打印全文
  ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
  
  I – Relatório
  A intentou acção declarativa com processo ordinário contra B e C, pedindo a sua condenação solidária no pagamento de MOP$4.420.805.81, bem como juros legais desde a citação.
  Por sentença de 14 de Fevereiro de 2011, o Presidente do Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base absolveu o réu B do pedido e condenou C no pagamento à autora de MOP$217.169.36 a título de danos patrimoniais e de MOP$150.000.00 a título de danos não patrimoniais.
  O Tribunal de Segunda Instância (TSI) concedeu parcial provimento ao recurso interposto pela autora, condenando os réus a pagar à autora a quantia de MOP$2.003.056.46 (embora o réu B apenas na parte excedente a MOP$1.000.000.00), soma dos seguintes montantes:
  - MOP$153.056.46, de despesas de assistência médica em Hong Kong;
  - MOP$1.000.000.00, de indemnização por danos futuros, por ter de se aposentar por virtude do acidente e não poder ter um salário e pensão de aposentação mais elevados como Agente do Corpo de Polícia de Segurança Pública;
  - MOP$500.000.00, por perda de capacidade para desempenhar funções públicas;
  - MOP$350.000.00, por danos não patrimoniais.
  Inconformados, recorrem a autora A e o réu B para este Tribunal de Última Instância (TUI), pedindo a revogação do Acórdão recorrido.
  Para tal, formula a autora A as seguintes conclusões úteis:
- De acordo com os supracitados factos provados, por a recorrente não estar curada das lesões da vértebra cervical com dores constantes, o médico responsável sugeriu-lhe que fosse submetida à terapêutica profissional e ao tratamento fisioterapêutico, mas a situação da recorrente não ficou melhor, por ainda sentir dores na vértebra cervical, e os seus membros estarem sem força e com paralisia frequente, a recorrente não conseguiu regressar ao trabalho. Por a recorrente não estar curada das lesões após tratamentos médicos de vários meses, a recorrente decidiu recorrer à técnica médica exterior e deslocar-se a uma instituição médica em Hong Kong para se submeter a tratamento médico, só assim é que a recorrente teve oportunidade de recuperar-se e regressar ao trabalho;
- Talvez o tratamento da mesma natureza possa ser realizado em Macau, mas o tratamento da mesma natureza e o tratamento da mesma qualidade são duas concepções diferentes; in casu, o que é necessário para curar as lesões da recorrente não é apenas o tratamento da mesma natureza, mas é mais importante o tratamento da mesma qualidade;
- In casu, a recorrente teve em consideração que os serviços médicos em Hong Kong eram aperfeiçoados e podia receber tratamento adequado, o mais importante é que podia ser curada das suas lesões; a recorrente deslocou-se a hospital em Hong Kong para se submeter a internamento e tratamento médico por não estar curada das lesões após tratamentos médicos de longo tempo nas instituições e unidades médicas em Macau;
- Os juízos de 1ª e de 2ª instância já averiguaram o valor exacto dos danos, razão pela qual a recorrente entende que por existir pressuposto de facto para averiguar o valor exacto dos danos sofridos, os dois juízos não devem aplicar o disposto no art.º 560.º, n.º 6 do Código Civil e julgar equitativamente o valor da indemnização;
- Apesar de a recorrente ter direito a receber pensão de aposentação, a sua capacidade de trabalho é afectada, quer dizer, além de ficar obrigado a abandonar o lugar de origem, é também restrita a possibilidade de fazer outro trabalho e ganhar dinheiro;
- A capacidade da recorrente para trabalhar, para realizar uma actividade física ou espiritual, foi afectada de forma definitiva e permanente, e foi um activo de que ficou privado para sempre;
- Sendo um funcionário público sujeito à aposentação, a recorrente mantém o seu rendimento (pensão de aposentação) mas não pode manter o seu cargo e perde com certeza a oportunidade de promoção;
- In casu, o despacho proferido pelo Secretário para a Segurança em 16 de Julho de 2007 considerou o acidente de viação como um acidente em serviço, e segundo o despacho proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças em 27 de Julho de 2007, a recorrente desligou-se do serviço e ficou sujeita à aposentação compulsiva, recebendo uma pensão de aposentação correspondente ao índice 260 previsto na tabela do índice de vencimento em vigor;
- De acordo com o mapa I a que se refere o n.º 1 do art.º 5.º e o art.º 19.º, n.º 2 da Lei n.º 2/2008 (Reestruturação de carreiras nas Forças e Serviços de Segurança), aprovada em 9 de Abril de 2008, se a recorrente não fosse sujeita à aposentação, o seu índice teria sido alterado para 360 a partir de 1 de Julho de 2007 (de guarda-ajudante para guarda principal), tendo uma diferença de índice 100 com a pensão de aposentação de índice 260 que recebe agora;
- Ao abrigo do disposto no art.º 109.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 66/94/M de 26 de Dezembro, o escalão da recorrente progredirá ao 4º escalão com índice 370, tendo uma diferença de índice 110 com a pensão de aposentação de índice 260 que a recorrente recebe agora;
- A esperança de vida duma pessoa comum é de 75 anos, e calculado a este critério, a recorrente perde a diferença entre o vencimento de exercício e a pensão de aposentação no valor total de MOP$2.453.220.00 (75 anos – 48 anos da recorrente no dia 1 de Julho de 2007 x 14 meses x índice 110 x 59 patacas por índice), mas deve ser descontada a diferença entre 1 de Julho e 31 de Dezembro de 2007 no valor de MOP$2.640,00, calculada à taxa de 55 patacas por índice;
- A recorrente desligou-se do serviço e ficou sujeita à aposentação compulsiva por causa do referido acidente em serviço, não podendo beneficiar da nova carreira devido aos factos alheios à sua vontade e perdendo o direito a vencimento previsto pela nova carreira; para a recorrente, este dano era razoavelmente previsível na altura;
- A Lei n.º 2/2008 (Reestruturação de carreiras nas Forças e Serviços de Segurança) não foi aprovada de um dia para o outro, e antes da sua aprovação em 9 de Abril de 2007, teve um processo de consulta, elaboração e apreciação legislativa que durou vários anos, por isso, segundo o mapa I a que se refere o n.º 1 do art.º 5.º e o art.º 19.º, n.º 2 desta lei, as valorizações indiciárias produzem efeitos desde 1 de Julho de 2007;
- Por isso, a recorrente solicitou em nome do lucro cessante que os réus pagassem a indemnização calculada de forma acima referida no valor não inferior a MOP$2.450.580.00;
- A decisão recorrida, tendo em consideração os factores n.º 1 a n.º 4 acima referidos, reduziu a supracitada indemnização para MOP$1.000.000.00, tal decisão foi contra os assentos dominantes que fixaram indemnização para casos semelhantes;
- Se não fosse o acidente, a recorrente teria sido promovida, pelo que perde não só a diferença de índice 100/110, e mesmo que não seja promovida, é possível que receba maior diferença por causa da alteração de carreira ou do aumento de índice de vencimento;
- A decisão recorrida reduziu a indemnização de MOP$2.450.580.00 para MOP$1.000.000.00, com um decréscimo cerca de 60%, e a recorrente entende que não é proporcional;
- Apesar de a decisão recorrida ter fixado a indemnização pela incapacidade permanente absoluta da recorrente para o exercício das funções públicas em MOP$500.000.00, a recorrente entende que este montante não é proporcional;
- Apesar de a recorrente ter direito a receber pensão de aposentação, a sua capacidade de trabalho é afectada, quer dizer, além de ficar obrigado a abandonar o lugar de origem, é também restrita a possibilidade de fazer outro trabalho e ganhar dinheiro;
- Tendo em consideração todos os elementos e circunstâncias, incluindo a gravidade das lesões da recorrente, o tempo de 3 anos pelo qual duraram as dores, o efeito nocivo que as lesões causaram à capacidade de trabalho, à actividade física e à vida quotidiana da recorrente, e a grave perturbação psicológica e mental, para reparar os danos, a recorrente entende que a indemnização pelos danos não patrimoniais no valor de MOP$600.000.00 é a mais adequada;
  
  O réu B formulou as seguintes conclusões úteis:
  - O direito à indemnização por acidente de viação tem limites e a fixação de um determinado valor deve ser calculado objectivamente, não se compadecendo com as particulares sensibilidades dos lesados; tendo sido feito, em Macau, o diagnóstico correcto no que concerne ao dano corporal que sofreu a Autora/Recorrida - uma hérnia traumática de disco intervertebral cervical -, não se pode concluir que, em Macau, não havia condições para o seu tratamento, tendo sido uma decisão pessoal da Autora, ora Recorrida, a de se deslocar a uma instituição médica em Hong Kong, de onde se conclui que não deve ser reembolsada das despesas ali efectuadas.
  - Deve ser reconhecido à Autora, a título de danos emergentes, o direito a uma indemnização não superior a MOP$64.112.90 (sessenta e quatro mil, cento e doze patacas e noventa avos) pois, não havendo forma de averiguar o valor exacto das despesas que faria em Macau caso não tivesse decidido ir para Hong Kong, essa Alta Instância, nos termos previstos no art.º 560.°, n.º 6, do Código Civil, pode fixar tal valor por se encontrar dentro dos limites que foram dados por provados.
  - Estando provado que a Autora/Recorrida não sofre de incapacidade permanente e definitiva, podendo trabalhar em qualquer outra área, ao mesmo tempo que recebe uma pensão de aposentação correspondente ao índice 260 da tabela salarial acrescida de 4 prémios de antiguidade, a compensação por diferença salarial não deve ser superior a MOP$567.875.00, isto é, a 1/4 do resultado matemático apurado, representando uma compensação justa e equilibrada da perda de ganho enquanto funcionária pública.
  - A Autora/Recorrida ficou, apenas, impossibilitada para o exercício de funções públicas e aos 50 anos, foi forçada à aposentação compulsiva. Este dano, resultante da lesão que sofreu, fica compensado a título de lucros cessantes e, nestas circunstâncias, a atribuição de uma compensação pela perda de capacidade para exercer funções públicas representaria uma duplicação indemnizatória e, por via disso, um enriquecimento da Autora/Recorrida à custa da lesão, não se vendo as razões por que não possa a mesma exercer outra actividade da qual obtenha até um rendimento superior ao seu salário, à data em que passou a ser aposentada; tal dano, nas circunstâncias concretas do caso em apreciação, não deve ser objecto de indemnização autónoma.
  - A apreciação da gravidade do dano não patrimonial deve operar sob um critério objectivo, excluindo-se, tanto quanto possível, da subjectividade inerente a alguma particular sensibilidade do lesado. De toda a factualidade assente, constata-se que a Autora/Recorrida sofreu uma hérnia traumática de disco intervertebral que, obviamente, lhe causou dores e incómodos mas não lhe provocou qualquer sofrimento de índole psicológica ou moral, nem determinou uma incapacidade permanente para ter uma vida activa, pelo que se considera justa e equilibrada uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, fixada em MOP$150.000.00 (cento e cinquenta mil patacas).
  
  II – Os factos
  a) Os factos considerados provados pelo Tribunal de Segunda Instância são os seguintes:
  No dia do acidente, o automóvel de matrícula MK-XX-XX, conduzido pelo 1º R., encontrava-se segurado na 2ª C,a responsabilidade pela indemnização foi transferida, dentro dos limites de indemnização, à 2ª R. conforme consta do contrato de seguros. (A)
  Em 3 de Outubro de 2005, cerca das 09H10, a A. conduziu o automóvel de matrícula MD-XX-XX, procedente da Avenida de Horta e Costa, em direcção à Avenida Dr. Rodrigo Rodrigues, circulando na via de trânsito de acesso ao Túnel da Guia. (B)
  Na data dos factos, a A. foi imediatamente transportada para a Secção de Urgência do Centro Hospitalar Conde de São Januário para se submeter a tratamento de urgência, tendo alta no mesmo dia. (C)
  O 1º R. conduzia o automóvel MK-XX-XX e embateu no automóvel da A. (D)
  Dentro do túnel, o automóvel de matrícula MK-XX-XX, conduzido por D encontrava-se em marcha lenta, seguindo a viatura da A. na sua rectaguarda também de marcha lenta. (1º)
  O automóvel de matrícula MK-XX-XX, conduzido pelo 1º R., que circulava no mesmo sentido, embateu, por trás, na parte central traseira do veículo conduzido pela A., fazendo com que este embatesse na parte traseira do automóvel matrícula MK-XX-XX que se encontrava à sua frente. (2º)
  O automóvel da A. ficou assim entalado entre o automóvel MK-XX-XX, conduzido pelo 1º R., e o automóvel MK-XX-XX, ficando paradas as referidas três viaturas para aguardar a chegada da Polícia. (3º)
  Provado apenas o que consta da resposta dada ao quesito 2º. (4º)
  Do embate resultou directa e necessariamente para a A. as lesões da vértebra cervical decorrentes do choque. (5º)
  Foi diagnosticada que sofreu de hérnia traumática de disco intervertebral cervical. (6º)
   Na altura em que ocorreu o acidente, o estado de tempo era bom, a iluminação era suficiente, o pavimento estava seco e limpo e a densidade de trânsito era normal. (7º)
  Quando o 1º R. conduziu até ao local dos factos não conseguiu travar o seu veículo a tempo, pelo que, embateu no da A., causando-lhe as lesões acima referidas. (8º)
  Por ainda sentir dores no pescoço, tontura e náusea, dirigiu-se, na noite do mesmo dia, ao Hospital Kiang Wu para consulta médica, onde foi submetida a tratamento médico, nomeadamente tratamento ortopédico em medicina chinesa. (9º)
  Por os seus membros estarem sem força e com paralisia (nomeadamente com dificuldades em pegar em objectos com os dedos da mão direita), aliado ao facto de ter às vezes incontinência da urina, tinha que se submeter a tratamentos médicos na consulta externa do referido hospital, nomeadamente referentes ao medicamento, à acupunctura, à tracção cervical, à massagem “Tuina” (técnico), ao treinamento funcional, à máquina para terapia neuromuscular e à medicina tradicional chinesa. (10º)
  Tendo em conta que a A. não conseguiu ficar curada das lesões da vértebra cervical com dores constantes, o médico responsável sugeriu-lhe que fosse submetida à terapêutica profissional e ao tratamento fisioterapêutico. (12º)
  Durante o período em que sujeitava a tratamentos médicos, a A. não conseguiu trabalhar. (13º)
  A A. por sentir dores na vértebra cervical, com debilidade e paralisia frequente dos seus membros, não conseguiu regressar ao trabalho. (15º)
  Por a A. ainda não estar curada das lesões após tratamentos médicos de vários meses, a A. decidiu deslocar-se a uma instituição médica em Hong Kong para se submeter a tratamento médico. (16º)
  Para esse efeito, a A. dirigiu-se ao “Hong Kong Baptist Hospital” para se submeter a tratamento médico, tendo ficado internada no hospital para ser submetida a vários tratamentos farmacoterapêuticos e fisioterapêuticos. (17º)
  Até a presente data, a A. despendeu MOP$256.00 em despesas médicas na Secção de Urgência do Centro Hospitalar Conde de São Januário de Macau (anexo n.º 17) e MOP$62,704.00 em despesas médicas e despesas com a emissão dos certificados na Consulta Externa do Hospital Kiang Wu. (18º)
  E despendeu MOP$260.00 em despesas médicas na consulta do Hospital da Universidade da Ciência e Tecnologia de Macau. (19º)
  Mais despendeu MOP$542.50 para comprar suporte cervical e aparelho de tracção cervical em Macau e MOP$230.40 para comprar “Chili” Brand Porous Capsicum External Medicated Plaster. (20º)
  E para consulta médica no consultório de E, a A. despendeu MOP$120.00 (21º)
  Para se submeter a tratamento médico no “Hong Kong Baptist Hospital”, a A. despendeu HKD$252,833.00, equivalente a MOP$260,417.99, em despesas médicas. (22º)
  Mais despendeu HKD$43,850.00, equivalente a MOP$45,165.50, em despesas de medicamento no consultório de F, em Hong Kong. (23º)
  Durante o período em que esteve internada no “Hong Kong Baptist Hospital”, por ter requerido a autorização para prorrogação de permanência junto do Departamento de Imigração da RAEHK, pagou despesas no valor de HKD$320.00, equivalente a MOP$329.60, e despendeu HKD$194.00, equivalente a MOP$199.82, em despesas de deslocação (táxi). (24º)
  Durante o período em que esteve submetida a tratamentos médicos, a A. precisava, na vida quotidiana, de usar o suporte cervical para fixação e protecção, e utilizou com frequência o aparelho de tracção cervical para o tratamento, mesmo depois de ter alta, tinha que ir à consulta externa das Secções de Ortopedia e de Fisioterapia para acompanhamento das lesões. (25º)
  Quer na altura da ocorrência do acidente de viação quer no período em que esteve submetida a tratamentos médicos, a A. teve dores. (26º)
   Até à data da propositura da presente acção, a A. ainda sente dores, mesmo se movimentar um pouco mais a parte lesionada (pescoço), e quando o tempo muda de repente e apanha humidade e vento, as dores tornam-se mais fortes. (27º)
  Por algumas vezes, a A. tem dificuldades em adormecer à noite devido às dores, e mesmo que consiga dormir, acorda com dores, o que lhe tem provocado distracção e languidez. (28º)
  Sempre que a A. trabalha física ou intelectualmente por longo período de tempo ou exerce força na parte lesionada, sente dores nesta parte e não consegue praticar desporto violento. (29º)
  Das lesões do pescoço resultou para a A. limitações de extensão e rotação cervical, bem como dores constantes, o que tem afectado a sua vida quotidiana e a capacidade de trabalho. (30º)
  Durante o período de tratamento, a A. foi acompanhada por vezes por algum membro da família, nomeadamente quando foi às consultas médicas. (32º)
  Na altura do acidente, a A. tinha 46 anos, e, antes do acidente, tinha boa saúde, sem padecer de doenças. (33º)
  Devido a essa doença relativamente prolongada, a A. ficou muito preocupada e com um temperamento instável e colérico. (34º)
  Considerando que não houve grande melhoria, a A. teve outras consultas médicas, e ficou muito preocupada e cansativa. (36º)
  Antes de se aposentar, a A. trabalhava como guarda-ajudante do 3º escalão do 3º Comissariado afecto à P.S.P., auferindo um salário base ilíquido de MOP$14,300.00. (38º)
  A A. aufere prémios de antiguidade de MOP$760.00. (39º)
  A A. gozou da licença por doença por 18 meses, contado a partir da data em ficou ferida em consequência do acidente até 27 de Março de 2007, e na conferência da Junta de Saúde realizada em 22 de Junho de 2007, ficou assente que a A. tinha sofrido a incapacidade permanente absoluta para o exercício das funções públicas a partir de 27 de Março de 2007. (40º)
  Por despacho do Secretário para a Segurança proferido em 16 de Julho de 2007, considerou-se o referido acidente de viação como um acidente em serviço no processo de acidente n.º XX/XXXX/B instaurado em relação à A., tendo posteriormente procedido ao arquivamento. (41º)
  De acordo com o despacho do Secretário para a Economia e Finanças proferido em 27 de Julho de 2007, a A., em consequência do acidente em serviço, sofreu a incapacidade permanente absoluta para o exercício das funções públicas, desligou-se do serviço e ficou sujeita à aposentação compulsiva, recebendo uma pensão de aposentação correspondente ao índice 260 previsto na tabela do índice de vencimento em vigor, acrescida dos quatro prémios de antiguidade. (42º)
  A sua capacidade para trabalhar, para realizar uma actividade física ou espiritual, foi afectada. (44º)
  Provado o que consta do resposta dada ao quesito 42º. (45º)
  Depois do acidente, o automóvel do 1º R. ficou danificado na parte de para-choque dianteiro, deixando uma pequena amolgadela, produzida pela parte terminal do tubo de escape do automóvel da A. no para-choque do automóvel do 1º R. (53º)
  Provado o que consta da resposta dada ao quesito 8º. (55º)
  Provado o que consta das respostas dadas ao quesitos 40º e 42º. (57º)
  A A. foi internado no hospital de Hong Kong entre os dias 6 de Outubro e 18 de Novembro de 2006, e entre 16 e 29 de Dezembro de 2006. (58º)
  
  III – O Direito
1. As questões a resolver
São as seguintes as questões a resolver:
  Relativamente às despesas médicas em Hong Kong, que o TSI fixou em MOP$153.056.46, a autora pretende ser indemnizada em MOP$306.112.92 e o réu B que a mesma indemnização seja fixada em MOP$64.112.90.
  Quanto ao montante de MOP$1.000.000.00, de indemnização por danos futuros, por a autora ter de se aposentar por virtude do acidente e acidente e não poder auferir um vencimento mais elevado como Agente da Polícia de Segurança Pública, fixado pelo TSI, pretende a autora a alteração do mesmo montante para MOP$2.450.580.00, enquanto o réu B entende que tal montante não deve ser superior a MOP$567.875.00.
  O TSI fixou em MOP$500.000.00 o montante por perda de capacidade para desempenhar funções públicas. A autora pretende a sua elevação para montante não inferior a MOP$1,000,000.00, enquanto que o réu B entende que haveria uma duplicação com a verba pela perda de valor da pensão de aposentação.
  Relativamente à indemnização por danos não patrimoniais, fixado pelo TSI em MOP$350.000.00, pretende a autora a sua alteração para montante não inferior a MOP$600.000.00, e o réu B em MOP$150.000.00.
  São estas questões, atinentes aos montantes indemnizatórios, que o Tribunal conhecerá.
  O réu B suscitou uma outra questão, que este tribunal não conhecerá, relativa ao grau de culpa na produção do acidente, atribuída na sentença de 1.ª Instância, na totalidade, ao réu B, questão não conhecida pelo TSI, por ninguém a ter suscitado. O réu entende que deve haver distribuição de culpas, em igualdade, à autora e ao réu, tendo também em atenção o nexo de causalidade entre a conduta dos dois condutores e o dano corporal sofrido pela autora.
  E a razão para não se conhecer da questão é esta. O réu não suscitou tal questão no recurso interposto pela autora para o TSI, tendo o ónus de o fazer, nos termos do artigo 590.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável por analogia. Por isso, não tendo sido objecto de apreciação do TSI, não cabe ao TUI apreciar tal questão.
  
  2. Despesas de assistência médica em Hong Kong
  Provou-se nos autos que a autora despendeu MOP$306.112.91 em despesas de assistência médica em Hong Kong.
  O Tribunal de 1.ª Instância considerou que a autora poderia ter efectuado tais tratamentos em Macau, pelo que a sua opção por fazê-los em Hong Kong, por se tratar de serviços de qualidade provavelmente mais elevada, não devem ser pagas na totalidade pelos réus. Equitativamente, impôs o pagamento aos réus de metade de tais despesas, decisão com a qual o TSI concordou, com fundamento em não haver indícios de que o tratamento em Hong Kong foi melhor do que o teria sido em Macau.
  Antes de mais, vejamos o que se provou:
  É indiscutível que a autora foi examinada por médicos em Hong Kong e aí recebeu tratamentos, nos quais despendeu MOP$306.112.91.
  Temos, também, por certo, por se tratar de factos notórios, por serem do conhecimento geral – não sujeitos a alegação das partes, nem a prova, nos termos do artigo 434.º, n.º 1, do Código de Processo Civil – que:
  i) Em Hong Kong realizam-se intervenções cirúrgicas e tratamentos médicos que não são realizados em Macau apenas com os recursos locais, tais como transplantes de órgãos e tecidos, certas intervenções cirúrgicas sofisticadas nas áreas cardíaca e de neurologia, designadamente;
  ii) Relativamente aos serviços médicos especializados, é possível obter em Hong Kong uma qualidade superior aos que se realizam em Macau. Em Hong Kong é possível proporcionar ao doente um tratamento melhor do que beneficiaria em Macau.
  Convém clarificar este segundo facto. Nem todos os serviços médicos feitos em Hong Kong são superiores aos executados em Macau, como é óbvio. Mas, em termos gerais, médios, pelo menos quanto aos serviços mais especializados, é possível receber tratamentos em Hong Kong mais sofisticados do que em Macau.
  Relativamente aos factos mencionados em i), afigura-se-nos que se o lesado se dirige a Hong Kong para receber tais tratamentos, o lesante está obrigado a ressarcir o lesado das despesas tidas com os mesmos tratamentos.
  Trata-se apenas de aplicação do princípio geral em matéria de obrigação de indemnização por factos ilícitos, segundo o qual aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação (artigo 477.º do Código Civil).
  Quanto aos mencionados em ii), desde que se prove que o tratamento em Hong Kong é necessário para a cura ou a recuperação possível do doente, também nos parece que o lesante deve ressarcir na totalidade as despesas com tais tratamentos.
  É o que parece defender ARMANDO BRAGA1quando, a propósito da indemnização do custo dos tratamentos médicos e outros conexos, refere: “Em caso de necessidade de hospitalização do sinistrado, esta deverá ocorrer em estabelecimentos que reúnam as condições necessárias ao seu restabelecimento e à sua reabilitação. Quando se revele necessário e justificado, poderá a vítima recorrer a estabelecimento hospitalar situado no estrangeiro”.
  Ora, a autora alegou os seguintes factos que foram objecto de prova perante o tribunal colectivo:
16.º
  Tendo em conta que a Autora não ficou curada das lesões após tratamentos médicos de vários meses, não lhe restou outra alternativa senão procurar acesso à tecnologia médica do estrangeiro, pelo que a Autora decidiu deslocar-se a uma instituição médica em Hong Kong para se submeter a tratamento médico, e só assim fazendo, a Autora é que poderia ter oportunidade de ficar curada das lesões, de modo a regressar ao trabalho com a maior brevidade possível?
17.º
  Para esse efeito, a Autora dirigiu-se ao “Hong Kong Baptist Hospital” para se submeter a tratamento médico, e após o diagnóstico a que esteve sujeita, a Autora tinha que se manter internada no hospital para se submeter a tratamento médico, tendo, durante o internamento, sido submetida a vários tratamentos farmacoterapêuticos e fisioterapêuticos?
  Ora a matéria do quesito 16.º da base instrutória, recebeu a seguinte resposta do tribunal:
  Por a A. ainda não estar curada das lesões após tratamentos médicos de vários meses, a A. decidiu deslocar-se a uma instituição médica em Hong Kong para se submeter a tratamento médico. (16º)
  E a do quesito 17.º teve a seguinte resposta:
  Para esse efeito, a A. dirigiu-se ao “Hong Kong Baptist Hospital” para se submeter a tratamento médico, tendo ficado internada no hospital para ser submetida a vários tratamentos farmacoterapêuticos e fisioterapêuticos. (17º).
  Pois bem, não se provou a necessidade de a autora se deslocar a Hong para obter tratamento que em Macau não lograria obter ou que em Macau teria, mas de qualidade inferior.
  Logo, não se pode impor ao réu o pagamento total de tais despesas.
  Não obstante, não há dúvida que a autora realizou tais tratamentos em Hong Kong. Se os tivesse feito em Macau o lesante teria de os ressarcir na totalidade.
  Assim, concordamos com a decisão do TSI de, equitativamente, impor ao lesante o pagamento de uma parte dessas despesas. Fixou tal percentagem em 50%. No caso em apreço afigura-se-nos razoável tal percentagem, visto o demandado não ter alegado nem provado, por exemplo, a sumptuosidade das instalações utilizadas, caso em que não haveria lugar a indemnização.
  
  3. Indemnização por danos futuros. Pensão de aposentação
  Quanto ao montante que foi fixado pelo TSI, de MOP$1.000.000.00, a título de indemnização por danos futuros, por a autora ter de se aposentar por virtude do acidente e não poder auferir um vencimento mais elevado como Agente da Polícia de Segurança Pública, face à normal evolução na carreira, pretende a autora a alteração do mesmo montante para MOP$2.450.580.00, enquanto o réu B entende que tal montante não deve ser superior a MOP$567.875.00.
  Ora, com interesse para a decisão da questão, provou-se o seguinte:
  Na altura do acidente, a A. tinha 46 anos (33º).
  Antes de se aposentar, a A. trabalhava como guarda-ajudante do 3º escalão do 3º Comissariado afecto à P.S.P., auferindo um salário base ilíquido de MOP$14,300.00. (38º)
  A A. aufere prémios de antiguidade de MOP$760.00. (39º)
  De acordo com o despacho do Secretário para a Economia e Finanças proferido em 27 de Julho de 2007, a A., em consequência do acidente em serviço, sofreu a incapacidade permanente absoluta para o exercício das funções públicas, desligou-se do serviço e ficou sujeita à aposentação compulsiva, recebendo uma pensão de aposentação correspondente ao índice 260 previsto na tabela do índice de vencimento em vigor, acrescida dos quatro prémios de antiguidade. (42º)
  Por outro lado, face ao disposto nos artigos 5.º, n.º 1 e mapa I, 13.º, n.º 1, 19.º, n.º 2 da Lei n.º 2/2008, os guardas-principais, 3.º escalão, passaram a ser abonados pelo índice 360, a partir de 1 de Julho de 2007 e de acordo com o artigo 109.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º66/94/M, de 26.12, a autora passaria para o 4.º escalão, com o índice 370, a partir de 1 de Agosto de 2007.
  O índice 100 da tabela de vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública corresponde a MOP$5.250.00, a partir de 1 de Janeiro de 2005, a MOP$5.500.00, a partir de 1 de Janeiro de 2007, a MOP$5.900.00, a partir de 1 de Janeiro de 2008, a MOP$6.200.00, a partir de 1 de Janeiro de 2011 e a MOP$6.600.00, a partir de 1 de Maio de 2012.
  Isto é, se a autora estivesse ao serviço estaria ser abonada do índice 370 desde de 1 de Agosto de 2007, sendo que o seu índice da pensão de aposentação é e continuará a ser para sempre o 260.
  O valor do índice 100, progressivamente aumentado desde 2007 e que previsivelmente, também continuará a ser no futuro, não constitui um dado muito importante, ao contrário do que pretende a autora. Esquece esta que desde 2007 (e anteriormente) existe inflação e que no futuro previsível é muito mais expectável que haja inflação que deflação. Logo, os vencimentos públicos continuarão a aumentar em termos nominais, mas não é certo que tal alteração corresponda a um aumento em termos reais.
  Por outro lado, admite-se que a autora, se continuasse no activo, ainda poderia progredir na carreira, obtendo, assim, um vencimento superior. Mas a progressão não seria muito significativa, seguramente, face à sua idade.
  Alega a autora que face à sua idade actual (48 anos) e à expectativa de vida até aos 75 anos a diferença de valor entre o vencimento que auferia no activo e, posteriormente, na aposentação, e a pensão de aposentação que já lhe está fixada, corresponde a MOP$2.453.220.00. Isso é certo. Mas tal montante seria auferido durante 27 anos, enquanto que, por via da presente acção, ela receberá um capital de imediato, que poderá aplicar como lhe aprouver. ARMANDO BRAGA2pondera que quando está em causa o recebimento de um capital, de uma só vez, para compensar aquilo que só se deveria receber ao longo to tempo, fraccionadamente, há que deduzir o desconto necessário, pois a não ser assim, os beneficiários da indemnização enriqueceriam sem causa.
  Por outro lado, não há qualquer garantia de que a autora viva até aos 75 anos. Pode até viver até uma idade muito superior, mas isso também pode não acontecer.
  Tudo ponderado, julgamos que o valor fixado pelo acórdão recorrido (MOP$1.000.000.00), para ressarcir as diferenças de vencimento e pensão de aposentação da autora, foi criteriosamente fixado.
  
  4. Perda da capacidade de ganho por incapacidade permanente absoluta para o exercício de funções públicas
  A autora está aposentada. Aufere pensão de aposentação. Mas nada obstaria a que, estando aposentada, pudesse exercer qualquer actividade remunerada pública. Contudo, foi declarada a sua incapacidade permanente absoluta para o exercício de funções públicas.
  Desconhece-se se a autora está ou não incapacitada permanentemente, e em que grau, para o trabalho.
  Mas a autora pediu MOP$1.000.000.00 apenas pela incapacidade permanente para o exercício de funções públicas e nada mais.
  Como referimos no Acórdão de 25 de Abril de 2007, no Processo n.º 20/2007, cujas considerações se aplicam ao caso dos autos:
<3.2. Ora, quando o trabalhador sofre uma lesão permanente na sua capacidade de ganho, isto é, quando o trabalhador fica permanente e parcialmente incapacitado para o trabalho mas, por circunstâncias várias, continua a auferir o mesmo salário que auferia antes da lesão (execute ou não o mesmo trabalho), deve ou não ser indemnizado por tal facto?
O TJB considerou não dever ser o lesado indemnizado, por não se poder prever o prejuízo do ofendido, mas decidiu mal.
   O lesado já sofreu um prejuízo. Não se trata de danos futuros, mas de danos presentes. O lesado ficou com a sua capacidade de ganho diminuída a partir do momento em que teve alta médica. Está definitiva e irremediavelmente incapacitado para o trabalho, no futuro, em 70% (incapacidade geral). Trata-se de um dano actual e não futuro. O que pode constituir um dano futuro é a diferença de rendimentos do trabalho que pode vir a sofrer se passar a auferir um salário inferior ao actual ou mesmo se deixar de auferir qualquer rendimento do trabalho por força da sua incapacidade. Como bem referiu a recorrente, apenas a perda de ganho é um dano futuro. A perda da capacidade de ganho é um prejuízo sofrido (já existente) e verificável.
   Trata-se, portanto, de um dano emergente e não de um lucro cessante.3
Mas o lesado não veio pedir ao processo os salários que deixaria de ganhar no futuro. O que o lesado pediu foi a indemnização pela afectação da sua capacidade de trabalho (embora no seu cálculo tenha utilizado o salário mensal que auferia).
Indiscutivelmente que o dano sofrido pelo lesado é ressarcível. Embora o seu salário se mantenha, a sua capacidade para o trabalho ficou afectada. Ora, nada obsta a que qualquer pessoa – salvo incompatibilidades legais – possa efectuar outro trabalho, para além da sua ocupação habitual, e usufruir os respectivos rendimentos. Esta possibilidade ficou afectada substancialmente no que toca ao lesado.
Da mesma maneira, mesmo que alguém não exerça um trabalho – por conta própria ou alheia – seja porque tem rendimentos de outra natureza, como de propriedade fundiária ou intelectual ou de capitais – seja porque não tem quaisquer rendimentos e vive a cargo de outrem, sempre terá direito a ser indemnizado pela incapacidade permanente parcial para o trabalho em geral, porque a sua capacidade para trabalhar, para realizar uma actividade física ou espiritual, foi afectada de forma definitiva e permanente. Foi um activo de que ficou privado para sempre e de que deve ser indemnizado nos termos gerais.
É neste sentido para que tem propendido a doutrina.4
Por outro lado, actualmente, o lesado, como funcionário público, mantém as funções e o vencimento. Mas todos os residentes gozam do direito de liberdade de escolha de profissão e de emprego, conferida pelo art. 35.º da Lei Básica. O lesado dificilmente poderá usufruir deste direito, eventualmente para auferir salário superior, face à diminuição substancial da sua capacidade de ganho. Também por esta razão é evidente que o dano do lesado é actual.

4. Cômputo da indemnização por perda da capacidade de ganho. Equidade
No caso, como é óbvio, a reconstituição natural não é possível. O lesado ficou com uma incapacidade permanente de 70% e não é possível suprimi-la. Logo, a indemnização tem de ser fixada em dinheiro, como resulta do n.º 1 do art. 560.º do Código Civil.
De acordo com o n.º 5 do art. 560.º do Código Civil, “Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos”.
Numa situação como a dos autos, em que está em causa a indemnização por perda da capacidade de ganho, a norma transcrita não resolve todos os problemas, por isso que o n.º 6 do mesmo artigo 560.º estatui:
“Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julga equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.
É para casos como o dos autos que está indicado, pois, o recurso à equidade [cfr. também a alínea a) do art. 3.º do Código Civil], sem prejuízo de se atenderem aos outros factos provados pertinentes, como a idade da vítima, o seu estado físico antes da lesão, o seu salário actual e o seu emprego, as suas habilitações académicas, as suas perspectivas profissionais antes e depois da lesão>.
Face aos factos provados, à idade da autora e à circunstância de a autora apenas pretender o ressarcimento da incapacidade para o exercício de funções públicas (até porque outra incapacidade para o trabalho se não provou), entendemos que o valor fixado pelo TSI (MOP$500.000.00) é algo exagerado, pelo que o fixamos em MOP$200.000.00.
  
  5. Indemnização por danos não patrimoniais
  Os factos pertinentes são os seguintes:
  Quer na altura da ocorrência do acidente de viação quer no período em que esteve submetida a tratamentos médicos, a A. teve dores. (26º)
   Até à data da propositura da presente acção, a A. ainda sente dores, mesmo se movimentar um pouco mais a parte lesionada (pescoço), e quando o tempo muda de repente e apanha humidade e vento, as dores tornam-se mais fortes. (27º)
  Por algumas vezes, a A. tem dificuldades em adormecer à noite devido às dores, e mesmo que consiga dormir, acorda com dores, o que lhe tem provocado distracção e languidez. (28º)
  Sempre que a A. trabalha física ou intelectualmente por longo período de tempo ou exerce força na parte lesionada, sente dores nesta parte e não consegue praticar desporto violento. (29º)
  Das lesões do pescoço resultou para a A. limitações de extensão e rotação cervical, bem como dores constantes, o que tem afectado a sua vida quotidiana e a capacidade de trabalho. (30º)
  Durante o período de tratamento, a A. foi acompanhada por vezes por algum membro da família, nomeadamente quando foi às consultas médicas. (32º)
  Na altura do acidente, a A. tinha 46 anos, e, antes do acidente, tinha boa saúde, sem padecer de doenças. (33º)
  Devido a essa doença relativamente prolongada, a A. ficou muito preocupada e com um temperamento instável e colérico. (34º)
  Considerando que não houve grande melhoria, a A. teve outras consultas médicas, e ficou muito preocupada e cansativa. (36º).
  O acórdão recorrido fixou os danos não patrimoniais em MOP$350.000.00, a autora pretende MOP$600.000.00 e o réu entende justo e equilibrado um montante de MOP$150.000.00.
De acordo com o n.º 3 do artigo 489.º do Código Civil, o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 487.º, onde se dispõe que, quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, pode a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem.
  Parece-nos justa uma indemnização de MOP$250.000.00.
  Assim, a totalidade da indemnização a que a autora tem direito é de MOP$1.603.056.46, tendo o réu B de suportar MOP$603.056.46.
  
  IV – Decisão
  Face ao expendido, concedem parcial provimento ao recurso do demandado e negam provimento ao recurso da demandante, revogam parcialmente o acórdão recorrido e condenam o réu B a pagar à autora a quantia de MOP$603.056.46 (seiscentas e três mil e cinquenta e seis patacas e quarenta e seis avos).
  Custas dos recursos neste TUI nas proporções dos respectivos vencimentos. A mesma regra se aplica às custas da acção e do recurso para o TSI.
  Macau, 7 de Novembro de 2012.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai
  

    1 ARMANDO BRAGA, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Extracontratual, Coimbra, Almedina, 2005, p. 112.
    2 ARMANDO BRAGA, A Reparação…, p. 148.
   3 Nota do Relator: o Relator corrige, assim, a afirmação, feita noutro local, que a perda da capacidade de ganho constitui lucro cessante.
4 AMÉRICO MARCELINO, Acidentes de Viação e Responsabilidade Civil, Lisboa, Livraria Petrony, 6.ª edição, p. 453 e seg. E não falte mesmo quem defenda, como é caso da mais alta instância judicial italiana, o Tribunal de Cassação, em decisão de 6 de Junho de 1981, que “O dano dito biológico, enquanto lesivo do direito à saúde, que por explícito ditame constitucional é direito fundamental do indivíduo, deve ser ressarcível mesmo que não incidindo sobre a capacidade de produzir ganhos e mesmo independentemente desta última”. Citado por J.A. ÁLVARO DIAS, Dano Corporal, Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Coimbra, Almedina, 2001, p. 131, nota 278.
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------




1
Processo n.º 62/2012