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Processo n.º 8/2023
Recurso jurisdicional em matéria administrativa
Recorrente: Secretário para a Economia e Finanças
Recorridos: A e B
Data da conferência: 14 de Abril de 2023
Juízes: Song Man Lei (Relatora), José Maria Dias Azedo e Sam Hou Fai

Assuntos: - Imposto do selo especial

SUMÁRIO:
1. A liquidação do imposto do selo especial depende vinculadamente do preenchimento cumulativo dos seguintes pressupostos:
- A identidade do objecto: a aquisição e a subsequente transmissão referidas no n.º 1 do art.º 2.º da Lei n.º 6/2011 têm como objecto o mesmo imóvel ou mesmo direito sobre o imóvel;
- A identidade do sujeito: a pessoa que realiza a transmissão que está sujeita ao imposto do selo especial é o sujeito activo da aquisição anterior, sendo que a mesma pessoa opera sucessivamente a aquisição e a respectiva transmissão; e
- O tempo decorrido entre a transmissão sujeita ao imposto do selo especial e a liquidação do imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto que titulou a respectiva aquisição é menos que dois anos.
2. O imposto do selo especial é cobrado se o adquirente do imóvel ou do direito sobre imóvel transferir tal imóvel ou direito sobre imóvel a um terceiro no prazo de dois anos a contar da liquidação do imposto do selo (relativa à sua aquisição) procedida após a entrada em vigor da Lei n.º 6/2011.
A Relatora,
Song Man Lei
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
A e B, ambos melhor identificados nos autos, interpuseram recurso contencioso do acto de indeferimento tácito do seu recurso hierárquico necessário interposto para o Senhor Secretário para a Economia e Finanças do despacho do Director da Direcção dos Serviços de Finanças que indeferiu a sua reclamação apresentada do acto de liquidação oficiosa de imposto do selo especial e respectivos juros compensatórios.
Por acórdão proferido nos autos de recurso contencioso n.º 791/2021, o Tribunal de Segunda Instância julgou procedente o recurso, anulando o acto recorrido.
Inconformado, vem o Senhor Secretário para a Economia e Finanças recorrer para este Tribunal de Última Instância, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. O presente recurso tem por objecto o Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância, em 8 de Setembro de 2022, o qual concedeu provimento ao recurso contencioso de anulação interposto pelos ora recorridos com a consequente anulação do acto recorrido.
2. A decisão que se impugna procede, em nosso entender, a uma errada interpretação e aplicação da lei material bem como errada apreciação da matéria de facto.
3. O tribunal a quo decidiu com fundamento de que o contrato-promessa de cessão da posição contratual celebrado a 24 de Novembro de 2013 e a respectiva liquidação do imposto do selo são “irrelevantes” para efeitos de determinar a incidência de imposto de selo especial sobre o contrato-promessa de compra e venda celebrado pelos Recorrentes a 6 de Janeiro de 2014, pelo facto de ter ocorrido a resolução do primeiro contrato a 25 de Novembro de 2013.
4. O contrato-promessa de cessão da posição contratual celebrado entre os ora recorridos e C no valor de HK$680,000.00, celebrado a 24 de Outubro de 2013, encontra-se sujeito a tributação em sede de imposto do selo por força do artigo 51.º do RIS tendo o mesmo sido liquidado a 25 de Outubro de 2013.
5. A 6 de Janeiro de 2014 e D foi celebrado contrato-promessa de compra e venda pelos ora recorridos e D no valor de HK$1,580,000.00.
6. Em sede de imposto do selo especial, criado com vista ao combate à especulação imobiliária, por força do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 6/2011, com a redacção dada pela Lei n.º 15/2012, a transmissão temporária ou definitiva de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis no prazo de dois anos a contar da liquidação que tenha lugar após a entrada em vigor da Lei n.º 6/2011, do imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto que titulou a respectiva aquisição, está sujeita ao imposto do selo especial.
7. Nos n.ºs 1 e 2 do artigo 4.º da Lei n.º 6/2011 são atribuídos a determinados pressupostos de facto – documentos, papéis ou actos – efeitos jurídicos que, no plano tributário, revelam utilidades económicas que são possíveis atingir mediante aqueles meios negociais.
8. De acordo com as disposições legais acima referidas, são considerados como factos tributários os títulos, enquanto facto tributário per se e objecto imediato da incidência do imposto do selo especial.
9. Para efeitos de tributação, no âmbito de transmissões de bens, são os títulos que as tenham operado, e não a transferência da propriedade, que releva.
10. Quanto às fontes de transmissão em sede do imposto do selo especial, resulta claramente do artigo 4.º n.º 1 e n.º 2 alíneas 2) e 5) da Lei n.º 6/2011 que o contrato-promessa de compra e venda encontra-se sujeito à incidência de imposto do selo especial verificados os respectivos pressupostos.
11. Sobre a incidência objectiva do imposto do selo especial, resulta da leitura conjugada do artigo 2.º n.º 1, quanto ao âmbito de aplicação daquele diploma, e do artigo 4.º n.º 1 e n.º 2 alíneas 2) e 5) que o contrato-promessa celebrado pelos ora recorridos a 6 de Janeiro de 2014 e D no valor de HK$1,580,000.00 reúne os pressupostos para a liquidação do imposto do selo especial.
12. No tocante à resolução, a 25 de Novembro de 2013, do contrato-promessa celebrado a 24 de Outubro de 2013, somente a apresentação pelo sujeito passivo de sentença transitada em julgado, que reconheça a invalidade ou ineficácia do documento, papel ou acto que titula a transmissão, impede a cobrança do imposto de selo, conforme o disposto no n.º 2 do artigo 52.º do RIS.
13. Citando o Acórdão no Processo n.º 661/2021 “A vontade só tem relevância na medida em que tal concretização do pressuposto da tributação assenta, em regra, num comportamento voluntário. Uma vez concretizado o pressuposto, gera-se inescapavelmente a obrigação tributária, sendo a vontade do contribuinte indiferente ao seu conteúdo e validade, muito menos a desistência posterior do negócio em causa”.
14. De tudo acima expendido não pode pois ser outra a conclusão de que a decisão da Administração Fiscal, em proceder à liquidação oficiosa do imposto do selo especial, foi em rigorosa conformidade com a lei aplicável por se encontrarem preenchidos os pressupostos de facto e de direito.
15. Ao não ter assim decidido, fez o Tribunal recorrido errada interpretação e aplicação da lei material aplicável, o artigo 51.º n.º 1, n.º 2 e n.º 3 alínea b) do e artigo 52.º do Regulamento do Imposto do Selo, o artigo 2.º n.ºs 1 e 2, artigo 4.º n.º 1 e n.º 2 alíneas 2) e 5) da Lei n.º 6/2011, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 15/2012, bem como errada apreciação da matéria de facto.

Contra-alegaram A e B, entendendo que deve ser negado provimento ao recurso jurisdicional e confirmado o acórdão recorrido.
O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o douto parecer, propendendo pelo não provimento do presente recurso jurisdicional.

2. Factos
Foi dada como assente a seguinte factualidade com interesse à boa decisão da causa:
1. Os ora recorridos adquiriram a posição contratual de promitentes-compradores da Fracção Autónoma, por contrato de cessão de posição contratual datado de 07 de Dezembro de 2007.
2. Por contrato outorgado em 24 de Outubro de 2013, os recorridos prometeram ceder a um terceiro a posição contratual de promitentes-compradores da Fracção Autónoma que detinham no CP de 07/12/2007, tendo o respectivo imposto de selo sido liquidado em 25 de Outubro de 2013 e pago pelo transmissário.
3. Em 25 de Novembro de 2013 acordaram as partes em não celebrar o contrato prometido, tendo os recorridos pago ao ali promitente-comprador/cessionário, designadamente, quantia equivalente ao dobro do sinal prestado.
4. Em 06 de Janeiro de 2014 foi celebrado novo contrato-promessa referente ao mesmo lugar de estacionamento entre os recorridos na qualidade de transmitentes e D na qualidade de adquirente.
5. No dia 14 de Janeiro de 2014 foi submetida perante a Administração Fiscal para liquidação do imposto do selo, a declaração Modelo M/1 a que foi dado o nº 2014/08/XXXXXX/X, o imposto devido no montante de MOP$17.088,00 foi pago por D no dia 21 de Janeiro de 2014 através da guia de pagamento com o nº 2014-08-XXXXXX-X-X.

3. Direito
Na óptica da entidade recorrente, o Tribunal recorrido fez errada interpretação e aplicação da lei material aplicável, o art.º 51.º n.º 1, n.º 2 e n.º 3, al. b) e art.º 52.º do Regulamento do Imposto do Selo, o art.º 2.º n.ºs 1 e 2, art.º 4.º n.º 1 e n.º 2, al.s 2) e 5) da Lei n.º 6/2011, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 15/2012, bem como errada apreciação da matéria de facto.
Vejamos.
No caso vertente, foi posta em causa a liquidação do imposto do selo especial.
Conforme a factualidade assente, tendo adquirido a posição contratual de promitentes-compradores do imóvel reportado nos autos por contrato de cessão de posição contratual datado de 07 de Dezembro de 2007, os ora recorridos prometeram ceder a um terceiro tal posição, por contrato outorgado em 24 de Outubro de 2013 e com pagamento pelo transmissário do imposto de selo liquidado em 25 de Outubro de 2013; E uma vez que não foi celebrado o contrato prometido, por acordo de ambas as partes, em 06 de Janeiro de 2014 os recorridos celebraram novo contrato-promessa referente ao mesmo imóvel com D.
A Direcção dos Serviços de Finanças decidiu proceder à liquidação oficiosa do imposto do selo especial relativo a tal transmissão, titulada por documento datado de 6 de Janeiro de 2014, ou seja, por contrato-promessa celebrado entre os recorridos na qualidade de transmitentes e D na qualidade de adquirente (cfr. fls. 25 dos autos).
Daí que está em discussão tão só a matéria relacionada com o imposto do selo especial, e não a do imposto do selo regulado pela Lei n.º 17/88/M (Regulamento do Imposto do Selo).
E não se constata no acórdão recorrido que o Tribunal recorrido fez interpretação e aplicação do disposto no art.º 51.º n.º 1, n.º 2 e n.º 3, al. b) nem do art.º 52.º, ambos do Regulamento do Imposto do Selo, nem do art.º 4.º n.º 1 e n.º 2, al.s 2) e 5) da Lei n.º 6/2011.

Como se sabe, o imposto do selo especial é criado pela Lei n.º 6/2011, que foi depois alterada pela Lei n.º 15/2012.
Resulta expressamente do art.º 1.º da Lei n.º 6/2011, na redacção dada pela Lei n.º 15/2012, que tal diploma “cria o imposto do selo especial que é devido na transmissão de bens imóveis destinados a habitação, com fins comerciais, de escritórios ou de estacionamento de veículos motorizados, localizados na Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM, construídos, em construção ou em projecto de construção, adiante designados por bens imóveis, ou direitos sobre esses bens imóveis, com vista ao combate à sua especulação”.
O art.º 2.º da mesma Lei define o âmbito de aplicação da lei, com o seguinte teor:
“Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1. A transmissão temporária ou definitiva de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis, no prazo de dois anos a contar da data da liquidação, que tem lugar após a entrada em vigor da presente lei, do imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto que titulou a respectiva aquisição, está sujeita ao imposto do selo especial.
2. Após a entrada em vigor da presente lei, a transmissão temporária ou definitiva dos bens ou direitos referidos no número anterior, ocorrida sem que tenha sido pago o imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto a que se refere o mesmo número, está sempre sujeita ao imposto do selo especial calculado com base na taxa prevista na alínea 1) do artigo seguinte.
3. Está sujeita ao imposto do selo especial a transmissão temporária ou definitiva dos bens ou direitos referidos no n.º 1 titulados por documentos, papéis ou actos que foram objecto de isenção do imposto do selo ao abrigo do disposto em leis do orçamento, no prazo de dois anos a contar da data de emissão da respectiva certidão de isenção do imposto do selo pela Direcção dos Serviços de Finanças, adiante designada por DSF, que tenha lugar após a entrada em vigor da presente lei.”
“São consideradas fontes de transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis todos os documentos, papéis ou actos que titulam a transferência ou promessa de transferência do direito de propriedade ou outro direito real de gozo sobre bens imóveis, ou a transferência ou promessa de transferência dos poderes de facto de utilização e fruição desses bens imóveis”, estando sujeitos ao imposto do selo especial “os contratos-promessa de compra e venda, os pactos de preferência, ou outros documentos, papéis ou actos que, ainda que lícitos, válidos e eficazes, não sejam susceptíveis de transmitir o direito de propriedade ou outro direito real de gozo” e “a cessão da posição contratual, independentemente da forma assumida” (n.º 1 e n.º 2, al. 2 e 5 do art.º 4.º)
E nos termos do art.º 5.º, “O sujeito passivo do imposto do selo especial é o transmitente do bem imóvel ou direito sobre bem imóvel”.
Desde logo, é de salientar que, tal como é sabido, a Lei n.º 6/2011 visa principalmente o combate às actividades de especulação a curto prazo no mercado das fracções habitacionais, sendo a cobrança do imposto do selo especial uma das medidas nucleares adoptadas “com vista a diminuir as actividades especulativas a curto prazo, assegurar o desenvolvimento estável do mercado imobiliário e diminuir a probabilidade de surgimento de uma crise no mercado imobiliário”. Nos termos dessa lei, “a transmissão de fracções habitacionais num curto espaço de tempo após a respectiva aquisição está sujeita, adicionalmente, ao imposto do selo especial.” 1
Tendo em consideração o aumento de especulação imobiliária relativa às lojas, escritórios e parques de estacionamento, que provocou efeitos negativos sobre a vida quotidiana da população e o normal funcionamento do comércio, o Governo da RAEM propôs a alteração da Lei n.º 6/2011, no sentido de estender o seu âmbito de aplicação às transmissões de lojas, escritórios e parques de estacionamento, “para combater a excessiva especulação relativa a esses imóveis”. Daí que, com a Lei n.º 15/2012, “a transmissão de lojas, escritórios e parques de estacionamento, no prazo de dois anos a contar da data da liquidação do imposto do selo, que tenha lugar após a entrada em vigor da nova lei, esteja sujeita ao imposto do selo especial”.2
Ora, com a definição expressa do âmbito de aplicação da Lei n.º 6/2011, o imposto do selo especial é cobrado nos casos em que se procedeu à transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis no prazo de dois anos a contar da data da liquidação do imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto que titulou a respectiva aquisição. (sublinhado nosso)
O prazo de dois anos conta-se a partir da data de liquidação do imposto do selo relativo à aquisição de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis.
E o imposto do selo é previsto na Lei n.º 17/88/M (Regulamento do Imposto do Selo, doravante RIS), em que, quanto à transmissão de bens, se estabelece que é devido imposto do selo por quaisquer documentos, papéis e actos que sejam fonte, para efeitos fiscais, de transmissão entre vivos, temporária ou definitiva, a título oneroso ou gratuito de imóveis, sendo consideradas fontes de transmissão de bens para efeitos fiscais todos os documentos, papéis ou actos que titulem a transferência dos poderes de facto de utilização e fruição do bem; e o sujeito passivo do imposto do selo é o adquirente do bem ou direito – art.ºs 51.º e art.º 53.º do RIS.
Assim sendo, sobre a transmissão do bem imóvel ou do direito sobre bem imóvel, é cobrado o imposto do selo, a pagar pelo adquirente do bem ou direito; se este vier a transferir o bem imóvel ou direito sobre bem imóvel que tenha adquirido, no prazo de dois anos a contar da data da liquidação, que tem lugar após a entrada em vigor da Lei n.º 6/2011, do imposto do selo relativo à respectiva aquisição, tem que pagar ainda o imposto do selo especial regulado nesta lei, pois é o transmitente do bem imóvel ou direito sobre bem imóvel o sujeito passivo do imposto do selo especial, nos termos do art.º 5.º da mesma lei.
Ora, tal como foi frisado pelo Digno Magistrado do Ministério Público, da interpretação literal, sistemática e teleológica das normas legais contidas na Lei n.º 6/2011 decorre que a liquidação do imposto do selo especial depende vinculadamente do preenchimento cumulativo dos seguintes pressupostos:
- A aquisição e a subsequente transmissão referidas no n.º 1 do art.º 2.º da lei têm como objecto o mesmo imóvel ou mesmo direito sobre o imóvel, quer dizer que o imposto do selo especial exige a identidade do objecto;
- A pessoa que realiza a transmissão que está sujeita ao imposto do selo especial é o sujeito activo da aquisição anterior, ou seja, o imposto do selo especial exige a identidade do sujeito – a mesma pessoa opera sucessivamente a aquisição e a respectiva transmissão; e
- O tempo decorrido entre a transmissão sujeita ao imposto do selo especial e a liquidação do imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto que titulou a respectiva aquisição é menos que dois anos.
É esta interpretação que cremos corresponder à intenção legislativa da Lei n.º 6/2011, de combater à especulação no mercado imobiliário local, exigindo o pagamento do imposto do selo (ordinário) enquanto adquirente do imóvel ou direito sobre imóvel e ainda o pagamento do imposto do selo especial, já na qualidade de transmitente, se houver transmissão do mesmo imóvel ou direito sobre imóvel no prazo de dois anos a contar da data da liquidação feita na vigência da Lei n.º 6/2011 do imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto que titulou aquela aquisição.
Por outras palavras, o imposto do selo especial é cobrado se o adquirente do imóvel ou do direito sobre imóvel transferir tal imóvel ou direito sobre imóvel a um terceiro no prazo de dois anos a contar da liquidação do imposto do selo (relativa à sua aquisição) procedida após a entrada em vigor da Lei n.º 6/2011.

No caso vertente, foi tributada a título de imposto do selo espacial a transmissão de um direito sobre imóvel titulada por contrato-promessa de 06 de Janeiro de 2014, porque, no entender da entidade ora recorrente, tal contrato “reúne os pressupostos para a liquidação do imposto do selo especial”, pois foi celebrado dentro do prazo de dois anos a contar do contrato celebrado a 24 de Outubro de 2013 entre os recorridos e um terceiro e da respectiva liquidação de imposto do selo, “que são relevantes para efeitos de incidência de imposto do selo especial do contrato de promessa de compra e venda de 6 de Janeiro de 2014”.
Ora, salvo o muito respeito por opinião diversa, afigura-se-nos dever ser outro o entendimento, face à nossa interpretação das normas legais acima exposta.
É verdade que os recorridos chegaram a celebrar um contrato promessa em 24 de Outubro de 2013, prometendo ceder a sua posição contratual de promitentes-compradores do imóvel que tinha adquirido em 07 de Dezembro de 2007, sendo que o transmissário pagou o imposto de selo liquidado em 25 de Outubro de 2013.
Não está em discussão o pagamento do imposto do selo nem a sua liquidação em 25 de Outubro de 2013, que é irrelevante, a nosso ver, para a resolução da questão colocada nos presentes autos.
Na verdade, independentemente da discussão sobre a validade da resolução do contrato celebrado em 24 de Outubro de 2013 e dos seus efeitos na matéria de imposto do selo nos termos do n.º 1 do art.º 52.º do RIS, tal como foi invocado pela entidade recorrente, sempre se deve afirmar que a liquidação de 25 de Outubro de 2013 não pode assumir a relevância pretendida pela entidade recorrente, por não incidir sobre o documento que titulou a aquisição do direito sobre o imóvel por parte dos recorridos em 07 de Dezembro de 2007.
Repetindo, o imposto do selo especial é cobrado se o adquirente transferir o imóvel ou o direito sobre imóvel no prazo de dois anos a contar da liquidação do imposto do selo (relativo à sua aquisição) procedida após a entrada em vigor da Lei n.º 6/2011, caso em que o indivíduo paga não só o imposto do selo (ordinário) mas também o imposto do selo espacial.
No presente caso, os recorridos adquiriram a posição contratual de promitentes-compradores do imóvel por contrato datado de 07 de Dezembro de 2007.
Não foi alegado pela entidade recorrente que a liquidação do imposto do selo relativo a essa aquisição tivesse lugar após a entrada em vigor da Lei n.º 6/2011.
Daí que não está compreendida no âmbito de aplicação da Lei n.º 6/2011a transmissão por contrato de 06 de Janeiro de 2014, não podendo haver lugar à tributação a título do imposto do selo especial ao abrigo do no n.º 1 do art.º 2.º da mesma Lei.
Invoca ainda a entidade recorrente a disposição do n.º 2 do art.º 2.º da Lei n.º 6/2011, que tem o seguinte teor:
“Após a entrada em vigor da presente lei, a transmissão temporária ou definitiva dos bens ou direitos referidos no número anterior, ocorrida sem que tenha sido pago o imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto a que se refere o mesmo número, está sempre sujeita ao imposto do selo especial calculado com base na taxa prevista na alínea 1) do artigo seguinte.”
Dessa norma, conjugada com o art.º 5.º da mesma lei, resulta que a transmissão ocorrida após a entrada em vigor da lei “está sempre sujeita ao imposto do selo especial” se o transmitente não pagou ainda o imposto do selo incidente sobre o documento, papel ou acto relativo à anterior aquisição.
Com tal norma, a transmissão dos bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis relativamente aos quais não tenha sido pago o imposto do selo nos termos legais, ocorrida após a entrada em vigor da lei, está sujeita ao imposto do selo especial de 20%, “independentemente do período que media entre a aquisição e a transmissão.”3
No caso sub judice, não é esta situação que está em causa, pois nem sequer foi alegado que os recorridos não chegaram a pagar o imposto do selo devido pela aquisição do direito sobre o imóvel4, inverificado assim o pressuposto da aplicação do n.º 2 do art.º 2.º da Lei n.º 6/2011.
Concluindo, não se nos afigura que o Tribunal recorrido tenha feito errada interpretação e aplicação da lei nem errada apreciação da matéria de facto apurada nos autos.
É de negar provimento ao recurso.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional.
Sem custas, por isenção subjectiva da entidade recorrente.

14 de Abril de 2023
                Juízes: Song Man Lei (Relatora)
José Maria Dias Azedo
Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Mai Man Ieng

1 Cfr. Nota Justificativa da Proposta da Lei n.º 6/2011 e Nota Justificativa da Proposta da Lei n.º 15/2012, ambas constantes da página electrónica da Assembleia Legislativa e Diário da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau, Série I, n.º IV-46, de 7 de Junho de 2011, pág. 17.
2 Cfr. Nota Justificativa da Proposta da Lei n.º 15/2012, constante da página electrónica da Assembleia Legislativa.
3 Cfr. Nota Justificativa da Proposta da Lei n.º 6/2011 e Nota Justificativa da Proposta da Lei n.º 15/2012, ambos constantes da página electrónica da Assembleia Legislativa.
4 Até se encontram nos autos os documentos de fls. 130 e 131, apresentados pelos ora recorridos, que mostram o pagamento do imposto do selo em Janeiro de 2008, devido pela aquisição pelos recorridos do direito do imóvel reportado nos autos.
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