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Processo nº 74/2020
(Autos de recurso jurisdicional)
   





ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. “COMPANHIA DE INVESTIMENTO E FOMENTO PREDIAL SAMTOLY, LIMITADA”, (“森多利置業發展有限公司”), sociedade com sede em Macau, interpôs, no Tribunal de Segunda Instância, recurso contencioso do despacho do CHEFE DO EXECUTIVO de 25.07.2017 que declarou a extinção do procedimento de troca do terreno da “Fábrica de Panchões Iec Long”, situada na Ilha da Taipa e determinou o pagamento da última prestação do prémio no valor de MOP$14.157.052,00; (cfr., fls. 2 a 46 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Por Acórdão de 20.02.2020, (Proc. n.° 862/2017), negou-se provimento ao recurso; (cfr., fls. 501 a 530).

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Inconformada com o decidido, do mesmo traz a aludida recorrente o presente recurso, alegando para, a final, produzir as conclusões seguintes:

“1. O presente recurso tem por objecto o douto Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância, que negou provimento ao recurso contencioso interposto do Despacho do Chefe do Executivo, de 25 de Julho de 2017, exarado na proposta n.º 254/DSO/2017 da DSSOPT, que, por sua vez, declarou a extinção do procedimento de troca do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long, sita na Ilha da Taipa, e determinou o pagamento da última prestação do prémio no valor de MOP14.157.052;
Da Produção de Prova
2. Pelo douto acórdão ora recorrido, foi rejeitada a reclamação apresentada pela Recorrente relativa à produção de prova;
3. Entende a Recorrente que a prova documental existente nos autos não é suficiente para que possam ser apreciadas todas as questões de facto e de direito suscitadas pela Recorrente no seu recurso;
4. Não está em causa a liberdade de uso da faculdade prevista no artigo 63.º do CPAC, apenas se invoca que está a ser inadequadamente aplicada porque a prova a produzir é relevante, pertinente, útil e essencial aos pedidos concretamente formulados pela recorrente;
5. Razão pela qual deve a decisão de não produção da prova testemunhal ser revogada e substituída por outra que determine a sua inquirição;
Da Legitimidade
6. O acto recorrido é composto por duas partes: (i) a declaração da extinção do procedimento administrativo de troca do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long e a ordem de pagamento da última prestação do prémio no valor de MOP$14.157.052,00;
7. Vem a douta decisão recorrida determinar a ilegitimidade da Recorrente para impugnar a primeira parte do acto (i) porque o procedimento da troca de terrenos estaria a correr somente entre a RAEM e a BNSE, (ii) porque a questão do prémio pago a mais “dizia respeito a alguém que tinha interesses directos nos terrenos da antiga fábrica de Panchões Iec Long”, (iii) porque “a circunstância de ter sido extinto o procedimento de troca (…) só lateralmente toca os interesses da recorrente” e (iv) porque “não se pode dizer que a solução da troca de terrenos tenha lesado a esfera jurídica da Samtoly ou atentado contra um interesse directo e pessoal da recorrente”;
8. Ao contrário, resulta dos documentos constantes dos autos que o procedimento de troca de terrenos encontrava-se a correr entre a RAEM e representantes da BNSE e da Samtoly;
9. Tal é o que directamente resulta da Informação n.º 30/SOTDIR/2000 (ponto 17 da matéria provada): “1. No seguimento da reunião efectuada com o Exmo. Sr. A, representante da G e da Companhia de Fomento Predial Sam To Lei, no Gabinete de V. Exa. respeitante ao assunto em epígrafe, deu entrada nesta DSSOPT o pedido de confirmação dos valores analisados, discutidos e acordados na citada reunião, nomeadamente no que respeita ao valor da propriedade da Fábrica Iec Long, assim como o valor do prémio que deve ser devolvido pela revisão da concessão do lote 27 da Baixa da Taipa efectuada no período da anterior Administração.”;
10. Da Informação n.º 88/DSODEP/99 pode ler-se também:
Pág. 6: “Confirma-se que os representantes da concessionária [a Samtoly] são igualmente parte interessada no processo de troca de terrenos da antiga Fábrica de Panchões Iec Long com 4. 627m2 em regime de aforamento, 2. 809m2 em regime de propriedade perfeita e cerca de 20.000m2 de terreno ocupado mas já revertido ao Território (…). [O mesmo se pode ler do parágrafo 6. da informação reproduzida no ponto 22.º da matéria considerada provada]
(…) julga-se de admitir, no processo de troca de terrenos do “Iec Long”, a participação da “Samtoly” como terceiro outorgante, ajustando-se então os valores das contrapartidas. Refere-se ainda que os representantes da concessionária manifestaram, em reuniões anteriormente realizadas a disponibilidade para liquidar a última prestação ($14.157.052,00) caso fosse admitida a concessão dos lotes de terreno do Plano da Baía da N. S. da Esperança como troca pelos terrenos da antiga Fábrica de Panchões Iec Long.”;
11. “Confirma-se deste modo que valores de uma eventual compensação do concessionário do lote BT27 passaram a estar incluídos no processo de troca de terrenos da antiga fábrica de Panchões Iec Long por terrenos do Plano da Baía da Esperança.” (parágrafo 12. da informação reproduzida no ponto 22.º da matéria considerada provada);
12. Resulta, de forma clara e inequívoca, que o procedimento de troca de terrenos envolvia a Recorrente como parte no negócio;
13. A troca de terrenos foi a forma encontrada pelos representantes da RAEM para compensarem a Recorrente do prémio que havia sido cobrado em excesso e, como tal, entenderam ser de resolver as duas questões num só procedimento administrativo;
14. Resulta claramente da cláusula nona do contrato publicado com o Despacho n.º 76/GM/93, que era a Recorrente a devedora do prémio adicional fixado e não qualquer outra entidade jurídica;
15. A partir do momento em que a compensação que lhe era devida foi incluída no termo de Compromisso, a troca de terrenos da Fábrica de Panchões passou a ser do interesse directo, pessoal e legítimo da Recorrente;
16. Pelo que a extinção do procedimento de troca afecta diretamente os interesses da Recorrente;
17. A devolução em singelo, em 2017 ou 2020, da compensação fixada em 2000 é algo absolutamente diferente do retorno do investimento que a Recorrente iria obter, juntamente com a BNSE, do aproveitamento dos terrenos resultantes da troca de terrenos (factor que ponderava o valor do dinheiro, independentemente da data em que se concretizasse o projecto da Baía da Nossa Senhora).
18. A diferença entre as duas formas de compensação, assumindo que a RAEM pagará o prémio pago a mais em singelo, é uma lesão directa e grave da esfera jurídica da Recorrente e resulta unicamente da extinção do procedimento de troca de terrenos;
19. Da mesma opinião é o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido que, a fls. 480, afirma: “afigura-se fora de questão o seu interesse e legitimidade na impugnação do acto, na sua totalidade, dada a relação de triangulação subjacente ao negócio de troca de terrenos, onde a recorrente está envolvida por via de pretensões relacionadas com o lote BT27, que era suposto virem a ser acauteladas no procedimento de troca, como resulta com exuberância, quer dos articulados da recorrente, quer dos elementos oferecidos pelos autos e pelo processo instrutor. Aliás, a recorrente, mesmo não sendo parte directa na troca, foi notificada do acto e instada a solver a quantia de MOP$14.157.052, exigida como última prestação da concessão daquele lote BT27.”
20. Assim também o entendeu a Entidade Recorrida quando praticou dois actos diferentes: um para a BSNE e outro para a Recorrente;
21. Do despacho do Chefe do Executivo que recaiu sobre a Proposta n.º 254/DSO/2017, relativo ao procedimento da Recorrente (aliás, sequencialmente anterior ao procedimento da BNSE), resulta inequivocamente que foi praticado um acto com duas vertentes: a declaração da extinção do procedimento da troca de terrenos e a consequente, no entender da Entidade Recorrida, necessidade de pagamento da última prestação do prémio;
22. Caso entendesse não ser a Recorrente parte interessada directa no acto de extinção do procedimento de troca de terrenos, a Entidade Recorrida podia ter optado por declarar a extinção no procedimento que preparou para a BNSE e, no procedimento realizado para a Recorrente, ter simplesmente remetido para a decisão ali tomada, o que não fez;
23. Com o devido respeito, que é muito, a conclusão de que a Recorrente tem um interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso resulta abundantemente e decorre de forma lógica da matéria considerada provada pela douta decisão acima citada, ou seja, a factualidade considerada provada aponta para a inequívoca legitimidade da Recorrente;
24. Razão pela qual a douta sentença ora recorrida é nula, nos termos do artigo 571.º, n.º 1 alínea c), em virtude de os seus fundamentos estarem em oposição com a decisão;
25. Porém, caso assim não se entenda, a decisão recorrida fez uma errada apreciação da prova documental que determina que a Recorrente é parte legítima para discutir a legalidade do acto relativo à extinção do procedimento de troca, aplicando de forma errada a lei aplicável, em particular o artigo 33.º do CPAC;
Do Pagamento da Última Prestação do Prémio e do meio Processual
26. O acto de determinação do pagamento faz parte do acto administrativo que impôs a extinção do procedimento de troca de terrenos e dele dependente em absoluto;
27. É um acto único e absolutamente autónomo do contrato administrativo que esteve na base do pagamento do prémio;
28. A contenda contratual existente entre a Recorrente e a RAEM sobre o prémio adicional devido pelo contrato publicado pelo Despacho n.º 76/GM/93 encontra-se resolvida desde 2001;
29. A Informação n.º 12/DSODEP/2000 (ponto 14. da matéria provada) ficou reconhecido que o prémio do Lote BT27 não havia sido calculado de acordo com os mesmos critérios utilizados para outros lotes em semelhantes circunstâncias, em que foram pagos valores consideravelmente mais baixos;
30. Na Informação n.º 30/SOTDIR/2000 (da qual foi junta certidão aos autos pela Recorrente e que se encontra reproduzida no ponto 17. da matéria provada) pode ler-se o reconhecimento por parte da RAEM em como é devida a devolução à Recorrente da quantia de MO77.000.000, paga por esta a título de prémio excessivo pela revisão do lote BT27, reconhecimento que foi concretizado pelo STOP em 21 de Julho de 2000;
31. Em 2001 é celebrado o Termo de Compromisso que passa a incluir a compensação devida à Recorrente, como se lê da Informação n.º 30/SOTDIR/2000; e
32. Por despacho do Chefe de Executivo, 15 de Março de 2013 é determinado que “(…) seja declarada a suspensão do pagamento da última prestação do prémio até à concretização dos respectivos processos de revisão e de troca de terrenos (…).” (ponto 17. da Informação n.º 031/DSODEP/2013, pontos 22. e 23. da matéria provada);
33. Fechando assim a discussão de todas as questões contratuais levantadas pela cobrança excessiva do prémio por parte da Administração;
34. Do despacho do Chefe de Executivo, de 15 de Março de 2013, resulta que a última prestação do prémio é devida quando se concretizar o processo de revisão da concessão e a troca de terrenos, ou seja, quando se concretizar o mecanismo de compensação da Recorrente;
35. Até à presente data nenhum desses factores ocorreu não sendo ainda devida a última prestação do prémio;
36. A ordem de pagamento é, no errado entender da Entidade Recorrida, uma consequência imediata da extinção do procedimento, fazendo uma equivocada interpretação e aplicação do despacho do Chefe de Executivo, de 15 de Março de 2013, já que enquanto não houver compensação da Recorrente não há lugar ao pagamento da última prestação do prémio, de acordo com o aquele despacho;
37. A extinção o procedimento da troca de terrenos apenas representa que a Recorrente, indevidamente, pôs termo ao mecanismo de compensação mas não compensou;
38. Extinguir o procedimento de troca de terrenos e simultaneamente pedir o pagamento da última prestação do prémio é vir pedir à Recorrente que pague um valor que já foi reconhecido como sendo indevido;
39. O Chefe do Executivo já reconheceu que o prémio devido era de MOP7.876.969 (ponto 8 da Informação 31/DSODEP/2013) e, até à data, a Recorrente já pagou, até à data, a quantia de MOP73.413.689, o que corresponde a quase dez vezes mais do que era devido;
40. E vem agora o acto recorrido pedir o pagamento de mais MOP14.157.052!
41. Se já foi confirmado que o valor foi mal calculado e que já foi pago prémio a mais a que título vem agora ser cobrado mais prémio da Recorrente?
42. O acto recorrido não tem por objectivo ou efeito (nem o refere, tão pouco) substituir a decisão tomada pelo Chefe do Executivo em 15 de Março de 2013 mas, pelo contrário, incumpre o ali determinado;
43. O acto recorrido é um acto autónomo, inovador e definidor da situação jurídica da Recorrente;
44. Acresce que o artigo 113.º, n.º 2 do CPAC determina que “O conhecimento da acção sobre contratos administrativos não impede o recurso contencioso de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato.”;
45. “Já costumava entender-se que no quadro da execução do contrato, se a Administração praticasse actos administrativos destacáveis, com efeitos definitivos e executórios, a apreciação da sua validade só podia ser feita em sede de recurso contencioso. O n.º 2 do artigo vem dar expressão a essa ideia.” (in Notas e Comentários ao Código de Processo Administrativo Contencioso, José Cândido de Pinho, Centro de Formação Jurídica e Judiciária, 2018, em anotação ao artigo 113.º);
46. Este é o caso da decisão em discussão nos autos que é um acto administrativo, bem como é impugnável em sede de recurso contencioso nos termos do 113.º, n.º 2 do CPAC;
47. A Recorrente não concorda com a decisão recorrida, também quando esta determina que a Recorrente devia ir discutir, noutra sede judicial, a invalidade da cláusula nona da revisão do contrato anexo ao Despacho 76/GM/93, para concluir que o recurso contencioso não é o meio processual adequado;
48. Conforme acima exposto, as contendas contratuais estão resolvidas: o único propósito de discutir a validade da cláusula nona seria a de obter a confirmação que o prémio foi calculado de forma errada e que foi cobrado prémio a mais, o que já foi validamente reconhecido pelo Chefe do Executivo;
49. Tendo inclusivamente sido confirmado o valor a restituir e a forma da restituição;
50. Pelo que não há mais interesse processual por parte da Recorrente em discutir esta questão numa acção relativa a contratos administrativos no Tribunal Administrativo;
51. Esta questão não é sindicável em sede de acção de contrato administrativo mas tão só em sede de impugnação de acto administrativo, nomeadamente nos termos do artigo 113.º, n.º 2 do CPAC;
52. Por isso não são mais relevantes as questões relativas a aceitação da minuta do contrato de revisão da concessão de terras ou da desistência da instância mencionadas na decisão recorrida;
53. Razões pelas quais se entende que o douto acórdão é nulo nos termos acima referidos e fez uma errada aplicação da lei processual ao concluir pela não inquirição das testemunhas, pela ilegitimidade da Recorrente e pelo erro na forma de processo”; (cfr., fls. 543 a 573).

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Na sequência das contra-alegações da entidade recorrida pugnando pela improcedência do recurso, (cfr., fls. 579 a 595), vieram os autos a este Tribunal, onde, em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público douto Parecer, pronunciando-se também no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 608 a 609-v).

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Cumpre apreciar.

Fundamentação

Dos factos

2. O Tribunal de Segunda Instância deu como provada a seguinte matéria de facto (que se passa a transcrever na sua íntegra):

“1º - A Recorrente “Companhia de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada” é uma sociedade comercial por quotas, com sede em Macau, [Endereço(1)], registada na Conservatória dos Registos Comerciais e Bens Móveis sob o n.º XXXX(SO) (Doc. n.º 3 junto com a p.i.).
2º - A Recorrente é concessionária do terreno designado por Quarteirão 27 (Lote BT27) sito na Baixa da Taipa, concedido por arrendamento inicialmente a B pelo Despacho 140/GM/89, publicado no Boletim Oficial n.º 51 de 18 de Dezembro 1989, nos termos do qual o prémio devido no montante de MOP56.366.550 (cláusula nona) foi integralmente pago pelo então concessionário.
3º - A referida concessão por arrendamento foi objecto de revisão pelo Despacho 76/GM/93, publicado na II Série do Boletim Oficial, n.º 33, de 18 de Agosto de 1993, do Chefe do Executivo, por B ter transmitido, a título gratuito, a concessão à ora Recorrente, da qual era sócio, que a recorrente aceitou expressamente por declaração de 6/01/1993 (fls. 699, vol. 3º do p.a.)
4º - Na sequência dessa revisão, foi determinado na respectiva cláusula 9ª um prémio adicional de MOP$ 87.570.741,00, que incluía o pagamento de 4 prestações semestrais de $ 14.157.052,00 cada uma (fls. 90 dos autos de acção ordinária nº 257/99/AO e fls. 346-347 dos presentes autos de recurso contencioso).
5º - B detinha, mediante procuração, uma quota-parte das parcelas de propriedade privada na antiga fábrica de panchões Iec Long, pelo que, era interessado na troca de terrenos realizada entre os titulares daquela fábrica e a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM).
6º - Porque existiu uma disputa entre o governo da RAEM e o concessionário deste terreno, relativa ao pagamento do prémio adicional, que considerava desajustado, os titulares do terreno da antiga fábrica de panchões solicitaram que se tivesse em consideração a resolução desta disputa no processo da permuta do terreno daquela fábrica.
7º - No dia 22/06/2017 foi elaborada a “Proposta nº 254/DSO/2017” no âmbito da DSSOPT, com o seguinte teor:
«Assunto: Relatório de investigação – Intenção de tomada de decisão do Chefe do Executivo, de declarar a extinção do procedimento de troca do terreno pertencente à Fábrica de Panchões Iec Long, e de ordenar à Sociedade de Investimento e Fomento Predial Samtoly o pagamento de última prestação do prémio do lote BT27 da Taipa.
(Proc n.º 6115.05)
1. Por despacho do Chefe do Executivo, de 24 de Abril de 2017, foi determinada a pretensão de declaração de extinção do procedimento de troca do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long (adiante designada por “Fábrica de Panchões”) nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 103.º do «Código do Procedimento Administrativo», aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M de 11 de Outubro, uma vez que de acordo com o n.º 2 do artigo 86.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de terras», existe a impossibilidade legal em relação ao respectivo objecto. E logo que declare a extinção do procedimento sobre a troca do terreno da Fábrica de Panchões, a Companhia de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada (adiante designada por “Samtoly”) deve pagar imediatamente a última prestação do prémio relativo ao lote BT27 da Taipa (Anexo 1)
2. Em conformidade com os artigos 93.º e 94.º do «Código do Procedimento Administrativo», esta Direcção de Serviços através do ofício n.º 324/6153.03/DSO/2017, de 9 de Maio, comunicou à Samtoly a referida intenção de tomada de decisão e que pode pronunciar-se sobre a mesma. (Anexo 2)
3. Em resposta ao ofício acima mencionado e, para os efeitos de audiência prévia, a Advogada C, representante da Samtoly, apresentou uma alegação escrita registada com entrada n.º 72 714/2017 de 25 de Maio de 2017, referindo as seguintes razões (Anexo 3):
O “termo de compromisso” não é nulo
3.1. O projecto do “termo de compromisso” foi visto e assinado pelo ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas (SOPT) em 8 de Janeiro de 2001 e autorizado e assinalado pelo Chefe do Executivo em 9 de Janeiro de 200l. Posteriormente em 10 de Janeiro de 2001, o “termo de compromisso” foi celebrado oficialmente pelo ex-Director da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) e pela Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança (adiante designada por “Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança”), nestas circunstâncias, o mesmo foi celebrado sob poderes conferidos legalmente;
3.2. O “termo de compromisso” foi transcrito no Despacho do SOPT n. º 87/2006, publicado no Boletim Oficial da RAEM (adiante designado por “Boletim Oficial”), n.º 23, II Série, de 7 de Junho de 2006;
3.3. Cabe ao Governo a decisão de publicação ou não do contrato administrativo, mas não à destinatária;
3.4. Pode-se verificar no n.º 11 deste despacho que o “termo de compromisso” e o respectivo processo já foram enviados à Comissão de Terras para discussão e parecer;
3.5. Nos termos legais, mesmo que o “termo de compromisso”, celebrado pela Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A. e pelo Governo, não fosse publicado no Boletim Oficial, produziria efeito entre as duas partes e estas obrigam-se a cumpri-lo;
3.6. A antiga «Lei de terras» é aplicável ao problema do “termo de compromisso”, e de acordo com os artigos 41.º, 124.º e 125.º desta lei, compete ao Chefe do Executivo a decisão de concessão de terreno, contudo, o “termo de compromisso” não é uma concessão de terreno;
3.7. O “termo de compromisso” tem por objectivo prometer a assinatura de um contrato e cujo conteúdo vai ser definido futuramente. Portanto, com a inexistência de concessão, não viola a antiga «Lei de terras».
A troca do terreno situado na Baía da Nossa Senhora da Esperança Pelo terreno da Fábrica de Panchões não é nula
3.8. A Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança trocou o terreno situado na Baía da Nossa Senhora da Esperança pelo terreno inteiro da Fábrica de Panchões e por pagamento de $ 428 000 000 patacas. O terreno inteiro envolve os terrenos da Sociedade e os ocupados pela mesma, incluindo a área total de 3 002 m2 de terreno em regime de propriedade perfeita, a qual é superior a 1 655 m2;
3.9. Na antiga «Lei de terras» permite-se expressamente trocar um terreno por um outro terreno menor do que aquele quando preenchidos os pressupostos de obedecer o princípio de equivalência e de que o concessionário paga, a título de preço ou renda, a importância correspondente à diferença;
3.10. O valor do terreno a trocar indicado no n.º 1.3 do “termo de compromisso” foi calculado de acordo com a legislação em vigor naquele momento que se relaciona com prémio. Não é adequado, nem justo tomar a decisão à base duma análise procedida de acordo com critério actual mas relativa à situação decorrente no passado;
3.11. O objecto do “termo de compromisso” envolve não só o terreno da Fábrica de Panchões, mas também as construções e coisas aí existentes e, com vista a resolver o problema do processo n.º 257/99, relativo ao prémio do Lote BT27 no valor de $ 77 000 000,00 patacas.
Sobre a devolução do prémio de $ 77 000 000,00 patacas
3.12. Conforme a intenção de tomada de decisão do Chefe do Executivo de 24 de Abril de 2017, logo que declare a extinção do procedimento sobre a troca do terreno da Fábrica de Panchões, Samtoly deve pagar imediatamente a última prestação do prémio relativo ao lote BT27 da Taipa, no valor de $ 14 157 052 patacas. Isso viola o despacho do Chefe do Executivo de 15 de Março de 2013, no qual foi determinada a suspensão de pagamento da última prestação do prémio até à conclusão da revisão do contrato de concessão do lote BT27 e do procedimento de troca do terreno da Fábrica de Panchões;
3.13. Segundo as informações constantes do processo, podemos saber que, até agora, a revisão do contrato de concessão do lote BT27 ainda não foi concluída, e também não foi concretizado o procedimento de troca de terreno da Fábrica de Panchões, pelo que actualmente não é possível exigir à concessionária do lote BT27, Samtoly, para pagar a última prestação do prémio;
3.14. A suspensão de pagamento da última prestação do prémio foi determinada pelo Chefe do Executivo, não é a falta de pagamento do prémio por parte da Samtoly;
3.15. Além disso, salientou que é obviamente injusto o Governo devolver agora o prémio pago em excesso em 1993 pela Samtoly, no valor de $ 77 000 000,00 patacas;
3.16. Dado que o acto do órgão administrativo prejudicou a Samtoly, nos termos legais, o órgão administrativo tem obrigação de a indemnizar;
3.17. A Samtoly considera sempre que o prémio recebido em excesso pela Administração de $ 77 000 000,00 patacas tornar-se-á uma parte do prémio quanto ao “termo de compromisso” da troca dos terrenos, constituindo assim uma compensação a Samtoly. Todavia, foi considerado o “termo de compromisso” nulo e consequentemente, a extinção do respectivo procedimento de troca vai ser declarada, isso prejudica completamente a expectativa legítima da Samtoly e violando o princípio da boa-fé.
4. Relativamente à alegação escrita da Samtoly, a análise ao assunto é a seguinte:
4.1 A Samtoly considera que o “termo de compromisso” foi celebrado sob os poderes conferidos legalmente. De facto, o que foi assinado pelo ex-SOPT, até pelo ex-Chefe do Executivo, é apenas urna minuta do “termo de compromisso”, mas não o original, pelo que não produz qualquer efeito jurídico (Anexo 4);
4.2 Pode-se verificar na cláusula primeira (objecto do contrato) do contrato de concessão titulado pelo Despacho do SOPT n.º 87/2006 que este despacho só titula a concessão de um terreno com a área de 18344 m2, situado na península de Macau, na zona B dos NAPE, junto da Avenida de Sagres e da Avenida Dr. Sun Yat Sen, descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º XXXXX. Além disso, a Comissão de Terras apenas emitiu parecer sobre o processo supra referido. Isto é, o conteúdo do acordo do “termo de compromisso” não é titulado por este despacho;
4.3 O disposto do artigo 127.º da «Lei de terras» em vigor é semelhante ao mesmo da antiga «Lei de terras», isto significa que a concessão e os eventuais actos de disposição relacionados com a concessão são titulados por despacho (do Secretário para os Transportes e Obras Públicas) publicado no Boletim Oficial;
4.4 Por isso, a publicação no Boletim Oficial do contrato de concessão de terreno é um acto formal obrigatório no ponto de vista jurídico, e não é uma decisão somente da parte do Governo, senão, é como o “termo de compromisso”, que fica nulo devido à falta do parecer da Comissão de Terras sobre o pedido de troca dos terrenos que não foi publicado no Boletim Oficial e que é um vício pelo que não é válido, assim implica a nulidade. Nos termos do n.º 1 do artigo 123.º do «Código do Procedimento Administrativo», o acto nulo não produz quaisquer efeitos, nem vincula qualquer pessoa ou entidade;
4.5 Em conformidade com o artigo 404.º do «Código Civil», aprovado pelo Decreto-Lei n.º 39/99/M, de 3 de Agosto, o “termo de compromisso” é um contrato-promessa que tem por objectivo a convenção da celebração de um contrato prometido. Visto que o conteúdo do contrato prometido envolve a concessão dos terrenos, não há qualquer dúvida de que o mesmo se rege pela «Lei de terras», aliás, nos termos dos artigos 168.º e 172.º do «Código do Procedimento Administrativo», a convenção constitui acto de formação dos contratos, pelo que também se rege pelo regime de invalidade;
4.6 Conforme as inscrições n.ºs XXXXXG e XXXXXG da CRP, verifica-se que o direito de propriedade das parcelas da Fábrica de Panchões, com a área total de 3 002 m2, demarcadas e assinaladas com as letras A11 (40 m2), A20 (694 m2), P1 (824 m2), Pla (462 m2), A18a (357 m2), A21 (256 m2), P3 (246 m2) e P2 (123 m2) na planta n.º 514/1989 de 13 de Setembro de 2016, descritas na CRP sob os n.ºs XXXXX (2020 m2), XXXXX (123 m2) e XXXXX (859 m2), acha-se inscrito a favor da Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança. Todavia, não existe registo sobre a situação de ocupação das outras parcelas da Fábrica de Panchões indicada pela Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança, esta sociedade nunca apresentou quaisquer provas ou decisão do Tribunal, comprovativas da sua alegação, ou seja, a aquisição dos respectivos direitos sobre a ocupação por meio de usucapião. Nestes termos, além das parcelas com a área de 3 002 m2, a Sociedade da Baía da Nossa Senhora da Esperança não tem legitimidade sobre o direito de disposição das outras parcelas de terreno da Fábrica de Panchões, mesmo que a ocupação seja um facto, tanto nos termos da nova «Lei de terras», como da antiga, o objecto da troca de terrenos deve ser do direito de terreno, mas não sobre a situação da ocupação de terreno (Anexo 5);
4.7 De facto, devido a várias razões, o conteúdo do “termo de compromisso” não foi realizado completamente até a entrada em vigor da Lei n.º 10/2013 em 1 de Março de 2014, por outra palavra, não foi realizada conforme o “termo de compromisso” a transmissão do terreno da Fábrica de Panchões à RAEM, nem a concessão do terreno situado na Baía da Nossa Senhora da Esperança, foi apenas concedida uma parte do terreno, ou seja, o terreno descrito sob o n.º XXXXX. Assim, uma vez que o procedimento ainda está a ser prosseguido, o que não produz completamente o esperado efeito jurídico, neste caso só se pode ser aplicada a nova Lei, isto é, a Lei n.º 10/2013;
4.8 O procedimento da troca dos terrenos, indicado no “termo de compromisso”, quer por iniciativa da RAEM, quer a pedido da entidade privada, e o facto de receber um terreno apenas com 3 002 m2 é incompatível com a igualdade das prestações prevista no artigo 86.º da Lei n.º 10/2013, isto é, existe a impossibilidade legal sobre os fins a alcançar do procedimento de troca dos terrenos resultante do “termo de compromisso”;
4.9 Aliás, considerando o princípio de legalidade, a Administração não pode continuar a pôr em prática o “termo de compromisso” que não está em conformidade com a «Lei de terras» em vigor, tanto na competência, como na forma e no procedimento.
4.10 De facto, conforme as informações constantes do processo n.º 6115, antes do despacho do Chefe do Executivo de 15 de Março de 2013, do qual se refere a suspensão do pagamento da última prestação do prémio, o prazo de pagamento da última prestação do prémio do lote BT27 já tinha expirado em 18 de Agosto de 1995, e a Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) através do ofício n.º 10013/NCT/08 de 20 de Março já tinha notificado a Samtoly para pagar o aludido prémio. Nestas circunstâncias, a última prestação do prémio a ser pago pela Samtoly já se encontrava em dívida desde 18 de Agosto de 1995 (Anexo 6);
4.11 O Chefe do Executivo praticou em 15 de Março de 2013 o despacho referente à suspensão do pagamento da última prestação do prémio, foi devido que a Samtoly ter considerado o prémio pago não era razoável e que esta era titular do direito sobre o terreno da Fábrica de Panchões, pelo que era necessário concluir as contas no acordo de troca de terrenos definido no “termo de compromisso”;
4.12 Consultado o respectivo processo, verificou-se que a desistência do processo judicial n.º 257/99 do Tribunal Administrativo foi apresentada por iniciativa da Samtoly, não existindo qualquer transacção;
4.13 Face aos motivos acima referidos, e tendo em conta que no ponto de vista jurídico não é possível executar o “termo de compromisso”, então o mesmo é como se fosse inexistente. Neste caso, a Administração tem de cobrar à Samtoly a última prestação do prémio em dívida;
4.14 Por despacho do ex-SOPT de 21 de Julho de 2000 exarado na informação n.º 30/SOTDIR/2000 de 20 de Julho, foi confirmada a devolução no valor de $ 77 000 000,00 recebido e correspondente ao prémio da revisão do contrato de concessão do terreno, depois do pagamento da aludida última prestação do prémio pela Samtoly (Anexo 7);
4.15 Dado que a invalidade do “termo de compromisso” não influencia o aludido prémio adicional, deve-se, posteriormente, dar seguimento ao assunto de devolução através de um procedimento independente.
4.16 Em relação a que a Samtoly considera injusta sobre a actual devolução do prémio pago em excesso em 1993, no valor de $ 77 000 000,00, temos que frisar que, o problema do prémio adicional do lote BT27 mantém-se irresoluto até agora não foi provocado por morosidade por parte da Administração, mas sim, em todo o procedimento, a Administração tem-se empenhado muito na procura de resolver o problema com a Samtoly. Além disso, é de salientar que a insatisfação sobre o cálculo do prémio adicional, a instauração de acção no Tribunal Administrativo, e o envolvimento desse assunto no processo já complicado da Fábrica de Panchões, todas são de iniciativa da Samtoly. E demais, não é aceitável a Samtoly evocar a existência da diferença de poder de compra entre o presente e o passado, uma vez que, em primeiro lugar, a devolução em atraso do prémio adicional não é imputável à Administração e, como todos sabem, o poder de compra varia no tempo e no espaço, e que é imprevisível, pelo que a Administração, como entidade concedente, não tem obrigação de assumir a responsabilidade do imprevisível prejuízo económico da sociedade concessionária.
5. Pelo exposto, não foram carreados para o procedimento elementos ou argumentos de facto e de direito que pudessem conduzir à alteração da declaração de extinção do procedimento de troca referente à Fábrica de Panchões-ê da ordem à Companhia de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada para pagar a última prestação do prémio do lote BT27 da Taipa, pelo que nos termos do artigo 86.º da Lei n.º 10/2013 e da alínea b) do n.º 2 do artigo 103.º do «Código do Procedimento Administrativo», submete-te a presente proposta à consideração superior a fim de:
5.1 Declarar a extinção do procedimento de troca do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long;
5.2 Notificar a Samtoly para pagar a última prestação do prémio no valor de $ 14 157 052,00 patacas.
À consideração superior» (fls. 48-53).
8º - Na sequência desta proposta, em 26 de Junho de 2017, foi emitido o seguinte parecer do assessor jurídico:
«Assunto: Proposta n.º 254/DSO/2017 – Análise à resposta apresentada pela “Companhia de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Lda”, em sede de audiência prévia, relativamente à intenção de se extinguir o procedimento de permuta dos terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long e das consequências daí decorrentes para a prestação em dívida do Lote BT27 da Taipa.
A coberto da proposta acima referenciada vem analisada a resposta apresentada pela “Companhia de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Lda”, em sede de audiência prévia, relativamente à intenção de declarar a extinção do procedimento de troca, uma vez que o seu objecto se mostra legalmente impossível, face ao disposto no n.º 2 do artigo 86.º da Lei n.º 10/2013, daí decorrendo que aquela “Companhia” terá de proceder ao pagamento da prestação do prémio em dívida referente ao lote BT27 da Taipa.
Na resposta apresentada por aquela “Companhia” esta pronuncia-se sobre questões que não haviam sido suscitadas aquando da manifestação da intenção de declaração de extinção do procedimento e que não são, por tal motivo, relevantes, razão pela qual nos abstemos de as analisar e não deve ser considerada a análise efectuada na Proposta n.º 254/DSO/2017.
Quanto à impossibilidade legal decorrente do n.º 2 do artigo 86.º da Lei n.º 10/2013, aquela “Companhia” apenas se limita a fazer considerações genéricas, não tendo trazido qualquer elemento, que importe a alteração da intenção de extinção do procedimento de troca por força do disposto no n.º 2 do artigo 86.º da lei n.º 10/2013, com as consequências daí decorrentes.
Pelo exposto, somos de opinião que este expediente pode ser levado à consideração de Sua Excelência o Chefe do Executivo, propondo-se que, se declarado extinto o procedimento em causa, se proceda em conformidade com o que vem referido na Proposta em análise.
À consideração de V. Ex.ª
RAEM, aos 26 de Junho de 2017.».
9º - O Secretário para os Transportes e Obras Públicas proferiu o seguinte despacho:
«À consideração superior com a minha concordância com o parecer deste Gabinete» (fls. 48).
10º - O Chefe do Executivo, em 25/07/2017, tomou a seguinte decisão (fls. 48 dos autos):
«Concordo. Proceda em conformidade com o parecer do STOP».
11º - A recorrente instaurou em 5/11/1999 no Tribunal Administrativo de Macau uma acção tendente à declaração de invalidade do contrato administrativo de Revisão da Concessão e à efectivação responsabilidade por danos emergentes, que ali correu termos com o nº 257/99, de cuja instância, porém, viria a desistir (cfr. fls. 256 e 258 da acção nº 257/99/AO, fls. 437 e 438 dos presentes autos, bem como fls. 22 do apenso “traduções”).
12º - Nessa acção pedia a declaração de invalidade da cláusula 9ª do Despacho nº 76/GM/93, a devolução dos montantes já liquidados a título de prémio adicional, bem como uma indemnização de MOP$ 88.682.975,00.
13º - No âmbito desse processo, pelo Of. 13/GP/2000/(3)0021, de 11 de Janeiro de 2000, e respectiva informação anexa preparada pelo Magistrado que acompanhou o Proc. n.º 257/99, o Ministério Público solicitou clarificações à DSSOPT ou, na falta de uma cabal explicação, um novo cálculo do valor do prémio e uma solução para a questão que seja benéfica para ambas as partes, por ter verificado que na concessão dos lotes 27, 32 e 33 a Administração tinha adoptado diferentes critérios na determinação do prémio adicional (fls. 855-857 do vol. IV do p.a. 6115 da DSSOP, com tradução a fls. 7 e 8 do apenso “traduções”).
14º - A resposta da DSSOPT veio contida na informação 12/DSODEP/2000, com o seguinte teor:
“Informação N.º: 012/DSODEP/2000
Data: 18/01/2000
Assunto: Processo de revisão do contrato de concessão do lote BT 27 da Baixa da Taipa/ Processo nº 257/99 do Tribunal Administrativo (Processo nº 6115.2)
1. Sobre o assunto e tendo em conta o oficio nº 21/13/GP/2000/(3) (anexo 1) do Gabinete do Procurador-Geral da RAEM, quanto às razões especiais que determinaram a aplicação do prémio adicional informa-se, por terem sido enviados para o Tribunal Administrativo e para o Ministério Público os processos nos 6115.2 (BT27), 6117.2 (BT32) e 6118.2 (BT33), que a presente informação se baseia no original da informação nº 88/DSODEP/99 de 26 de Maio de 1999 com despacho do ex-Secretário Adjunto para os Transportes e Obras Públicas, datado de 15 de Dezembro de 1999 que se encontra nesta DSSOPT (anexo 2).
2. Não existindo, à data em que se realizaram os primeiros concursos públicos para concessão de terrenos, legislação que regulasse o método de determinação do prémio adicional em caso de revisão dos respectivos contratos de concessão foi adoptada, por despacho do ex-SATOP de 23/06/92 sobre a informação nº 47/GJUDEP/92 (anexo 3), uma metodologia que salvaguardasse o interesse da Administração.
3. No que se refere ao processo de revisão do contrato de concessão do lote BT33 cujo despacho foi publicado no Boletim Oficial nº 38 de 22 de Setembro de 1993 sob o nº 129/SATOP/93 (anexo 4), o critério de fixação do prémio adicional não seguiu o definido na informação nº 47/GJUDEP/92 acima referida para os processos de revisão de contratos de concessão precedidos de concurso público, porque o mesmo foi inclui do num processo de negociação envolvendo outras entidades e outras contrapartidas para a Administração (despacho de 15/02/93 do ex-SATOP e oficio nº 43/SATOP/93 de 14 de Janeiro de 1993 em anexo 5).
4. Quanto ao processo de revisão do contrato de concessão do lote BT32 publicado no Despacho nº 13/SATOP/97 (anexo 6), o critério de fixação do prémio adicional não seguiu o definido na informação nº 47/GJUDEP/92, atendendo a que se considerou serem da responsabilidade da Administração os atrasos verificados e ainda a crise do mercado imobiliário aplicando-se uma redução dos factores de cálculo de acordo com o ponto 6 do artigo 3º da Portaria nº 230/93/M (despacho de 20/10/95 do ex-SATOP tendo em conta o parecer do ex-Director da DSSOPT sobre o memorando s/nº de 16/10/95 em anexo 7).
No que se refere ao processo de revisão do contrato de concessão do lote BT27 e atendendo a que:
5.1 o critério definido na informação nº 47/GJUDEP/92 não foi aplicado a nenhum processo de revisão de contratos precedidos de concurso público;
5.2 não resultaram quaisquer benefícios para a Administração provenientes de outros processos como no caso do lote BT33;
5.3 foi afectado na fase final de construção pela crise do mercado imobiliário, factor que foi considerado no processo do lote BT32,
informamos que se for aplicado o procedimento corrente nesta DSSOPT para a revisão de contratos de concessão de terrenos com dispensa de concurso público, por exemplo Despacho nº 34/SATOP/93 (Baixa da Taipa / Flower City) e Despacho nº 179/SATOP/93 (Pac On / Boa Vista) em anexo 8, o prémio adicional será de $62.589.889,00 a que corresponde o pagamento, incluindo capital e juros, de $65.490.520,00. Atendendo a que já foi liquidado de acordo com o Despacho nº 76/GM/93 o valor de $78.041.897,00 (capital e juros), e se encontra em dívida a última prestação no valor de $14.157.052,00, a aplicação deste critério corresponderia à devolução de $26.708.429,00 através do cancelamento desta prestação e ao pagamento em numerário à concessionário de $12.551.377,00. (fichas de cálculo e ficha resumo dos três processos em anexo 9).
À consideração superior.
O Técnico do DSODEP
A Chefe do DSODEP
O Director da DSSOPT
D
E
F”
15º - Foi elaborada uma Minuta de um Termo de Compromisso entre a Sociedade de Desenvolvimento Predial Nossa Senhora da Esperança, SA, titular do terreno da antiga “Fábrica de Panchões Iec Cheong” e o Governo da RAEM, aprovada pelo Chefe do Executivo em 8/01/2001 (fls. 84 dos autos).
16º - Na sequência disso, o Termo de Compromisso foi celebrado em 10/01/2001, entre o Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes de Macau e a Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança (fls. 79-81).
17º - Na Informação nº 30/SOTDIR/2000 dirigida ao Secretário dos Transportes e Obras Públicas, O Director da DSOPT referiu o seguinte:
“1. No seguimento da reunião efectuada com o Exmo. Sr. A, representante da G e da Companhia de Fomento Predial Sam To Lei, no Gabinete de V. Exa. respeitante ao assunto em epígrafe, deu entrada nesta DSSOPT o pedido de confirmação dos valores analisados, discutidos e acordados na citada reunião, nomeadamente no que respeita ao valor da propriedade da Fábrica Iec Long, assim como o valor do prémio que deve ser devolvido pela revisão da concessão do lote 27 da Baixa da Taipa efectuada no período da anterior Administração.
2. Verificando-se estar conforme o acordado na citada reunião, julga-se de confirmar os seguintes dados:
2.1. Lote 27 da Baixa da Taipa:
Devolução da quantia de MOP$77.000.000 recebida e correspondente ao prémio da revisão do contrato de concessão do terreno, devendo o concessionário efectuar o pagamento da última prestação do prémio em atraso no valor de MOP$14.157.052.
2.2 Fábrica de Panchões Iec Long:
Valorização da propriedade na quantia de MOP$136.000.000,00.» (doc. Fls. 73-75 dos autos)
18º - O SATOP concordou com o proposto em 21/07/2000 (fls. 73 dos autos).
19º - Na Informação nº 88/DSODEP/99, de 26/05/1999 pode ler-se:
Pág. 3: «Este critério veio a ser definido por despacho de 23/6/92 do Exmo. Senhor SATOP sobre a informação n.º 47/GJU/92 (...). Para salvaguardar o efeito do concurso o prémio é calculado sobre a totalidade das áreas e finalidades constantes dos novos projectos de acordo com as tabelas em vigor à data do despacho sendo o valor agravado na percentagem a mais oferecida no concurso.” (esta Informação n.º 47/GJU/92 encontra-se no Vol. 4, fls. 1020-1025).
Pág. 4: “Em 16/3/93 o concessionário apresentou no Gabinete do SATOP um requerimento reafirmando a aceitação das condições por lhe ter sido transmitido pelo Exmo. Senhor SATOP que tal metodologia havia sido aplicada aos lotes BT32 e 33 da Baixa da Taipa e solicitando, tendo em conta que decorria o processo de revisão, a emissão da licença da obra para a supra-estrutura.
(...)
Em 9/7/96 (T-2859) a concessionária apresentou um pedido de revisão do contrato para ser recalculado o prémio tendo em conta (...) os critérios diferentes adoptados nos processos de revisão de outros contratos de concessão de terrenos na mesma zona da Baixa da Taipa.
No seguimento da apresentação deste requerimento realizaram-se reuniões com representantes da concessionária tendo sido referido, por estes, as reuniões anteriores no gabinete do SATOP e a constatação de procedimentos diferentes noutros processos, e pelos representantes desta Direcção de Serviços que apenas se admitia o pagamento fraccionado da prestação em dívida e que seriam notificados para apresentarem uma proposta nesse sentido.”
Pág. 5: “Confirma-se o tratamento excepcional dado nos processos de revisão dos contratos de concessão dos lotes BT33 e BT32:
- Lote BT33 (Despacho n. o 129/SA TOP/93 (anexo 17):
De acordo como despacho do Exmo. Senhor SATOP o cálculo de prémio adicional com o efeito do concurso foi apenas aplicado ás áreas adicionais por finalidade; (anexo 17)
(...)
- Lote BT32 (Despacho n.º 13/SATOP/97 (anexo 18):
De acordo como despacho do Exmo. Senhor SATOP o cálculo de prémio adicional foi reduzido em 60% atendendo a circunstâncias várias (alterações das condicionantes urbanísticas / aplicação de novos regulamentos / etc).
Pág.6: “Tendo em conta o critério adoptado no processo de revisão do contrato de concessão do lote BT32 o prémio adicional para o lote BT27 seria de $25.035.956 [40%x ($118.956.439,00 -$56.366.550,00)] - (cálculo com base na totalidade da ABC, tabelas em vigor, sem efeito do concurso).
Tendo em conta o critério adoptado no processo de revisão do contrato de concessão do lote BT33 o prémio adicional para o lote BT2~ seria de $7.876.969 (calculando só as ABC adicionais e aplicando o efeito do concurso).”
20º - E quanto à Fábrica de Panchões Iec Long pode ler-se nesta informação:
Pág. 6: “Confirma-se que os representantes da concessionária são igualmente parte interessada no processo de troca de terrenos da antiga Fábrica de Panchões IEC LONG com 4. 627m2 em regime de aforamento, 2. 809m2 em regime de propriedade perfeita e cerca de 20.000m2 de terreno ocupado mas já revertido ao Território (...).
(...)
julga-se de admitir, no processo de troca de terrenos do “IEC LONG”, a participação da “SAMTOLY” como terceiro outorgante, ajustando-se então os valores das contrapartidas. Refere-se ainda que os representantes da concessionária manifestaram, em reuniões anteriormente realizadas a disponibilidade para liquidar a última prestação ($14.157.052,00) caso fosse admitida a concessão dos lotes de terreno do Plano da Baía da N. S. da Esperança como troca pelos terrenos da antiga Fábrica de Panchões IEC LONG.”
21º - Foi elaborada a Informação nº 031/02/2012, de 18/02/2013 no sentido da suspensão do pagamento da última prestação do prémio até à concretização dos respectivos processos de revisão e de troca de terrenos.
22º - Esta Informação nº 031/02/2012, em português, tem o seguinte teor:
“1. Pelo Despacho n.º 140/GM/89 (anexo 1) foi autorizada a concessão por arrendamento, precedida de concurso público do quarteirão BT 27, com 7.155 m2, a favor do Senhor B, pelo preço de $ 56.366.550,00, para construção de um edifício com uma altura máxima de 61 metros e constituído por um pódio com quatro pisos e quatro torres sendo duas com 18 pisos e duas com 19 pisos de acordo com a Planta de Alinhamento Oficial emitida em 23 de Fevereiro de 1989, com as seguintes áreas bruta de construção por finalidade:
• Habitação: ························80.145 m2;
• Comércio: ························12.307 m2;
• Estacionamento: ·················13.594 m2,
2. Na sequência da apresentação por parte do concessionário de diferentes propostas de aproveitamento do terreno, de transmissão dos direitos resultantes da concessão a favor da “Sociedade de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada”, e ainda da alteração das condicionantes urbanísticas definidas para o desenvolvimento dos lotes da zona da Baixa da Taipa nomeadamente levantando a restrição que limitava a altura dos edifícios a 61 metros (Planta de Alinhamento Oficial n.º 90A225 emitida em 31 de Março de 1992 em anexo 2) e da definição do critério de cálculo do prémio adicional (agravamento na percentagem a mais, 21%, oferecida no concurso*) pela revisão dos contratos de concessão de terrenos precedidos de concurso público (Informação n.º 47/GJU/92 de 18 de Junho de 1992 em anexo 3) foi publicado no Boletim Oficial o Despacho n.º 76/GM/93 (anexo 4) que revê o contrato de concessão e autoriza a transmissão a favor da “Sociedade de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada” e que se resume:
2.1 Construção de um edifício constituído por um pódio com quatro pisos sendo dois em cave e quatro torres (duas com 29 pisos, uma com 38 pisos e a quarta com 31 pisos);
• Habitação:·················85.209 m2;
• Comércio: ·················12.804 m2;
• Estacionamento: ··········13.755 m2;
2.2 Prémio adicional: $87.570.741,00 (este valor resulta do valor do prémio calculado de acordo com as tabelas em vigor àquela data, $118.956.439,00, agravado em 21%, percentagem a mais oferecida no concurso, passando para $143.937.291,00, e deduzido do valor do prémio oferecido no concurso público, $ 56.366.550,00, isto é $118.956.439,00 x 1,21 - $ 56.366.550,00). Fichas de cálculo também em anexo 4.
*Nota: O concessionário aceitou as condições da revisão apenas após esclarecimento quanto ao cálculo das áreas brutas de construção e metodologia estabelecida para a revisão dos contratos de concessão precedidos de concurso público e ainda por lhe ter sido transmitido pelo ex SATOP que a mesma metodologia havia sido aplicada aos lotes BT32 e BT33 da Baixa da Taipa. No âmbito desse acordo foi também autorizada a emissão, em 8 de Junho 1993 (anexo 5), da licença de obras da super-estrutura, isto é, antes da publicação do Despacho n.º 76/GM/93, em 18 de Agosto.
3. O aproveitamento do terreno encontra-se concluído, tendo sido emitida em 28 de Novembro de 1994 a Licença de Utilização nº 138 (anexo 6). Nesta data não tinha ainda vencido a última prestação do prémio no valor de $14.157.052,00 (anexo 7).
4. Em 9 de Julho de 1996 (T-2859 em anexo 8) a concessionária apresentou um pedido de revisão do contrato para ser recalculado o prémio tendo em conta os custos reais suportados, os valores realistas praticados no mercado e os critérios diferentes adoptados nos processos de revisão da outros contratos de concessão de terrenos na mesma zona da Baixa da Taipa.
4.1 No seguimento da apresentação deste requerimento realizaram-se reuniões com representantes da concessionária tendo sido referido: pelos requerentes, as reuniões anteriores no gabinete do SATOP e a constatação de procedimentos diferentes noutros processos; e pelos representantes desta Direcção de Serviços que apenas se admitia o pagamento fraccionado da prestação em dívida e que seriam notificados para apresentarem uma proposta nesse sentido;
4.2 Não consta do processo qualquer resposta ao requerimento devendo-se tal ao facto de decorrer na altura a apreciação global dos processos de concessão em situação de incumprimento (prémio e / ou aproveitamento);
4.3 Em 5 de Maio de 1999 a concessionária apresentou no Gabinete de SATOP novo requerimento (anexo 9) sobre o assunto referindo que:
4.3.1 Não se consideram devedores da prestação em atraso por aguardarem resposta ao requerimento de 9 de Julho de 1996 onde era solicitada a revisão do contrato;
4.3.2 Relaciona o processo “Quarteirão BT27” com o processo em curso relativo à proposta de troca de terrenos da antiga Fábrica de Panchões “IEC LONG” por os representantes de SAMTOLY serem igualmente representantes dos titulares daquele terreno;
4.3.3 Na fase da revisão do contrato, em reunião realizada com o ex SATOP foram informados de que o critério seguido era idêntico ao seguido para os lotes 32 e 33;
4.3.4 Do levantamento efectuado relativamente ao seu contrato e ao de terceiros consideram ter sido ludibriados uma vez que os critérios não foram os mesmos e tomaram-se públicos com a publicação dos despachos n.º 129/SATOP/93 (BT 33) e n.º 13/SATOP/97 (BT 32). Assim propuseram:
4.3.4.1 A reapreciação do processo de concessão do Lote BT 27;
4.3.4.2 Novo cálculo das áreas brutas de construção;
4.3.4.3 Informação quanto a continuarem devedores, à Administração, da prestação em atraso;
4.3.4.4 Andamento de processo de troca de terrenos da Fábrica de Panchões IEC LONG.
5. Confirma-se o tratamento excepcional dado nos processos de revisão dos contratos de concessão dos lotes BT 33 e BT 32:
5.1 Lote BT 33 (Despacho n.º 129/SATOP/93 (anexo 10):
5.1.1 De acordo com despacho de ex SATOP o cálculo de prémio adicional com o efeito do concurso apenas foi aplicado às áreas brutas de construção adicionais por finalidade;
5.1.2 Julga-se de destacar nessa altura o parecer da ex Chefe do Departamento de Solos, de 11 de Fevereiro de 1993, que refere que a publicação no Boletim Oficial do Despacho de revisão do lote BT33 poderia trazer problemas à Administração devido à alteração dos critérios aprovados (parecer integrado no anexo 10,6);
5.2 Lote BT 32 (Despacho nº 13/SATOP/97 (anexo 11): De acordo com despacho de Ex.mo Senhor SATOP o cálculo do prémio adicional, sem efeito de concurso, foi reduzido em 60% atendendo a circunstâncias várias (alterações das condicionantes urbanísticas/aplicação de novos regulamentos/etc.)
6. Confirma-se que os representantes da concessionária são igualmente parte interessada no processo de troca de terrenos da antiga Fábrica e Panchões IEC LONG com 4.627m2 em regime de aforamento, 2.809m2 em regime propriedade perfeita e cerca de 20.000 m2 de terreno ocupado mas já revertido ao Território.
7. Tendo em conta o critério adoptado no processo de revisão do contrato de concessão do lote BT32 o prémio adicional para o lote BT27 calculado com base: na totalidade das áreas brutas de construção por finalidade; nas tabelas em vigor; e sem efeito do concurso, seria de $25.035956,00 (40%x ($118.956.439,00 - $56.366.550,00).
8. Tendo em conta o critério adoptado no processo de revisão do contrato de concessão do lote BT33 o prémio adicional para o lote BT27 seria de $7.876.969,00 (calculando só as ABC adicionais e aplicando o efeito de concurso). Ficha de cálculo em anexo 12.
9. Na altura, através da informação n.º 88/DSODEP/99 (anexo 13), de 26 de Maio, foi submetido à consideração superior, considerando as dificuldades de um processo desta natureza e porque, no âmbito de Grupo de Terras, parte das receitas do Território já haviam sido divididas e entregues à parte chinesa, a possibilidade de, de acordo com a proposta da requerente, isto é, admitir no processo de troca dos terrenos do “IEC LONG”, a participação da “Sociedade de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada” como terceiro outorgante, ajustando-se então os valores das contrapartidas. A informação foi devolvida à DSSOPT por despacho do ex SATOP, de 15 de Dezembro, para, dada a grandeza das diferenças, ser efectuada uma reanálise desta situação.
10. A concessionária recorreu para aos tribunais tendo os processos relativos aos lotes BT27, BT32 e BT33 sido solicitados pelos Serviços do Ministério Público em finais de 1999. O processo n.º 6115.01/2 foi enviado através do ofício n.º 491/DSODEP/99, de 07 de Dezembro, e devolvido através do ofício n.º 02/2002/M.P.-T.A./E, de 05 de Março. Documentos referidos em anexo 14.
11. Em cumprimento do despacho de ex SOPT sobre o oficio n.º 0021113/GP/2000/(3), de 11 de Janeiro, foi elaborada a informação n.º 12/DSODEP/2000, de 18 de Janeiro, sobre o processo de revisão do contrato de concessão do lote BT27 tendo o ex SOPT determinado o seu envio ao Ministério Público. Documentos referidos em anexo 15.
12. Da consulta efectuada ao processo n.º 6153.02 retiraram-se cópias, do Memorando n.º 1/2000 relativo a uma reunião, realizada em 14 de Fevereiro de 2000, sobre o processo de concessão do lote BT27 da Baixa da Taipa, com vista ao estabelecimento de um princípio de acordo que contemplasse a desistência da “acção” no tribunal Administrativo, e do Memorando n.º 3/2000, sobre o cálculo do valor a devolver à concessionária, e de uma carta da concessionária e respectiva tradução. Confirma-se deste modo que valores de uma eventual compensação do concessionário do lote BT27 passaram a estar incluídos no processo de troca de terrenos da antiga Fábrica de Panchões Iec Long por terrenos do Plano da Baía da Esperança. Documentos referidos em anexo 16.
13. Sobre o processo de troca de terrenos da antiga Fábrica de Panchões Iec Long por terrenos do Plano da Baía da Esperança foram assinados dois Termos de Compromisso em 10 de Janeiro de 2001 (anexo 17) e 25 de Julho de 2006 (anexo 18) não se tendo ainda concretizado o processo por várias razões das quais se destaca a impossibilidade de concretização do Plano de Urbanização da Baía da Esperança.
14. Em 20 de Março de 2008 a Direcção dos Serviços de Finanças através do ofício n.º 10013/NCT/08 (anexo 19), com conhecimento a esta Direcção de Serviços, notificou a concessionária, “Sociedade de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada” para proceder ao pagamento da prestação em dívida, $14.157.052,00, sob pena de findo o prazo 15 dias proceder às operações para cobrança coerciva.
15. De acordo com documento enviado em anexo ao ofício n.º 224/NAJIMG/12, de 05 de Setembro, a concessionária, “Sociedade de Investimento e Fomento Predial Samtoly, Limitada” apresentou uma petição (Processo n.º 95/12-EF), junto do Juiz do Tribunal Administrativo de Macau, onde apresenta a sua oposição à pretensão da Direcção dos Serviços de Finanças. Passa-se a resumir os fundamentos apresentados pela concessionária:
15.1 Nunca terem aceite o agravamento do prémio, $87.570.741,00, fixado no Despacho n.º 76/GM/93 por o considerarem injusto e ilegal;
15.2 O cálculo não obedeceu aos critérios definidos na Portaria 230/93/M, de 16 de Agosto, então em vigor;
15.3 Aqueles critérios não foram aplicados para concessões na mesma zona (BT32 e BT33);
15.4 Viola o princípio da igualdade;
15.5 Devido à ameaça de perda da concessão e tendo em conta o investimento já realizado com as obras e os prémios pagos continuou a pagar as prestações do prémio adicional;
15.6 Em 15 de Novembro de 1999 intentou uma acção junto do Tribunal Administrativo de Macau (Processo n.º 257/99 para que fosse declarada inválida a cláusula 98 do Despacho n.º 76/GM/93 e devolvida a quantia de $73.413.684,00;
15.7 Numa reunião no gabinete do Procurador Geral foi reconhecido que os critérios aplicados pela DSSOPT no processo de revisão tinham sido desfavoráveis à concessionária, tendo sido proposto que a compensação fosse efectuada no processo em curso de troca de terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long dada a afinidade entre os titulares;
15.8 A DSSOPT transmitiu essa proposta à concessionária;
15.9 Foram estabelecidos contactos no gabinete do ex SOPT entre este, o Director da DSSOPT e o concessionário do quarteirão BT27, abordando as questões: das compensações; das obras; dos juros; da valorização dos terrenos da antiga Fábrica de Panchões Iec Long; do cálculo do prémio do terreno a conceder; e os custos do lago artificial e respectivas infra-estruturas;
15.10 Foi elaborada a informação n.º 30/SOTDIR/2000*, com despacho de concordância do ex SOPT, de 21 de Julho de 2000, que propunha o prosseguimento das negociações reconhecendo a devolução de $77.000.000,00, a liquidação por parte da concessionária da última prestação, $14.157.052,00, a valorização dos terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long em $136.000.000,00 e finalmente estabelecia as condições preliminares da concessão de terrenos da Baía de Nossa Senhora da Esperança;
*Esta informação não consta do processo 6115.02, presumindo-se que esteja classificada como confidencial.
15.11 Essas negociações culminaram com a assinatura, em 10 de Janeiro de 2001, de um termo de compromisso (anexo 17) através do qual a RAEM se comprometeu a conceder, à Sociedade de Desenvolvimento Predial Nossa Senhora da Esperança, S. A., um terreno situado na Baía de Nossa Senhora da Esperança, e aquela sociedade se comprometeu a ceder à RAEM, livre de ónus ou encargos e desocupados todos os terrenos que formam a antiga Fábrica de Panchões Iec Long e a apresentar um plano de aproveitamento do terreno a conceder de acordo com as condicionantes urbanísticas. Ficou ainda estipulado que do prémio que viesse a ser fixado pela concessão do terreno seria deduzida a quantia de $213.000.000,00 ($77.000.000,00 + $136.000.000,00). Ficou ainda estabelecido, embora não tenha ficado estipulado no termo de compromisso, que a concessionária do quarteirão BT27 liquidaria a prestação em dívida ($14.157.052,00);
15.12 Na sequência da assinatura do termo de compromisso a concessionária desistiu do processo intentado no Tribunal Administrativo (processo n.º 257/99);
15.13 Em 25 de Julho de 2006 foi assinado novo termo de compromisso (anexo 18) revendo os condicionamentos urbanísticos e não contrariando as cláusulas acordadas no termo de compromisso de 10 de Janeiro de 2001 tendo-se a RAEM comprometido a publicar no Boletim Oficial, no prazo de 6 meses, o despacho de concessão do terreno;
15.14 Tal não se concretizou aguardando ainda a “Sociedade de Desenvolvimento Predial Nossa Senhora da Esperança, S.A.” a assinatura do contrato com a RAEM
15.15 Conclui assim a concessionária que, até à celebração do contrato previsto no termo de compromisso, não está obrigada a pagar a quantia alegadamente em dívida
Documentos referidos em anexo 20.
16. A presente informação foi elaborada em cumprimento de instruções superiores e na sequência de o Senhor Director desta Direcção de Serviços ter sido notificado pelo Tribunal no âmbito do processo n.º 95/12-EF.
17. Face ao exposto e em especial o referido no ponto 14 julga-se de confirmar que ainda decorre o processo de troca de terrenos da antiga fábrica de panchões Iec Long e que de facto estava previsto nesse processo contemplar a compensação da concessionária do lote BT27 devido à alteração dos critérios de revisão dos contratos de concessão precedidos de concurso público, pelo que se propõe que seja declarada a suspensão do pagamento da última prestação do prémio até à concretização dos respectivos processos de revisão e de troca de terrenos dando-se conhecimento do despacho à Direcção dos Serviço de Finanças e ao Tribunal Administrativo.
Á consideração superior.
O Técnico,
D”
23º - O teor desta Informação mereceu a concordância do Chefe do Executivo em 15/03/2013.
24º - A Sociedade de Desenvolvimento Predial Baia da Nossa Senhora da Esperança, SA continua na posse dos terrenos previamente arrendados, dos terrenos foreiros e dos terrenos Sa Chi Kai até ao presente momento.
25º - A recorrente efectuou, na sequência do acto ora impugnado, a última prestação do prémio adicional relativa ao lote B27, na Taipa, no valor de MOP$ 14.157.052,00, vencida no dia 14/08/1995, sob reserva (fls. 226-229)”; (cfr., fls. 513-v a 525).

Do direito

3. Inconformada com o Acórdão pelo Tribunal de Segunda Instância proferido no âmbito do seu anterior recurso contencioso – onde se decidiu pela sua improcedência – traz a recorrente o presente recurso (jurisdicional), pedindo que se revogue o Acórdão recorrido com as suas legais consequências em relação ao despacho do Chefe do Executivo de 25.07.2017 que declarou a “extinção do procedimento de troca do terreno da Fábrica de Panchões Iec Long” e que determinou o “pagamento da última prestação do prémio no valor de MOP$14.157.052,00”.

Como resulta das atrás transcritas conclusões, com o presente recurso traz a recorrente à apreciação deste Tribunal de Última Instância as questões seguintes:
- do “indeferimento do pedido de produção de prova”;
- da “(i)legitimidade” da recorrente relativamente à decisão da extinção do procedimento de troca de terrenos; e,
- do pagamento da última prestação do prémio no valor de MOP$14.157.052,00.

–– Comecemos pelo “indeferimento do pedido de produção de prova”; (cfr., concl. 2ª a 5ª).

Pois bem – relativamente à reclamação do despacho do Exmo. Relator do Tribunal de Segunda Instância que indeferiu a pela ora recorrente requerida produção de prova testemunhal – tem o Acórdão ora recorrido o teor que segue:

“O despacho reclamado tem o seguinte teor:
«Depois de lidas com a atenção a petição inicial e a contestação, é nossa opinião que, para a resolução do presente recurso contencioso, não parece haver matéria controvertida com interesse para a decisão que precise de ser submetida a crivo probatório. A matéria invocada pela recorrente está, no essencial, documentada. Razão pela qual não se nos afigura necessária a produção de prova testemunhal»
Este colectivo sufraga e reitera a opinião vertida no despacho reclamado.
Efectivamente, a matéria que a recorrente/reclamante pretende seja submetida a prova testemunhal não carece de ser “depurada”, digamos assim, para além daquilo que já nos transmitem os documentos juntos no p.a., e para os quais a recorrente apela com indicação precisa da respectiva paginação”; (cfr., fls. 513).

Atento o pela ora recorrente alegado e concluído, (e sem perder de vista a “natureza” das questões decididas e agora com o presente recurso impugnadas), temos para nós que censura não merece o entendimento pelo Tribunal de Segunda Instância assumido.

Passa-se a tentar expor este nosso ponto de vista.

Segundo a doutrina que se tem como adequada e de subscrever, o art. 63°, n.° 1 do CPAC prevê “(…) a possibilidade, não havendo obstáculo à apreciação do mérito da causa, do conhecimento do pedido sem necessidade de produção de prova ou, de modo mais rigoroso, de prova adicional àquela que já se encontra produzida nos autos. Na verdade, embora a letra da lei se refira, sem fazer qualquer especificação, à produção de prova, o certo é que aquilo que está em causa é a desnecessidade [de] outra prova para além daquela que já se mostra produzida nos autos, em especial, prova de natureza documental. Julgamos que o legislador teve essencialmente em vista as situações em que se mostre desnecessária a produção de prova testemunhal que, não raro, é arrolada de modo pouco criterioso e sem pertinência para a discussão da causa. (…)”; (cfr., v.g., Viriato Lima e Álvaro Dantas in, “C.P.A.C. Anotado”, 2015, pág. 218).

Sobre a matéria e questão tem também este Tribunal de Última Instância repetidamente entendido que “No recurso contencioso, a produção de prova só tem lugar se os factos forem relevantes para a decisão de mérito (n.º 1 do artigo 63.º e n.º 3 do artigo 65.º do Código de Processo Administrativo Contencioso), segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito (proémio do n.º 1 do artigo 430.º do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente, nos termos do n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso. (…)”; (cfr., v.g., os Acs. de 23.05.2018, Proc. n.° 7/2018, de 06.06.2018, Proc. n.° 43/2018, de 31.07.2018, Proc. n.° 69/2017, de 24.07.2019, Proc. n.° 75/2019, de 30.07.2019, Proc. n.° 72/2019, de 29.11.2019, Proc. n.° 79/2019, de 26.02.2020, Proc. n.° 106/2018 e de 04.12.2020, Proc. n.° 145/2020).

Isto dito, vejamos.

Do ponto de vista da recorrente, os factos probandos assumem relevo em face do acto que a notificou para o pagamento da última prestação do prémio do “Lote BT27” na Taipa.

Considera essencial a requerida produção de prova testemunhal para demonstrar:
(i) o acordo celebrado entre a Recorrente e o Governo que levou à desistência da acção intentada por esta no Tribunal Administrativo;
(ii) as sucessivas reuniões a pedir a revisão do prémio do lote da Samtoly; e,
(iii) o facto de ter sido forçada a aceitar a minuta do contrato com o novo prémio sob pena de não lhe ser emitida a licença de construção.

Porém, cremos que tais “factos” retiraram-se da documentação junta aos autos, pois que (de forma clara) resulta da “Informação n.° 88/DSODEP/99” de 26.05.1999, (cfr., ponto 19° da matéria de facto dada como provada), bem como do ponto 4.1. da “Informação n.° 031/02/2012” de 18.02.2013, (cfr., ponto 22° da matéria de facto dada como provada), que houve reuniões entre os representantes da recorrente onde se discutiu a revisão do prémio da concessão do lote BT27, sendo certo que se acabou por definir que seria devolvida a quantia de MOP$77.000.000,00 recebida e correspondente ao prémio de revisão do contrato de concessão do terreno, devendo, (sublinhe-se), em todo o caso, o concessionário efectuar o pagamento da última prestação do prémio em atraso no valor de MOP$14.157.052,00, tudo conforme a “Informação n.° 30/SOTDIR/2000”, (cfr., ponto 17° da matéria de facto dada como provada), o que veio a merecer a concordância do Exmo. S.A.T.O.P.; (cfr., ponto 20° da matéria de facto dada como provada).

Assim, e sem prejuízo de melhor opinião, não se vislumbra a utilidade na produção de prova testemunhal para demonstrar “as sucessivas reuniões a pedir a revisão do prémio do lote da Samtoly”.

Por outro lado, retira-se também da “Informação n.° 031/02/2012” de 18.02.2013, (cfr., ponto 22° da matéria de facto dada como provada), que a ora recorrente apresentou um requerimento junto do Gabinete do Exmo. S.A.T.O.P. em 05.05.1999, através do qual pretendia relacionar o processo do “Quarteirão BT27” com o processo em curso relativo à proposta de troca de terrenos da antiga Fábrica de Panchões “Iec Long”, porque os representantes da recorrente eram igualmente representantes dos titulares daquele terreno, vindo a Administração a confirmar que os “representantes da concessionária” são igualmente parte interessada no processo de troca de terrenos da antiga “Fábrica de Panchões Iec Long”, tudo conforme se retira dos pontos 4.3., 4.3.2. e 6. da referida Informação.

Com efeito, por conta do facto dos “representantes da recorrente” serem também “representantes” dos (supostos) titulares dos terrenos da antiga “Fábrica de Panchões Iec Long”, a Administração aceitou procurar resolver, pela via negocial, a questão – da “compensação” – do prémio devido pela concessão do lote BT27 em sede do procedimento para a troca de terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long por terrenos do Plano da Baía da Esperança; (cfr., ponto 12 da Informação n.° 031/02/2012).

Por sua vez, resulta também do “ponto 15.11. da Informação n.° 031/02/2012”, o que as negociações culminaram com a assinatura em 10.01.2001 de um termo de compromisso entre a R.A.E.M. e a “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, através do qual a R.A.E.M. se teria comprometido a conceder a esta Sociedade um terreno situado na Baía de Nossa Senhora da Esperança, ficando ainda estipulado que ao prémio que viesse a ser fixado pela concessão do terreno seria deduzida a quantia de MOP$213.000.000,00, onde se incluía o montante de MOP$77.000.000,00, (que corresponderia ao montante do prémio em excesso cobrado à “Sociedade Samtoly” pela concessão do lote BT27), ficando, também, estabelecido, (apesar de não constar do termo de compromisso), que a ora recorrente e concessionária do quarteirão BT27 liquidaria a prestação em dívida de MOP$14.157.052,00.

Assim, sublinhando-se que em causa não estava um “acordo entre a ora recorrente e o Governo”, mas, antes, (e tão só), entre o Governo e as “pessoas” que se assumiam como “representantes” tanto da recorrente como da “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, (além do que se disse, vide ainda o ponto 6° da matéria de facto dada como provada), e que culminou no “termo de compromisso” assinado entre a R.A.E.M. e (apenas) esta última Sociedade, a verdade é que também não se vislumbra qualquer utilidade na prova testemunhal para demonstrar “o acordo celebrado entre a recorrente e o Governo que levou à desistência da acção intentada por esta no Tribunal Administrativo”, visto que, da documentação junta aos autos, resulta, à evidência, as razões que estiveram na base daquela desistência.

Por último, alega ainda a recorrente que a prova testemunhal seria relevante para demonstrar “o facto de ter sido forçada a aceitar a minuta do contrato com o novo prémio sob pena de não lhe ser emitida a licença de construção”.

Pois bem, aqui, mostra-se de consignar o que segue.

Curiosamente, (ou, estranhamente), outra foi a posição da recorrente ao longo dos anos…; (cfr., v.g., ponto 19° da matéria de facto dada como provada).

Contudo, seja como for, e sem prejuízo do respeito por outra opinião, não se nos apresenta que o “facto” em questão seja (minimamente) relevante para as “várias soluções plausíveis (da questão) de direito” relacionada com o acto que notificou a recorrente para o pagamento da última prestação do prémio pelo Lote BT27 que, saliente-se, e como se viu, havia sido acordado nos termos do “contrato de concessão” entre a R.A.E.M. e a dita recorrente celebrado.

Na verdade, e como se mostra evidente, em causa não está qualquer “vício” quanto à validade – ou qualquer “redução” – da cláusula contratual sobre a matéria dos prémios do contrato de concessão.

Daí que, (tendo-se como correcta e adequada a anotação doutrinária atrás citada em relação ao sentido e alcance do estatuído no comando legal do art. 63° do C.P.A.C., e) em face dos elementos probatórios existentes e produzidos nos autos, é efectivamente desnecessária a requerida “produção de prova testemunhal”, sendo assim de se negar provimento ao presente recurso na parte em questão.

–– Continuemos, passando-se a ver agora o que ponderou o Tribunal de Segunda Instância em relação à questão da “(i)legitimidade” da ora recorrente; (cfr., concl. 6ª a 25ª).

Pois bem, vale a pena atentar no seguinte excerto decisório do Acórdão agora recorrido:

“(…)
Se bem se reparar, a recorrente impugna o acto de 25/07/2017, na parte em que: ---
a) Declara extinto o procedimento administrativo de troca de terrenos da Baía de Nossa Senhora da Esperança pelos da antiga Fábrica de Panchões Iec Long na Taipa, com fundamento na ilegalidade do Termo de Compromisso de 10/01/2001, e, simultaneamente, na parte em que ---
b) Determina o pagamento da última prestação do prémio no valor de MOP$ 14.157.052,00, resultante do processo de revisão da concessão tida lugar pelo Despacho nº 76/GM/93 (em consequência da mudança de titularidade da concessão do lote 27 da Baixa da Taipa, inicialmente conferida a B, posteriormente transmitida a título gratuito para a recorrente “Samtoly”).
Ora, quanto à primeira parte, parece-nos claro que ela não tem interesse directo, pessoal e legítimo para recorrer. Com efeito, o procedimento de permuta de terrenos estava a decorrer desde há longo tempo somente entre a RAEM e a empresa “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, SA” (por comodidade, diremos “BNSE”), que são, obviamente, pessoas colectivas distintas, com personalidade jurídica autónoma.
E embora nessa empresa tenham interesses próprios algumas pessoas que compõem a sociedade recorrente “Samtoly”, a verdade é que não podemos confundir os interesses individuais de cada uma dessas pessoas com os da sociedade em si mesma.
Por outro lado, embora nesse procedimento de troca de terrenos estivesse a ser ponderado - mas apenas para efeito de apuramento do valor final dos prémios a ter em conta na concessão que viesse a derivar dessa permuta - o montante do prémio imposto em resultado da revisão acima mencionada (com o reconhecimento inclusive de alguma diferença de tratamento entre o prémio então imposto à recorrente concessionária do Quarteirão lote BT-27 e aos titulares dos Quarteirões BT-32 e BT-33), certo é que tudo isso só estava em “cima da mesa” enquanto modo de resolver, pela via do diálogo, uma questão que se arrastava ao longo dos anos e que dizia respeito a alguém que tinha interesses directos nos terrenos da antiga fábrica de Panchões Ieoc Long.
Ou seja, a RAEM só assentia nessa ponderação no quadro de um acordo final entre pessoas diferentes que não envolviam directamente a “Samtoly”, e que só reflexamente lhe diziam respeito, na medida em que contemplava representantes comuns de ambas as empresas (“Samtoly” e “BNSE”).
Sendo assim, o facto de não ter chegado a bom porto a negociação, isto é, a circunstância de ter sido extinto o procedimento de troca, por alegada ilegalidade do termo de compromisso assinado entre as partes (RAEM e “BNSE”), só lateralmente toca os interesses da recorrente “Samtoly”. Não esqueçamos que a legitimidade para o recurso só é reconhecida às pessoas que sejam titulares de direitos subjectivos ou de interesses legalmente protegidos que tivessem sido lesados pelo acto recorrido ou que aleguem e provem um interesse directo, pessoal e legítimo (art. 33º, al. a), do CPAC).
Portanto, não se pode dizer que a solução da troca de terrenos tenha lesado a esfera jurídica da “Samtoly” ou atentado contra um interesse directo e pessoal da recorrente. A relação jurídica-administrativa que a liga à RAEM, essa, é substancialmente diferente e independente; tem que ver unicamente com a relação de concessão que as une e, já o sabemos neste momento, com o conflito que ainda se mantém acerca do valor da última parte do prémio exigido à recorrente, no valor de MOP$ 14. 157.052,00.
Por conseguinte, em nossa opinião, não dispõe de legitimidade para discutir a legalidade do acto na parte em que se refere à extinção do procedimento de troca, nos termos do art. 33º, al. a), do CPAC”; (cfr., fls. 525 a 526-v).

Quid iuris?

Ora, também aqui se nos mostra que o assim considerado não merece qualquer censura.

Vejamos.

Nos termos do art. 33° do C.P.A.C.:

“Têm legitimidade para interpor recurso contencioso:
a) As pessoas singulares ou colectivas que se considerem titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos que tivessem sido lesados pelo acto recorrido ou que aleguem interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso;
(…)”.

Decorre assim da Lei que existem dois tipos de situações em que é atribuída “legitimidade” para a apresentação de um recurso contencioso:
i) quando os particulares aleguem ser titulares de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos que são abstractamente lesados pelo acto administrativo impugnado; e,
ii) quando os particulares aleguem ter um interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso.

Sobre tais “situações”, vale a pena desde já recordar que sobre as mesmas se considera que, “(…) tanto na figura do direito subjectivo como na do interesse legítimo existe um interesse privado reconhecido e protegido pela lei. Porém, no direito subjectivo essa protecção é imediata e plena, de tal modo que o particular tem a faculdade de exigir à Administração um ou mais comportamentos que satisfaçam integralmente o seu interesse privado e, bem assim, o poder de obter a sua completa realização em juízo em caso de violação ou não cumprimento. No interesse legítimo, ao invés, porque a protecção legal é mediata, ou de segunda linha – pois o interesse protegido directamente é um interesse público –, e não é plena, mas mitigada, o particular não pode exigir à Administração que satisfaça integralmente o seu interesse privado, mas apenas que não o prejudique ilegalmente; em caso de ilegalidade, o particular não poderá realizar plenamente o seu interesse em tribunal, mas, tão-somente, eliminar os actos ou comportamentos ilegais que o tenham prejudicado. (…)
Exemplo de um direito subjectivo: se a lei disser que ao fim de cinco anos de serviço o funcionário tem direito a uma diuturnidade, isso significa que o funcionário pode legalmente exigir a concretização dessa diuturnidade, e que o Estado tem a obrigação jurídica de fazer o respectivo pagamento ao funcionário. (…)
Exemplo de um interesse legítimo: a lei estabelece que para preencher um lugar de professor catedrático tem de se realizar um concurso público, ao qual podem concorrer todos aqueles que reúnam determinadas condições legais; suponhamos que concorrem três pessoas, mas que uma delas não se encontra nas condições legais exigíveis para concorrer, e que o júri a escolhe precisamente a ela para o provimento do cargo. Qualquer dos outros dois candidatos ficou prejudicado ilegalmente, porque a decisão que nomeou um candidato que não preenchia as condições legais foi ilegal. Esses dois candidatos podem impugnar a decisão, e têm direito a obter a sua anulação pelos tribunais. Isto significa que qualquer deles tem direito ao cargo? Claro que não. Significa apenas que eles podem remover um obstáculo ilegal à satisfação do seu interesse e significa, em segundo lugar, que terão uma nova oportunidade para tentar conseguir realizar esse interesse. (…)”; (cfr., v.g., Diogo Freitas do Amaral com a colaboração de Pedro Machete e Lino Torgal in, “Curso de Direito Administrativo”, Vol. II, 3ª ed., pág. 59 e 60).

Por outro lado, sobre o conceito de “interesse directo, pessoal e legítimo”, mostra-se também adequado ponderar nas seguintes considerações sobre o mesmo tecidas:

“O recorrente, portanto, há-de ter interesse na anulação ou na declaração de nulidade do acto, isto é, tem de mostrar que da procedência do seu pedido resulta para ele uma utilidade ou vantagem. Essa vantagem tanto pode ser material, como meramente moral.
Tem o interesse de ser directo, pessoal e legítimo: (…)
Em nosso entender, (…) esse interesse tem de ser considerado directo quando o provimento do recurso implique a anulação ou a declaração de nulidade de acto jurídico que constitua obstáculo à satisfação de pretensão anteriormente formulada pelo recorrente (quer essa pretensão seja positiva, quer negativa) ou seja causa imediata de prejuízos infligidos pela Administração.
O interesse será pessoal quando o recorrente alegue esperar uma utilidade concreta para si próprio ou para a sua função, do provimento do recurso, isto é, seja a pessoa em cuja carreira, em cuja esfera jurídica ou actividade se vá produzir o efeito da declaração pretendida.
Finalmente, o interesse é legítimo se a utilidade proveniente do provimento do recurso não for reprovada pela ordem jurídica (…)”; (cfr., v.g., Marcello Caetano in, “Manual de Direito Administrativo”, Vol. II, 10ª ed., pág. 1356 e 1357, podendo-se também sobre a matéria ver os Acs. deste T.U.I. de 28.04.2004, Proc. n.° 8/2004, de 15.12.2010, Proc. n.° 48/2010 e de 28.10.2011, Proc. n.° 56/2011).

Tendo em atenção o que se deixou consignado, importa então apurar se a recorrente preenche os requisitos legais estabelecidos para a sua reclamada “legitimidade” recursiva no que toca ao acto que determinou a “extinção do procedimento administrativo de troca de terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long”.

Pois bem, (e como com clareza resulta da documentação junta aos autos), há que referir, em primeiro lugar, que a “única questão” que opõe a ora recorrente ao Governo, prende-se com o “prémio adicional fixado aquando da revisão do contrato de concessão do lote BT 27”, efectuada na sequência da apresentação por parte do concessionário de diferentes propostas de aproveitamento do terreno, da alteração das condicionantes urbanísticas definidas para o desenvolvimento dos lotes da zona da Baixa da Taipa, (nomeadamente levantando a restrição que limitava a altura dos edifícios a 61 metros e da transmissão dos direitos resultantes da concessão a favor para a recorrente, “Sociedade Samtoly”).

Isto porque a recorrente entendeu ter sido prejudicada na fixação daquele prémio porque, ao contrário do que lhe havia sido afirmado, não foi seguida a mesma metodologia para a fixação do prémio em relação aos lotes BT 32 e BT 33, sentindo-se assim em desvantagem em relação às concessionárias daqueles lotes; (cfr., requerimento pela recorrente subscrito em 16.03.1993; o ponto 19° da matéria de facto dada como provada).

Daí, aliás, que a razão pela qual a pretensão (desde o longínquo dia de 09.07.1996) pela recorrente formulada em sede administrativa consistiu – sempre e apenas – na “revisão do (seu) contrato” para ser “recalculado o prémio” (aí estipulado), tendo em conta os custos reais suportados, os valores realistas praticados no mercado e os critérios diferentes adoptados nos processos de revisão dos outros contratos de concessão de terrenos na mesma zona da Baixa da Taipa; (tudo conforme se extrai do ponto 4. da “Informação n.° 031/02/2012”).

Por sua vez, e como já se referiu, não se pode igualmente perder de vista que o aludido “procedimento administrativo” relativamente à “troca de terrenos da Fábrica de Panchões”, decorreu – apenas e tão só – entre a “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.” e a R.A.E.M., no qual se pretendia que aquela Sociedade entregasse à R.A.E.M. os terrenos da “Fábrica de Panchões” que controlava, obtendo, em troca, a concessão de um terreno situado na Baía de Nossa Senhora da Esperança; (cfr., “termo de compromisso” assinado no decurso daquele procedimento), no qual, (e em bom rigor), a “Sociedade Samtoly”, ora recorrente, enquanto “pessoa jurídica autónoma”, (e que não se confunde com os seus “sócios” ou “representantes”), não foi tida nem achada, dado que, como se mostra natural e evidente, constituía “matéria” em relação à qual era “alheia”.

É certo, (e não se nega), que a partir de dado momento, e por iniciativa dos “sócios da recorrente” e da “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, os dois procedimentos administrativos passaram a correr “conjuntamente”, tendo-se encetado negociações no sentido de o montante de MOP$77.000.000,00 que teria sido cobrado em excesso no prémio do “Lote BT 27” ser deduzido no prémio que viesse a ser cobrado pela concessão do terreno à dita “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, não sendo porém, (e de qualquer modo), de equiparar o assim “acordado” com qualquer “acordo de revisão do contrato de concessão do Lote BT 27 entre a recorrente e a R.A.E.M.”.

Assim, adequado é pois concluir que, independentemente do procedimento administrativo sobre a “troca de terrenos”, à ora recorrente sempre caberia efectuar o – agora contestado – pagamento da última prestação do prémio devido pela concessão do terreno do Lote BT 27, no valor de MOP$14.157.052,00, tudo conforme resulta da leitura (conjugada) da “Informação n.° 30/SOTDIR/2000”, (cfr., ponto 17° da matéria de facto dada como provada), e dos pontos 12., 15.7. e 15.11. da “Informação n.° 031/02/2012”, (cfr., ponto 22° da matéria de facto dada como provada), totalmente acertada se nos apresentando assim a afirmação tecida no Acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância no sentido de que embora nesse procedimento de troca de terrenos estivesse a ser ponderado o montante do prémio “revisto” de acordo com a “Informação n.° 30/SOTDIR/2000”, o mesmo apenas relevava “para efeito de apuramento do valor final dos prémios a ter em conta na concessão que viesse a derivar dessa permuta”.

Pelo exposto, impõe-se concluir que a recorrente não tem qualquer “direito subjectivo” ou “interesse legítimo” relativamente ao acto administrativo que “determinou a extinção do procedimento administrativo relativo à troca de terrenos da Fábrica de Panchões Iec Long” que, aliás, (diga-se), constitui “matéria – definitivamente – arrumada” em sede da decisão prolatada (e transitada em julgado) nos Autos de Recurso Jurisdicional n.° 191/2020 deste Tribunal de Última Instância; (cujo Acórdão, de 03.02.2021, aqui se dá como integralmente reproduzido, consignando-se, igualmente, que aí se apreciou exactamente da dita decisão de “extinção do procedimento de troca de terrenos”, sendo recorrente a “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, e, em sede do qual, até se indeferiu um pedido da ora recorrente no sentido de se proceder à “apensação do processo” a estes autos; cfr., fls. 84 a 86 e 95 a 95-v).

Com efeito, a (única) “pretensão” administrativamente formulada pela recorrente relacionava-se – tão só – com a revisão da “cláusula 9ª” do contrato de concessão do lote BT 27 que determinou um prémio adicional de MOP$87.570.741,00, pago em 4 prestações de MOP$14.157.052,00 cada uma, (cfr., fls. 90 dos autos de acção ordinária n.° 257/99/AO, a fls. 346 a 347 dos presentes autos de recurso contencioso, e ponto 4° da matéria dada como provada), evidente se nos apresentando assim que, esta “questão”, não era passível de qualquer alteração pelo que viesse (ou pudesse) vir a suceder em sede do procedimento de “permuta de terrenos”, (que, como se referiu, em nada interferia com a sua obrigação de pagamento da última prestação de MOP$14.157.052,00).

Dest’arte, clara se mostra igualmente a solução para esta parte (e questão) do recurso.

–– Por fim, vejamos agora do decidido relativamente ao (referido) “pagamento do montante de MOP$14.157.052,00”; (cfr., concl. 26ª a 53ª).

Sobre esta matéria tem o Acórdão recorrido o teor seguinte:

“Recorde-se que a concessão do referido Lote B-27, inicialmente feita a B, só transitou para a “Samtoly” devido ao facto de a Administração ter aceitado a transferência no âmbito do Despacho nº 76/GM/93, através do qual se procedeu à Revisão do contrato inicialmente celebrado com aquele. Mas foi, precisamente, nessa Revisão que a Administração estabeleceu um prémio adicional no valor de $ 87.570.741,00 (fls. 346-347 dos presentes autos).
Prémio esse que foi introduzido na cláusula nona da minuta do contrato, onde estava igualmente estabelecido o valor de $ 14.157.052,00 para cada uma das últimas 4 prestações referentes, que a recorrente aceitou expressamente em 6/01/1993, por declaração documentada a fls. 699 do p.a. vol. III. E foi por causa dessa aceitação que, então, viria a ser publicado no Boletim Oficial de 18/08/1993, pág. 4263-4265, o referido Despacho nº 76/GM/93 do Chefe do Executivo.
Certo é que posteriormente veio a discordar desse agravamento, designadamente quanto à forma de cálculo do prémio (cfr. fls. 323-324 e 351-353 dos presentes autos). E foi, aliás, dentro desse espírito de indignação, digamos, que chegou a instaurar uma acção sobre contrato no Tribunal Administrativo (Proc. nº 257/99/AO), onde pretendia demonstrar a invalidade dessa cláusula contratual 9ª.
Pois bem. Acontece que esse processo terminou com uma desistência da instância (fls. 256 e 258 da acção nº 257/99/AO, fls. 437 e 438 dos presentes autos, bem como fls. 22 do apenso “traduções”). Terá essa desistência alguma consequência na presente impugnação?
Por si só, não. A desistência da instância apenas faz cessar o processo que se instaurou (art. 237º, nº2, do CPC), ao contrário da desistência do pedido, que, essa sim, faz cessar o direito que se pretendia fazer valer (art. 237º, nº1, do CPC).
Entendemos, pois, que aquela desistência da instância não constitui circunstância obstativa à legitimidade para a interposição do recurso por parte da “Samtoly” para discutir, noutro meio processual (se tal for possível, mas essa é outra questão que mais adiante teremos que abordar) a invalidade que na referida acção imputava à cláusula contratual.
Nem sequer lhe faz supervenientemente perder a legitimidade activa o facto de a recorrente ter efectuado o pagamento da quantia já referida, visto que o fez sob reserva. Ou seja, o pagamento neste caso não equivale a aceitação (cfr. art. 34º, nºs. 1 e 3, do CPAC).
O problema estará, eventualmente, a um outro nível exceptivo e dele trataremos já de seguida.
*
3. Da propriedade do meio
Será o recurso contencioso o meio processual próprio e adequado?
Na sua contestação, a entidade recorrida defendeu que não (cfr. art. 33º da contestação a fls. 127).
Vejamos.
Já sabemos que a recorrente declarou expressamente aceitar o valor do agravamento, onde estava já contemplado o pagamento da parte final do prémio em tranches de $ 14. 157.052,00 cada uma.
Ou seja, a recorrente livremente deu o seu acordo, e sem reserva, àquele valor em 6/01/1993, isto é, exercitou a sua vontade como quis e bem lhe apeteceu naquele instante e só mais tarde é que tentou, por diversas vias, o não pagamento, nomeadamente através da acção acima mencionada e de uns embargos a uma execução fiscal para cobrança coerciva daquele montante da última prestação de $ 14. 157.052,00.
Ora, estamos no âmbito de um contrato, sem dúvida nenhuma. E o que se passa no plano dos contratos tem incidência específica ao nível da reacção contenciosa, como por todos é sabido. E o que se sabe também é que os conflitos sobre contratos se devem dirimir através «acções sobre contratos administrativos» (art. 113º, nº1, do CPAC).
Claro que a «acção sobre contrato» serve, não só para dirimir conflitos posteriores à celebração do contrato, como também para resolver os conflitos respeitantes a actos administrativos praticados na formação do contrato e na própria execução deste, tal como dispõe o art. 113º, nº2, do CPAC.
Todavia, não se trata aqui de avaliar nenhum acto administrativo anterior à formação. O que houve foi a apresentação de uma minuta contratual que a recorrente aceitou, sem reserva, e a que se seguiu a celebração do contrato de revisão, com a publicação do respectivo despacho do Chefe do Executivo.
Portanto, o que está em causa é unicamente a validade de um acto que determina o pagamento da última prestação debitória naquele montante. Só que esse acto deve ser considerado já no âmbito da execução do contrato.
Ora, se, em geral, não está proibida a impugnação de actos de execução de contratos (art. 113º, nº2, do CPAC), não podemos esquecer que o meio próprio e adequado para a discussão judicial sobre a legalidade desses actos só é o recurso contencioso quando esses actos são dotados de imposição autoritária e reúnam todas as características de acto administrativo, tal como este é definido no art. 110º do CPA. Ou seja, têm que ser actos administrativos em sentido estrito e com dispositividade autónoma em relação à execução da matéria do objecto contratual (José Cândido de Pinho, Notas e Comentários ao Código de Processo Administrativo Contencioso, CFJJ, 2018, II, págs. 114-115 e 117).
Ora, nada disso se passa aqui. O que a recorrente acomete é aquilo que, a seu tempo e como condição de a Administração celebrar o Contrato de Revisão da Concessão, declarou aceitar. Ou seja, a recorrente vem agora afirmar que este acto que manda pagar é ilegal, não por fundamentos próprios (como seria, por exemplo, a incompetência do seu autor), mas por uma invalidade que em sua opinião já atingia o contrato na cláusula 9ª.
E sendo assim, este acto nada traz de novo, não inova, não tem dispositividade própria que seja susceptível de ser apreciada autonomamente.
E desta maneira voltamos ao princípio. Se o que verdadeiramente está em causa é uma cláusula contratual, então a razão da discórdia é, indiscutivelmente, a “invalidade do contrato”. Sendo assim, a forma processual para dirimir esse conflito não pode ser o recurso contencioso do acto que aplica a cláusula contratual aceite, mas a acção sobre o contrato a que se refere o art. 113º, nº1, do CPAC.
A recorrente já teve nas mãos a possibilidade de discutir a legalidade dessa cláusula contratual, instaurando a acção com esse fim, mas perdeu-a voluntariamente (embora não definitivamente, sem prejuízo das regras da caducidade) quando desistiu da respectiva instância.
O que se não pode é, através de um recurso contencioso, sindicar uma matéria que só pode ser objecto de acção. Há, pois, erro na forma do processo.
*
3.1 - Quais as consequências desta excepção?
Uma vez que se está no termo do processo, inaplicável se torna o disposto no art. 12º do CPAC.
Por outro lado, e uma vez que se ultrapassou já a fase liminar, cremos que haverá que apelar ao art. 145º do CPC, que manda anular os actos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime da forma estabelecida na lei (nº1), não se aproveitando aqueles que resultarem em diminuição das garantias do reu (nº2).
Ora bem. No caso em apreço, não nos parece que possamos “convolar” para a espécie própria, não apenas porque o tribunal competente para a acção é o Tribunal Administrativo, mas por outra razão especial. É que a convolação é ditada por preocupações de celeridade e economia processual, mas também pela veneração aos princípios “pro-actione” e da “da tutela judicial efectiva” (neste sentido, Ac. do TSI, de 14/02/2019, Proc. nº 707/2018).
Ora, estes princípios não podem agora ser invocados, uma vez que a recorrente “Samtoly” já teve nas mãos a possibilidade de discutir a invalidade da referida cláusula 9ª do contrato de revisão - o que lhe resolveria definitivamente a questão da eventual (i)legalidade do pagamento que aqui verbera -, mas despojou-se desse direito ao desistir da instância livremente na acção que, para esse fim, tinha instaurado no TA. Portanto, se a interessada não quis continuar a discutir o tema na acção, não cabe a este tribunal, no presente caso, substituir-se a ela e, em nome da justiça, obrigá-la a ir de novo para outra acção, pela via da convolação. Terá que ser ela a decidir se quer ir para a acção, para o que, segundo parece, poderá dispor do prazo previsto no nº2, do art. 231º, do CPC.
Resta, assim, a absolvição da instância”; (cfr., fls. 526-v a 529-v).

Ora, ponderando no assim decidido, e da reflexão que sobre o agora alegado nos foi possível efectuar, cremos que também aqui se nos apresenta que nenhum reparo merece o Acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância.

De facto, nos termos do art. 113° do C.P.A.C.:

“1. A acção sobre contratos administrativos tem por finalidade dirimir os litígios sobre interpretação, validade ou execução dos contratos, incluindo a efectivação de responsabilidade civil contratual.
2. O conhecimento da acção sobre contratos administrativos não impede o recurso contencioso de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato.
3. O pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato pode ser deduzido, inicial ou supervenientemente, em acção sobre contratos administrativos quando aquele pedido e os formulados nos termos do n.º 1 estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência ou quando a procedência de todos os pedidos dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas normas jurídicas ou cláusulas contratuais”.

E, como se em entendido:

“Constituindo o contrato administrativo um acordo de vontades entre duas ou mais partes, os litígios que surjam entre elas devem ser resolvidas por meio de acção, não podendo, em regra, o contraente público praticar actos administrativos que se imponham à parte privada. A regra tem excepções. (…)
4. Já a prática de actos administrativos durante a execução do contrato, também referida no n.º 2, envolve uma realidade mais complexa.
Dispõe o n.º 1 do artigo 173.º do CPA, que os actos administrativos que interpretem cláusulas contratuais ou que se pronunciem sobre a respectiva validade não são definitivos e executórios, pelo que na falta de acordo do co-contratante, a Administração só pode obter os efeitos pretendidos através de acção a propor no tribunal competente.
Mas, por vezes, a lei estabelece a possibilidade de o contraente público poder emitir declarações unilaterais no exercício de poderes de direcção, fiscalização, modificação unilateral, sancionatório e de resolução unilateral (são estes os termos utilizados nos artigos 302.º e seguintes do Código dos Contratos Públicos português).
Como refere JORGE ANDRADE DA SILVA, o poder da Administração de modificar unilateralmente as cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de execução das prestações previstas no contrato, traduz uma das mais salientes particularidades dos contratos administrativos cuja execução se prolonga por um período de tempo mais ou menos longo e não tem de estar previsto no contrato. Traduz-se, também, numa actuação da Administração, que integra um acto administrativo. (…)
De acordo com o artigo 174.º do mesmo Decreto-Lei, o dono da obra pode aplicar multas ao empreiteiro por violações contratuais (…) Posteriormente, pode o empreiteiro interpor recurso contencioso da sanção aplicada.
A Administração pode resgatar a concessão de obras públicas e serviços públicos, nos termos dos artigos 19.º, alínea c) e 20.º da Lei n.º 3/90/M, de 14.5, (…) O acto é, evidentemente, impugnável por meio de recurso contencioso.
Relativamente à rescisão, por exemplo, da empreitada de obras públicas, pelo dono da obra, com fundamento em sua conveniência ou em sanção aplicável ao empreiteiro, a corrente maioritária do STA entendia que não operava por meio de acto administrativo. Que constituía mero acto opinativo. (…)
Resolvida a rescisão, o dono da obra toma logo posse administrativa dos trabalhos… Daqui se retira que a lei configura a rescisão como uma decisão do dono da obra, antes da qual o empreiteiro tem direito ao contraditório, não constituindo qualquer acto opinativo. (…)”; (cfr., v.g., Viriato Lima e Álvaro Dantas in, ob. cit., pág. 325 e 326).

No caso dos presentes autos, (e como já se viu), resulta da “cláusula 9ª do contrato de concessão do Lote BT 27” que à recorrente cabia efectuar o pagamento de um prémio adicional de MOP$87.570.741,00, que incluía o pagamento de 4 prestações semestrais de MOP$14.157.052,00, (cfr., fls. 90 dos autos de acção ordinária nº 257/99/AO, a fls. 346 a 347 dos presentes autos de recurso contencioso, e ponto 4° da matéria de facto dada como provada), estando em falta a última prestação, (agora pela recorrente contestada).

E, sendo – precisamente – essa “cláusula” que fundamenta a “notificação” à ora recorrente do acto que determinou o pagamento desta dita “última prestação”, (no montante de MOP$14.157.052,00), claro se nos mostra que, com tal “notificação”, não foi emitida nenhuma “declaração unilateral”, (com base em qualquer lei), não estando assim em causa um “acto destacável”, que contenha “dispositividade própria” ou “autónoma”, e, desta forma, passível de ser impugnado em sede de um “recurso contencioso” que, como se viu, foi o que sucedeu.

Bate-se, a ora recorrente, por outro entendimento.

Porém, e sem prejuízo do muito respeito a opinião diversa, temos para nós que, tudo o que invoca reconduz-se às “negociações” que os seus “sócios”, (a título particular e pessoal), foram mantendo ao longo dos anos com o Governo, no sentido de se reconhecer um prémio adicional excessivo pela concessão do Lote BT 27, e, ao invés desse “excesso” ser devolvido à recorrente, ser o mesmo “deduzido” no (eventual) prémio que viesse a ser fixado pela concessão de um terreno na Baía da Nossa Senhora da Esperança com a área de 152.073m2 à “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, (por troca do terreno da “Fábrica de Panchões”).

Por outras palavras, o facto de se ter procurado um “acerto de contas informal” com o “grupo societário”, (também informal), do qual faz parte a recorrente e a “Sociedade de Desenvolvimento Predial Baía da Nossa Senhora da Esperança, S.A.”, não implicou, nem podia implicar, que a recorrente tenha deixado de ser devedora da quantia de MOP$14.157.052,00, (tal como acordado tinha sido).

Em suma, nada do que a recorrente alega afecta (ou altera) o sucedido, e que, em boa verdade, é que o referido “acto impugnado” com o recurso contencioso que interpôs no Tribunal de Segunda Instância se limitou a dar aplicação ao constante da “cláusula contratual” por si aceite, e que, por nenhum motivo legal existir, se mantém, obviamente, inalterada.

Daí, e também na parte em questão, a improcedência do presente recurso.

Apreciadas que assim cremos ter ficado todas as questões pela recorrente colocadas, cumpre decidir como segue.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos que se deixam expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, com a taxa de justiça de 15 UCs.

Registe e notifique.

Junte-se cópia do Acórdão de 03.02.2021 por este Tribunal proferido nos Autos de Recurso Jurisdicional n.° 191/2020.

Macau, aos 14 de Abril de 2023


Juízes: José Maria Dias Azedo (Relator)
Sam Hou Fai
Song Man Lei

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Mai Man Ieng
Proc. 74/2020 Pág. 42

Proc. 74/2020 Pág. 43