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ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A, Perita Criminalística da Polícia Judiciária (PJ), interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário para a Segurança, de 17 de Janeiro de 2006, que negou provimento a recurso hierárquico de despacho do Director da PJ, que homologou a classificação de serviço da ora recorrente relativa ao período de 12 de Outubro de 2004 a 10 de Outubro de 2005.
Por acórdão de 3 de Abril de 2008, o Tribunal de Segunda Instância, (TSI) negou provimento ao recurso.
Inconformada, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI).
Termina a respectiva alegação com a formulação das seguintes conclusões:
  I. Sobre o período anual correspondido de avaliação da classificação
a) A recorrente entendeu que o acórdão recorrido violou os art.s 172° e 173° do Estatuto dos Trabalhadores, nomeadamente segundo o art. 172° em harmonia com o art. 173°, o segundo período de avaliação deveria entre 10 de Dezembro de 2004 e 9 de Dezembro de 2005 (correspondido ao 2° período anual de nomeação provisória), foi lamentável que tivesse feito uma referencia errada no Boletim de Classificação de Serviço, nomeadamente no período de avaliação entre 12 de Outubro de 2004 a 10 de Outubro de 2005 (cfr. o documento Anexo 1, cujo original constante nos autos).
  b) Como o notador errou no período de avaliação de classificação do serviço, foi consequentemente que incluiu comportamentos da recorrente durante o período entre 12 de Outubro de 2004 e 10 de Outubro de 2005 como os do período que devia ser avaliado, razão pela qual, o resultado final não poderia reflectir a verdadeira conduta da recorrente nesse período anual (quer dizer, entre 10 de Dezembro de 2004 e 9 de Dezembro de 2005), ao contrário, avaliou a conduta da recorrente do outro período anual, por isso, o vício é muito grave.
  c) O acto de pontuação violou o disposto nos art. s 172° e 173° do Estatuto dos Trabalhadores, de modo que o resultado da avaliação da classificação enferma do vício grave e, em consequência, deve ser declarado nulo ao abrigo do art. 122° do Código de Procedimento Administrativo, ou ao abrigo do art. 124° do mesmo diploma, deve ser anulado.
  d) Devido ao erro no período de avaliação da classificação, terá naturalmente causado grande diferença nos valores parcelares e na pontuação final, o que conduzirá a erro grosseiro e à manifesta injustiça no exercício da margem da discricionariedade, por isso, o acto violou o princípio de justiça.
II. Violação do princípio de justiça previsto no art. 7º do Código de Procedimento Administrativo
  Além do erro supra citado no período anual de avaliação da classificação do serviço, ainda cabe referir os seguintes:
  e) A entidade recorrida entendeu que a pontuação de 5 valores no item de Aperfeiçoamento não enferma de nada, por isso, o Tribunal a quo não procedeu ao conhecimento e à apreciação a este respeito do facto.
  f) Mesmo pode ser admitida ao notador uma certa margem de discricionariedade, ela só pode ser exercida dentro de um limite admitido pela lei, além disso, dentro do estipulado do art. 162° do Estatuto dos Trabalhadores em conjugação com os modelos de impressos e a Guia de pontuação para a avaliação da classificação previstos no Despacho n.° 65/GM/99, porque todos esses são critérios que devem ser observados pelos notadores, pois fazendo parte do Estatuto dos Trabalhadores.
g) Porém, o acórdão recorrido violou a Guia de Pontuação e o princípio de justiça previsto no art. 7° do Código de Procedimento Administrativo na avaliação dos valores nos itens de Aperfeiçoamento, Qualidade de Trabalho, Quantidade de Trabalho e Assiduidade e Pontualidade.
  III. Violação do disposto do art. 571°, n.° 1, al. b) e do art. 556°, n.° 2 do Código de Processo Civil aplicável por força do art. 1° do Código de Processo Administrativo
  h) Segundo o disposto no art. 571°, n.° 1, al. b) do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

  i) Mas, segundo o disposto no art. 556°, n. ° 2 do Código de Processo Civil, a decisão proferida deve declarar quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
  j) No entanto, o acórdão recorrido apenas declarou os factos dados como provados, sem declarar quais não provados.
  k) Além disso, mesmo entre os factos dados como provados, o acórdão recorrido só enumerou os factos que já tinham sido apresentados antes de interposição do recurso contencioso e copiou apenas o teor constante da reclamação e do recurso hierárquico, sem se pronunciar se os valores parcelares e a pontuação final e outros factos constantes do documento Anexo 1 foram dados como provados (mesmo a recorrente já tem apresentado a reclamação sobre tais valores e cujos fundamentos de facto), bem como se os factos apresentados pela recorrente na motivação do recurso contencioso anteriormente interposto e os factos apresentados pela entidade recorrida na contestação também anteriormente encaminhada foram provados.
l) Foi um erro mais grosseiro, salvo o devido respeito, o facto de o acórdão recorrido não ter especificado o meio de prova usado para provar os factos já dados como provados, nem os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, como não especificou se foram provados por declarações prestadas por testemunhas ou por provas documentais e objectos.
  m) Face ao expendido, o acórdão recorrido violou notavelmente o disposto no art. 556°, n.° 2 e no art. 571°, n.°1, al. b) do Código de Processo Civil e, consequentemente, deve ser declarado nulo.
  IV. Vício de erro de facto
  n) O Tribunal a quo interpretou erradamente, ao considerar que os vícios de “violação do princípio de justiça” e de “erro de facto” invocados pela recorrente se enquadram na mesma questão de direito e por isso, só conheceu e apreciou o recurso no âmbito de se ter violado os princípios de proporcionalidade e justiça, sem apreciar os erros de facto a ser expressados mais adiante.
o) Porém, mesmo sendo vinculados, os dois vícios não são iguais, muito menos podiam ser confundidos um com outro.
  p) Na realidade, além de ter impugnado o vício de violação do princípio de justiça, a recorrente tem especificado na motivação do recurso contencioso todas as circunstâncias de que resultaram avaliação errada de matéria de factos na atribuição de pontos de diversos itens, tais como Qualidade de Trabalho, Quantidade de Trabalho e Aperfeiçoamento.
  q) Para devidos efeitos, o Tribunal a quo deveria proceder ao conhecimento destes erros de facto, foi lamentável que o acórdão recorrido não tenha conhecido nem apreciado tais erros de facto verificados na pontuação da avaliação da classificação dos itens referidos, ou seja, não tenha se pronunciado sobre as questões de que ele deveria conhecer, nem tenha especificado tais factos se foram dados como provados ou não provados.
  r) Nestes termos, sem apreciar tais factos relevantes supra citados nem especificá-los se foram provados ou não provados, o acórdão recorrido violou o disposto no art. 571°, n.° 1, al. b) e al. d) e no art. 556°, n.° 2 do Código de Processo Civil e, em consequência, violou o disposto no art. 124° do Código de Procedimento Administrativo por ter enfermado do erro de facto.
V. Violação do art. 162° e o princípio de justiça vinculado
s) O notador deveria conceder valores em todos os itens (ou pelo menos de 1° a 10° item), porém, no caso sub judice, o notador não deu valores nos itens de 9° a 11°, nem especificou os fundamentos sobre a não avaliação.
t) Como a recorrente tinha de ir a locais de crime para fotografar, recolher e tratar vestígios e dados, de maneira que sem dúvida alguma trabalhava enfrentando a sua própria segurança e a segurança de terceiros.
u) Já que o serviço prestado pela recorrente estava ligado com a segurança, mesmo não com muita frequência (mera suposição), deveria dar à recorrente valores no 9° item “Respeito pela Segurança”.
  v) Quanto ao 10° item “Relações com o público”, atendendo à necessidade de suas funções, a recorrente ia frequentemente a locais de crime, tendo contacto com vítimas, testemunhas e funcionários de outros órgãos do governo.
  w) Por isso, deveria dar valores nesse 10° item.
  x) Por outro lado, na mesma categoria de avaliação, foram dados valores nos 10 itens, de 1° a 10° no período anual anterior (inclusive os itens “Respeito pela segurança” e “Relações com o público”) (cfr. os documentos Anexo 2° e 3°).
  y) Porém, sem ter mudanças essenciais nas funções, o notador não deu valores nos itens 9° e 10° deste período anual, sem especificar seus motivos, o que viola evidentemente o disposto no art. 162°, n.° 1 do Estatuto dos Trabalhadores e a Guia de Pontuação.
  z) Face a tudo isso, o acto enferma do erro grosseiro e da manifesta injustiça na avaliação da pontuação final ao exercer sua margem de discricionariedade devido ao facto de não ter dado valores nesses itens supra citados, em fim, violou o princípio de justiça.
  aa) Pelo exposto, o acórdão recorrido violou os art. s 162°, 172° e 173° do Estatuto dos Trabalhadores, o Despacho n.° 65/GM/99, os art.s 7°, 122° e 124° do Código de Procedimento Administrativo e os art.s 571 °, n.° 1, al. b) e al. d) e 556°, n.° 2 do Código de Processo Civil, razão pela qual, deve ser anulado.
A Ex.ma Procuradora-Adjunta emitiu douto parecer em que se pronuncia pela improcedência do recurso.

II - Os Factos
  O Acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
  - A, ora recorrente, desempenha funções de perita de criminalística na Directoria da Polícia Judiciária desde 23.04.2003, e, em 10.12.2003, foi nomeada provisoriamente, passando a desempenhar tais funções no Gabinete de Fotografia Criminal,
  - no “Boletim de Classificação de Serviço” de A, propôs-se a classificação de “regular” com a seguinte pontuação:
   “1. Qualidade do trabalho..........................................5
   2. Quantidade de trabalho........................................5
   3. Aperfeiçoamento.................................................5
   4. Responsabilidade.................................................4
   5. Relações humanas no trabalho............................4
   6. Assiduidade e pontualidade.................................8
   7. Iniciativa e criatividade........................................4
   8. Conservação do material......................................7
   9. Respeito pela segurança....................................... -
   10. Relações com o público..................................... -
   11. Capacidade de direcção..................................... -
  Pontuação obtida: 5.25”
  - em termos de “apreciação geral”, consignou-se que:
   “A qualidade de trabalho é evidentemente insuficiente, a notada falta de espírito apreender; falta de sentido de responsabilidade, falta de dedicação ao trabalho, mantém uma péssima relação com os colegas, criando um mal ambiente de trabalho o que torna um obstáculo nos trabalhos do Gabinete de Fotografia.”; (cfr., fl. 201).
  - em sede de reclamação da classificação assim proposta e respondendo à mesma, consignou-se:
   “Após a apreciação da reclamação (...), o notador responde o seguinte:
  Esclarecimento detalhado sobre as pontuações atribuídas à notada no boletim de classificação de serviço:
  1. Qualidade de Trabalho
   Segundo a Guia de Pontuação do Boletim de Classificação de serviço, este factor é uma meta para avaliar a “perfeição e rigor do trabalho executado”, a notada não conseguiu dominar bem a técnica de fotografar impressões digitais e provas materiais durante longo tempo, além disso, nunca, por iniciativa própria, chegou a pedir aconselhamentos aos colegas, nem estando disposta a aceitar as orientações dadas por iniciativa dos colegas mais experientes, nomeadamente em Junho deste ano, o notador fez um ajustamento em relação às atribuições dos funcionários do gabinete de fotografia segundo o qual, a notada foi transferida para encarregar de fotografar impressões digitais e os outros colegas mantêm-se basicamente nos mesmos postos. O objectivo deste ajuste é somente para a notada mudar o posto de trabalho, passando de auxiliar em trabalhos de fotografia de impressões digitais para a responsável principal dos referidos trabalhos, de forma a elevar o seu sentido de responsabilidade e aumentar o seu entusiasmo e a técnica de trabalho. Mas a notada não revelou o espírito empreendedor, pelo contrário andou a repreender o seu chefe no gabinete por este lhe ter aumentado suas funções, mais disse que o chefe andou a dirigir-se contra ela. Após o ajuste interno, a notada não conseguiu tratar muitos dos procedimentos de trabalhos a tempo e conforme a quantidade de trabalho exigida. Com este tipo de desempenho vai muito além da boa qualidade e prudência. Quanto ao factor da Qualidade de trabalho do Boletim de Classificação de Serviço, a pontuação para um “Trabalho aceitável, sem erros ou defeitos graves” é de 6 valores, portanto é adequada a pontuação de 5 valores atribuída pelo notador.
  2. Quantidade de trabalho
   Este factor destina-se à “Avaliação do volume de trabalho realizado e a rapidez da sua execução”. Como os tipos e os pormenores de trabalhos no gabinete de fotografia criminal são relativamente complicados, é impossível discriminar pormenorizada e concretamente na guia de orientações de trabalho todas as tarefas e o volume de trabalho a serem executados diariamente por cada funcionário, por isso, só se pode listar os trabalhos gerais para orientar os funcionários a assumir principalmente um certo trabalho. A notada referiu que só se encarrega de executar os trabalhos listados na Guia de Orientação de Trabalho, portanto não presta atenção nem apoio aos restantes trabalhos internos do Serviço, mesmo os trabalhos e procedimentos de trabalho da sua responsabilidade que a notada devia concluir foram precisos de apoio de outros colegas para a sua conclusão, como por exemplo, em princípio; cada funcionário do gabinete de fotografia após fotografar deve revelar as fotografias por si próprio, porém, actualmente, o auxiliar C está encarregado desse trabalho. Quando necessitam do apoio de C para revelar as fotografia, todos os funcionários esclarecem-lhe claramente, contudo, a notada só deixa os rolos de fotografias sem nenhum recado, o que torna difícil para outros colegas que querem dar-lhe apoio. Por outro lado, os funcionários que tiram fotografias de impressões digitais necessitam de preencher várias informações e tem de assinar, mas depois de advertida muitas vezes, a notada ainda não observou as orientações durante longo tempo, o que causou obstáculos no trabalho e dificuldades em apoiar o acompanhamento do seu trabalho. Além disso, antigamente, os funcionários encarregados de tirar fotografia revelavam primeiro os rolos de fotografias após fotografar as provas materiais e as impressões digitais, e depois, entregavam pessoalmente as fotografias reveladas à Secção de Dactiloscopia. Mas a notada não só não revela os rolos de fotografias, como também não entrega as fotografias à Secção de Dactiloscopia, mesmo que as fotografias já estejam reveladas. Segundo os procedimentos passados, após fotografar; a Secção de Dactiloscopia conseguia receber normalmente as fotografias dentro de três a quatro dias. Todavia, depois de a notada assumir esta função, os trabalhos andam sempre atrasados, muitas vezes a Secção de Dactiloscopia só recebe as fotografias dentro de oito a nove dias. Esta situação nunca melhorou mesmo que a notada fosse aconselhada por seus colegas. Pelo que, é adequado que o notador atribuiu uma classificação de 5 valores para o referido factor.
  3. Aperfeiçoamento
   Conforme a guia de pontuação do Boletim de Classificação de Serviço, este factor que se destina a avaliar o “esforço posto na melhoria da preparação profissional e o empenho em adquirir novos conhecimentos” deve ser entendido como o seguinte: Para melhorar o trabalho, aumenta os conhecimentos que dizem respeito ao seu trabalho, adquirindo por iniciativa própria novos conhecimentos do seu âmbito de trabalho. Neste momento, a notada está a tirar o Curso de Licenciatura em Direito na Universidade de Macau fora do horário de serviço, é sem dúvidas uma auto-valorização, mostrando o seu espírito progressivo. Todavia o âmbito de trabalho da notada neste Serviço é a perícia na área de criminalística, estando a notada encarregada principalmente de fotografar impressões digitais, provas materiais e locais dos crimes, e ao mesmo tempo, a notada também tem de possuir conhecimentos e técnicas profissionais sobre as impressões digitais, só unindo estes dois aspectos é que consegue fazer os trabalhos de fotografias com eficácia para proporcionar provas criminais através da recolha e fixação das impressões digitais. Portanto, a notada deve aperfeiçoar-se a referida área, por exemplo, deve consultar por iniciativa aos seus colegas sobre as técnicas de fotografar em vez de mostrar-se desinteressada em ouvir as orientações de boa vontade dadas pelos colegas. Esta sua atitude não só causa que as suas técnicas profissionais de fotografia mantêm-se estagnadas, como também leva a notada a ser uma funcionária de baixo nível da qualidade no gabinete durante longo tempo. Segundo uma análise racional, a notada revela-se desinteressada em se aperfeiçoar, por isso é adequado que o notador atribuiu uma pontuação de 5 valores.
  4. Responsabilidade
   Para provar de forma suficiente que a notada não possui o básico sentido da responsabilidade que deve ter, vou apontar de entre outros, dois exemplos quaisquer. o meu horário de trabalho é normalmente organizado em escala, sendo 6 horas de trabalho por dia, portanto, existe naturalmente a mudança de escala. Quando outros colegas vêm substituir a notada, geralmente, a notada não lhes deixa qualquer informação sobre a situação do trabalho, de que missão estava a tratar, a que devia proceder com cuidado e qual o trabalho urgente que possuía, entre outros. Na maior parte do tempo de serviço, a notada não costuma conversar com colegas, e até não conversa com eles na mudança de escala, portanto isso causou um acontecimento grave ocorrido num dia de Setembro do corrente ano, o horário de escala da notada foi de 21H00 até 03H00, antes das 03H00 a notada estava a realizar trabalhos fotográficos e ao aproximar-se das 03H00, chegaram um colega da seguinte escala e um colega de apoio. Às 03H00 em ponto, estavam os três no gabinete de fotografia, no entanto, a notada saiu do serviço sem dizer aos outros dois colegas nem deixar informações respeitantes ao trabalho por acabar a outros 2 colegas, por consequência, atrasou-se o procedimento do referido trabalho, e provocou-se o mau entendimento entre os colegas da Secção de Dactiloscopia e os do Gabinete de Fotografia. Este acontecimento está na fase de investigação no processo disciplinar n.° 09/2005 instaurado contra a notada, por isso não vou especificar mais sobre isso. Nestes termos, é adequado que o notador atribuiu uma classificação de 4 valores à notada em relação ao factor de responsabilidade.
  5. Relações humanas no trabalho
   O Gabinete de Fotografia onde a notada trabalha possui 9 trabalhadores. Basicamente, a notada não tem comunicação com 7 deles quer seja dentro ou fora do horário de expediente e, no caso em que precisar de comunicar com eles por necessidade de trabalho, a notada costuma transmitir-lhes mensagens unilateralmente através de anotações de papelaria, tendo manifestado os colegas das subunidades da Secção de Informação Criminal e Apoio Técnico e os das repartições de investigação ao notador que estavam insatisfeitos com a atitude de empenho e de relacionamento interpessoal da notada, sendo péssima a relação estabelecida entre a notada e os colegas da própria subunidade e de outras subunidades, assim sendo, cria um mau ambiente de trabalho no Gabinete de Fotografia. Uma classificação de 4 valores atribuída pelo notador à notada é muito adequada.
  6. Assiduidade e pontualidade
   A notada cumpre basicamente o horário de entrada e saída do serviço. A natureza e o horário do trabalho do gabinete de fotografia são relativamente excepcionais, os funcionários necessitam de trabalhar por turno durante 6 horas. A notada está ciente de que, devido à excepcionalidade do trabalho do gabinete, para elevar a eficiência de trabalho e assegurar o máximo possível a saída pontual dos colegas, os colegas do gabinete de fotografia atingiram um acordo verbal de chegar ao serviço 10 a 15 minutos antes da mudança de escala, por outras palavras, os funcionários da seguinte escala devem chegar antecipadamente 10 a 15 minutos ao serviço para a mudança de escala, mas ao longo do tempo, a notada é a única que chegou mesma à hora de trabalho e nunca chegou antecipadamente ao serviço como o que está em concordância. Apesar dessa conduta da notada está conforme o estatuto e não tem violada as respectivas regras, mas, por senso comum, podem obter uma noção sobre a idoneidade que ela tem em aspectos de assiduidade e pontualidade. Uma classificação de 8 valores atribuída pelo notador à notada é, na realidade, uma classificação bastante elevada.
  7. Iniciativa e criatividade
  Segundo o Boletim de Classificação de Serviço, o factor de iniciativa e criatividade é para “avaliar a capacidade de, com autonomia, procurar e propor novas soluções”. Durante um ano e meio em que o notador desempenha o cargo de Chefe de Departamento de Fotografia Criminal, a notada não tem conseguido dominar bem a técnica profissional do referido âmbito, não tem tido aperfeiçoamento, bem como muitos dos procedimentos de trabalhos da notada foram concluídos através do apoio dos seus colegas. Isso provavelmente tem a ver com a capacidade da notada ou consequência de esquivar-se da responsabilidade. A notada não possui nenhuma iniciativa nem capacidade criadora no trabalho, portanto é adequado que o notador atribuiu uma classificação de 4 valores para o referido factor.
  8. Conservação de material
  Segundo a guia de pontuação, este factor é para “avaliar o cuidado posto na conservação dos instrumentos de trabalho”, a pontuação para “normalmente cuidadoso mas com falhas sem consequências graves” equivale a 6 pontos e a pontuação para “Cuidadoso, raramente estraga ou deixa estragar o material” corresponde a 8 pontos, por isso é razoável que o notador atribuiu uma média de 7 valores para o referido factor.
  9. Respeito pela Segurança
   Segundo a guia de pontuação do Boletim de Classificação de Serviço, este factor é para “avaliar o esforço posto em evitar acidentes que ponham em perigo a segurança própria ou de outrem”. A natureza de trabalho da notada não constitui acidente que ponha em perigo a segurança própria ou de outrem, pelo que não é necessário supervisionar diariamente a notada sobre o esforço posto em evitar acidentes. Mesmo que aconteçam de vez em quando as situações que dizem respeito à segurança, uma ou várias vezes destas não são suficientes para avaliar o comportamento da notada sobre o respeito pela segurança durante todo o ano, pois, em princípio, isto não é acto contínuo e coerente, por isso não é necessário avaliar o referido factor.
  10. Relações com o público
   Este factor avalia a “urbanidade e correcção no tratamento do público utente dos serviços”, que é semelhante com o factor 9. A natureza de trabalho da notada não exige contactos com o público, necessita apenas de colaborar estreitamente com a Secção de Dactiloscopia e os investigadores, portanto o eventual contacto com o público não deve servir de critério da avaliação. Em princípio, isto não é um acto contínuo e coerente, por isso, é desnecessário avaliar o referido factor.
  Esclarecimento detalhada sobre a apreciação geral atribuída no Boletim de Classificação de Serviço:
  1. Quanto à qualidade de trabalho, conforme os fundamentos da avaliação e as notas atribuídas aos factores 1 e 2, o notador atribuiu à notada uma apreciação de “a qualidade de trabalho é evidentemente insuficiente”.
  2. Quanto ao espírito empreendedor, segundo os fundamentos de avaliação e as notas atribuídas aos factores 3 e 7, o notador atribuiu à notada uma apreciação de “falta de espírito empreendedor”.
  3. Quanto ao espírito de responsabilidade, segundo os fundamentos de avaliação e a nota atribuída ao factor 4, o notador atribuiu à notada uma apreciação de “falta de sentido de responsabilidade”.
  4. Quanto à dedicação ao trabalho, segundo os fundamentos de avaliação e as notas atribuídas aos factores 1, 2, 4, 6 e 7, o notador atribuiu à notada uma apreciação de “falta de dedicação ao trabalho”.
  5. Quanto ao relacionamento com os colegas, conforme os fundamentos de avaliação e a nota atribuída ao factor 5, o notador atribuiu à notada uma apreciação de “péssima relação com os colegas”.
  6. De acordo com os fundamentos de avaliação e as notas atribuídas aos factores 2, 4, 5 e 6 o notador atribuiu à notada uma apreciação de “criar mau ambiente de trabalho no gabinete, causando obstáculos nos trabalhos do gabinete de fotografia”.
  Síntese
  Após uma apreciação séria e detalhada da classificação de serviço dada pelo notador à notada durante o período compreendido entre 12 de Outubro de 2004 e 10 de Outubro de 2005 e da reclamação apresentada pela notada, o notador decide manter a pontuação e a classificação proposta (Regular) atribuídas em 8 de Novembro de 2005.
   (..)”; (cfr., fls. 219 a 228).
  - tal classificação dizia respeito ao período de 12.10.2004 a 10.10.2005, e veio a ser homologada por despacho de 30.11.2005 do Exm° Director da Polícia Judiciária;
  - inconformada com a classificação (de “regular”) que lhe foi dada, da mesma interpôs A recurso hierárquico para o Exm° Secretário para a Segurança, afirmando, em síntese, o que segue:
  “A Classificação de serviço deve ser atribuída conforme os princípios de igualdade, justiça, objectividade, proporcionalidade, boa-fé e isenção para avaliar a capacidade e moralidade de cada funcionário público. Vou comprovar o seguinte com base nos fundamentos de facto:
  1. A apreciação de “a qualidade de trabalho é evidentemente insuficiente” atribuída pelo notador é uma avaliação não correspondente à verdade, carecendo de fundamentos de factos objectivos.
  2. A apreciação de “falta de espírito empreendedor” ofendeu com má intenção à minha dignidade. A classificação de ataque pessoal foi atribuída sem observar o principio da boa fé.
  3. Atribuiu-me uma apreciação de “falta de responsabilidade” só com base na versão parcial sem me dar oportunidade de justificar, o que violou os princípios de igualdade, proporcionalidade e isenção.
  4. Atribuiu-me uma apreciação de “falta de dedicação ao trabalho” também só com base na versão parcial, sendo uma apreciação demasiadamente subjectiva, sem fundamentos de factos.
  5. Foi-me atribuída uma apreciação de “péssima relação com os colegas” porque uma parte de funcionários que são “favorecidos” pelo superior hierárquico levantam falsos testemunhos e semeiam discórdias, o que causou um mau ambiente de trabalho. Na realidade, com excepção de manter uma relação normal com aqueles colegas, convivo em harmonia com a maior parte dos investigadores, pessoal administrativo e os funcionários de outros serviços, nunca fiz quaisquer mexericos sobre outras pessoas. Contudo, o notador concedeu-me uma apreciação de péssima relação humana sem entender a situação real, o que, evidentemente, carece de imparcialidade e de justiça.
  6. Foram me atribuídas as apreciações de “a qualidade de trabalho é evidentemente insuficiente”, “falta de espirito empreendedor”, “falta de sentido de responsabilidade”, “falta de dedicação ao trabalho”, “péssima relação humana”, das quais resultou uma apreciação de “criar um mau ambiente de trabalho no gabinete, causando obstáculos nos trabalhos do gabinete de fotografia”, mas tais apreciações têm erros nos pressupostos de facto por falta dos fundamentos de factos e violação dos princípios de igualdade, de justiça e da boa-fé.
  7. Na “Tabela de comparação sobre as últimas três classificações de serviço” discriminada na segunda parte, revela-se que desde o meu ingresso em 10 de Dezembro de 2003, a natureza do meu trabalho não houve basicamente mudanças, a quantidade de trabalho só aumenta dia após dia. Mas após a mudança de notador, só o factor 6 “Assiduidade e pontualidade” mantém-se os 8 valores, os restantes da pontuação sofrem uma descida anormal e os factores 9 e 10 foram inadequadamente eliminados na terceira classificação de serviço, portanto, duvido que a 3ª classificação de serviço tenha feita por grave violação dos princípios de igualdade, justiça, objectividade, proporcionalidade, boa-fé e isenção, pelo que solicito ao Exmo. Sr. Secretário uma averiguação séria e justa.”; (cfr., fls. 198 a 199).
  - no âmbito de tal recurso hierárquico elaborou o Exmo Director da Polícia Judiciária o seguinte parecer:
  “1. Veio a recorrente A, perito de criminalística, com nomeação provisória, interpor recurso da decisão de homologação da sua classificação de serviço efectuada pelo Chefe da Secção de Informação Criminal e Apoio Técnico, relativa ao período de avaliação compreendido entre 12 de Outubro de 2004 e 10 de Outubro de 2005;
  2. Em 08 de Novembro de 2005, o Chefe da Secção de Informação Criminal e Apoio Técnico, B, procedeu à avaliação extraordinária da ora recorrente relativa ao supra indicado período, tendo-lhe sido atribuída a pontuação de 5,25, a que corresponde a classificação de “Regular”;
  3. Tal classificação teve como fundamento a falta da qualidade do trabalho prestado, a sua não execução ou a falta de vontade para a mesma, a falta de responsabilidade, a má relação com os seus colegas e o consequente mau ambiente de trabalho, resultando tudo num impedimento para a prestação de serviço no Gabinete Fotográfico, seu local de trabalho, como melhor consta do Anexo 1, já junto ao processo;
  4. A ora recorrente veio, oportunamente, interpor reclamação sobre o resultado da avaliação, o que fez ao abrigo do artigo 170.° do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau;
  5. A reclamação apresentada foi indeferida à ora recorrente, conforme consta do processo e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, tendo a sua classificação sido ratificada pelo Chefe do Departamento de Investigação Criminal em 30 de Novembro de 2005, com posterior homologação por parte do signatário, na mesma data;
  6. Nesses termos, foi a ora recorrente notificada de tal classificação no passado dia 07 de Dezembro de 2005, com indicação expressa da sua automática cessação de funções a partir de 10 do mesmo mês de Dezembro, com base na alínea c) do n.° 2 do artigo 163.° do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau;
  7. Vem agora a ora recorrente apresentar recurso nos termos e com os fundamentos constantes da petição já junta ao processo e cujo teor se dá aqui por completamente reproduzido;
  8. A nomeação provisória ou definitiva é a forma de provimento do pessoal do quadro - art. 20.° ETAPM -, prevendo o artigo 22.°, no seu n.° 1 que “... a admissão em lugar do quadro tem carácter provisório durante dois anos.”, determinando o n.° 6 do mesmo artigo que “Se o agente, em qualquer período da nomeação provisória, obtiver classificação de serviço inferior a Bom é automaticamente exonerado no termo daqueles períodos, com direito ao vencimento do mês em que cessar as funções.”;
  9. No que se refere à classificação de serviço, atente-se no disposto no artigo 163.° do ETAPM; que prevê a relevância e efeitos da mesma. O n.° 2 do referido artigo refere-se especificamente às consequências da atribuição da classificação de regular, estabelecendo, para o que interessa ao caso concreto, na alínea c) que tal classificação determina a automática cessação de funções do pessoal em nomeação provisória;
  10. A lei é clara e inequívoca quanto aos efeitos da classificação “regular”, havendo uma concordância absoluta entre as normas citadas, pelo que não nos resta outro entendimento senão o de que se procedeu em conformidade com a lei, quer quanto à sua decisão, quer quanto à sua fundamentação, devendo negar-se provimento ao recurso hierárquico apresentado;
  11. Por outro lado, os “fundamentos do recurso” apresentado são apenas factos relatados pela ora recorrente, aos quais deve corresponder, mesmo que sucintamente, a fundamentação legal correspondente. Neste sentido, veja-se o artigo 157.°, n.° 1, do C.P.A. e o comentário a este respeito de Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho, vertido no Código do Procedimento Administrativo de Macau, anotado e comentado, na pag. 870: “de resto, por analogia, entende-se que se deve aplicar as regras do artigo 76.° do C.P.A., das quais destacamos o dever de fundamentação”;
  12. Note-se que a ora recorrente, além de não basear a interposição do presente recurso em nenhuma norma jurídica, limita-se a fazer uma breve menção aos artigos 5.° e 7.° do C.P.A. (início da pag. 9), por forma a invocar os princípios de direito aí consagrados;
  13. Além do mais, nos dois únicos momentos da petição de recurso (pags. 9 e 17) em que a ora recorrente invoca a violação de princípios de direito ou a ausência de fundamentos não faz minimamente corresponder os factos descritos aos vícios apontados;
  Pelos argumentos invocados, carece, pois, de fundamentação legal o recurso hierárquico ora apresentado, devendo decidir-se pela sua improcedência, com as consequências legais.; (cfr., fls. 41 a 43).
  - posteriormente, proferiu o Secretário para a Segurança o despacho seguinte:
   “Relativamente à classificação de serviço homologada a 30 de Novembro de 2005 pelo Director da Polícia Judiciária, A vem apresentar o recurso hierárquico.
   Em relação aos factos concretos e reais, e após uma apuração e leitura dos dados, os critérios da classificação de serviço do recorrente feita pelo Notador se baseiam nos fundamentos relacionados com a “qualidade do trabalho executado ser claramente insuficiente, não procura a auto-valorização, falta de responsabilidade, falta de dedicação ao trabalho, as relações humanas com os colegas de trabalho serem muito más, cria mau ambiente de trabalho no departamento....”; A recorrente apresentou a reclamação sobre a classificação de serviço; o Notador não concordou com os fundamentos invocados pela recorrente; e na reclamação, o Notador já tinha apresentado de forma detalhada dos parâmetros desta classificação bem como apresentou os fundamentos que levaram a essa classificação nos diferentes parâmetros. A recorrente não concordou com a resposta à sua reclamação, pelo que veio apresentar o recurso hierárquico, contestando a verdade dos factos invocados pelo Notador. Neste recurso, a recorrente apresentou factos concretos e definiu-os de uma forma meramente subjectiva, como por exemplo: “O Notador esquivou-se das suas responsabilidades...recorreu a falsas alegações... (vide a página 3 do recurso)...para atingir os seus propósitos não se importou de se contradizer a si mesmo, pelo que está mais do que evidente a falta de princípios por parte do notador, e a forma de gestão basicamente oficial e arbitrária que nos impede de compreender e colaborar ...(vide a página 5 do recurso)” é evidente que, os fundamentos invocados pela recorrente carecem da qualquer capacidade de persuasão, baseada pura e simplesmente numa interpretação meramente subjectiva, falta de objectividade e sem fundamentação dos seus argumentos “.
  Em termos judiciais, o mesmo referiu que as autoridades competentes com base nos critérios da justiça administrativa material nas situações concretas para proceder à classificação do serviço da trabalhadora; por outro lado, os fundamentos invocados pela recorrente consiste somente no relato da realidade dos factos, não tendo feito qualquer referência à violação da legislação. Ao mesmo tempo, a realidade abordada neste recurso também não viola os princípios de Justiça.
   De acordo com o supramencionado, e nos termos do n° 4 do Regulamento Administrativo n° 6/1999 e usando das competências delegadas pela Ordem Executiva n° 13/2000, declaro o recurso improcedente bem como se mantém a classificação homologada pelo Director da Policia Judiciária a 30 de Novembro de 2005.”
Este é o acto recorrido.

III – O Direito
1. As questões a apreciar
As questões a resolver são as de saber se o Acórdão recorrido incorreu em:
- Nulidade, por falta de especificação na sentença dos factos não provados e dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador;
- Vícios da matéria de facto, por o Acórdão recorrido não se ter pronunciado se os valores parcelares e a pontuação final foram dados como provados;
- Violação do artigo 173.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (doravante ETAPM), ao considerar não ter havido violação desta norma legal pelo acto administrativo impugnado, por ter sido feita a homologação da classificação de serviço em 30.11.2005, em vez de o ter sido antes de 10.11.2005;
- Violação dos princípios de justiça, da proporcionalidade e da imparcialidade, por ter sido atribuída a pontuação de 5 valores nos itens de aperfeiçoamento, qualidade do trabalho e quantidade de trabalho e de 8 valores no item de assiduidade e pontualidade.

2. Questões novas
Como bem refere a Ex.ma Procuradora-Adjunta, a recorrente não suscitou no recurso contencioso as seguintes questões, relativamente às quais pede a apreciação neste recurso jurisdicional:
- Violação do artigo 172.º do ETAPM, por erro no período de avaliação, que devia ser de 10.12.2004 a 9.12.2005 e não de 12.10.2004 a 10.10.2005;
- Violação do artigo 162.º do ETAPM, porque o notador não deu valores em todos os itens, como devia, nem especificou os fundamentos sobre a não avaliação.
Estas questões não serão apreciadas, já que o recurso jurisdicional de sentença proferida em recurso contencioso se destina a averiguar do bem ou mal fundado da sentença, relativamente às questões suscitadas no recurso contencioso. Por isso, o recorrente do recurso jurisdicional não pode suscitar questões novas, não submetidas ao veredicto do tribunal que se pronunciou em 1.º grau de jurisdição, salvo, naturalmente, aquelas questões de conhecimento oficioso do Tribunal.
Trata-se de doutrina e jurisprudência pacíficas. Foi esse o nosso entendimento nos Acórdãos de 29 de Junho de 2005, no Processo n.º 15/2005 e de 10 de Maio de 2006, no Processo n.º 7/2006.
Não sendo as questões indicadas de conhecimento oficioso do Tribunal, delas não vamos conhecer.

3. Questões de nulidade do acórdão recorrido. Falta de especificação na sentença dos factos não provados e dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador
Importa começar por apreciar as questões que podem conduzir à nulidade do Acórdão recorrido já que, a procederem, poderiam determinar a devolução do processo ao TSI para conhecer da omissão.
A tese da recorrente é a de que o Acórdão recorrido é nulo porque dele não constam os factos não provados e porque se não especificou os meios de prova usados para considerar os factos provados, nem os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, o que violaria o disposto nos arts. 571.º, n.º 1, alínea b) e 556.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, aplicáveis subsidiariamente, nos termos do art. 1.º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Como se sabe, em processo civil, na acção declarativa com forma ordinária, que constitui o paradigma para as restantes formas de processo civil e, por conseguinte, para os restantes direitos processuais, há uma cisão entre o julgamento de facto e o julgamento de direito.
O julgamento da matéria de facto tem lugar por meio de uma decisão em que o tribunal (na maior parte dos casos o tribunal colectivo) “... declara quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador” (art. 556.º, n.º 2 do Código de Processo Civil).
Posteriormente, tem lugar o julgamento de direito, que se consubstancia na sentença, que é sempre proferida por um juiz (singular).
A estrutura da sentença consta do art. 562.º do Código de Processo Civil, onde se dispõe:
Artigo 562.º
(Sentença)
  “1. A sentença começa por identificar as partes e o objecto do litígio, fixando as questões que ao tribunal cumpre solucionar.
  2. Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
  3. Na fundamentação da sentença, o juiz toma em consideração os factos admitidos por acordo ou não impugnados, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.
4. ...”
Assim, em processo civil, na sentença o juiz não indica os factos não provados, mas apenas os factos provados. Deste modo, mesmo que o Código de Processo Civil fosse aplicável à sentença no recurso contencioso, estava o recorrente equivocado ao defender a aplicação de norma que se aplica à decisão de julgamento de facto e não à sentença, em que se consubstanciou o Acórdão recorrido.
Na verdade, o artigo 556.º, n.º 2 do Código de Processo Civil não se aplica à sentença.
No recurso contencioso não há uma separação entre o julgamento de facto e de direito. À semelhança do processo penal, no recurso contencioso, na sentença (ou Acórdão se se tratar do TSI), procede-se ao julgamento de facto e de direito.
O Código de Processo Administrativo Contencioso contém uma norma respeitante à sentença no recurso contencioso, que é o artigo 76.º e que dispõe:
“Artigo 76.º
(Conteúdo da sentença e acórdão)
A sentença e o acórdão devem mencionar o recorrente, a entidade recorrida e os contra-interessados, resumir com clareza e precisão os fundamentos e conclusões úteis da petição e das contestações, ou das alegações, especificar os factos provados e concluir pela decisão final, devidamente fundamentada”.
Ora, esta norma determina que a sentença especifique os factos provados, mas não os factos não provados, pelo que, tendo aplicação directa ao nosso caso, não será de aplicar subsidiariamente o artigo 562.º do Código de Processo Civil. Mas ainda que o fosse, o resultado seria o mesmo.
Ou seja, tanto em processo civil, como em processo administrativo contencioso, a sentença não indica os factos alegados pelas partes não considerados provados pelo tribunal, mas indica apenas os factos provados.
Não tem, pois, razão o recorrente nesta parte.
Já quanto à tese do recorrente, de que Acórdão recorrido é nulo porque não especificou os meios de prova usados para considerar os factos provados, nem os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, a questão é mais complexa.
O artigo 76.º Código de Processo Administrativo Contencioso, atrás transcrito, não impõe ao julgador tal obrigação, naquela norma que se refere à estrutura da sentença no recurso contencioso.
  Mas já o n.º 3 do artigo 562.º do Código de Processo Civil determina que “na fundamentação da sentença, o juiz toma em consideração os factos admitidos por acordo ou não impugnados, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer”.
Na sentença, além dos factos considerados provados na decisão sobre a matéria de facto – factos sujeitos à livre apreciação do julgador (artigo 558.º, n.º 1) - o juiz considera, ainda, os factos cuja prova se baseia em meios de prova que escapam ao julgador da matéria de facto (factos admitidos por acordo ou não impugnados nos articulados, provados por documentos – prova plena – ou por confissão escrita).
Na sentença, quando o juiz examina criticamente as provas fá-lo “... de modo diferente de como fez o julgador da matéria de facto: não se trata já de fazer jogar a convicção formada pelo meio de prova, mas de verificar atentamente se existiram os factos em que se baseia a presunção legal (lato sensu) e delimitá-los com exactidão para seguidamente aplicar a norma de direito probatório”1.
Assim, o Acórdão recorrido não tinha de especificar os meios de prova usados para considerar os factos provados, nem os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
De resto, mesmo que o Acórdão recorrido contivesse a omissão apontada – e não tem - tal omissão não seria fundamento de nulidade, mas antes, a requerimento da parte, poderia ser determinada a devolução do processo para que o tribunal recorrido fundamentasse a decisão de facto (artigo 629.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente).
O recorrente não efectuou o requerimento a que se refere o artigo 629.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, pelo que sempre seria improcedente a arguição de nulidade.

4. Vícios da matéria de facto
Ainda em relação à matéria de facto, a recorrente alega que o Acórdão recorrido não se pronunciou sobre se os valores parcelares e a pontuação final foram dados como provados.
Ora, há aqui uma qualquer confusão da recorrente, já que nos factos provados se considerou como provado os valores parcelares e a pontuação final atribuídas pela entidade classificadora à recorrente. O que a recorrente pode é não concordar – como não concorda – com a pontuação, mas isso é outra questão, que se refere à substância da motivação e que se apreciará posteriormente.
Alega ainda a recorrente que o Acórdão recorrido não se pronunciou sobre os factos alegados na petição de recurso contencioso nem com os alegados na contestação, mas não esclarece quais, com o que a alegação é insubsistente, porque não fundamentada.

5. Violação do artigo 173.º do ETAPM. Formalidades essenciais e não essenciais
Trata-se de saber se houve violação do artigo 173.º do ETAPM, ao considerar não ter havido violação desta norma legal pelo acto administrativo impugnado, por ter sido feita a homologação da classificação de serviço em 30.11.2005, em vez de o ter sido antes de 10.11.2005.
O artigo 173.º do ETAPM fixa o termo do período de prolação do acto de homologação da classificação de serviço do pessoal de nomeação provisória, até ao 30.º dia que anteceder o termo do período anual de nomeação provisória.
A tese da recorrente é a de que o acto de homologação deveria ter sido proferido até 10 de Novembro de 2005 e não, como aconteceu, em 30 de Novembro de 2005.
E tem razão.
Mas será esta violação do prazo legal relevante, em termos de afectar a validade ou eficácia do acto de classificação?
Como se sabe, o procedimento administrativo consiste numa sucessão ordenada de actos e formalidades tendentes à formação e manifestação da vontade da Administração Pública, ou à sua execução (artigo 1.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo).
Ensina MARCELLO CAETANO2 que formalidade é “todo o acto ou facto, ainda que meramente ritual, exigido por lei para segurança da formação ou da expressão da vontade de um órgão de uma pessoa colectiva”, acrescentando que “os próprios prazos estabelecidos para a prática de um acto entram no conceito genérico de formalidade”.
Como se sabe, as formalidades são essenciais ou não essenciais, consoante a sua preterição ou omissão afecte ou não a validade do acto que delas dependa ou que por elas se traduza.
Em princípio, toda a formalidade prescrita por lei é essencial, pelo que tem de ser observada para que o acto seja válido.
Mas, ainda na lição de MARCELLO CAETANO3, “Aparte os casos em que a lei declare essenciais ou não essenciais as formalidades, devem considerar-se como não essenciais:
a) as formalidades preteridas ou irregularmente praticadas quando, apesar da omissão ou irregularidade, se tenha verificado o facto que elas se destinavam a preparar ou alcançado o objectivo específico que mediante elas se visava produzir;
b) as formalidades meramente burocráticas prescritas na lei com o intuito de assegurar a boa marcha interna dos serviços.
Nestes casos, embora tivesse havido uma irregularidade na prática do acto, esta não afecta a sua validade nem a eficácia”.
O caso dos autos integra qualquer das duas categorias propostas pelo Ilustre Professor de Lisboa.
Por um lado, o acto de classificação foi atribuído sem qualquer prejuízo para a interessada, apesar de praticado 20 dias depois do termo do prazo previsto na lei.
Por outro, trata-se de formalidade meramente burocrática, porque prescrita na lei como o intuito de assegurar a boa marcha interna dos serviços.
Assim, como bem se reflectiu no Acórdão recorrido, esta violação do prazo legal não tem consequências em termos de invalidade do acto administrativo, dado que não afectou quaisquer direitos ou interesses protegidos da recorrente.
Trata-se de prazo meramente ordenador, destinado a assegurar que o processo classificatório decorra em tempo razoável.
A violação da norma não tem consequências anulatórias do acto administrativo, sem prejuízo de a entidade competente poder extrair outras consequências da violação legal, em termos disciplinares ou outros.
Improcede a questão suscitada.

6. Justiça administrativa. Sindicância do mérito de notação.
Resta apreciar as questões relacionadas com a violação dos princípios de justiça, da proporcionalidade e da imparcialidade, por ter sido atribuída a pontuação de 5 valores nos itens de aperfeiçoamento, qualidade do trabalho e quantidade de trabalho e de 8 valores no item de assiduidade e pontualidade.
Convém começar por recordar que este TUI já abordou a questão de saber em que circunstâncias é que os tribunais podem sindicar o mérito, o fundo, das classificações de serviço ou notações de funcionários da Administração Pública. Fê-lo no Acórdão de 8 de Novembro de 2006, no Processo n.º 33/2006. As considerações que então expendemos mantêm ainda a nossa concordância. A exposição que se segue aproveita o essencial do nosso entendimento naquele Acórdão, com modificações adequadas à especificidade do caso dos autos, bem como outras tidas por pertinentes, atento o tempo decorrido.
Quanto a esta questão, o Acórdão recorrido entendeu que, quanto ao mérito da notação, os actos administrativos inserem-se na chamada justiça administrativa, só sindicável pelos tribunais em caso de erro grosseiro ou manifesta injustiça.
A doutrina tem considerado vários casos de discricionariedade imprópria, constituindo figuras que são conceitualmente diferentes do poder discricionário, mas que seguem basicamente o mesmo regime deste.4
Os casos que têm sido considerados como de discricionariedade imprópria são a liberdade probatória, em que a Administração toma decisões depois de recolher certas provas, para se certificar da situação de facto sobre a qual vai incidir a sua decisão jurídica; a discricionariedade técnica, em que a Administração toma decisões com base em estudos prévios de natureza técnica e segundo critérios extraídos de normas técnicas; e a justiça administrativa, em que a Administração toma decisões baseada essencialmente em critérios de justiça material.
A notação de funcionários, a classificação de alunos em exames escolares, a classificação de candidatos em concursos públicos de recrutamento ou provimento e a classificação de propostas em concursos públicos para adjudicação de contratos são considerados como integrando a discricionariedade imprópria, na modalidade de justiça administrativa.
Referindo-se a estes casos de justiça administrativa, escreve FREITAS DO AMARAL5:
“Em todos estes casos - e supondo que não se trata de matérias a resolver por decisão vinculada; supondo portanto que estamos fora do domínio da vinculação legal - os órgãos competentes da Administração pública (nomeadamente, júris de exame, júris de concurso, juntas de recurso, etc.) tomam uma decisão cujo critério não pode ser impugnado em tribunal. Ninguém pode ir a tribunal reclamar da nota que lhe foi dada, ou da classificação em que foi colocado, ou da notação que lhe foi atribuída pelo seu superior hierárquico, com fundamento em que devia ter sido outra e não aquela.
Os tribunais, em casos destes, só podem eventualmente vir a pronunciar-se sobre ilegalidades que tenham sido cometidas: por exemplo, se a decisão foi praticada por um órgão incompetente, o tribunal pode declarar que aquele acto está viciado de incompetência; se no processo de exame ou de concurso não foram respeitadas as formalidades essenciais exigidas por lei, naturalmente que os tribunais poderão vir a anular a decisão com base em vício da forma; se no exercício desta função se tiver cometido o vício de desvio de poder, os tribunais poderão naturalmente anular com base em desvio de poder. Mas trata-se sempre de aspectos em que foi ofendida a vinculação legal”.
As razões que têm sido dadas para esta contenção judicial relativamente ao mérito avaliativo ou classificativo residem, por um lado, na falta de meios humanos e técnicos dos tribunais para apreciarem questões eminentemente técnicas6. Certo que sempre poderiam recorrer a peritos em que baseassem os seus julgamentos, mas não haveria garantias que os peritos do Tribunal fossem superiores aos da Administração.7
Por outro lado, aduz-se que neste tipo de decisões existe sempre algum tipo de subjectividade, a que os tribunais também não poderiam fugir.
Por fim, a Administração tem um conhecimento global dos notandos ou avaliandos, permitindo afinar a respectiva bitola classificativa, pois não está em causa apenas a justiça absoluta, de se pronunciar sobre o mérito absoluto de cada funcionário ou candidato, mas também a justiça relativa, de avaliação do mérito relativo de um determinado grupo de funcionários. Ora, ao Tribunal escapa completamente esta vertente, pois tem apenas perante si um caso isolado.
Não obstante, admite-se que, em casos limite, os tribunais possam conhecer do mérito da notação ou da classificação. Como, por exemplo, se se demonstrar o uso de um critério ostensivamente inadmissível ou erro manifesto de apreciação.
Mas no nosso caso, em que está em causa a notação de um funcionário relativamente à sua prestação durante um ano, em 2004 e 2005, acresce um outro obstáculo à sindicabilidade judicial, que é a irrepetibilidade das percepções ou a impossibilidade probatória, como também acontece, por exemplo, com as provas orais, escolares ou não - mas que não se verifica nas provas escritas8.
Na verdade, não é possível repetir perante os tribunais a prestação de serviço da recorrente durante os 365 dias dos anos de 2004 e 2005.
A prova que pudesse ter sido produzida perante o Tribunal a quo e não perante o TUI, que não conhece de matéria de facto, nunca poderia ser minimamente fiável.
É o que também se tem entendido na jurisprudência alemã, em que se destaca “a insusceptibilidade de repetição e a colaboração prolongada”, referidos por HANS J. WOLFF, OTTO BACHOF e ROLF STOBER9 , que acrescentam “Estas condições não são reconstituíveis num procedimento judicial”.
Os mesmos autores, tratando das hipóteses versadas na jurisprudência, relativamente àqueles casos em que a decisão da autoridade administrativa assenta num juízo técnico altamente pessoal, por exemplo no valor do serviço prestado por uma pessoa, dizem: “O juízo técnico em si considerado não pode, nem deve, ser substituído pelos juízos ou pelos critérios dos próprios juízes ou, por exemplo, dos peritos por eles questionados... Efectivamente, o legislador não confiou a decisão a eles ... mas apenas àqueles a quem incumbiu de tomar tais decisões”.
Feitas as considerações que se consideram ajustadas às situações genéricas de classificações de serviço durante um período determinado, vejamos em pormenor as questões suscitadas.
Quanto à pontuação de 5 valores nos itens de qualidade do trabalho e quantidade de trabalho aplicam-se completamente o que antes referimos sobre a impossibilidade de sindicar estes aspectos da notação.
No que respeita à pontuação de 8 valores no item de assiduidade e pontualidade que, de acordo com os parâmetros classificativos, se ajusta aos casos em que o funcionário “raramente falta ou se atrasa”, pretende a recorrente ser classificada com 10 valores, que se reporta às situações em que o notando é “excepcionalmente cumpridor, só falta ao serviço em circunstâncias excepcionais”.
Na apreciação da reclamação da classificação, o notador fez constar o seguinte:
“ ... os funcionários necessitam de trabalhar por turno durante 6 horas. A notada está ciente de que, devido à excepcionalidade do trabalho do gabinete, para elevar a eficiência de trabalho e assegurar o máximo possível a saída pontual dos colegas, os colegas do gabinete de fotografia atingiram um acordo verbal de chegar ao serviço 10 a 15 minutos antes da mudança de escala, por outras palavras, os funcionários da seguinte escala devem chegar antecipadamente 10 a 15 minutos ao serviço para a mudança de escala, mas ao longo do tempo, a notada é a única que chegou mesma à hora de trabalho e nunca chegou antecipadamente ao serviço como o que está em concordância. Apesar dessa conduta da notada está conforme o estatuto e não tem violada as respectivas regras, mas, por senso comum, podem obter uma noção sobre a idoneidade que ela tem em aspectos de assiduidade e pontualidade. Uma classificação de 8 valores atribuída pelo notador à notada é, na realidade, uma classificação bastante elevada”.
Estas considerações parecem-nos ajustadas. A recorrente obteve uma alta notação neste parâmetro e não merece a nota máxima porque, ao contrário dos outros, não colabora para a máxima eficiência do serviço, não permite uma mudança suave dos turnos.
Não nos parece haver aqui nenhum erro ostensivo ou manifesto de apreciação.
Quanto à pontuação de 5 valores no item de aperfeiçoamento, temos que esta valoração, face aos parâmetros classificativos, fica no meio de “Desinteressado” e “Mostra interesse em se aperfeiçoar, embora de modo descontínuo”.
A recorrente aduz, contra esta notação, o facto de se encontrar a frequentar o curso de Direito.
Sem dúvida que a frequência deste curso e a obtenção da licenciatura em Direito teria inegáveis vantagens para a profissão da recorrente, que é perita criminalística na Polícia.
Mas dizer que este facto – só por si – implica que tenha havido erro ostensivo ou manifesto na avaliação, vai um passo que não podemos dar.
É que a recorrente, no seu dia a dia, pode ter uma actuação desinteressada em relação ao serviço, pode não mostrar vontade em melhorar, pode não querer passar da rotina diária para atingir outros patamares de qualidade. A ser assim, certamente não seria a frequência do curso de Direito que iria alterar radicalmente a apreciação do órgão notador.
Não podemos, pois, dizer que a Administração tenha incorrido em erro ostensivo ou manifesto na avaliação.
Improcede, pois, a questão suscitada.

IV – Decisão
Face ao expendido, nega-se provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, fixando a taxa de justiça em 7 UC.
Macau, 29 de Junho de 2009



Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Sam Hou Fai – Chu Kin


A Magistrada do Ministério Público
presente na conferência: Song Man Lei

1 J. LEBRE DE FREITAS, A. MONTALVÃO MACHADO E RUI PINTO, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, Coimbra Editora, 2001, p. 643.
2 MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, I, 10ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 1980., p. 470
3 MARCELLO CAETANO, Manual..., I, p. 471 e 472.
4 Segue-se a descrição de FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, lições policopiadas, Lisboa, 1988, Volume II, p. 168 e segs. Cfr., também BERNARDO DINIZ DE AYALA, O (Défice de) Controlo Judicial da Margem de Livre Decisão Administrativa, Lisboa, Lex, 1995, p. 110 e segs.
5 FREITAS DO AMARAL, Direito..., p. 183 e 184.
6 ALBERTO XAVIER, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Lisboa, 1972, p. 374.
7 Este argumento tem perdido fulgor na doutrina já que as circunstâncias apontadas ligam-se à dificuldade da prova judicial e nada têm que ver com a liberdade da administração (ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Lisboa, Almedina, 1980, Volume I, p. 249), sendo que, em processos judiciais de outra natureza, nunca se pôs em causa a possibilidade de produção de prova pericial.
8 Mas relativamente a estas provas escritas apontam-se outros obstáculos ao conhecimento do seu mérito por parte dos tribunais, que é o de existir um resíduo de subjectividade – salvo no caso de testes de escolha múltipla (multiple choice) – que também estaria presente na avaliação que o tribunal fizesse, assente numa visão parcelar da realidade em consequência da limitação dos seus poderes cognitivos aos aspectos questionados. Cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo português, de 11 de Dezembro de 1997, Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo n. os 440-441, p. 1061.
9 HANS J. WOLFF, OTTO BACHOF e ROLF STOBER, Direito Administrativo, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2006, tradução da 11.ª edição, 1999, Vol. 1, p. 456.
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1
Processo n.º 32/2008