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Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau



Recurso penal
N.º 10 / 2011

Recorrente: A







   1. Relatório
   A foi julgada no Tribunal Judicial de Base no âmbito do processo comum colectivo n.º CR3-10-0128-PCC e foi condenada a final pela prática de um crime de tráfico ilícito de drogas previsto e punido pelo art.º 8.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009 na pena de 7 anos e 6 meses de prisão.
   Desta decisão a arguida recorreu para o Tribunal de Segunda Instância. No seu acórdão de 17 de Fevereiro de 2011 proferido no processo n.º 45/2011, julgou-se rejeitar o recurso por manifesta improcedência.
   Vem agora a arguida recorrer deste acórdão para o Tribunal de Última Instância, formulando as seguintes conclusões na motivação do recurso:
   “1. Entende o Tribunal de Segunda Instância que as circunstâncias verificadas no presente processo (nomeadamente a de ser delinquente primária, de ter feito confissão sem reservas e de ter entregado carta para pedir desculpas) não podem ser consideradas como podendo conduzir à atenuação especial da pena.
   2. Mas o facto é que estas circunstâncias realmente existem.
   3. Estes são comportamentos que nem toda a gente pode ter, e que a recorrente fez por livre vontade e vontade.
   4. Por este motivo, as condutas da recorrente acima descritas devem ser consideradas como circunstâncias de atenuação especial previstas no art.º 66.º do CPM.
   5. Portanto, o entendimento do Tribunal de Segunda Instância de que estas circunstâncias não são “especiais” ou “excepcionais” e a rejeição do recurso decidida por este não podem ser aceites pela recorrente.”
   Pedindo que seja atenuada especialmente a pena.
   
   Na resposta, o Ministério Público entende que o recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência.
   
   Nesta instância, o Ministério Público mantém a posição assumida na resposta.
   
   
   Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
   
   
   
   2. Fundamentos
   2.1 Matéria de facto
   O Tribunal Judicial de Base e o Tribunal de Segunda Instância consideraram fixada a seguinte matéria de facto:
   “No dia 20 de Janeiro de 2010, às 16H45, na área de bagagens do átrio de chegada do Aeroporto Internacional de Macau, agentes da Polícia Judiciária interceptaram a arguida A que acabou de chegar ao Aeroporto Internacional de Macau no voo n.º XXXX da Air Asia e levaram-na posteriormente à Divisão de Investigação e Combate ao Tráfico de Estupefacientes da PJ para feitos de averiguação.
   No mesmo dia, às 18H30, a arguida A foi conduzida por agentes da PJ para os Serviços de Urgência do Centro Hospitalar Conde de S. Januário para feitos de examinação, por suspeita de ter possuído estupefacientes dissimulados no interior do corpo.
   Os Serviços de Urgência do Centro Hospitalar Conde de S. Januário realizaram o exame de raio X na cavidade abdominal da arguida A e detectaram que havia objectos estranhos no interior do corpo da mesma (vide relatório médico de fls. 22 e 83 dos autos).
   Em seguida, agentes da PJ levaram a arguida A à Divisão de Investigação e Combate ao Tráfico de Estupefacientes da PJ para evacuar do corpo dela os objectos estranhos.
   Das 21H35 do dia 20 de Janeiro de 2010 até 10H12 do dia 21 de Janeiro de 2010, a arguida A evacuou do ânus 31 peças de pós da cor de iogurte que foram embrulhadas, em forma oval pequena, com fita adesiva branca e transparente; e evacuou da vagina 1 peça de pós da cor de iogurte que foi embrulhada, em forma oval grande, com preservativo amarelo (vide auto de apreensão de fls. 24 dos autos).
   Após o exame laboratorial, averigua-se que as referidas 31 peças de pós da cor de iogurte, que foram embrulhadas em forma oval pequena, contêm “Heroína” abrangida pela tabela I-A anexa à Lei n.º 17/2009, com peso líquido de 299,05 gramas (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem de “Heroína” é de 60,31% e tem o peso de 180,357 gramas); e, a referida 1 peça de pós da cor de iogurte, que foi embrulhada em forma oval grande, também contem “Heroína” abrangida pela tabela I-A, com peso líquido de 199,73 gramas (após a análise de métodos quantitativos, verifica-se que a percentagem de “Heroína” é de 57,55% e tem o peso de 114,945 gramas).
   Os aludidos estupefacientes foram adquiridos pela arguida A de indivíduo não identificado em Kuala Lumpur, com o objectivo de os entregar a outro indivíduo desconhecido em Shenzhen de Guangdong.
   A arguida A praticou o referido acto, com a intenção de ganhar remuneração pecuniária.
   A par disso, agentes da PJ encontraram em posse da arguida A 1 telemóvel, 4 cartões SIM de telemóvel, 2 bilhetes electrónicos de avião da Air Asia e 1 cartão de embarque da Air Asia (vide auto de apreensão de fls. 26 dos autos).
   O aludido telemóvel, os cartões de telemóvel das marcas Xpax Prepaid e one2free, bem como os bilhetes electrónicos de avião foram instrumentos de comunicação e bilhetes de avião usados pela arguida A no transporte de estupefacientes.
   A arguida A agiu livre, voluntária, consciente e deliberadamente.
   A arguida A sabia perfeitamente que as supramencionadas substâncias trazidas ocultamente no interior do corpo para Macau eram Heroína.
   O acto praticado pela arguida A não foi permitido por lei.
   A arguida A tinha perfeito conhecimento de que a referida conduta era proibida e punida por lei.
   Segundo o certificado de registo criminal, a arguida não tem antecedentes criminais.
   A arguida confessou integral e sinceramente os factos que lhe foram imputados, bem como demonstrou arrependimento sincero.
   Antes de ser presa, a arguida exercia funções de vendedora de vestuário, auferindo o salário mensal de cerca de 200.000,00 rupiah; tem os pais a seu cargo; e, tem como habilitações literárias o ensino secundário complementar completo.
   
   Factos não provados:
   Não há factos relevantes para julgamentos por provar.”
   
   
   2.2 Atenuação especial da pena
   A recorrente continua a sustentar que a pena a ela imposta deve ser atenuada especialmente em consideração de ter confessado os factos na audiência e mantido boa conduta durante o período de prisão preventiva, ao abrigo do art.° 66.°, n.ºs 1 e 2, al. d) do Código Penal (CP).
   
   Segundo as referidas normas, o tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, como por exemplo, ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.
   
   Para além de ter muito pouca relevância, a boa conduta mantida durante a prisão preventiva pela recorrente não cabe na previsão da referida al. d) do n.° 2 do art.° 66.° do CP, pois nesta se estatui para o caso de que já tem decorrido muito tempo sobre a prática do crime e durante este período o agente tem mantido boa conduta. Portanto, esta boa conduta não se relaciona com o período em que o agente está já em prisão preventiva por causa do respectivo crime.
   
   Por outro lado, a confissão da recorrente sobre os factos do crime em audiência também tem pouco valor no presente caso, porque o crime foi surpreendido em flagrante delito. De qualquer maneira, a relevância da confissão para efeitos de atenuação especial da pena é sempre relativa.
   
   Assim, o presente recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência.
   
   
   
   3. Decisão
   Face ao exposto, acordam em rejeitar o recurso.
   Nos termos do art.º 410.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, é a recorrente condenada a pagar 4 UC.
   Custas pela recorrente com a taxa de justiça fixada em 4 UC e os honorários de 1000 patacas ao seu defensor nomeado.
   
   
   Aos 30 de Março de 2011




Os juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai

Processo n.º 10 / 2011 1