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Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau



Recurso penal
N.º 21 / 2011

Recorrente: A







   1. Relatório
   A foi julgado no Tribunal Judicial de Base, no âmbito do processo comum colectivo n.º CR3-10-0100-PCC e foi condenado pela prática dos seguintes crimes:
   - um crime de roubo qualificado previsto e punido pelo art.º 204.º, n.º 2, al. b) do Código Penal (CP), com referência ao seu art.º 198.º, n.º 2, al. f), em concurso aparente com o crime de detenção ilegal de arma previsto no art.º 262.º do mesmo Código, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão;
   - um crime de ofensa à integridade física previsto e punido pelo art.º 137.º, n.º 1 do CP na pena de 7 meses de prisão.
   Em cúmulo, foi condenado na pena única de 5 anos de prisão.
   Desta decisão o arguido recorreu para o Tribunal de Segunda Instância. Por seu acórdão de 17 de Março de 2011 proferido no processo n.º 164/2011, o recurso foi rejeitado por ser manifestamente improcedente.
   O mesmo arguido interpôs recurso deste acórdão ao Tribunal de Última Instância.
   Em resposta, o Ministério Público entende que o recurso não merece provimento.
   Nesta instância, o Ministério Público suscitou a questão prévia de extemporaneidade do recurso, entendendo que o recurso não deve ser admitido.
   
   
   Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
   
   
   
   2. Fundamentos
   2.1 Matéria de factos
   Consideramos provados, segundo os elementos dos autos, os seguintes factos relevantes para apreciar a questão prévia de extemporaneidade do recurso:
   - O acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância foi proferido em 17 de Março de 2011.
   - A defensora constituída do arguido foi notificada deste acórdão por carta registada com aviso de recepção enviada no dia 18 seguinte.
   - O arguido recebeu a notificação do acórdão no dia 21 seguinte através dos serviços do Estabelecimento Prisional de Macau.
   - Por carta recebida pelo Estabelecimento Prisional de Macau no dia 22 de Março de 2011 e recebida no dia seguinte pelo Tribunal de Segunda Instância, o arguido manifestou a intenção de recorrer e pediu o apoio judiciário.
   - No mesmo dia 23, o relator do Tribunal de Segunda Instância mandou oficiar ao Director do Estabelecimento Prisional de Macau para notificar ao arguido o seguinte: “no caso de o arguido pretender recorrer para o Tribunal de Última Instância, devia contactar a sua defensora constituída (Dr.ª B) em 6 de Outubro de 2010, a não ser que já a despediu. Só neste caso pode pedir ao tribunal a nomeação de um advogado de apoio judiciário. Se for esta última situação, deve reiterar imediatamente ao tribunal a sua intenção de requerer advogado de apoio judiciário.”
   - A notificação acima mencionada foi efectuada no dia 24.
   - No dia 30, a advogada veio renunciar ao mandato conferido pelo arguido.
   - Por carta recebida pelo Estabelecimento Prisional de Macau no dia 31 e recebida no dia seguinte pelo Tribunal de Segunda Instância, o arguido voltou a manifestar a intenção de recorrer e seguindo o ofício do Tribunal de Segunda Instância despediu a advogada por ele constituída, bem como pediu o apoio judiciário.
   - Perante estes requerimentos, o relator do Tribunal de Segunda Instância mandou visto ao Ministério Público.
   - Em seguida, o mesmo relator proferiu despacho no dia 6 de Abril de 2011, tendo em conta a renúncia do mandato pela advogada do arguido, nomeou um novo defensor oficioso ao arguido para efeitos de apresentar motivação do recurso e concedeu novo prazo de dez dias.
   - A motivação do recurso deu entrada no Tribunal de Última Instância no dia 13 de Abril de 2011.
   - O arguido tem estado sob prisão preventiva.
   
   
   2.2 Tempestividade do recurso
   O Ministério Público suscitou a questão prévia de extemporaneidade do recurso, entendendo que a motivação do recurso foi entregue já depois de ter decorrido o prazo para interposição do recurso, pois o requerimento de apoio judiciário no processo penal com arguido preso não suspende o decurso do prazo, e também não houve qualquer justo impedimento.
   
   Já o arguido, ora recorrente, sustenta a tempestividade do recurso, considerando que o despacho do relator do Tribunal de Segunda Instância de 6 de Abril de 2011 que nomeou novo defensor ao recorrente e fixou novo prazo de dez dias para apresentar motivação do recurso transitou em julgado, pelo que a motivação foi entregue ainda dentro do prazo. E a título subsidiário, invocou justo impedimento por ser o recorrente não residente de Macau, estar preso, não conhecer o regime processual local, não ter defensor desde o dia 21 de Março, data da sua carta em que se manifestou que não precisava mais da sua mandatária constituída, e em geral, a impossibilidade de imputar a responsabilidade ao recorrente.
   
   Ora, no presente caso, a primitiva defensora do recorrente foi considerado notificada do acórdão recorrido no dia 21 de Março de 2011, dia em que o recorrente recebeu este acórdão através dos serviços do Estabelecimento Prisional de Macau.
   Assim, é no dia 22 que começou a contar o prazo de interposição do recurso.
   
   Nas duas cartas do recorrente recebidas pelo Estabelecimento Prisional nos dias 22 e 31 de Março, ele manifestou a intenção de pedir apoio judiciário para interpor recurso.
   Segundo o art.º 16.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 41/94/M, o pedido de apoio judiciário não suspende a instância em processo penal havendo arguidos presos.
   Por isso, tais pedidos não suspende nem interrompe o decurso do prazo de recurso.
   O mesmo acontece com a manifestação de vontade de recorrer pelo próprio arguido. Esta nunca pode ser considerada como interposição formal do recurso, pois o requerimento de interposição do recurso deve ser sempre motivado e com a assistência do defensor (art.º 401.°, n.° 2 do CPP).
   
   O recorrente tinha tido mandatária constituída. Só na carta recebida pelo Estabelecimento Prisional no dia 31 de Março ele manifestou que despediu a advogada. Por outro lado, esta entregou requerimento no dia 30 de Março em que se renunciou o mandato.
   Tratando-se de revogação e renúncia do mandato, os seus efeitos só se produzem a partir da notificação, nos termos do art.º 81.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC).
   Ou seja, até dia 31 de Março, último dia do prazo do recurso, mantém-se ainda válido o mandato conferido pelo recorrente à advogada constituída.
   Assim, a entrega de motivação para além desta data é considerado inevitavelmente extemporânea.
   
   O despacho do relator do Tribunal de Segunda Instância de 6 de Abril, proferido já depois de ter decorrido o prazo de recurso, em que se fixou novo prazo de dez dias para entregar motivação de recurso, com a consequente admissão do recurso, não vincula o Tribunal de Última Instância (art.º 594.º, n.º 4 do CPC), pelo que este Tribunal pode e deve apreciar a admissibilidade do recurso de acordo com o regime legal aplicável.
   
   O facto de o recorrente ser preso preventivamente, como não residente da Região e não conhecer o regime processual de Macau não pode constituir justo impedimento para justificar a prática do acto fora do prazo legal.
   Aos presos são sempre assegurados os direitos de receber visitas e enviar correspondência, incluindo o contacto com o advogado. O simples facto de estar preso não constitui o justo impedimento.
   Por outro lado, é natural que o desconhecimento da lei, mesmo em relação a não residente, não justifica o seu não cumprimento, tal como se refere o disposto no art.º 5.º do Código Civil.
   
   Assim, o presente recurso não pode ser admitido porque a motivação formal do recurso foi entregue fora do prazo legal.
   
   
   
   3. Decisão
   Face ao exposto, acordam em não admitir o recurso.
   Custas pelo recorrente com a taxa de justiça fixada em 1 UC e os honorários de 1200 patacas ao seu defensor nomeado.
   
   Aos 25 de Maio de 2011




Os juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai

Processo n.º 21 / 2011 1