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   ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
   
   1. Relatório
   A interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Exmo. Senhor Secretário para a Segurança proferido em 21 de Janeiro de 2010 que indeferiu o seu pedido de renovação da autorização de residência, imputando os vícios de violação de lei e de falta de fundamentação.
   Por Acórdão proferido em 24 de Novembro de 2011, o Tribunal de Segunda Instância decidiu negar provimento ao recurso, mantendo o acto administrativo impugnado.
   Inconformando com a decisão, vem A recorrer para o Tribunal de Última Instância, apresentando as seguintes conclusões:
   1. O artº 9º nº 2 al. 3) da Lei nº 4/2003 prevê: Finalidades pretendidas com a residência na RAEM e respectiva viabilidade.
   2. Tal disposto legal visa considerar a finalidade específica com a residência em Macau da recorrente e a sua necessidade, no entanto, também importa prestar atenção à “viabilidade da residência da recorrente na RAEM”.
   3. A recorrente tem de reiterar que, depois de pedir a autorização de residência em Macau, a recorrente vive habitualmente em Macau, trabalha para ganhar dinheiro, e ao mesmo tempo, cuida da sua mãe.
   4. No final de 2007, a mãe foi visitar os parentes na cidade de Foshan da China, e em 18 de Janeiro de 2008, caiu descuidadamente e ficou com estase sanguínea e inchaço nas pernas e na coxa. Ela foi levada ao Hospital(1) da cidade de Foshan da China e ficou internada por 14 dias. Aquando da alta hospitalar, o médico assistente disse que ela só podia ficar deitada na cama e necessitava de ir periodicamente ao hospital para seguintes consultas. Tendo em consideração que a mãe estava fraca que não podia sofrer a viagem cansativa para Macau, a recorrente deixou-a temporariamente na China, para que ela pudesse convalescer e ir periodicamente ao hospital para as seguintes consultas. Quando ficaria melhor, a mãe iria regressar a Macau.
   5. Infelizmente, no dia 9 de Fevereiro de 2009, a mãe teve asma subitamente, por isso, foi levada outra vez para o Hospital(1) da cidade de Foshan da China e aí ficou internada até 21 de Fevereiro de 2009. Para que a mãe pudesse receber melhor tratamento médico, a recorrente decidiu voltar para Macau, pelo que, a recorrente procedeu antecipadamente às formalidades de saída do hospital da sua mãe e levou a mãe às Portas do Cerco, onde pediu cadeira de rodas para levar a mãe passar pelo posto fronteiriço. Depois de chegaram a Macau, os trabalhadores do posto médico tomaram a iniciativa de chamar ambulância para levá-la ao Hospital(2).
   6. A mãe ficou internada apenas por três dias no Hospital(2) porque o hospital disse para ela sair, contudo, naquela altura, a mãe ainda estava muito fraca. Dado que não era capaz de sustentar as altas despesas médicas do Hospital(3), a recorrente, sem outra alternativa, pediu ao Hospital(2) para levar a sua mãe com ambulância às Portas do Cerco, e esta ficou na cidade de Foshan para o tratamento médico e só regressou a Macau até Fevereiro de 2010.
   7. Foi a recorrente que suportou as altas despesas médicas da mãe, pelo que, a recorrente voltou para Macau para continuar a trabalhar. Nas folgas de cada mês, ela foi a Foshan da China para visitar e cuidar da mãe, pelo que, entre princípio de 2008 e final de 2009, a recorrente ficou na China por 10 dias em cada mês, indo para China mais frequentemente em comparação com antigamente, pelo que, a recorrente ainda cumpre o dever de cuidar da sua mãe.
   8. Este caso infortunado não pode ser evitado pelas recorrente e sua mãe, podendo-se dizer que é uma situação de motivo de força maior, contudo, sem ponderar a “viabilidade da residência da recorrente na RAEM”, a decisão recorrida julgou improcedente o recurso.
   9. A mãe da recorrente está melhor e voltou para Macau em Fevereiro de 2010. Actualmente, a recorrente continua a concretizar ou manter a finalidade pretendida com a residência em Macau.
   10. Por fim, a recorrente quer apontar que a falta do requerimento para renovação dentro do prazo, salvo por motivo de força maior devidamente comprovado, implica a caducidade da autorização de residência (vide o artº 23º do Regulamento Administrativo nº 5/2003).
   11. Embora o “motivo de força maior” previsto no aludido artigo só se aplique ao caso da renovação tardia, a recorrente entende que o disposto em causa deve ser aplicado, por analogia, a este caso.
   12. Porquanto, o “motivo de força maior” não só pode aparecer no caso de renovação tardia da autorização de residência, como também no caso em que os requisitos não são preenchidos por “motivo de força maior” aquando da renovação da autorização de residência, contudo, a respectiva lei ou regulamento não prevê nem considera isso, e igualmente, a decisão recorrida também não ponderou isso.
   13. Assim sendo, a recorrente entende que a decisão recorrida padece de vício de violação de lei por erro na interpretação do artº 9º, nº 2, al. 3) da Lei nº 4/2003.
   
   A entidade recorrida não apresentou contra-alegações.
   O Exmo. Procurador-Adjunto do Ministério Público emitiu o douto parecer, entendendo que não merece provimento o recurso.
   Foram corridos os vistos.
   
   2. Os Factos Provados
   Nos autos foram apurados os seguintes factos:
   1. A recorrente foi excepcionalmente autorizada a residir em Macau pela entidade recorrida em 12 de Novembro de 2004.
   2. Posteriormente, foi renovado o prazo de validade da sua autorização de residência até 11 de Novembro de 2009.
   3. Em relação ao pedido de renovação da autorização de residência apresentado pela recorrente em 2009, o Comissariado de Estrangeiros do CPSP de Macau elaborou uma Informação nº MIGXXXX/2009/E em 15 de Dezembro de 2009, cujo teor se encontra junto ao Apenso a fls. 106 a 107 que se dá aqui por integralmente reproduzido.
   4. Em 16 de Dezembro de 2009, o Chefe dos Serviços de Migração do CPSP de Macau fez uma proposta na referida Informação, cujo teor se encontra junto ao Apenso a fls. 106 que se dá aqui por integralmente reproduzido.
   5. O Comandante do CPSP de Macau proferiu o seguinte despacho na mesma Informação: “Concordo. À apreciação do Exmo. Senhor Secretário para a Segurança.”
   6. Em 21 de Janeiro de 2010, o Secretário para a Segurança proferiu o seguinte despacho na Informação nº MIGXXXX/2009/E: “Nos termos dos fundamentos invocados no parecer da presente Informação, indefiro o pedido”.
   7. A recorrente foi notificada da aludida decisão em 9 de Fevereiro de 2010.
   8. Em 22 de Fevereiro de 2010, a recorrente apresentou uma reclamação ao Secretário para a Segurança.
   9. Em 8 de Março de 2010, o Secretário para a Segurança rejeitou a referida reclamação, mantendo a sua decisão.
   10. A recorrente foi notificada da aludida decisão em 26 de Março de 2010.
   Para além disso, resulta ainda dos autos que a recorrente conseguiu autorização excepcional de residência em Macau para cuidar da sua mãe, pessoa idosa, sendo a condição necessária, para renovação da autorização de residência, que a recorrente e a sua mãe vivam habitualmente em Macau (fls. 165 do Processo Administrativo Instrutor).
   
   3. O Direito
   Assaca a recorrente ao Acórdão ora recorrido o vício de violação de lei por erro na interpretação do artº 9º nº 2, al. 3) da Lei nº 4/2003, invocando ainda a verificação de “motivo de força maior” previsto no nº 3 do artº 23º do Regulamento Administrativo nº 5/2003 para ver atendida a sua pretensão.
   Dispõe o artº 9º da Lei nº 4/2003 o seguinte:
   “1. O Chefe do Executivo pode conceder autorização de residência na RAEM.
   2. Para efeitos de concessão da autorização referida no número anterior deve atender-se, nomeadamente, aos seguintes aspectos:
   1) Antecedentes criminais, comprovado incumprimento das leis da RAEM ou qualquer das circunstâncias referidas no artigo 4.º da presente lei;
   2) Meios de subsistência de que o interessado dispõe;
   3) Finalidades pretendidas com a residência na RAEM e respectiva viabilidade;
   4) Actividade que o interessado exerce ou se propõe exercer na RAEM;
   5) Laços familiares do interessado com residentes da RAEM;
   6) Razões humanitárias, nomeadamente a falta de condições de vida ou de apoio familiar em outro país ou território.
   3. A residência habitual do interessado na RAEM é condição da manutenção da autorização de residência.”
   Na realidade e para efeitos de autorização de residência, a lei manda expressamente atender às “finalidades pretendidas com a residência na RAEM e respectiva viabilidade” e estabelece, como condição necessária para manutenção da autorização, “a residência habitual do interessado na RAEM”.
   Ao mesmo tempo, o artº 22º do Regulamento Administrativo nº 5/2003 prevê a renovação da autorização de residência:
   “1. A autorização de residência, com excepção da que é concedida nos termos do artigo 19.º, é em regra válida pelo prazo de 1 ano, e é renovada por períodos de 2 anos, a pedido do interessado ou seu representante, devendo o respectivo requerimento dar entrada até à data em que expira a sua validade.
   2. A renovação da autorização depende da verificação dos pressupostos e requisitos previstos na lei de princípios e no presente regulamento.”
   Chama-se ainda atenção para a disposição no artº 24º do Regulamento Administrativo nº 5/2003, segundo a qual é uma das causas de caducidade da autorização de residência “o decaimento de quaisquer pressupostos ou requisitos sobre os quais se tenha fundado a autorização”.
   
   Voltando ao caso sub judice, constata-se nos autos que o pedido de autorização de residência formulado pela recorrente foi excepcionalmente deferido precisamente para tomar conta da sua mãe, e isto é a finalidade pretendida com a fixação de residência em Macau.
   No entanto, resulta da factualidade provada que, aquando da decisão sobre renovação da autorização de residência, a Administração verifica que, nos períodos abrangidos de Outubro de 2007 a Setembro de 2008 e de Outubro de 2008 a Setembro de 2009, a mãe da recorrente vive em Macau apenas por 18 dias e 3 dias, respectivamente.
   Daí que é legítimo para a Administração concluir que a mãe da recorrente não reside habitualmente em Macau, o que põe em causa, naturalmente, a finalidade invocada pela recorrente, e também considerada pela Administração, para autorização de residência.
   Ora, se a mãe da recorrente não residir habitualmente em Macau, como não residiu, insubsistindo assim o pressuposto sobre o qual se tenha fundado a autorização de residência, para quê há que renovar a autorização de residência já concedida à recorrente?
   Por outro lado, mesmo admitindo a aplicação analógica do nº 3 do artº 23º do Regulamento Administrativo nº 5/2003 (que nos parece duvidosa), não se afigura que os argumentos aduzidos pela recorrente para justificar a ausência da sua mãe da RAEM são susceptíveis de se enquadrar no alegado “motivo de força maior”.
   Na realidade e sem ignorar a gravidade dos problemas da mãe, certo é que a sua doença não a impediria de regressar para Macau, tendo até ficado internada no Hospital(2) por 3 dias, e foi por opção da ora recorrente que a mãe foi de novo transferida para o Interior da China, com invocação da dificuldade económica para suportar as despesas do Hospital(3).
   Resumindo, a mãe da recorrente foi residir para o Interior da China e para receber tratamento médico, por opção pessoal e não por motivo de força maior, pelo que a renovação da autorização excepcional de residência foi indeferida, por deixar de se verificar o pressuposto que estivera na base da autorização.
   Afigura-se correcta a decisão recorrida.
   
   4. Decisão
   Pelo exposto, acordam em negar provimento ao presente recurso.
   Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 3 UC.
   
    Macau, 13 de Junho de 2012
   
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho
   



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Processo nº 18/2012