打印全文
Processo n.º 56/2011. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
Assunto: Suspensão da eficácia do acto. Interesse de terceiro.
Data da Sessão: 28 de Outubro de 2011.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Sam Hou Fai e José Maria Dias Azedo.
SUMÁRIO:
O requerente da suspensão da eficácia de acto administrativo não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do mesmo Código.
  O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A requereu a suspensão da eficácia do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 5 de Julho de 2011, que indeferiu o pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da ponte cais n.º XX e, em consequência, determinou a entrega da mesma à gestão da Administração.
Por Acórdão de 29 de Setembro de 2011, o Tribunal de Segunda Instância, (TSI) indeferiu o requerido.
Inconformado, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), formulando as seguintes conclusões úteis.
- O douto Tribunal recorrido entendeu que os factos aduzidos pelo Recorrente no seu requerimento inicial dos autos, e que transcreve no douto Acórdão, seriam eles mesmos manifestamente insuficientes para suportar a alegação do "prejuízo de difícil reparação", pressuposto fundamental para o deferimento da providência requerida, e que a falta de alegação de matéria fáctica por parte do ora Recorrente no seu requerimento inicial tornaria assim inviável poder falar-se in casu de "prejuízo de difícil reparação", com a inerente constatação de não verificação do referido "prejuízo de difícil reparação", pressuposto previsto na alínea a), n.° 1 do transcrito art. 121.°, e consequente inevitável decisão de indeferimento da pretensão apresentada;
- Julga o Recorrente que o douto Tribunal a quo entendeu mal, porquanto o por si alegado nos artigos 54.° a 68.º da sua petição inicial dos autos, a saber, a) O Requerente poder deixar de cumprir com as obrigações decorrentes da outorga da procuração a favor da sociedade comercial "Companhia de Importação e Exportação B Limitada ";b) a possível liquidação da sociedade comercial "Companhia de Importação e Exportação B Limitada”, que ao não ver renovada a licença de exploração da Ponte-Cais n.° XX, poderá simplesmente deixar de ter um local para desenvolver a sua actividade comercial, e com isso, c) deixar de pagar aos seus credores; d) deixar de pagar aos seus trabalhadores; e) ter de se socorrer do endividamento privado para fazer face às consequências da execução do acto suspendendo; e f) ter que reconsiderar a sua estratégia de investimento e a paralisação de todo o processo produtivo, por um período de tempo longo, consubstancia e se traduz em verdadeiros factos relevantes para alcançar uma decisão favorável do douto Tribunal, no sentido de se considerar provado o requisito do "prejuízo de difícil reparação", sendo matéria fáctica relevante e atendível, que deveria resultar no deferimento da providência requerida;
- O douto Acórdão recorrido, ao julgar não se encontrarem alegados pelo Recorrente no seu requerimento inicial dos autos, os factos necessários à prova do "prejuízo de difícil reparação", fez uma errada aplicação de lei processual, violando o disposto nos arts. 121.º, do Código de Processo Administrativo Contencioso, e 329.°, n.º 1 do Código de Processo Civil, e inquinando a decisão com a nulidade insanável prevista no art. 571.°, n.° 1 alínea d) do Código de Processo Civil;
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer em que se pronuncia pela improcedência do recurso.

II - Os Factos
O TSI considerou provado que:
Desde 1993, a A, foi concedida a licença para o ocupação a título precário da ponte-cais nº XX;
Após as sucessivas renovações com a duração de um ano, a data do termo da última renovação é 31 de Dezembro de 2010;
Em 14 de Outubro de 2010, a Companhia de Importação e Exportação B, Limitada, na qualidade do procurador e em representação do titular da licença A, formulou o pedido da renovação da mesma licença;
Pedido esse veio a ser indeferido por despacho datado de 5 de Julho de 2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas;
E em consequência, pelo mesmo despacho, foi determinada desocupação e entrega da ponte-cais à gestão pela Administração da RAEM.

III – O Direito
1. As questões a apreciar
Trata-se de saber se o Acórdão recorrido violou o disposto no artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), que fixa os requisitos para que seja concedida a suspensão da eficácia de actos administrativos.
O Acórdão recorrido julgou que o acto tinha conteúdo negativo, com uma vertente positiva, pelo que nada obstava à suspensão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 120.º, alínea b) do CPAC.
O Tribunal não apreciará esta questão na medida em que favorece o recorrente, sendo certo que a entidade recorrida não suscitou a sua apreciação para o caso de o recurso obter provimento, nos termos previstos no artigo 590.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
O Acórdão recorrido julgou que não se verificava o requisito da existência de prejuízos de difícil reparação e, por isso, não apreciou os outros dois requisitos previstos nas alínea b) e c) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC, por os considerar prejudicados face àquela solução.
No caso de este Tribunal julgar verificado aquele primeiro requisito conhecerá dos restantes, por força da regra do artigo 159.º, n.º 3 do CPAC.

2. A suspensão jurisdicional da eficácia de actos administrativos
O artigo 121.º do CPAC exige como requisitos para a concessão da suspensão da eficácia dos actos administrativos objecto de recurso contencioso, que:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.

3. Prejuízo de difícil reparação. O caso dos autos.
O recorrente afirma que alegou como prejuízos que a execução do acto administrativo lhe causará, na petição de suspensão de eficácia:
a) O Requerente poder deixar de cumprir com as obrigações decorrentes da outorga da procuração a favor da sociedade comercial Companhia de Importação e Exportação B Limitada; b) a possível liquidação da sociedade comercial "Companhia de Importação e Exportação B Limitada”, que ao não ver renovada a licença de exploração da Ponte-Cais n.° XX, poderá simplesmente deixar de ter um local para desenvolver a sua actividade comercial, e com isso, c) deixar de pagar aos seus credores; d) deixar de pagar aos seus trabalhadores; e) ter de se socorrer do endividamento privado para fazer face às consequências da execução do acto suspendendo; e f) ter que reconsiderar a sua estratégia de investimento e a paralisação de todo o processo produtivo, por um período de tempo longo.
Os alegados prejuízos invocados nas alíneas b), c), d), e) e f), que antecedem, são de um terceiro que não é parte no processo, que não é o requerente, sendo uma alegada sua mandatária.
Ora, os prejuízos de que fala a lei são os prejuízos do próprio requerente ou relativos a interesses seus, que possa vir a defender no recurso contencioso. Estes últimos, serão o caso dos interesses em que um residente de Macau pode actuar como actor popular: os relativos à saúde pública, a habitação, a educação, o património cultural, o ambiente, o ordenamento do território, a qualidade de vida e, em geral, qualquer bem do domínio público (artigo 36.º, n.º 1, do CPAC).
O requerente não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33.º do CPAC, pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC.
Resta o prejuízo alegado pelo requerente, na alínea a), que antecede: o Requerente poder deixar de cumprir com as obrigações decorrentes da outorga da procuração a favor da sociedade comercial Companhia de Importação e Exportação B Limitada.
Mas o recorrente não esclarece concretamente que obrigações são essas – para além de ter transferido os seus poderes de exploração para a mencionada sociedade – e em que medida é que a falta de cumprimento dessas obrigações constituem para si, não só fonte de prejuízos mas, em especial, prejuízos de difícil reparação.
Logo, por falta de alegação de prejuízos concretos, a sua pretensão estava votada ao insucesso.
O recurso não merece provimento.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 3 UC.
Macau, 28 de Outubro de 2011.

   Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Sam Hou Fai –
   José Maria Dias Azedo

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho




1
Processo n.º 56/2011

8
Processo n.º 56/2011