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   ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
   
   1. Relatório
   A interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Exmo. Senhor Secretário para a Segurança de 20 de Abril de 2010 que, negando provimento ao recurso hierárquico necessário por si interposto, manteve a aplicação da medida de interdição de entrada.
   Por Acórdão proferido em 1 de Dezembro de 2011, o Tribunal de Segunda Instância concedeu provimento ao recurso contencioso, anulando o acto recorrido.
   Inconformando com a decisão, vem o Senhor Secretário para a Segurança recorrer para o Tribunal de Última Instância, apresentando as seguintes conclusões:
   1. O acto administrativo objecto do recurso contencioso, à margem indicado, é o despacho do Secretário para a Segurança, de 20/04/2010, conforme o art.º LXV da P.A. “Despacho exarado em 20/04/2010 que constituirá o objecto do presente recurso (...)” que sufragou os despacho e informação do Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), respectivamente, de 21/12/2009 e de 07/04/2010 conforme arts.º 1 e 2 e fls. 31 dos autos.
   2. Contudo, não obstante ser aquele o objecto do recurso, o douto Acórdão recorrido elege o despacho do Comandante do CPSP, de 21/08/2008, como o acto sobre que recai a decisão de anulação, por insuficiência de fundamentação que gera o vício de forma, relativamente ao despacho do Comandante do CPSP atrás referido, com referência ao n.º 2 do artigo 115.º do CPA.
   3. O acto administrativo apreciado (Despacho do Comandante do CPSP de 21/08/2008), e que consta da matéria de facto assente pelo Acórdão recorrido, foi substituído e, em consequência, revogado tacitamente, pelo despacho da mesma entidade, datado de 21/12/2009, pelo que, está há muito eliminado da ordem jurídica (desde 21/12/2009), por força dos vícios de que padecia, não sendo passível de apreciação em recurso contencioso – por absoluta falta de objecto.
   4. Assim, o acto administrativo objecto do recurso, como tal identificado e qualificado pelo interessado, não foi, de todo, apreciado, limitando-se o Acórdão recorrido a analisar, apenas e só, um acto inexistente, pelo que se mostra eivado do desvalor de nulidade por erro no objecto do recurso.
   Se assim não se entender, e sem prescindir,
   5. É notório que o Acórdão recorrido, ao longo da sua fundamentação, refere-se expressa e repetidamente, ao acto, revogado, do Comandante do CPSP, de 21/08/2008, fazendo apenas uma ligeira referência, que se presume, ao acto administrativo verdadeiro objecto do recurso, no parágrafo último da sua fundamentação, pelo que incorreu também em erro de julgamento na apreciação da matéria de facto.
   Caso ainda assim se não considere, e igualmente sem prescindir,
   6. No caso de se considerar que o fundamento de anulação (insuficiência de fundamentação) há-de ter-se por dirigido ao acto recorrido propriamente dito, também improcedente se mostrará o apontado vício de forma.
   7. A medida de interdição de entrada aplicada pela entidade ora recorrente é uma medida administrativa de natureza securitária-preventiva que configura a prática de um acto administrativo parcialmente vinculativo, como decorre da redacção da norma do artigo 33.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 6/97/M, de 30 de Julho, Lei da Criminalidade Organizada, conforme art.º 13.º.
   8. Com vista à prática do acto em apreço, ao abrigo da Lei n.º 6/97/M é bastante, para a aplicação de medida de interdição de entrada, a obtenção de informação da qual conste a existência de fortes indícios de pertença ou ligação a associação criminosa, no caso, emitida pela autoridade competente para o efeito na RAEHK, a HKPF onde o interessado é residente, não sendo exigidos, à Administração, a indicação de factos concretos que comprovem a sua pertença ou ligação a associação criminosa, o que de todo se não encaixa na posição defendida pelo interessado e da qual o Acórdão recorrido se apropria, conforme supra art.º 16.º.
   9. Assim, a entidade ora recorrente praticou um acto administrativo parcialmente vinculativo (vinculação positiva no sentido de a medida dever ser aplicada ante a verificação de certos pressupostos de facto, conforme supra art.º 13.º) e com os limites, no que respeita à dosimetria do “quantum” da medida da interdição de entrada, impostos pelo princípio da proporcionalidade consagrado no n.º 2 do artigo 5.º do CPA, (nos seus três subprincípios, idoneidade ou adequação, necessidade ou exigibilidade e proporcionalidade em sentido estrito), mas analisando este, sempre, em articulação com o interesse público securitário que a referida medida visa defender.
   10. Em momento algum, a Lei n.º 6/97/M estipula um prazo máximo (ou mínimo) para o período de interdição de entrada, ao contrário do que defende o Acórdão recorrido quando refere “Mas isto não significa que a Administração não tem de fundamentar a sua escolha, especialmente quando aplica o limite temporal máximo de interdição (...).” o que configura, erro na interpretação da lei.
   11. Limite temporal que não se justifica nem justificaria pois, por um lado, a Lei n.º 6/2004, sem margem para qualquer dúvida, não estipula a fixação de quaisquer limites e, por outro lado, não faria qualquer sentido existir um limite máximo para o período da medida de interdição de entrada ao abrigo da Lei n.º 6/97/M quando a natureza dos crimes desta lei é muito mais grave do que a daqueles a que se refere a Lei nº 6/2004, e na qual se não estabelece qualquer limitação.
   12. Sendo que, os limites decorrentes do princípio da proporcionalidade, contudo, afastam, de todo, a possibilidade de, por acto administrativo, a Administração poder estabelecer graduações arbitrárias e injustificadas e, consequentemente, determinar um período de interdição de entrada “ad infinitum”, mas o que também não significa que não possa fixar períodos bastante longos quando a situação em causa o justifique.
   13. De igual modo, a Lei n.º 6/97/M, também, não estipula prazos para que, durante ou após a cessação do período da vigência de uma medida de interdição, a Administração efectue a reapreciação da situação factual no caso concreto com vista à sua manutenção, alteração, renovação ou cessação.
   14. Face à ausência de prazo, referida na conclusão anterior, nada impede que, cumprido o período de uma interdição de entrada, a Administração volte a interditar a entrada à mesma pessoa, não residente na RAEM, desde que entenda continuar a fazer sentir-se essa necessidade de natureza securitária, se verifique o preenchimento do requisito legal, “in casu”, a alínea b) do n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 6/97/M e, mediante um juízo de proporcionalidade que pode ditar um período, maior ou menor, que o período de interdição anterior.
   15. Posição esta que o próprio Acórdão recorrido defende, mas errando na sua concretização quando expressamente refere “Mas isto não significa que a Administração não tem de fundamentar a sua escolha, especialmente quando aplica o limite temporal máximo de interdição (...) e ainda “(...) não quer dizer que a Administração pode converter uma interdição de entrada com prazo limitado para ilimitado. É necessário que hajam fundamentos suficientes que justificam a nova interdição”, entendimento que não pode proceder.
   16. É certo que, a Administração não pode aplicar a um não residente uma medida de interdição de entrada por período indeterminado, mas tem o dever, face ao conhecimento da existência, manutenção, alteração ou extinção de fortes indícios de pertença ou ligação a associação criminosa, fazer uma nova análise da situação factual em concreto e, sempre norteada pela prossecução do interesse público securitário, decidir, pela aplicação, ou não, de nova medida de interdição com período igual, maior ou menor que o período anterior.
   17. A Lei n.º 6/97/M é uma lei especial que visa combater a criminalidade organizada, cuja “ratio” se prende com a ameaça à segurança e ordem públicas da RAEM, pela presença de não residentes dos quais se receba informação, das entidades policiais competentes, de pertença ou ligação a associações criminosas mesmo que estas não desenvolvam qualquer actividade em Macau.
   18. A prática, e a experiência da entidade recorrente dizem no sentido de o não residente a quem foi aplicada uma medida de interdição de entrada por existirem fortes indícios de pertença ou ligação a associação criminosa, não deixa de o ser ou manter, a referida pertença ou ligação, apenas porque cumpriu a medida de interdição, o que se confirma, no caso em apreço, pelo conteúdo substantivo das diversas informações emitidas pela entidade competente da RAEHK e recebidas pelo CPSP, referindo que o interessado pertence e mantem ligações a associação criminosa daquela Região.
   19. Entendimento que é, também, o da jurisprudência da RAEM em face dos casos em que as autoridades policiais sentem a necessidade de aplicar uma nova medida de interdição de entrada a um não residente sobre o qual foi obtida informação da manutenção da existência de fortes indícios de pertença ou ligação a associações criminosas, cfr. o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância citado supra art.º 29.º.
   20. O Acórdão recorrido enlenca um conjunto de questões sobre a informação recebida pelo CPSP, da HKPF, transcritos supra art.º 30.º, que não são de aceitar e devem ser afastadas por configurarem uma apreciação da matéria substantiva ou material do documento emitido por entidade competente externa à RAEM, o que lhe é vedado devendo, antes, efectuar uma apreciação, apenas, de natureza formal do documento em apreço, salvo, em casos excepcionais, se o conteúdo substantivo do documento violar os princípios fundamentais estruturantes do ordenamento jurídico da Região.
   21. Neste sentido, as autoridades judiciais e policiais da RAEM, com responsabilidade no combate e prevenção do crime organizado, só podem interpretar essa informação, como idónea e credível, não sendo exigível, para tal conclusão, o fornecimento de casos ou situações concretas e específicas, donde aqueles indícios resultem, pelo que, o entendimento expresso no Acórdão recorrido de “(...) já é a segunda interdição do recorrente (…) daí que uma fundamentação mais profunda em comparação coma primeira (…).” não pode ser sufragado.
   22. No caso em apreço, tratando-se de um não residente de Macau, é natural e lógico que a existência de fortes indícios provenham de informações de entidades credíveis, designadamente policiais, exteriores ao Território, e que, sendo o interessado residente da RAEHK, tenha origem na HKPF que tem vindo a fornecer informação a confirmar e reconfirmar que o interessado pertencia e continua a pertencer, e tinha e mantém ligações com associação criminosa que opera naquela Região.
   23. O Acórdão recorrido erra quando tenta estabelecer a analogia entre as normas dos artigos 18.º e 33.º da Lei n.º 6/97/M para efeitos do estabelecimento do limite máximo de 10 anos da medida de interdição aplicada ao abrigo da alínea b) do n.º l daquele último preceito.
   24. Já porque a responsabilidade da aplicação da medida de interdição de entrada prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 6/97/M é da Administração com observância das normas do Código do Procedimento Administrativo (art. 33.º, n.º 2 do mesmo diploma).
   25. E porque em momento algum, o legislador deixa transparecer a possibilidade de, por qualquer tipo de analogia, o limite de 10 anos constante na alínea l) do n.º 1 do artigo 18.º da lei n.º 6/97/M constituir, também, limite à medida aplicável nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 33.º do mesmo diploma.
   26. E por último, porque segundo a doutrina e a jurisprudência, as penas e as medidas administrativas são distintas, “as penas [em sentido lato] são as reacções públicas sobre os crimes em si” e “a interdição de entrada não constitui consequência directa da prática dos crimes pelos quais vem condenado, mas sim medida policial [não detentiva] de prevenção tomada em consequência da análise de personalidade e situação pessoal de um não-residente da RAEM”, e com fins exclusivamente securitários.
   27. Assim, o acto administrativo recorrido em lª instância está devidamente fundamentado de facto e de direito, porque tendo sufragado os despacho e informação do Comandante do CPSP referidos supra art.º 2.º mostra-se praticado em termos de qualquer pessoa normal perceber, de modo claro e preciso, os elementos de facto e de direito, descritos supra art.º 39.º, que estiveram presentes na decisão de aplicar uma nova medida de interdição de entrada.
   28. Pelo que, com a decisão de anulação do acto administrativo em apreço, incorreu o Acórdão recorrido em erro de julgamento sobre os pressupostos de facto, interpretou e aplicou erradamente a norma do artigo 21.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC) e, com os fundamentos acima descritos, padece de vício de violação de lei gerador de nulidade por erro no objecto do recurso.
   
   O recorrido não apresentou contra-alegações.
   E o Exmo. Procurador-Adjunto do Ministério Público emitiu o douto parecer, entendendo que merece provimento o recurso.
   Foram corridos os vistos.
   
   2. Os Factos Provados
   Nos autos foram considerados assentes os seguintes factos com pertinência:
   - Por despacho do Comandante da PSP, de 10/01/1997, foi determinada a interdição da entrada de A, ora recorrido, por tempo indeterminado, com fundamento de que o recorrido “tem registo criminal em Hong Kong desde 1987 e é soldado da seita XXX” (fls. 171 do P.A.).
   - Na altura, o recorrido tinha o seguinte registo criminal em Hong Kong (fls. 185 do P.A.):
   * 1987, dois crimes de furto, regime educativo de 2 anos;
   * 1992, furto de veículo, regime educativo de 1 ano; e
   * 1993, furto, pena de multa de HKD$2.000,00 e pena de prisão de 3 meses, com suspensão de 18 meses.
   - Além disso, era considerado como membro da seita XXX de Hong Kong.
   - Em 18/02/1997, o recorrido foi notificado do despacho supra.
   - Em 21/08/2008, o Comandante da PSP decidiu interditar a entrada do recorrido na RAEM por um período de 10 anos, a contar a partir da notificação da decisão (fls. 117 e 118 do P.A.).
   - Em 23/09/2008, o recorrido foi notificado da decisão supra.
   - Inconformado com a decisão da interdição da entrada, em 22/10/2008, o ora recorrido interpôs o recurso hierárquico necessário junto ao Sr. Secretário para a Segurança.
   - Em 07/11/2008, o Comandante da PSP proferiu a nova decisão de interdição, que substituiu a de 21/08/2008 (fls. 93 e 94 do P.A.).
   - Por ofício datado de 17/11/2008, dirigido ao endereço de Hong Kong declarado pelo recorrido, a PSP procedeu-se à notificação pessoal da decisão supra ao mesmo (fls. 92 do P.A.).
   - Em 01/06/2009, na sequência do pedido de informação do andamento do recurso hierárquico necessário acima referido pela mandatária do recorrido, a PSP informou à mesma a existência da nova decisão de interdição que substituiu da anterior, inutilizando assim o recurso hierárquico necessário em referência, bem como concedeu o novo prazo para efeitos de impugnação (fls. 73 do P.A.).
   - Em 01/07/2009, o recorrido interpôs o novo recurso hierárquico necessário contra a decisão de interdição de 07/11/2008.
   - Em 24/09/2009, o Sr. Secretário para a Segurança, no âmbito do recurso hierárquico necessário interposto, determinou a remessa do processo à PSP para completar a fundamentação.
   - Em 21/12/2009, o Comandante da PSP proferiu a nova decisão de interdição da entrada por um período de 10 anos, a contar desde 20/08/2008, com fundamento de que o recorrido é membro da associação criminosa, facto esse confirmado e demonstrado por informações actualizadas (fls. 42 do P.A.).
   - As informações actualizadas relativos aos antecedentes criminais do recorrido são as seguintes (fls. 95 e 96 do P.A.):
   * 16/02/1987, dois crimes de furto, regime educativo de 2 anos;
   * 12/10/1992, furto de veículo, regime educativo de 1 ano;
   * 05/11/1993, furto, pena de multa de HKD$2.000,00 e pena de prisão de 3 meses, com suspensão de 18 meses; e
   * 29/07/1998, furto, pena de prisão de 3 meses.
   - Além disso, é considerado como membro da seita XXX de Hong Kong.
   - Por ofícios datados de 12/01/2010, a PSP procedeu-se à notificação da nova decisão de interdição ao recorrido e à sua mandatária (fls. 27 e 28 do P.A.).
   - Em 24/02/2010, o ora recorrido interpôs novo recurso hierárquico necessário contra a referida decisão de interdição.
   - Em 07/04/2010, o Comandante da PSP elaborou informação constante a fls. 32 a 35 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido.
   - Por despacho de 20/04/2010, cujo teor consta a fls. 31 dos autos e aqui se dá integralmente reproduzido, o Sr. Secretário para a Segurança negou provimento ao recurso hierárquico interposto, confirmando a decisão recorrida.
   
   3. O Direito
   A única questão suscitada no presente recurso prende-se com a fundamentação do acto administrativo alvo do recurso contencioso.
   Na tese do Tribunal recorrido, estando em causa a segunda interdição da entrada do ora recorrido na RAEM, por um período de 10 anos a contar de 20 de Agosto de 2008, é necessário que hajam fundamentos suficientes que justificam a decisão, pelo que não basta a informação colhida junto da autoridade policial de Hong Kong de 2008 que diz o recorrido ser membro da seita, já que a mesma imputação já existia no ano de 1997 e motivou a primeira interdição da entrada.
   Entendeu ainda que, para determinar a eventual necessidade da interdição da entrada bem como o seu período, são essenciais mais elementos, tais como se o recorrido continua a ser membro da seita no ano de 2008 e, no caso afirmativo, será um membro activo ou inactivo.
   Vejamos.
   É de notar, desde logo, que não tem razão a entidade recorrente ao alegar que o Acórdão ora recorrido elegeu o despacho do Comandante do CPSP de 21 de Agosto de 2008 como o acto sobre que recaiu a decisão de anulação, pois não resulta do douto Acórdão que o Tribunal recorrido tenha feito confusão sobre o objecto do recurso, que na sua fundamentação nem sequer fez referência expressa àquele despacho.
   Nos termos do art.º 114.º do Código de Procedimento Administrativo, a Administração deve fundamentar os seus actos administrativos.
   E o art.º 115.º n.º 2 estabelece a equivalência entre a falta de fundamentação e “a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto”.
   A lei exige que a fundamentação seja congruente, clara e suficiente.
   E para haver falta de fundamentação, não basta qualquer obscuridade, contradição ou insuficiência dos fundamentos invocados, sendo necessário ainda que eles não possibilitem um “esclarecimento concreto” das razões que levaram a autoridade administrativa a praticar o acto.1
   Não se pode esquecer que a lei permite a chamada “fundamentação por concordância ou referência”, que pode “consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto” (artº 115º nº 1 do CPA)
   No caso sub judice, o acto administrativo que está em causa é o despacho do Senhor Secretário para a Segurança, proferido em 20 de Abril de 2010, que, em concordância com o despacho e a informação do Comandante do CPSP de 21 de Dezembro de 2009 e 7 de Abril de 2010, respectivamente, decidiu confirmar a decisão posta em crise no recurso hierárquico necessário.
   Constata-se nos autos que o despacho de 21 de Dezembro de 2009 do Comandante do CPSP – objecto de recurso hierárquico – afirma que há informações actualizadas provenientes das autoridades de Hong Kong no sentido da pertença do recorrido a uma associação criminosa.
   Chama-se atenção para uma informação oferecida pela entidade policial de Hong Kong em 5 de Novembro de 2008, que aponta o recorrido como membro da seita XXX.
   Trata-se, a nosso ver, duma informação actualizada, afirmativa de que o recorrido continua a pertencer à seita, sendo também credível para o efeito de determinar a interdição da entrada.
   Por outro lado, o Tribunal recorrido entendeu não haver necessidade de produção de prova sobre os factos da causa (art.º 63.º do CPAC).
   Ao mesmo tempo, a decisão de interdição da entrada foi tomada ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 33.º da Lei n.º 6/97/M, segundo a qual será interdita a entrada na RAEM aos não residentes a respeito dos quais conste informação sobre “existência de fortes indícios de pertença ou ligação a associação criminosa, nomeadamente do tipo de associação ou sociedade secreta, ainda que esta aqui não desenvolva qualquer actividade”.
   Ora, se a lei não exige o exercício de qualquer actividade aqui no território para que um indivíduo não residente seja interdito de entrar, sendo bastante constar informação sobra a sua pertença ou ligação a associação criminosa, por lógica das coisas não fará diferença se o indivíduo é ou não membro activo desta associação, uma vez que a interdição da entrada visa proteger a ordem e segurança públicas dos riscos que estes bens jurídicos corriam com a presença em Macau da pessoa ligada a associação criminosa.
   Assim sendo, parece que se deve entender que a fundamentação do acto administrativo é suficiente, uma vez que o despacho recorrido é claro no sentido de as informações serem actuais, dando conhecer os motivos de facto e de direito que justificam a aplicação da medida de interdição da entrada.
   Quanto à existência de um prazo máximo para a proibição de entrada na RAEM, ao abrigo do art.º 33.º da Lei n.º 6/97/M, parece que o Acórdão recorrido ajuizou bem ao dizer que não pode deixar de ser 10 anos, atento o disposto no art.º18.º n.º 1, al. l) da mesma Lei.
   No entanto, tratando-se duma questão relacionada com a proporcionalidade da medida aplicada pela Administração, não é de entrar agora na sua discussão, pois o Tribunal recorrido não chegou a apreciar a questão, cujo conhecimento considerou prejudicado.
   
   4. Decisão
   Pelo exposto, acordam em julgar procedente o recurso jurisdicional, determinando a baixa dos autos ao Tribunal de Segunda Instância para conhecer das restantes questões suscitadas em sede do recurso contencioso, se para tal nada obsta.
   Sem custas.
   
    Macau, 4 de Julho de 2012
   
Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho
   
   
1 Lino José Baptista Rodrigues Ribeiro e José Cândido de Pinho, Código do Procedimento Administrativo de Macau, anotado e comentado, pág. 639 e 640.
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1
Processo nº 26/2012