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Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau



Recurso penal
N.º 22 / 2011

Recorrente: A






   1. Relatório
   A foi julgada no Tribunal Judicial de Base, no âmbito do processo comum colectivo n.º CR3-10-0142-PCC e foi condenada pela prática de um crime de tráfico ilícito de drogas previsto e punido pelo art.º 8.°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009 na pena de 7 anos e 9 meses de prisão.
   Desta decisão a arguida recorreu para o Tribunal de Segunda Instância. Por seu acórdão de 24 de Março de 2011 proferido no processo n.º 84/2011, foi negado provimento ao recurso.
   A mesma arguida interpôs recurso deste acórdão ao Tribunal de Última Instância.
   Na resposta, o Ministério Público suscitou a questão prévia de extemporaneidade do recurso, entendendo que o recurso não deve ser admitido por ser interposto fora do prazo legal.
   Notificada da posição do Ministério Público, a recorrente não se pronunciou.
   Nesta instância, o Ministério Público mantém a posição assumida na resposta.
   
   Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
   
   
   
   2. Fundamentos
   2.1 Matéria de factos
   Consideramos provados, segundo os elementos dos autos, os seguintes factos relevantes para apreciar a questão prévia de extemporaneidade do recurso:
   - O acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância foi lido em audiência de 24 de Março de 2011 em que estava presente o defensor da arguida.
   - A arguida recebeu a notificação do acórdão no dia 1 de Abril seguinte através dos serviços do Estabelecimento Prisional de Macau.
   - Por carta recebida pelo Estabelecimento Prisional de Macau no dia 4 de Abril de 2011 e recebido no dia 6 seguinte pelo Tribunal de Segunda Instância, a arguida manifestou a intenção de recorrer.
   - No mesmo dia, o defensor da arguida foi notificada por fax sobre o teor da referida carta.
   - A motivação do recurso deu entrada no Tribunal de Segunda Instância ainda no dia 11 de Abril passado.
   - A arguida tem estado sob prisão preventiva.
   
   
   2.2 Tempestividade do recurso
   O Ministério Público suscitou a questão prévia de extemporaneidade do recurso, entendendo que o prazo para recorrer deve ser contado a partir da notificação do acórdão recorrido ao defensor da recorrente, presente na leitura do acórdão, sendo irrelevante a notificação pessoal da recorrente efectuada posteriormente. A notificação do acórdão ao defensor da recorrente produz efeitos previstos no art.º 401.º, n.º 1 do Código de Processo Penal (CPP). Assim, o prazo de interposição do recurso para o Tribunal de Última Instância no presente caso terminou em 4 de Abril. Também não ocorreu qualquer situação susceptível de suspender ou interromper o prazo, nem justo impedimento. É intempestivo o recurso interposto só em 11 de Abril.
   
   Está em causa o momento inicial para a contagem do prazo para interposição do recurso, questão já decidida em vários acórdãos do Tribunal de Última Instância, nomeadamente no proferido em 15 de Dezembro de 2010 no processo n.º 49/2010:
   
   “Sobre o prazo de interposição do recurso prescreve o art.º 401.°, n.º 1 do CPP:
   “1. O prazo para interposição do recurso é de 10 dias e conta-se a partir da notificação da decisão ou do depósito da sentença na secretaria, ou, tratando-se de decisão oral reproduzida em acta, da data em que tiver sido proferida, se o interessado estiver ou dever considerar-se presente.”
   
   A questão ora em apreço consiste em saber se o prazo para interposição do recurso de acórdão do Tribunal de Segunda Instância se conta a partir da notificação da decisão ao defensor, quando for realizada antes da notificação ao próprio arguido.
   Entendemos que a resposta deve ser positiva.
   
   Nos termos do art.º 53.°, n.° 1, al. e) do CPP, é obrigatória a assistência do defensor nos recursos.
   Se o recurso for julgado em audiência, o defensor é sempre convocado para estar presente, o que não sucede com o próprio arguido recorrente (art.º 411.°, n.° 2 do CPP). Então, o acórdão será lido com a presença do defensor, sem que o arguido recorrente convocado para o efeito.
   Pesa embora que o art.º 100.°, n.° 7 do CPP impõe que a sentença seja notificada ao próprio arguido, é com a notificação da decisão ao defensor na leitura de acórdão que começa a contar o prazo para interposição do recurso. Na realidade, não se pode sustentar que não há notificação da decisão depois da leitura de acórdão neste quadro de situação, para os efeitos do art.º 401.°, n.° 1 do CPP.
   
   É verdade que nos processos penais devem ser sempre asseguradas as garantias de defesa do arguido e essas garantias só serão plenamente adquiridas quando lhe for dado conhecimento integral da decisão a ele respeita. Esse cabal conhecimento do arguido será atingido, sem violar as garantias de defesa, quando o seu defensor seja notificado da mesma decisão. Pois os deveres funcionais e deontológicos do defensor o obriga a transmitir o resultado do julgamento realizado nos tribunais superiores ao recorrente patrocinado, de modo a criar condições para ambos ponderarem e decidirem conjuntamente sobre a conveniência de interpor recurso à instância superior.
   
   Como as funções do defensor consistem em exercer os direitos que a lei reconhece ao arguido, salvo os que ela reservar pessoalmente a este (art.º 52.°, n.° 1 do CPP), e é obrigatória a intervenção do defensor nos recursos, a notificação da decisão ao defensor satisfaz o requisito legal para activar a contagem do prazo para a interposição do recurso, tal como vem prescrito no art.º 401.º, n.º 1 do CPP.”
   
   
   No presente caso, o defensor da recorrente foi notificado do acórdão recorrido no dia 24 de Março de 2011, então o prazo para interposição do recurso deste acórdão começou a contar a partir dessa notificação e terminou em 4 de Abril de 2011.
   Em 6 de Abril de 2011 deu entrada no Tribunal de Segunda Instância uma carta da recorrente em que se manifestou a intenção de recorrer do acórdão de segunda instância.
   
   Como tem sido reiterado pela jurisprudência do Tribunal de Última Instância, uma carta do arguido em que se manifesta a intenção de recorrer, mesmo com a exposição de fundamentos do recurso, não pode ser considerada como interposição formal do recurso1, pois o requerimento de interposição do recurso deve ser sempre motivado e com a assistência do defensor (art.º 401.°, n.° 2 do CPP).
   
   Assim, o presente recurso não pode ser admitido porque a motivação formal do recurso foi entregue apenas em 11 de Abril passado, portanto fora do prazo legal.
   
   
   
   3. Decisão
   Face ao exposto, acordam em não admitir o recurso.
   Custas pela recorrente com a taxa de justiça fixada em 1 UC e os honorários de 1200 patacas ao seu defensor nomeado.
   
   Aos 18 de Maio de 2011


Os juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai

1 Entendimento reiterado já em vários acórdãos do TUI, como ultimamente no acórdão de 26 de Janeiro de 2011, proferido no processo n.° 73/2010.
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Processo n.º 22 / 2011 1