara de filmar, o facto provado acima circunscreveu as imagens em causa às “imagens passadas na retaguarda do referido automóvel [de matrícula MF-XX-XX] de modo a que pudessem vigiados e controlados veículos, agentes das forças de segurança ou quaisquer outras pessoas ...” (sublinhado nosso), pelo que no caso concreto dos autos, sem serem instalados no automóvel MF-XX-XX, nunca conseguiriam a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] em causa captar imagens passadas (que se passassem) na retaguarda do mesmo automóvel (e não de outro automóvel), daí que o instrumento do crime, para os efeitos do art.º 101.º, n.º 1, do CP, foi o veículo MF-XX-XX, necessariamente equipado com a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] em causa, e não apenas a câmara e a televisão;
   - Vistas as coisas noutro prisma, se não tivessem sido instalados no veículo MF-XX-XX, a câmara e a televisão em causa, por simples facto de serem aparelhos possibilitadores de captar imagens, também não deveriam ter sido objecto de declaração de perda. Ou ainda simetricamente falando, se não tivesse sido equipado com a câmara de filmar e a televisão em causa, o veículo MF-XX-XX, por simples facto de ser um veículo automóvel, também não deveria ter sido objecto de declaração de perda;
   - Nessa conformidade, há que concluir pela inseparabilidade do veículo MF-XX-XX da câmara de filmar e da televisão [marca “X”] em causa, isto, obviamente, independentemente da questão de utilização do termo “acessório” pelo Tribunal recorrido na qualificação do equipamento “câmara de filmar e a televisão em causa” em relação ao veículo MF-XX-XX, na frase “... o veículo não pode ser separado do equipamento acessório para o efeito de declaração da sua perda”, ínsita na pág. 80 do acórdão recorrido a fls. 7994 v dos autos, sob pena de se cair em petição de princípio ou mero silogismo nos seguintes termos, para nós incorrectamente defendidos pelo recorrente a pág. 27 da sua motivação de recurso (a fls. 8147): “Efectivamente, a expressão equipamento acessório afasta por definição a referida inseparabilidade”.
   Outrossim, quanto ao preenchimento do critério material exigido na segunda parte do n.º 1 do art.º 101.º do CP (com a epígrafe de “Perda de objectos”), que dispõe que “São declarados perdidos a favor do Território os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este tiverem sido produzidos, quando, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das pessoas ou a moral ou ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos”, a resposta é - nos afirmativa, já que:
   - pelas circunstâncias apuradas no caso concreto dos autos (i.e., servindo para captar imagens passadas na retaguarda de modo a que pudessem ser vigiados e controlados veículos, agentes das forças de segurança ou quaisquer outras pessoas, sendo assim utilizado na actividade de chefia da sociedade X), o veículo MF-XX-XX e a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] nele instaladas, oferecem, em seu conjunto, risco sério de ser utilizado para o cometimento de novo facto ilícito típico, mormente congénere ao praticado pelo recorrente A na actividade de chefia em associação ou sociedade secreta, através do mesmo veículo com mesmo equipamento.
   E é neste sentido que deve ser entendidas as seguintes considerações - fundamentos da Primeira Instância na pág. 125 do respectivo acórdão (a fls. 7628 dos autos):
   “ ... O veículo automóvel de matrícula MF-XX-XX registado em nome do arguido A e a ele pertencente, foi utilizado na sua actividade de chefia da sociedade X.
   (...)
   (...)
   Nos termos do art.º 101.º do Código Penal são declarados estes objectos perdidos a favor do Território, por haver sérios riscos de serem utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos.”
   E por conseguinte, improcede de modo manifesto o recurso também nesta parte, devendo manter-se a declaração de perda a favor do Território (hoje, leia-se R.A.E.M.) do veículo MF-XX-XX e a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] nele instaladas.
   *
   Conclusões:
   1. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista. Mas, o que importa é que o tribunal decida a questão posta, não lhe incumbindo apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.
   2. Assim sendo, o tribunal de recurso só se limita a resolver as questões concretamente postas pelo recorrente e delimitadas pelas conclusões da sua motivação de recurso, transitando em julgado as questões nelas não contidas, pois uma conclusão que verse matéria não tratada ou desenvolvida especificadamente na minuta do recurso é de considerar como inexistente e não escrita, sendo irrelevante que algum tema não focado nas conclusões tenha sido abordado no texto da motivação ou que esse tema seja desenvolvido em alegações posteriores.
   3. Quanto ao poder de cognição em recurso penal correspondente a terceiro grau de jurisdição, o Tribunal de Última Instância apenas conhece da matéria de direito, bem como dos vícios elencados no art.º 400.º, n.º 2, do CPP e de qualquer nulidade não considerada sanada, nos termos do n.º 3 do mesmo art.º 400.º, sendo certo que por força do art.º 47.º, n.º 2, da Lei de Bases da Organização Judiciária da Região Administrativa Especial de Macau, nunca procede a renovação da prova, mesmo na hipótese prevista no art.º 415.º, n.º 1, do CPP, havendo lugar antes a reenvio do processo para novo julgamento, nos termos do art.º 419.º, n.º 1, do CPP.
   4. Assim, aos eventuais casos de verificação da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e/ou de contradição insanável da fundamentação no acórdão recorrido nos termos do art.º 400.º, n.º 2, als. a) e/ou b), do CPP, nunca se aplica, a título subsidiário, o art.º 650.º do Código de Processo Civil, dada a auto-suficiência do processo penal nesta matéria.
   5. A rejeição de um recurso, com fundamento na sua manifesta improcedência, pressupõe o conhecimento do objecto do mesmo, se bem que se trate de uma simplificação do processo decisório perante a manifesta improcedência do recurso tendo em conta os respectivos fundamentos, rejeição esta que não justifica, quer pela letra quer pelo espírito da lei processual penal vigente, a prossecução dos autos com a realização da audiência, com prejuízo às celeridade e economia processuais - cfr. os arts. 410.º, n.º 1, e 411.º, n.º 1, do CPP, comparativamente.
   6. Não se pode, pois, confundir a rejeição do recurso por manifesta improcedência do mesmo, permitida pelo art.º 410.º, n.º 1, parte final, do CPP, com a rejeição do recurso por falta de motivação, prescrita pela primeira parte do n.º 1 deste preceito, nem com a rejeição do recurso por falta de indicação, nas conclusões da motivação de recurso que versem matéria de direito, dos elementos exigidos nas diversas alíneas do n.º 2 do art.º 402.º do CPP, porquanto nestes últimos dois casos, não pode haver conhecimento do objecto do recurso, dada a falta da motivação ou da indicação dos elementos exigidos legalmente.
   7. Mesmo no conhecimento do objecto do recurso no caso da sua rejeição por manifesta improcedência, o princípio do contraditório encontra-se sempre salvaguardado: quer essencialmente no tribunal a quo, através do cumprimento do disposto no art.o 401.º, n.º 4, tendo em vista os efeitos eventualmente relevantes dos n.os 1 e 2 do art.º 403.º, quer ainda no tribunal ad quem, por meio do art.º 407.º, n.º 2, a aplicar no caso de o Ministério Público ter suscitado, na vista a dar nos termos do art.º 406.º, questão que agrave a posição processual do arguido, hipótese em que este é previamente notificado para, querendo, responder, nos termos do art.º 407.º, n.º 2.
   8. Não se pode partir do “quantum” das páginas de uma sentença, ou, rectius, do volume da fundamentação da mesma, para daí se concluir por um juízo de verificação ou não da manifesta improcedência do recurso.
   9. É que, para além do dever de se acatar os requisitos exigidos pela lei nomeadamente no art.º 355.º do CPP (alguns dos quais cuja inverificação é cominada com o vício de nulidade da sentença, nos termos do art.º 360.º, al. a)), não há critérios uniformes ou estandardizados de elaborar sentenças, tudo dependendo, antes, do estilo do seu relator ou juiz que elabore a sentença.
   10. Assim, o que leva à rejeição de um recurso por manifesta improcedência do mesmo nunca é o estilo sumário na enumeração dos fundamentos da decisão de rejeição ou o pequeno número de fundamentos para a decisão de rejeição, mas, sim, a verificação, em moldes manifestos, da improcedência do recurso, examinados os fundamentos alegados na motivação de recurso.
   11. Rigorosamente falando, no caso de rejeição do recurso, o tribunal pode ter-se limitado a elaborar o acórdão recorrido, através da indicação do tribunal recorrido, do processo, dos seus sujeitos, e da especificação sumária dos fundamentos da decisão, tal como assim exige apenas o art.º 410.º, n.º 3, do CPP. Entretanto, nunca constitui pecado o ter elaborado uma sentença de rejeição do recurso, em moldes eventualmente mais analíticos ou elaborados, com inserção nomeadamente no seu texto, do relatório, dos factos pertinentes à decisão, e da exposição, de forma completa, dos fundamentos da decisão, seguindo analogicamente a regra geral do art.º 355.º.
   12. Aliás, para compensar o carácter abreviado do processo decisório no caso da rejeição do recurso, o legislador processual penal exige a unanimidade de votos na deliberação (art.º 410.º, n.º 2), ao contrário da apreciação e decisão do objecto do recurso só após a realização da audiência nos termos do art.º 411.º, caso em que é permitida a declaração de voto vencido em tribunal superior nos termos do art.º 417.º, n.º 2, ao contrário do princípio do segredo da votação plasmado no art.º 348.º e a observar na Primeira Instância.
   13. A audiência a realizar nos termos do art.º 414.º do CPP, tirando o caso de renovação da prova e/ou o caso de o arguido ter sido julgado à revelia na Primeira Instância, não serve mais do que para o relator fazer proceder aos debates do objecto do recurso, através da exposição sumária sobre o objecto do recurso, e da subsequente apresentação de alegações orais por outros sujeitos processuais, nos termos do art.º 414.º, n.os 1, 3 e 4, mas necessariamente sempre dentro do âmbito do objecto do processo, delimitado pelas conclusões da motivação de recurso.
   14. Se não houve documentação das declarações prestadas oralmente perante o tribunal singular ou o tribunal colectivo de Primeira Instância, nos termos do art.º 345.º do CPP, não seria possível ao Tribunal de Segunda Instância proceder em sede própria do art.º 414.º, n.º 2, à renovação da prova quando esse mesmo tribunal de recurso tivesse constatado, através da decisão preliminar ou interlocutória tomada nos termos do art.º 415.º, n.º 2, qualquer dos vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do art.º 400.º que resultasse dos elementos dos autos, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum, e houvesse razões para crer que a renovação da prova viria a permitir evitar o reenvio do processo.
   15. Isto porque a documentação da prova produzida na Primeira Instância é condição sine qua non para um eventual juízo de realização da renovação da prova na Segunda Instância, pelo que a impossibilidade a priori de renovação da prova com a falta de documentação da prova, conduz necessariamente à impossibilidade a priori de alteração da matéria de facto fixada pela Primeira Instância.
   16. Há que evitar que o mecanismo de recurso que verse sobre matéria de facto seja aproveitado abusivamente para apenas pôr em causa a livre convicção do julgador, formada nos termos do art.º 114.º do CPP, sob pretexto, mas injustificado, de ocorrência de qualquer dos três vícios referidos no n.º 2 do art.º 400.º do mesmo diploma.
   17. A indicação das provas em que o tribunal recorrido se fundou para formar a sua convicção satisfaz plenamente a obrigatoriedade estabelecida no art.º 355.º, n.º 2, do CPP, destinada a garantir que na sentença se seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, sem necessidade de referência expressa às testemunhas ouvidas a cada facto considerado provado, ou seja, essa exigência de indicação de provas não ao ponto de reclamar a reprodução integral e casuística de todas as provas produzidas e relativas a cada um dos factos provados, mas sim basta-se com a indicação das provas que serviram ou funcionaram de suporte à convicção do tribunal.
   18. Pois, a indicação das provas visa não principalmente a fiscalização do tribunal, por esta ser difícil, se não de impossível execução (salvo no que se refere a prova vinculada) em face da livre apreciação da prova conferida ao tribunal pelo artigo 114.º do CPP, mas sim fazer incidir a atenção do Tribunal no momento de avaliar e decidir sobre as provas concretamente produzidas e ao tribunal de recurso nessa parte só é permitido intervir para verificar se ocorre algum dos vícios constantes do artigo 400.º, n.os 2 e 3, do CPP.
   19. Por outro lado, se a decisão deve reflectir a verdade material e permitir à instância de recurso um controlo efectivo da avaliação de todos os factos relevantes para a decisão da causa, parece óbvio que se essa verdade e esse controle puderem ser atingidos ainda que sobre uma decisão menos perfeita, não se deve ser tão purista que se exija um desnecessário e cego respeito pela letra da lei.
   20. Assim, verificando-se que o tribunal não se serviu de meios ilegais de prova e que a sua convicção resulta de um processo lógico, racional, com base em dados concretos, não sendo a decisão arbitrária e porque a indicação das provas não significa que o tribunal recorrido tenha de mencionar o seu conteúdo, tem de se concluir que o acórdão recorrido se encontra fundamentado, nos termos do art.º 355.º, n.º 2, do CPP, não ocorrendo, portanto, a nulidade do art.º 360.º, al. a), do mesmo diploma.
   21. Para poderem permitir a reapreciação da matéria de facto considerada pelo tribunal recorrido, os vícios elencados no n.º 2 do art.º 400.º do CPP têm que decorrer da própria decisão recorrida, sem recurso a quaisquer elementos que lhes sejam externos, e hão-de ser tão notoriamente evidentes que não passem despercebidos ao comum dos observadores, que o homem médio facilmente dê conta deles.
   22. Há que distinguir o vício de “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada” da “mera insuficiência da prova”.
   23. A “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada” só ocorre quando há uma lacuna no apuramento da matéria de facto necessária a uma decisão de direito. O vício prende-se com a verificação de serem, ou não, bastantes os factos para, subsumidos à lei aplicável, poderem gerar a conclusão lógica. Ou seja, só se está perante este vício quando se verifica uma lacuna no apuramento desta matéria que impede a decisão de direito ou quando se puder concluir que sem ela não é possível chegar-se à conclusão de direito encontrada.
   24. Assim, diferentemente da “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”, “a insuficiência da prova” para a matéria de facto dada por assente está fora do âmbito do reexame por contender com o princípio da livre convicção do julgador, firmado no art.º 114.º do CPP, cuja formação depende necessariamente da apreciação global e crítica dos elementos de prova, segundo as regras da experiência e sob a égide da oralidade e imediação permitidas pelo confronto directo do julgador com os arguidos se julgados presencialmente com prestação de declarações.
   25. A “contradição insanável da fundamentação”, como vício previsto no art.º 400.º, n.º 2, al. b), do CPP, pode ocorrer entre a matéria de facto dada como provada, ou entre a dada como provada e a não provada, ou até entre a fundamentação probatória da matéria de facto, e tem de se apresentar insanável ou irredutível, ou seja, que não possa ser ultrapassada com o recurso à decisão recorrida no seu todo e às regras da experiência comum, sendo certo que não se podem incluir no âmbito deste vício, as eventuais contradições entre a decisão e outras peças processuais das quais não é possível fazer uso, nem é possível a consideração de quaisquer elementos que lhe sejam externos, já que o recurso tem por objecto a decisão recorrida e não a questão sobre que incide esta decisão.
   26. Assim, uma eventual contradição literalmente aparente entre os próprios factos não julgados provados, cuja eliminação é fácil de alcançar através de uma interpretação global e conjugada de todos os factos não provados, necessariamente à luz do teor da motivação de facto e de direito dada pelo tribunal recorrido, nunca conduz à “contradição insanável da fundamentação”, por não ser irredutível.
   27. O tipo legal do crime de “exercício de funções de chefia em associação ou sociedade secreta”, p. e p. pelo art.º 2.º, n.º 3, da Lei da Criminalidade Organizada (n.º 6/97/M, de 30 de Julho), basta com o exercer de funções de direcção ou chefia em qualquer grau em associação ou sociedade secreta, pelo que desde que esteja provado, como no caso dos autos no que tange ao recorrente, que alguém (ele) exerce funções de chefia no seio de uma associação ou sociedade secreta, independentemente do grau de direcção ou chefia, e/ou da identificação em concreto da facção ou facções em causa se existentes, já se acciona o mesmo tipo-de-ilícito.
   28. Aliás, a própria Lei da Criminalidade Organizada, ao proceder no seu art.º 1.º à definição de associação ou sociedade secreta para efeitos do seu disposto, não exige que os membros da associação ou sociedade secreta se conheçam entre si para se poder considerar a existência da mesma (cfr. o art.º 1.º, n.º 2, al. b), dessa Lei).
   29. O exercício de funções de chefia em associação secreta, como crime previsto no art.º 2.º, n.º 3, da Lei da Criminalidade Organizada, absorve a conduta ilícita de pertença a associação secreta, prevista no n.º 2, corpo, do mesmo artigo.
   30. O tipo-de-ilícito previsto no art.º 262.º, n.º 1, do CP traduz-se num conjunto de condutas ilícitas de perigo comum e abstracto, visto que as condutas descritas por este tipo legal não lesam assim de forma directa e imediata qualquer bem jurídico, apenas implicam a probalidade de um dano contra um objecto indeterminado, dano esse que a verificar-se será não raras vezes gravíssimo, sendo o bem jurídico protegido por conseguinte a segurança da comunidade face aos riscos (em última instância para bens jurídicos individuais), da livre circulação e detenção de armas proibidas, engenhos e matérias explosivas.
   31. E o agente deste tipo-de-ilícito será aquele que em cada momento proceda à venda, importação ou detenção de armas (para não falar nos outros tipos de actividade previstos no art.º 262.º, n.º 1, do CP), pois se trata de um tipo legal de realização permanente cujo preenchimento se inicia com qualquer um dos comportamentos descritos, e se mantém enquanto durar qualquer uma dessas formas de actuação.
   32. Assim, basta a mera iniciação do processo de importação da arma proibida em causa para se considerar preenchido o tipo legal do art.º 262.º, n.º 1, do CP, devendo entender-se a importação, para os efeitos deste preceito incriminador, no sentido de “aquisição no exterior e posterior transporte para o país”.
   33. Sem serem instalados no automóvel MF-XX-XX, nunca conseguiriam a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] apreendidos nos autos captar imagens passadas (que se passassem) na retaguarda do mesmo automóvel (e não de outro automóvel), pelo que o “instrumento do crime”, para os efeitos da declaração de perda a favor do “Território” (hoje leia-se “R.A.E.M.”) nos termos do art.º 101.º, n.º 1, do CP, foi o veículo MF-XX-XX, necessariamente equipado com a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] em causa, e não apenas a câmara e a televisão.
   34. Sendo certo que pelas circunstâncias apuradas no caso concreto dos autos, o veículo MF-XX-XX e a câmara de filmar e a televisão [marca “X”] nele instaladas, oferecem, em seu conjunto, risco sério de ser utilizado para o cometimento de novo facto ilícito típico, mormente congénere ao praticado pelo recorrente na actividade de chefia em associação ou sociedade secreta, através do mesmo veículo com mesmo equipamento, pelo que devem ser declarados perdidos nos termos do art.º 101.º, n.º 1, do CP.
   35. É que se não tivessem sido instalados no veículo MF-XX-XX, a câmara e a televisão em causa, por simples facto de serem aparelhos possibilitadores de captar imagens, também não deveriam ter sido objecto de declaração de perda. Ou ainda simetricamente falando, se não tivesse sido equipado com a câmara de filmar e a televisão em causa, o veículo MF-XX-XX, por simples facto de ser um veículo automóvel, também não deveria ter sido objecto de declaração de perda. Nessa conformidade, há que concluir pela inseparabilidade do veículo MF-XX-XX da câmara de filmar e da televisão [marca “X”] em causa.
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   Por todo o acima expendido, há que rejeitar o recurso sub judice no seu todo, dada a sua manifesta improcedência, nos termos do art.º 410.º, n.º 1, parte final, do CPP.
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   V. DECISÃO
   Por todo o acima exposto, acordam, em conferência, rejeitar, por manifesta improcedência, o recurso ora interposto pelo arguido recorrente A.
   Custas pelo recorrente, com 8UC de taxa de justiça, já reduzida em metade (art.º 72.º, n.os 1 e 3, do Regime das Custas nos Tribunais), para além da condenação no pagamento de uma importância fixada em 6UC, pela rejeição do recurso (nos termos do art.º 410.º, n.º 4, do CPP, conjugado com o art.º 4.º, n.º 1, al. g), do Decreto-Lei n.º 63/99/M, de 25 de Outubro, aprovador do Regime das Custas nos Tribunais).
   Notifique-se o recorrente e o Ministério Público (sendo o recorrente pessoalmente com entrega da cópia integral do acórdão, através da competente requisição ao Senhor Director do Estabelecimento Prisional de Macau, nos termos dos arts. 100.º, n.º 7, parte final, e 101.º, n.º 1, do CPP).
   Comunique-se o presente acórdão, com envio da respectiva cópia integral, aos Exm.os Advogados/Defensores de todos os 22 arguidos (incluindo o ora recorrente) julgados pela Primeira Instância, para efeitos de referência.
   
   Macau, 7 de Fevereiro de 2001.
   
   (Com a certificação de elaboração e revisão integral pelo relator do presente texto processado em computador, para os efeitos do art.º 84.º, n.º 2, do CPP.)
   
   Chan Kuong Seng (Relator Substituto) - Sam Hou Fai - Sebastião Póvoas
Processo No.14/2000 Página 114