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Processo nº 584/2011 Data: 27.10.2011
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “furto”, “burla” e “falsificação”.
Crime continuado.
Concurso real.



SUMÁRIO

1. Constitui “crime continuado” a realização plúrima do mesmo tipo ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.
A não verificação de um dos pressupostos da figura do crime continuado impõe o seu afastamento, fazendo reverter a figura da acumulação real ou material

2. Se o agente actuou sucessivamente, superando obstáculos e resistências ao longo do “iter criminis”, aperfeiçoando a realidade exterior aos seus desígnios e propósitos, sendo ele a dominá-la, e não o inverso, inexistem motivos para que se considere atenuada a sua culpa, não sendo de se considerar os crimes pelo mesmo assim cometidos como um crime continuado.

3. Não havendo “substracção de coisa” mas antes “obtenção de património através de meios enganosos”, não é de considerar que cometido foi o crime de “furto”, mas sim o de “burla”.

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo







Processo nº 584/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Sob acusação pública e em audiência colectiva no T.J.B. respondeu A, (1°) arguido com os sinais dos autos, vindo a ser condenado pela prática em concurso real de 6 crimes de “furto qualificado” p. e p. pelo art. 198°, n.°2, al. a) do C.P.M., outros 3 na forma tentada, e 1 de “furto (simples)”, p. e p. pelo art. 197°, n.° 1, fixando-lhe o Colectivo a pena única de 7 anos de prisão; (cfr., fls. 2128 a 2129-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Do assim decidido, e porque inconformado, o arguido recorreu.
Motivou para, a final, produzir as conclusões seguintes:

“a) Em face dos factos apurados e dados como provados na audiência e julgamento (cfr., pag. 24 a 41 do douto acórdão recorrido) i) Erro na qualificação pelo Tribunal “a quo”, da forma como os factos acusados foram praticados pelo recorrente (forma do crime), na base da qual foi arguido condenado nas penas acima transcritas; e ii) Erro na determinação (em concreto) da medida da pena aplicável ao recorrente.
b) Pois, na óptica do recorrente, o Tribunal a quo, ao condenar o recorrente pela prática de
- 6 crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. no artigo 198°, n°2, alínea a) do Código Penal;
- 1 crime de furto simples, na forma consumada, p. e p. no artigo 197°, n°1 do Código Penal;
- 3 crimes de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. no artigo 198°, n°2, alínea a) do Código Penal;
cometeu erro grave de qualificação da forma como os factos acusados foram praticados pelo recorrente (forma do crime).
c) Sendo certo que, na humilde opinião do ora recorrente, os referidos factos por ele praticados, na forma consumada, deveriam ser qualificados, correctamente, como um só crime continuado, na forma consumada, nos termos do artigo 29°, n° 2 do Código Penal.
d) Voltando ao caso sub judice, os factos dados como provados pelo Tribunal a quo demonstram, com clareza e segurança, o modo pelo qual os factos foram praticados pelo recorrente.
e) Importa salientar que pelos factos assentes e acima transcritos, no caso sub judice, se afigura uma situação de crime continuado, tendo em conta o modo de execução dos factos pelo recorrente, e pela verificação dos pressupostos previstos no artigo 29°, n°2 do Código Penal, a saber:
g) Realização plúrima do mesmo tipo de crime (a prática do mesmo crime de furto);
h) Homogeneidade na forma de execução (com recurso aos cartões “Union Pay” falsos com códigos);
i) Lesão do mesmo bem jurídico (a fé pública e a credibilidade em relação ao uso de cartões “Union Pay”;
j) Unidade do dolo (do arguido aquando da prática dos factos ilícitos em causa;
k) Persistência de uma situação exterior que facilite a execução e que diminua consideravelmente a culpa do agente (a facilidade de o arguido obter os montantes pretendidos); e
l) A proximidade temporal dos factos ilícitos praticados.
f) Nesta óptica, devem os factos ilícitas praticados pelo recorrente ser qualificado como um Só crime continuado de furto qualificado, e, por conseguinte, ser o mesmo arguido punido nos termos do artigo 73° do Código Penal.
g) Tendo o Tribunal a quo qualificado, incorrectamente, nos termos do artigo 29°., n° 1, os factos praticados pelo recorrente como: 6 crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. no artigo 198°, n°2, alínea a) do Código Penal; 1 crime de furto simples, na forma consumada, p. e p. no artigo 197°, n°1 do Código Penal; e 3 crimes de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. no artigo 198°, n°2, alínea a) do Código Penal, cometeu erro grave de qualificação da forma como os factos acusados foram praticados pelo recorrente (forma do crime), violando o disposto no artigo 29º, nº 2 do Código Penal;
h) Por outras palavras, ao subsumir incorrectamente os factos acusados aos preceitos legais do artigo 290., n'!. 1 do C.P., o Tribunal a quo cometeu erro de julgamento.
i) Caso esse Venerando Tribunal doutamente assim não entender, que se admite por mera hipótese académica, deverá ser considerado a existência de um crime continuado nos seguintes factos praticados pelo recorrente, no dia 29.7.2009, pelas 18H30 e 19H00 pelas razões acima apontadas.
j) Assim sendo, devem os dois factos ilícitos praticados pelo recorrente no dia 29.7.2009, pelas 18H30 e 19H00, ser qualificado como um só crime continuado de furto qualificado, e, por conseguinte, ser o mesmo arguido punido nos termos do artigo 73° do Código Penal.
k) Sem prescindir do que foi exposto nos termos anteriores em relação a um Só crime continuado, na modesta opinião do recorrente, o Tribunal a quo cometeu um outro erro, isto é, Erro na determinação (em concreto) da medida da pena aplicável ao recorrente.
l) Ora, a lei manda que, na determinação em concreta de penas a aplicar ao arguido, sejam respeitados os dispostos nos Artigos 40.° (Finalidades das penas e medidas de segurança), 64.° (Critério de escolha da pena) e 65.° (Determinação da medida da pena), do Código Penal.
m) Sendo o 1° arguido é primário, confessa, de forma integral, sem reserva e espontâneo os factos, e ainda se mostra arrependido, as penas arbitradas pelo Tribunal a quo ao ora recorrente, e em cúmulo jurídico de uma única de 7 anos de prisão efectiva, é, salvo o devido respeito, excessiva, inadequada e injusta”; (cfr., fls. 2172 a 2181).

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Respondendo, considera o Exmo. Magistrado do Ministério Público que o recurso deve ser julgado improcedente; (cfr., fls. 2185 a 2186-v).

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Nesta Instância e em sede de vista, juntou o Exmo. Procurador-Adjunto douto Parecer pugnando também pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 2208).

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Cumpre decidir.
Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos seguintes:

“1. O 1° arguido A, o 2° arguido B e outros indivíduos de identidade desconhecida ou ausentes em parte incerta formaram um grupo de crime; o 3° arguido C, o 4° arguido D, o 5° arguido E e uns indivíduos de identidade desconhecida ou ausentes em parte incerta formaram um grupo de crime; os referidos dois grupos, sob o pretexto de fazer negociações com comerciantes do Interior da China, obtiveram a confiança de outros, enganaram-nos e obtiveram informações e senhas de cartões de UnionPay destes, a fim de reproduzir um outro cartão de UnionPay com estas informações. Mais tarde, os arguidos ou outros membros dos grupos trouxeram os cartões de UnionPay para Macau, e levantaram o dinheiro depositado nas respectivas contas pelos comerciantes através de operações de “cash out”, pagando com cartão em várias casas de penhor em Macau.
2. Em 28 de Julho de 2009, o l° lesado F e o 2°lesado G discutiram um negócio com H e I. Na altura, I exigiu que os dois lesados fizessem o negócio com cartões de UnionPay, alegando que para garantir o seu interesse e evitar prejuízo causado pela insuficiência de capital da companhia dos dois lesados durante o negócio, ele próprio iria alterar a senha do cartão de UnionPay dos dois lesados e só ele podia saber da senha. Assim os dois lesados não podiam usar o dinheiro depositado na respectiva conta durante o negócio e ao mesmo tempo, I solicitou que os dois lesados depositassem RMBY1.910.000,00 na conta do respectivo cartão de UnionPay na tarde de 29 de Julho de 2009.
Os dois lesados entenderam que apesar de I saber da senha do cartão de UnionPay, o cartão ainda ficou nas mãos do 2° lesado G, pelo que concordaram com a exigência de I.
Em 29 de Julho de 2009, pelas 08h30, os dois lesados F e G dirigiram-se ao filial Jinghu do Banco Agrícola da China (Shenzhen), abriu em nome do 2° lesado G uma conta e obteve um cartão de UnionPay n.° XXXX. O 2° lesado depositou apenas RMB ¥ 10 na referida conta.
Em 29 de Julho de 2009, pelas 10h30, os dois lesados F e G dirigiram-se a um bar de chá na cidade de Shenzhen para encontrar com H, I, um homem de apelido “Chen” e um indivíduo de identidade desconhecida. Durante o encontro, I entregou ao 2° lesado G uma fotocópia do salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.° XXXX para provar a sua identidade de residente de Hong Kong.
A seguir, a pedido de I, o 2° lesado G) e este foram à caixa automática fora do filial Futian do Banco Agrícola da China para alterar a senha do cartão de UnionPay acima referido, e desde então, apenas I sabia da nova senha e o cartão de UnionPay ainda se encontrou na guarda do 2° lesado G.
Em 29 de Julho de 2009, pelas 13 horas da tarde, H telefonou ao 1 ° lesado F, solicitando que este depositasse dinheiro na supracitada conta quanto antes.
Logo depois, o 2° lesado G dirigiu-se sozinho ao Banco SPD e depositou RMBY1.912.680,00 na conta acima referida.
Em 29 de Julho de 2009, pelas 14h13, o 1° lesado telefonou a H, notificando-o do depósito da verba na conta acima referida.
3. Em 2007, o 1º arguido A conheceu na cidade de Shenzhen um homem de nome J (também conhecido por “XX”), e na conversa, J propôs que o 1º arguido trouxesse os cartões de UnionPay fornecidos por este para Macau, levantasse o dinheiro depositado nos cartões através de operações de “cash out” e entregasse o dinheiro a J, assim o 1º arguido podia receber como remuneração 3% do dinheiro que levantou dos cartões. Por ser considerável a remuneração, o 1º arguido concordou com a proposta de J.
J telefonou irregularmente ao 1º arguido para se encontrarem no centro comercial subterrâneo na cidade de Zhuhai, entregou-lhe ao mesmo tempo os cartões de UnionPay, bilhete de identidade de residente de Hong Kong e salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente, nos quais era igual o nome do portador, e as fotos nos documentos de identidade foram fornecidas pelo 1º arguido a pedido de J, além disso, J também disse ao 1º arguido a senha dos cartões de UnionPay.
Depois de obter os supracitados cartões de UnionPay e documentos de identidade, o 1º arguido dirigiu-se de imediato a Macau, levantou a quantia indicada por J através de operações de “cash out” em várias casas de penhor, e depois voltou para o Interior da China, entregou o dinheiro levantado a J e recebeu a sua remuneração.
Em 2009, o 1º arguido A disse ao 2º arguido B que podia receber como remuneração RMB¥5.000,00 a RMB¥10.000,00 sempre que tivesse sucesso em levantar RMB¥1.000.000,00 através de operações de “cash out” nas casas de penhor, pagando com cartões de UnionPay alheios. O 2º arguido decidiu seguir o 1º arguido para praticar crimes em Macau para obter remuneração.
A pedido do 1º arguido, o 2º arguido entregou 2 fotos para o bilhete de identidade de residente de Hong Kong e o salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente. Os arguidos precisaram de mostrar aos empregados de casa de penhor os referidos documentos para levantar numerário através de operações de “cash out”.
4. Em 29 de Julho de 2009, J telefonou ao 1º arguido para se encontrarem no centro comercial subterrâneo na cidade de Zhuhai, entregou-lhe um cartão de UnionPay do Banco Agrícola da China n.º XXXXXX (que é igual ao número do cartão de UnionPay do 2º lesado G), e um bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4), com o nome de K e a foto do 2º arguido B, dizendo ao mesmo tempo a senha do cartão de UnionPay ao 1º arguido.
No mesmo dia (29 de Julho de 2009), o 1º arguido, o 2º arguido e L entraram em Macau.
O 1º arguido dirigiu-se primeiro a uma caixa automática para confirmar que havia grande quantidade de dinheiro na respectiva conta, e a seguir, entregou ao 2º arguido o cartão de UnionPay do Banco Agrícola da China n.º XXXXX e o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4), dizendo-lhe ao mesmo tempo a senha do cartão de UnionPay.
Em seguida, o 2º arguido e L seguiram o 1º arguido , vaguearam na volta do Hotel Fortuna e agiram sob instruções do 1º arguido.
5.1. Em 29 de Julho de 2009, pelas 6 horas da tarde, os 1º e 2º arguidos dirigiram-se à Joalharia XX situada na Rua de XX, n.º XX, EdfXX, rés-do-chão, e solicitou que levantasse HKD$2.000.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay. Na altura, o 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXX ao empregado M, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir, M efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Quando o 2º arguido entrou a senha do cartão e assinou K na respectiva factura, a transacção foi mais ou menos cumprida. Porém, M perguntou ao 2º arguido para mostrar o boletim de entrada e saída da RAEM para visitantes, o 2º arguido alegou que não tinha o boletim, pelo que segundo as normas da loja, M cancelou de imediato a transacção. Pelo que o 2º arguido assinou K na factura de anulação da transacção e saiu com o 1º arguido.
5.2. Em 29 de Julho de 2009, pelas 18h15, os 1º e 2º arguidos dirigiram-se à loja XX Jewellery and Watch Trading sita na Avenida da Praia Grande, n.º 998A, rés-do-chão, pretenderam levantar HKD$1.000.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay, e L esperou fora da loja. Na altura, o 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXX ao empregado N, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir N efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e N entregou ao 2º arguido HKD$1.000.000,00 em numerário.
5.3. Em 29 de Julho de 2009, pelas 18h30, o 1º arguido, o 2º arguido e L dirigiram-se à XX Jewellery and Watch Ltd. sita na Avenida do XX, n.º XX, Edf. XX, rés-do-chão T, e pretenderam levantar HKD$1.100.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay. O 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXX ao empregado O, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir, O efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e O entregou ao 2º arguido HKD$1.100.000,00 em numerário. O 2º arguido não conseguiu colocar todo o dinheiro na sua bolsa, pelo que colocou parte do dinheiro na bolsa de L.
Mais tarde, o 1º arguido A trouxe o cartão de UnionPay n.º XXXX e dirigiu-se sozinho a uma caixa automática para ver o saldo na conta, sabendo que ainda restou cerca de HKD$10.000,00 na conta.
5.4. Em 29 de Julho de 2009, pelas 7 horas da tarde, o 2º arguido, sob instruções do 1º arguido, dirigiu-se sozinho à XX Jewellery and Watch Ltd., pretendeu levantar HKD$14.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay, e o 1º arguido e L esperou fora da loja. O 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXX ao empregado P, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir, P efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e P entregou ao 2º arguido HKD$14.000,00 em numerário.
Depois de cumprir a supracitada transacção, todo o dinheiro era guardado pelo 1º arguido para este entregar a J. O 1º arguido podia receber pelo menos remuneração no montante de RMB¥60.000,00 através de efectuar operações de “cash out” com o cartão de UnionPay nas supracitadas casas de penhor.
6. Mais tarde, o 1º arguido disse ao 2º arguido e L que tinha na sua posse um outro cartão de UnionPay, e que teria sido depositado mais dinheiro neste cartão, pelo que solicitou que o 2º arguido e L ficassem em Macau por mais uns dias.
Em 31 de Julho de 2009, na madrugada, o 1º arguido recebeu instruções de J para praticar crime com o outro cartão de UnionPay, pelo que o 1º arguido entregou ao 2º arguido um cartão de UnionPay do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXX, cujo portador é XXX.
6.1. Em 31 de Julho de 2009, pelas 12 horas da madrugada, o 1º arguido e o 2º arguido dirigiram-se à Ourivesaria Joalharia XX sita na Avenida XX, n.º XX, rés-do-chão D, pretenderam levantar HKD$2.000.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay, e L esperou no quarto do hotel. O 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXXX ao empregado Q, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir, Q efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e Q entregou ao 2º arguido HKD$2.000.000,00 em numerário.
6.2. Em 31 de Julho de 2009, pelas 00h20, o 1º arguido e o 2º arguido dirigiram-se à casa de penhor XX sita na Avenida XX, n.º 188, Edf. XX, rés-do-chão AA, e pretenderam levantar HKD$1.000.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay. O 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXXX ao empregado “XX”, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir, “XX” efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi quase cumprida a transacção, mas quando o outro empregado R registou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong mostrado pelo 2º arguido, descobriu que o documento era suspeito, pelo que telefonou de imediato para o banco para cancelar a transacção. Pelo que o 2º arguido assinou K na factura de cancelamento e saiu com o 1º arguido.
6.3. Em 31 de Julho de 2009, pelas 00h43, o 1º arguido e o 2º arguido dirigiram-se à Joalharia XX sita na Rua do XX, n.º 13, rés-do-chão, e pretenderam levantar HKD$1.500.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay. Mas o empregado S alegou que na altura só havia cerca de MOP$600.000,00 na joalharia, pelo que os dois arguidos só pretenderam levantar HKD$500.000,00 em numerário. O 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXXX ao empregado S, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K, a seguir, S efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e S entregou ao 2º arguido HKD$500.000,00 em numerário.
6.4. Em 31 de Julho de 2009, pelas 00h40, o 1º arguido e o 2º arguido dirigiram-se à Ourivesaria Joalharia XX sita na Rua de XX, n.º XX, Edf. XX, rés-do-chão P, e pretenderam levantar HKD$1.000.000,00 em numerário através de operação de “cash out”, pagando com cartão de UnionPay. O 2º arguido entregou o cartão de UnionPay n.º XXXXX ao empregado T, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º H09XXXX(4) com o nome do portador K. O empregado T, segundo o costume, pretendeu efectuar a transacção por duas vezes, ou seja levantar HKD$500.000,00 cada vez, e a seguir, depois de o 2º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar K na respectiva factura, foi cumprida a primeira transacção, e T entregou ao 2º arguido HKD$500.000,00 em numerário, mas quando T pretendeu efectuar a segunda transacção para os dois arguidos, não teve sucesso por ser demasiado grande a quantia, e em seguida, o 2º arguido retirou o cartão de UnionPay e o documento de identidade e saiu com o 1º arguido.
6.5. Em 31 de Julho de 2009, pelas 03h21, o 1º arguido A dirigiu-se sozinho a Joalharia XX sita na Avenida da XX, n.º XX, XX. Center, rés-do-chão AD, requerendo comprar uma jóia de diamante no valor de MOP$211.000,00. O 1º arguido entregou ao empregado U o cartão de UnionPay n.º XXXXX, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong n.º G12XXXX(A) com o nome do portador U, a seguir, U efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 1º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar U na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e U entregou a jóia ao 1º arguido. O 1º arguido pretendeu vender de imediato a jóia para obter numerário, pelo que a referida loja comprou a jóia a 70% do preço original. O 1º arguido adquiriu MOP$150.000,00 em numerário e saiu.
6.6. Em 31 de Julho de 2009, pelas 03h30, o 1º arguido dirigiu-se à casa de penhor XX sita na Rua de Xangai, Edf. I Hoi, rés-do-chão AE, requerendo levantar HKD$300.000,00 em numerário através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay. O 1º arguido entregou ao empregado V o cartão de UnionPay n.º XXXX, e a pedido deste, mostrou o bilhete de identidade de residente de Hong Kong acima referido, a seguir, V efectuou a transacção segundo o procedimento normal, mas o banco não admitiu esta transacção, pelo que o 1º arguido retirou o cartão de UnionPay e o documento de identidade e saiu.
7. Depois de cumprir as supracitadas transacções, o 1º arguido e o 2º arguido voltaram para o hotel e o 1º arguido deu ao 2º arguido HKD$20.000,00 como remuneração.
Na manhã do dia 31 de Julho de 2009, para reduzir o risco de trazer grande quantidade de dinheiro para o Interior da China, o 1º arguido distribuiu ao 2º arguido e L o dinheiro adquirido e solicitou que estes dois ajudassem a trazer o dinheiro para o Interior da China.
Depois de chegarem na cidade de Zhuhai, o 2º arguido e L devolveram de imediato o dinheiro ao 1º arguido, e este entregou sozinho o dinheiro, os cartões de UnionPay e os documentos a J. O 1º arguido recebeu pelo menos RMB¥90.000,00 como remuneração.
8. Na tarde do dia 6 de Julho de 2010, ao entrar em Macau, os 1º e 2º arguidos foram interceptados pelos guardas do CPSP no posto fronteiriço das Portas do Cerco.
Mais tarde, os agentes da PJ encontraram na posse do 1º arguido A os seguintes objectos (vide as fls. 224 dos autos):
1). Encontraram-se os seguintes objectos na carteira de cor de café do 1º arguido:
- Um cartão de conta do grupo de elite do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXXX;
- Um cartão de conta do grupo de elite do Banco Industrial e Comercial de China n.º XXXXX;
- Um cartão Kins Tongbao do Banco Agrícola da China n.º XXXXX:
- Um cartão Kins Tongbao do Banco Agrícola da China n.º XXXXXX;
- Um cartão de débito da Cooperativa Rural de Crédito da Província de Guangdong n.º XXXXX;
- Um cartão de débito da Cooperativa Rural de Crédito da Província de Guangdong n.º XXXXX;
- Um cartão de peónia do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXXX;
- Um cartão do Banco de Poupança Postal da China n.º XXXX;
- Dois cartões de peónia do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXX;
- Um cartão SIM n.º XXXXW;
- Um cartão SIM no qual se escreveu “380香港”;
2). Encontraram-se os seguintes objectos na mochila de cor de café do 1º arguido:
- Um telemóvel de marca NOKIA, IMEI: XXXXX, junto com um cartão SIM: XXXX;
- Um telemóvel de marca NOKIA, IMEI: XXXXX, junto com um cartão SIM: XXXX;
- Um telemóvel de marca Samsung, S/N: XXXXX, junto com dois cartões SIM: XXXXX e XXXXX, e um cartão de memória: POTEVIO, 256MB;
- RMB¥1.300,00 em numerário.
3). Encontraram-se os seguintes objectos na mala de cor de café do 1º arguido:
- Um bilhete de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º C312140(0), com o nome de portador W;
- Um salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º H064052XXXX, com o nome de portador W;
- Um envelope vermelho de Lai Si;
- Um bilhete de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º E86XXXX(8), com o nome de portador X;
- Um salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º H06226XXXX, com o nome de portador X.
4). Encontrou-se um colar de cor de ouro na posse do 1º arguido.
Foram entregues ao 1º arguido por J no centro comercial subterrâneo da cidade de Zhuhai os supracitados dois cartões de peónia do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXXX, os dois bilhetes de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º C31XXXX(0) e n.º E86XXX(8) e os dois salvo-condutos para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXX e n.º XXXX, e este solicitou que o 1º arguido usasse os referidos cartões de UnionPay e documentos de identidade para levantar RMB¥200.000,00 em numerário através de operação de “cash out”.
Através de examinação feita pela PJ, verificou-se que eram falsificados os supracitados dois bilhetes de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º C312XXXX(0) e n.º E86XXXX(8); além disso, a foto no salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXXX foi substituída e o salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXXX era falsificado.
9. Através de reconhecimento, M reconheceu o 2º arguido como o homem que levantou numerário na Joalharia XX através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay no dia 29 de Julho de 2009.
Através de reconhecimento, N reconheceu o 1º arguido e o 2º arguido como os dois homens que levantaram numerário na loja XX Jewellery and Watch Trading através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay no dia 29 de Julho de 2009.
Através de reconhecimento, R reconheceu o 1º arguido e o 2º arguido como os dois homens que levantaram numerário na casa de penhor XX através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay no dia 31 de Julho de 2009.
Através de reconhecimento, S reconheceu o 2º arguido como o homem que levantou numerário na Joalharia XX através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay no dia 31 de Julho de 2009; e parece-lhe que o 1º arguido é o homem que acompanhou o 2º arguido na Joalharia XX no dia 31 de Julho de 2009.
Através de reconhecimento, T reconheceu o 1º arguido e o 2º arguido como os dois homens que levantaram numerário na Ourivesaria Joalharia XX através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay no dia 31 de Julho de 2009.
10. Na noite do dia 26 de Abril de 2010, Y, também conhecido por “XX” e “XX”, e o 3º arguido C, também conhecido por “XX”, entraram em Macau.
No mesmo dia (26 de Abril de 2010), o 5º arguido E conheceu o 3º arguido C e Y no casino, na altura, estes dois disseram ao 5º arguido que podia receber remuneração se o 5º arguido ajudasse-os a levantar numerário através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay nas casas de penhor. Para ganhar dinheiro, o 5º arguido concordou com a proposta do 3º arguido C e Y.
O 3º arguido e Y entregaram ao 5º arguido um cartão de UnionPay do Banco Agrícola da China n.º XXXX, cujo portador era Z, dizendo-lhe ao mesmo tempo a senha do cartão.
10.1. Em 27 de Abril de 2010, pelas 00h27, sob instruções do 3º arguido C e Y, o 5º arguido E entrou sozinho na Joalharia XX, requerendo levantar HKD$1.200.000,00 através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay. O 5º arguido E entregou ao empregado AA o cartão de UnionPay n.º XXXX, e a pedido deste, mostrou o seu BIRM n.º 729XXXX(9), a seguir, AA efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 5º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar o seu nome na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e AA entregou ao 5º arguido MOP$1.272.000,00 em numerário, equivalente a HKD$1.200.000,00.
O 5º arguido saiu da joalharia e entregou o dinheiro ao 3º arguido C e Y, recebendo a remuneração de MOP$3.000,00 a MOP$5.000,00.
10.2. Em 27 de Abril de 2010, pelas 00h31, o 3º arguido C e o 5º arguido E dirigiram-se à loja XX Jewellery and Watch Trading sita na Avenida da XX, n.º XX, rés-do-chão, requerendo levantar HKD$1.200.000,00 em numerário através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay. O 5º arguido E entregou ao BB o cartão de UnionPay n.º XXXXXX, e a pedido deste, mostrou o seu BIRM n.º 729XXXX(9), a seguir, BB efectuou a transacção segundo o procedimento normal. Depois de o 5º arguido entrar a senha do cartão de UnionPay e assinar o seu nome na respectiva factura, foi cumprida a transacção, e BB entregou ao 5º arguido MOP$1.278.000,00 em numerário, equivalente a HKD$1.200.000,00.
O 5º arguido saiu da loja e entregou o dinheiro ao 3º arguido C e Y, recebendo de novo a remuneração de MOP$3.000,00 a MOP$5.000,00.
Através de reconhecimento, AA reconheceu o 5º arguido como o homem que levantou numerário através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay na Joalharia XX no dia 27 de Abril de 2010.
Através de reconhecimento, BB reconheceu o 3º arguido como o homem que acompanhou o 5º arguido para levantar numerário na loja XX Jewellery and Watch Trading no dia 27 de Abril de 2010.
11. Em 9 de Agosto de 2010, o 5º arguido foi interceptado pelos guardas do CPSP no posto fronteiriço das Portas do Cerco.
11.1. Em 14 de Outubro de 2010, o 3º arguido C recebeu instruções para levantar numerário de HKD$500.000,00 através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay em Macau. Antes de entrar em Macau, o 3º arguido recebeu no centro comercial subterrâneo de Gongbei um cartão de UnionPay do Banco Industrial e Comercial da China n.º XXXXX, cujo portador é CC. Depois, o 3º arguido telefonou ao 5º arguido, solicitando a sua ajuda para levantar numerário.
Depois de receber a chamada do 3º arguido, o 5º arguido notificou de imediato a polícia judiciária (vide as fls. 1238v dos autos).
Mais tarde, o 3º arguido e o 5º arguido tentaram levantar numerário através de operação de “cash out” em duas casas de penhor em Macau mas não tiveram sucesso, e em fim, quando estes dois verificaram o saldo no supracitado cartão de UnionPay na caixa automática no salão do Hotel StarWorld, a caixa automática confiscou o referido cartão de UnionPay.
Em seguida, o 3º arguido voltou para o Interior da China.
Através de examinação feita pelo empregado da China Unionpay DD, verificou-se que o supracitado cartão de UnionPay n.º XXXXX foi remodelado.
12. No Setembro de 2010, no Interior da China, Y perguntou ao 4º arguido D se pretendeu acompanhar o 3º arguido C para levantar numerário em Macau através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay falsificado. Por dever dívidas de jogo, o 4º arguido concordou com a proposta de Y.
12.1. Em 27 de Outubro de 2010, o 3º arguido C e o 4º arguido D receberam instruções de Y para levantar numerário de HKD$1.200.000,00 através de operação de “cash out” nas casas de penhor em Macau, e para o efeito, Y encontrou-se com os 3º e 4º arguidos no posto fronteiriço de Gongbei e entregou ao 3º arguido um cartão de UnionPay do Banco Agrícola da China n.º XXXXXX, um bilhete de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º K05XXXX(6) e um salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXXX (o nome de portador dos dois documentos é EE), dizendo-lhe também a senha do cartão de UnionPay.
A seguir, o 3º arguido e o 4º arguido dirigiram-se de imediato a Macau, e o 3º arguido telefonou ao 5º arguido, solicitando a sua ajuda para levantar numerário.
Depois de receber a chamada do 3º arguido, o 5º arguido notificou de imediato a polícia judiciária.
Os 3º e 4º arguidos encontraram-se com o 5º arguido fora do Casino Grande Lisboa, e o 3º arguido entregou ao 5º arguido o supracitado cartão de UnionPay n.º XXXXXX, o bilhete de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º K05XXXX(6) e o salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXXX (o nome de portador dos dois documentos é EE), dizendo-lhe a senha do cartão e mandando-o para levantar numerário de HKD$1.200.000,00 através de operação de “cash out” nas casas de penhor.
Depois, os 3º e 4º arguidos seguiram e vigiaram o 5º arguido quando este tentou levantar numerário através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay em três casas de penhor, usando os supracitados documentos de identidade e cartão, mas o 5º arguido não teve sucesso. Em fim, os agentes da PJ prenderam os 3º e 4º arguidos nas imediações de Holiday Inn Macau.
Na altura, os agentes da PJ encontraram na posse e na bagagem do 3º arguido C os seguintes objectos:
- Um cartão de UnionPay do Banco Agrícola da China n.º XXXXXX;
- Um bilhete de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º K05XXXX(6), cujo portador é EE;
- Um salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXXX, cujo portador é EE;
- Um cartão SIM n.º XXXX;
- Um cartão SIM n.º XXXXG;
- Um telemóvel de cor preta, de marca NOKIA, de modelo 6030, IMEI: 3575XXXX, junto com um cartão SIM n.º XXXXE;
- Um telemóvel de cor preta, de marca PHILIPS, de modelo X710, IMEI: 3560XXXX, junto com dois cartões SIM n.º XXXXS e n.º XXXX1, e um cartão de memória MICRO SD com capacidade de 2GB;
- RMB¥2.845,00.
Através de examinação feita pela PJ, verificou-se que o supracitado bilhete de identidade de residente permanente de Hong Kong n.º K05XXXX(6) e o salvo-conduto para residentes de Hong Kong e Macau para entrada e saída do Continente n.º XXXX eram falsificados.
*
Os 5 arguidos agiram em esforço comum e em divisão de trabalho com os falsificadores de cartões de UnionPay ao utilizar os falsos cartões de UnionPay para levantar dinheiro nas respectivas contas, causando danos patrimoniais aos lesados e intentando ofender direito patrimonial alheio; os arguidos não tiveram sucesso por várias vezes por causas fora do seu controlo, pelo que as suas condutas constituem tentativas de crimes.
Os 5 arguidos sabiam bem que era falsificados os documentos de identidade produzidos por terceiro, ainda os trouxeram para Macau e mostraram aos empregados das lojas em Macau para levantar numerário através de operação de “cash out” com cartão de UnionPay, com a intenção de obter para si e para outros interesses ilegítimos, prejudicando a fé pública nestes tipos de documento e os interesses da RAEM e de terceiros. Os arguidos não tiveram sucesso por várias vezes por causas fora do seu controlo, pelo que as suas condutas constituem tentativas de crimes.
Os 5 arguidos agiram de forma voluntária, livre e consciente ao praticar as supracitadas condutas, sabendo bem que tais condutas eram proibidas e punidas por lei.
*
Mais se provou:
O 2º lesado G pretendeu efectivar as responsabilidades penal e de indemnização civil dos arguidos.
*
O 5º arguido notificou os agentes da PJ e sob instruções destes, agiu de acordo com as exigências dos 2º e 3º arguidos, e os agentes da PJ seguiram-nos às escondidas.
*
De acordo com o CRC, os 5 arguidos não têm registo criminal em Macau.
O 1º arguido alegou que é empregado na cozinha, aufere mensalmente cerca de RMB¥1.800,00, tem a seu cargo os pais e um filho e tem como habilitações literárias o 1º ano da escola secundária.
(…)”; (cfr., fls. 2112-v a 2121 e 2259 a 2282).

Do direito

3. Vem o arguido A recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou pela prática em concurso real de 6 crimes de “furto qualificado” p. e p. pelo art. 198°, n.°2, al. a) do C.P.M., outros 3 na forma tentada, e 1 de “furto (simples)”, p. e p. pelo art. 197°, n.° 1, fixando-lhe o Colectivo a pena única de 7 anos de prisão.

Assaca à decisão recorrida “erro de direito”, considerando violado o art. 29°, n.° 2 do C.P.M., pois que entende que devia ser condenado como autor da prática dos ditos crimes na forma continuada, (considerando, subsidiariamente, que, pelo menos, os ilícitos praticados no dia 29.07.2009, pelas 18:30 e 19:00, o deviam ser), afirmando também que excessiva é a pena.

Vejamos.

–– Quanto ao “crime continuado”.

Sobre tal figura já teve este T.S.I. oportunidade de se pronunciar, afirmando, nomeadamente que:

“O conceito de crime continuado é definido como a realização plúrima do mesmo tipo ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”, e que, a não verificação de um dos pressupostos da figura do crime continuado impõe o seu afastamento, fazendo reverter a figura da acumulação real ou material”; (cfr., v.g., o Acórdão de 21.07.2005, Proc. n.°135/2005, e recentemente, o Acórdão de 10.03.2011, Proc. n.° 563/2009).

E, independentemente do demais, não se vislumbra na matéria de facto dada como provada a mencionada “situação exterior que diminui a culpa do arguido”.

É verdade que teve sucesso em várias das operações de levantamento de numerário e na aquisição de bens, até podendo considerar-se que “fácil” foi efectuá-las.

Todavia, não se pode olvidar que houve sempre um prévio controlo da autenticidade dos documentos utilizados assim como da identidade do utilizador.

E, em nossa opinião, não parece de considerar que a “falha” em tal controlo constitui a dita situação exterior que diminui a culpa do arguido.

Aliás, como se decidiu no Ac. deste T.S.I. de 26.07.2007, Proc. n.° 329/2007, “se o agente actuou sucessivamente, superando obstáculos e resistências ao longo do “iter criminis”, aperfeiçoando a realidade exterior aos seus desígnios e propósitos, sendo ele a dominá-la, e não o inverso, inexistem motivos para que se considere atenuada a sua culpa, não sendo de se considerar os crimes pelo mesmo assim cometidos como um crime continuado”.

Assim, não se mostra de acolher a pretendida qualificação jurídico penal.

–– Porém, e ainda nesta sede, outra questão se coloca.

É que foi a conduta do arguido qualificada como “furto”, não nos parecendo ser a mesma adequada.

Com efeito, não houve “subtracção” de coisa móvel.
O que houve, foi, a “obtenção de património através de meios enganosos”.

De facto, com os “cartões” referidos na matéria de facto, o arguido, simulando a qualidade de seu titular, faz levantamentos de numerário e adquiriu objectos.

Assim, e sem prejuízo de outro entendimento em sentido diverso, cremos que em causa está o crime de “burla” do art. 211° do C.P.M., (onde, no seu n.° 1, e descrevendo os seus “elementos típicos” se preceitua que “quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, por meio de erro ou engano sobre factos que astuciosamente provocou, determinar outrem à prática de actos que lhe causem, ou causem a outra pessoa, prejuízo patrimonial é punido com…”).

Aqui chegados, e não havendo continuação criminosa, vejamos.

Resulta da matéria de facto dada como provada que o ora recorrente agiu em comunhão de esforços com o (2°) arguido (não recorrente) B, afigurando-se-nos assim de acordo com aquela que cometeu em concurso real, 3 crimes de “burla”, na forma tentada (o primeiro, em 29.07.2009, na Joalharia “XX” e os outros 2, em 31.07.2009, nas casas de penhor “XX” e “XX”), e outros 7 crimes de “burla” consumados (ocorridos na loja “XX Jewellery and Watch Trading”, “XX Jewellery Lda”, “XX Jewellery and Watch Lda”, “Ourivesaria Joalharia XX”, “Joalharia XX”, “Ourivesaria Joalharia XX”, e “Joalharia XX”).

Certo sendo que pode este T.S.I. alterar a qualificação oficiosamente jurídico-penal efectuada pelo T.J.B., desde que observado esteja – como está – o contraditório, e respeitado seja também o princípio da “proibição da reformatio in pejus” consagrado no art. 399° do C.P.P.M., assim se decidirá.

Continuemos.

Verifica-se também que foi o arguido ora recorrente absolvido da imputada prática de 7 crimes de “uso de documento falso”, p. e p. pelo art. 243°, al. c), 244°, n.° 1, al. c) e 245° do C.P.M. e da de outros 3, na forma tentada, dado que se entendeu que motivos não havia para a sua condenação por tais crimes de forma autónoma.

Ora, certo sendo que a conduta provada do dito arguido integra os elementos típicos de tais ilícitos, e motivos não havendo para não se afirmar que cometeu o mesmo os referidos crimes em concurso real com os crimes de “burla” que se deixaram explicitados, (neste sentido, cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I., de 13.10.2011, Proc. n.° 534/2011), nesta conformidade se decidirá.

–– Pede também o recorrente a redução da pena, alegando que “é primário, confessa, de forma integral, sem reserva e espontâneo os factos, e ainda se mostra arrependido”, e afirmando que “excessiva”, “inadequada” e “injusta” é a pena única de 7 anos; (cfr., concl. m).

Cremos que não se pode acolher tal pretensão.

Vejamos.

O crime de “burla” (simples) é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se o prejuízo patrimonial for de “valor elevado”, então em causa está a pena de prisão até 5 anos ou multa até 600 dias, sendo aplicável a pena de 2 a 10 anos se o prejuízo for de valor “consideravelmente adequado”; (cfr., art. 211°, n.° 1, 3°, e 4°, al. a) do C.PM.).

Na decisão recorrida, e perante idênticas molduras penais, decidiu o Tribunal a quo fixar em 3 anos e 6 meses de prisão a pena para cada 1 dos 6 crimes de “furto qualificado”, 7 meses de prisão para o de “furto simples”, e a de 2 anos de prisão para cada 1 dos 3 crimes de “furto tentado”.

Ora, atenta a intensidade do dolo (directo) no cometimento dos crimes em questão, a sua forma de cometimento, (em comparticipação), e às necessidades de prevenção criminal, sendo também de notar que da matéria de facto não consta que o ora recorrente tenha confessado de forma integral, espontânea e sem reservas os factos, demonstrando arrependimento, cremos que – com as devidas adaptações – censura não merecem tais penas parcelares, sendo, por isso, de manter.

Por sua vez, e tendo presente o estatuído no art. 71°, n.° 1 e 2 do C.P.M., que preceitua que na determinação da pena única se deve considerar, “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, cremos também que nenhuma censura merece a pena única de 7 anos de prisão pelo Tribunal a quo fixada, que, em nossa opinião, até se mostra benevolente, pois que, para além do demais, contabilizadas não estão as sanções pelos crimes de uso de documento falso pelo recorrente também cometidos.

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, acordam alterar oficiosamente a qualificação jurídica operada pelo T.J.B., negando-se provimento ao recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça de 8 UCs.

Macau, aos 27 de Outubro de 2011
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 584/2011 Pág. 42

Proc. 584/2011 Pág. 1