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Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau



Recurso penal
N.° 11/ 2002

Recorrente: A





1. Relatório
   O arguido A, recorrente nos presentes autos, foi condenado em 18 de Janeiro de 2002 por acórdão do Tribunal Judicial de Base, proferido no âmbito do processo comum colectivo n.° PCC-075-01-1 pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente previsto e punido pelo art.° 8.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 5/91/M na pena de oito anos e um mês de prisão e multa de 8000 patacas, com a alternativa de 50 dias de prisão.
   Seguidamente, o arguido interpôs recurso ao Tribunal de Segunda Instância, alegando que é diminuta a quantidade total de 3,594g (gramas) de Metanfetamina e Ketamina contidas nos 40 comprimidos apreendidos do seu corpo e noutros 20 que estavam na sua posse, e que se deve considerar que, com as suas condutas, apenas cometeu o crime de tráfico de quantidades diminutas previsto no art.° 9.°, n.°s 1 e 3 do referido Decreto-Lei, pedindo, em consequência, a redução da pena e a suspensão da sua execução. O Tribunal de Segunda Instância proferiu, em 4 de Abril de 2002, o primeiro acórdão no recurso n.° 39/2002, entendendo que os 60 comprimidos com Metanfetamina e Ketamina excede largamente a quantidade diminuta no sentido legal. Assim julgou rejeitar o recurso por manifesta improcedência.
   Contra o acórdão do Tribunal de Segunda Instância, o arguido recorreu para o Tribunal de Última Instância suscitando as mesmas questões. Após o julgamento, o presente Tribunal julgou, em 30 de Maio de 2002 no recurso penal n.° 7/2002, que, para determinar se a quantidade de droga é diminuta nos termos legais, mesmo que esta se apresente como comprimidos ou pílulas, no pressuposto da viabilidade técnica, é necessário conhecer e ter por critério a quantidade da substância de droga contida naqueles. A respectiva quantidade consta do relatório do exame mas já não da matéria de facto provada, o que consubstancia, no acórdão recorrido, o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Por isso, foi anulado o acórdão do Tribunal de Segunda Instância e determinada a baixa do processo àquele tribunal para apurar a quantidade de Metanfetamina nos 40 comprimidos encontrados na posse do recorrente e proferir nova decisão em conformidade com a doutrina exposta no acórdão do presente Tribunal.
   Nestes termos, no seu acórdão de 18 de Julho de 2002, o Tribunal de Segunda Instância aditou o seguinte facto à matéria de facto fixada pelo Tribunal Judicial de Base: “O peso líquido total de Metanfetamina contida nos 40 comprimidos apreendidos ao arguido e enviados ao exame do Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária, realizado a pedido dele formulado e deferido na audiência de 10 de Dezembro de 2001, é de 1,198 gramas.” E considerou que não constituíam droga de quantidade diminuta os 40 comprimidos que continham 1,198g de Metanfetamina. Julgou, assim, improcedente o recurso apresentado pelo arguido do acórdão do tribunal de primeira instância de 18 de Janeiro de 2002.
   
   Vem, agora, o arguido recorrer deste último acórdão do Tribunal de Segunda Instância para o Tribunal de Última Instância e apresenta as seguintes conclusões da motivação:
“1. É admissível o presente recurso para essa Alta Instância.
   2. O Venerando Tribunal recorrido incorreu na violação de normas de direito substantivo – erro de direito enunciado no n.º 1 do art.º 400.º do C.P.Penal.
   3. Quando se está perante uma situação em que o Tribunal de julgamento já esgotou os seus poderes de indagação em matéria de facto, existindo insuficiência, esta traduz-se em erro de qualificação jurídica dos factos que dá lugar à revogação da decisão recorrida.
   4. O douto Acórdão recorrido subsumiu a conduta do ora recorrente à autoria de um crime do art.º 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 5/91/M, quando tal conduta integra um crime do art.º 9.º, n.ºs 1 e 3 do mesmo diploma, uma vez que o total da substância proibida metanfetamina detectada nos 40 comprimidos que lhe foram apreendidos deve ser considerado quantidade diminuta pois eles continham um total de 1,198g daquela substância, sendo certo que na apreciação do presente recurso – cfr. decidiu o Tribunal recorrido – há tão só que atender à substância metanfetamina contida nos 40 comprimidos em relação à qual se apurou o seu peso líquido.
   5. Não estando preenchido o conceito de “quantidade diminuta” na lei – que apenas refere “a que não excede a quantidade necessária para o consumo individual durante três dias” -, há que recorrer ao entendimento expresso na Jurisprudência dos nossos Tribunais que aponta para os 2 (dois) gramas diários quando se trata da substância “metanfetamina”, um dos componentes contidos nos comprimidos encontrados na posse do recorrente.
   6. Não pode aceitar-se a tese que fez vencimento no Ac. recorrido por ser inteiramente de rejeitar o entendimento de que, tratando-se de drogas sintéticas em comprimidos ou em pílulas, só é de considerar o número dos mesmos em termos de unidade para os efeitos penais a relevar no tipo legal do art.º 9.º do DL n.º 5/91/M.
   7. Não só a lei não faz essa distinção como se refere expressamente a《quantidades de substâncias ou preparados》nos n.°s 1 e 3 do citado art.º 9.º.
   8. É inequívoco que o legislador quis privilegiar (pela menor ilicitude do facto indiciada) os que trafiquem quantidades diminutas de substâncias ou preparados, irrelevando, no princípio que formula, o tipo ou a natureza da droga, porque o que está em causa é uma substância ou um preparado proibido.
   9. É um facto notório o conhecimento de que na região de Dju-Hoi, adjacente à RAEM, é frequente a venda de comprimidos vulgarmente designados por Ice que, para além dos excipientes, não contêm a substância estimulante que se supunha integrá-los.
   10. A droga de tipo sintético assume menor gravidade do que a droga pura, sob a forma de cristais ou pó, precisamente porque surge sempre misturada com outros produtos anódinos, impondo-se, redobradamente, a necessidade da quantificação das substâncias ou preparados proibidos para fins criminas, sob pena de se punirem os chamados crimes impossíveis
   11. Admitir como bom o entendimento perfilhado pelo M.mo Juiz que subscreveu o voto de vencido no Ac. de 4 de Abril de 2002 do TSI – com a incerteza que domina o raciocínio expresso – no sentido de uma alteração súbita e imponderada dos valores definidos pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores – quanto ao conceito de quantidades diminutas – corresponderia a uma grave incerteza na aplicação do direito, geradora de alarme social.
   12. O arresto ora recorrido – em obediência à precedente decisão dessa Suprema Instância – começou por inscrever na factualidade apurada o peso total de metanfetamina contida nos 40 comprimidos apreendidos ao arguido ora recorrente: 1 grama e 198 miligramas, assim sanando o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
   13. O apelo feito na decisão recorrida às《regras da experiência vividas pela generalidade dos consumidores de metanfetamina (...) a fim de formar a convicção do julgador a nível da emissão do juízo de valor sobre a verificação ou não in casu de quantidade diminuta (...) já que, aliás, não se provou nos autos qual a quantidade consumida individualmente pelo arguido ora recorrente e se o fazia todos os dias》 não é o cominho necessário ao cumprimento da orientação decorrente da precedente decisão do TUI.
   14. Se o tribunal ora recorrido cumpriu a decisão de 30 de Maio de 2002 do TUI no que concerne ao apuramento da quantidade líquida de substância proibida contida nos 40 comprimidos apreendidos ao recorrente, já deixou, manifestamente, de cumprir aquela douta decisão no que concerne à obrigatoriedade de《proferir decisão em conformidade com a doutrina ali exposta》, isto é, a questão de saber qual é a quantidade de substância metanfetamina que deve ser considerada《que não excede o necessário para consumo individual para três dias》para os fins do art.º 9.º, n.º 3 do DL n.º 5/91/M, para, então, se concluir no sentido do correcto enquadramento jurídico-penal dos factos apurados contra o arguido ora recorrente.
   15. A argumentação expendida na tese que fez vencimento no Ac. recorrido nada alterou a tese que fizera vencimento no anterior Ac. de 4 de Abril de 2002 do mesmo Tribunal e que fora anulado pelo TUI, havendo-se voltado a decidir (embora de modo menos explícito) que o que conta ao preenchimento do tipo do art.º 8.º do DL n.º 5/91/M é não a quantidade líquida de substância proibida contida nos comprimidos apreendidos mas sim o seu número, como claramente resulta da afirmação contida naquele arresto (pág. 30, ao cimo) de que o recorrente (como o comum dos consumidores)《não poderia consumir 13 comprimidos por dia》.
   16. É, assim, manifesta a resistência do Venerando TSI em abdicar da tese já anteriormente exposta no Ac. anulado e em cumprir a determinação do Ac. orientador do Tribunal de Última Instância que concluíra, enfaticamente, no sentido de que o que está em causa nos tipos legais dos art.ºs 8.º e 9.º do mencionado diploma legal é《o tráfico de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas》(e não o número de comprimidos que contenham aquelas substâncias).
   17. Os Distintos Julgadores do TSI olvidaram, também, a orientação decorrente do Acórdão de 30 de Maio de 2002 do TUI no sentido de que não pode perder-se de vista que quem está a ser julgado, nestes autos, é um arguido em concreto, o que o Ac. ora recorrido perdeu sistematicamente de vista, antes emprestando a ideia de que julgou não o arguido recorrente mas o《consumidor comum》ou o《homem médio》a que fez sistematicamente apelo ao longo de toda a decisão, olvidando o princípio colocado em destaque no arresto precedente do TUI de que《estamos no campo de Direito Penal》, no qual《o princípio nulla poena sine culpa》assume uma relevância extrema.
   18. A liberdade de apreciação da prova significa julgar obedecendo a critérios de objectividade, não confundindo as regras da experiência com a apreciação da prova com base no arbítrio e em meras impressões subjectivas do julgador.
   19. Não se vislumbram razões para se alterar o conceito de quantidades diminutas já antes definido pelo muito recente Ac. do TSJ de 2 de Junho de 1999 (in JUR. 1999, pág. 760) que fixou tal quantidade em dois gramas diários (e, consequentemente, em seis gramas para o consumo individual por três dias).
   20. A moldura penal, abstractamente, aplicável ao crime de tráfico de quantidades diminutas é prisão de 1 a 2 anos e multa de MOP$2,000.00 a MOP$225,000.00, pelo que se afigura adequada ao caso a aplicação de uma pena de um ano e um mês de prisão e multa de MOP$3,000.00.
   21. Não pode deixar de se considerar que o ora recorrente se posicionava, na actividade do tráfico de droga, ao nível mais baixo, àquele a que pertencem as denominadas últimas personagens da cadeia de tráfico, os chamados distribuidores ou “dealers”.
   22. O douto Acórdão recorrido violou as normas substantivas dos art.ºs 8.º e 9.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal de Macau1, as quais têm de ser interpretadas com os sentidos que se deixaram supra expressos nesta minuta.”
   O recorrente pede que seja dado provimento ao recurso, revogada a decisão recorrida e proferida decisão que fixe em quantidade não superior a seis gramas a quantidade de metanfetamina necessária ao consumo individual por três dias e, em consequência, proceda à convolação do crime por que o recorrente foi condenado para um crime do art.º 9.º, n.ºs 1 e 3 do Decreto-Lei n.º 5/91/M, de 28 de Janeiro e aplique uma pena de prisão inferior a dois anos, considerando-se justa a de um ano e um mês de prisão e MOP$3,000.00 de multa.
   
   O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Segunda Instância emitiu a seguinte resposta:
   “O objecto do presente recurso consiste em saber se a conduta do recorrente é subsumível à previsão do art.º 8.º, n.º 1 ou à do art.º 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 5/91/M, de 28-1.
   O douto acórdão recorrido, na sequência do reenvio decretado por esse Venerando Tribunal, acrescentou, à materialidade anteriormente fixada, o seguinte facto:
   - “O peso líquido total de Metanfetamina contida nos 40 comprimidos apreendidos ao arguido e enviados ao exame do Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária, realizado a pedido dele formulado e deferido na audiência de 10 de Dezembro de 2001, é de 1,198 gramas”.
   Na prolação da decisão, entretanto, este Tribunal não tomou em conta tal facto para a fixação do conceito de “quantidade diminuta” referido no citado art.º 9.º, n.º 3.
   Cremos, todavia, na esteira de posições que já assumimos no processo, que não seguiu a via mais apropriada.
   Vejamos.
   
   Esse Tribunal de Última Instância, no douto acórdão2 de fls. 263 e sgs., pronunciou-se no sentido da relevância da “quantidade de estupefaciente contida nos comprimidos” detidos pelo arguido, tendo, em consonância, ordenado a ampliação da matéria de facto, para o apuramento dessa “quantidade”.
   E afigura-se-nos incontroversa a bondade desse juízo, pelas razões proficientemente expostas no mesmo arresto.
   O que está em causa é, pois, a determinação do “quantum” de metanfetamina pura susceptível de integrar o conceito em apreço.
   E, a esse respeito, não podemos deixar de reiterar a posição já exposta aquando do recurso interposto para esta Segunda Instância.
   
   No caso “sub judice”, foram apreendidos ao recorrente 40 comprimidos, tendo-se provado, também, que o mesmo havia transportado, antes, mais 20 comprimidos.
   Apurou-se, por outro lado, que esses 40 comprimidos continham, para além de uma quantidade não especificada de ketamina, um total de 1,198g ‘líquidos” de metanfetamina.
   E temos como certo que tal peso excede, largamente, “o necessário para consumo individual durante três dias”.
   O estudo científico já referenciado nos autos, do “Koch Crime Institute – Methamphetamine Frequently Asked Questions”, aponta para um limite diário de 50mg, sendo certo que essa quantidade pode causar uma reacção tóxica (ou overdose), a um consumidor “non-tolerant”.
   O que vale por dizer que a noção de “quantidade diminuta” não deve, em relação ao produto em análise, ultrapassar 150mg.
   Na Itália, para substâncias análogas – MDMA e anfetamina – o respectivo limite máximo diário foi fixado, igualmente, em 50mg, pelo Decreto n.º 186, de 12-7-90 (cfr. Lourenço Martins, Droga e Direito, 1994, pgs. 306 e sgs.).
   O legislador português, por seu turno, através da Portaria n.º 94/96, de 26-3, estabeleceu, também, “os limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária das plantas, substâncias ou preparações constantes das tabelas I a IV anexas ao Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro…”(cfr. n.º 9°).
   E, para as mesmas substâncias, fixou o mencionado limite em 0,1g.
   Assim, mesmo que se aceite a perspectiva – mais generosa – da lei portuguesa, o peso líquido de 1,198g sempre ultrapassaria, em cerca de 4 vezes, o questionado conceito de “quantidade diminuta”.
   
   O arguido volta a chamar à colação, na sua motivação, o acórdão do Tribunal Superior de Justiça, de 2-6-99 (cfr. Jurisprudência, I, pgs. 760 e sgs.).
   Tal acórdão, no entanto, reporta-se ao ice, a nosso ver, em termos de “peso bruto”.
   Não deve inferir-se, pois, que as quantidades de metanfetamina aí mencionadas sejam doses “puras” desse produto.
   Sempre seria inaceitável, de qualquer forma, como frisámos, uma noção de “quantidade diminuta”, do estupefaciente em foco, correspondente aos aludidos 6g.
   
   A problemática da pena, suscitada pelo recorrente, tem como pressuposto a propugnada alteração da qualificação jurídico-criminal.
   Falecendo tal pressuposto, prejudicada fica, naturalmente, a pretensão em questão.
   
   Deve, pelo exposto, ser negado provimento ao recurso.”
   
   A Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal de Última Instância emitiu o parecer que consiste essencialmente em:
   O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Segunda Instância evidencia já a sem razão do recorrente.
   Não podemos deixar de manifestar a nossa concordância com as considerações aí expendidas.
   A questão colocada pelo recorrente reside essencialmente em saber se a referida quantidade líquida de metanfetamina contida nos comprimidos apreendidos na posse do recorrente constitui ou não “quantidade diminuta”, nos termos e para os efeitos do art.º 9.º do DL n.º 5/91/M, já que a segunda pretensão do recorrente (em relação à pena) pressupõe a propugnada alteração da qualificação jurídico-criminal.
   
   A quantidade diminuta refere-se a quantidade que “não excede o necessário para consumo individual durante três dias, reportando-se à quantidade total das substâncias ou preparados encontrados na disponibilidade do agente” e poderá ser concretizada, segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente e mediante decreto-lei (n.ºs 3, 4 e 5 do art.º 9.º), que nunca foi publicado.
   Afirma o recorrente que o quantum para o preenchimento do conceito de “quantidade diminuta” é jurisprudencialmente fixado em 6 gramas para metanfetamina, invocando o Acórdão do antigo TSJ de Macau proferido em 2-6-1999 e no processo n.º 1073.
   É verdade que no citado acórdão, o TSJ decidiu claramente que “para o ice (metanfetamina) o consumo individual médio durante três dias é de 6 gramas, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art.º 9.º do Decreto-Lei n.º 5/91/M, de 28 de Janeiro”.
   No entanto, cremos que a quantidade aí referida não se refere ao peso líquido, mas sim ao peso ilíquido, como resulta expressamente da matéria de facto dada como assente naquele arresto: metanfetamina aí apreendida apresenta-se sob forma de cristal e com o peso bruto.
   Quando a droga em causa for do tipo “sintético”, ou seja, sob forma de comprimidos, sendo estes a mistura de várias substâncias, como se verifica no nosso caso concreto em que também foi detectada ketamina, a situação será diferente, tendo em conta a quantidade líquida concreta de metanfetamina.
   Há que recorrer a outros critérios.
   
   Como tem afirmado o Ministério Público durante o decurso dos presentes autos na fase do recurso, de acordo com estudos científicos específicos, a quantidade de 50mg de metanfetamina (em estado puro) é suficiente para causar uma reacção tóxica (ou overdose) para um consumidor “non-tolerant” (cfr. o estudo do “Koch Crime Institute, Methamphetamine Frequently Asked Questions”, já junto aos autos).
   E cremos não ser irrelevante a referência à legislação de Portugal e da Itália que fixa o limite diário de consumo para MDMA e anfetamina, uma vez que os tipos de droga em causa são da mesma natureza de metanfetamina (estimulante) e classificados na mesma tabela II da lista anexa ao DL n.º 5/91/M, em que se insere também metanfetamina (anfetamina e metanfetamina na tabela II-B e MDMA na tabela II-A).
   É de notar que a distribuição das substâncias e preparados pelas várias tabelas da referida lista “tem em conta a sua potencialidade letal, a intensidade dos sintomas de abuso, o risco de abstinência e o grau de dependência” (art.º 3.º, n.º 2 do DL n.º 5/91/M).
   Na Itália, pelo Decreto n.º 186 de 12-7-1990, o Ministério da Saúde fixou em 0,05 gramas para o limite máximo diário de consumo de MDMA e anfetamina (cfr. Droga e Direito, de Lourenço Martins, 1994, pág. 308).
   Em Portugal, a Portaria n.º 94/96 de 26 de Março, publicada no D.R., I série-B, n.º 73/96, pág. 611, indicou os limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária das plantas, substâncias ou preparações, fixando o limite máximo diário de consumo em 0,1 gramas para MDMA e anfetamina.
   
   Ora, tendo em conta tais elementos, é de concluir que o peso líquido de 1,198 gramas de metanfetamina nunca constitui quantidade diminuta referida no art.º 9.º do DL n.º 5/91/M, já que de acordo com os dados quer oferecido pelo estudo científico quer mencionado nas legislações acima citadas, tal quantidade é muito superior ao limite máximo para consumo individual durante três dias, independentemente de critério que se adopta: mesmo seguindo o critério de Portugal por ser mais generoso e benevolente para os agentes, a quantidade necessária para preencher o conceito de “quantidades diminutas” é apenas de 0,3 gramas.
   E é de acrescentar que para além do peso de metanfetamina contido nos 40 comprimidos, há de ter em conta ainda a quantidade contida nos outros 20 comprimidos cujo tráfico pelo recorrente ficou também provado (embora não seja possível determinar a quantidade líquida contida nos mesmos), uma vez que é jurisprudência uniforme que “no crime de tráfico de estupefacientes, está em causa não só a droga concretamente apreendida num determinado processo, mas também a quantidade de droga que durante uma determinada época foi traficada pelo agente”.
   Pelo exposto, é de concluir pela improcedência do recurso nesta parte.
   
   E dado que a alteração da pena pretendida pelo recorrente tem como pressuposto a qualificação da sua conduta como prática do crime de tráfico de quantidades diminutas, a sua sem razão nesta parte implica necessariamente a improcedência, também, daquela pretensão.
   
   Termos em que se deve negar provimento ao recurso interposto.
   
   
   Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
   
   
   
   2. Fundamentos
   1. Pelos Tribunal Judicial de Base e Tribunal de Segunda Instância foram dados como provados os seguintes factos:
   “Em 20 de Junho de 2001, cerca das 20:41, no posto fronteiriço das Portas do Cerco, o pessoal da PMF abordou o arguido A que vinha de Zhuhai para Macau.
   O pessoal da PMF encontrou, em flagrante, no corpo do arguido A 40 comprimidos suspeitos de serem comprimidos “ecstasy”.
   Após exame laboratorial, os tais comprimidos continham Metanfetamina e Ketamina, substâncias essas constantes respectivamente na Tabela II-B e II-C do Decreto-Lei n.° 5/91/M (alterado pela Lei n.° 4/2001).
   Tais estupefacientes foram adquiridos pelo arguido A, em Zhuhai a um indivíduo desconhecido, a fim de trazer para Macau e entregar a outro indivíduo desconhecido de nome “B” para venda.
   O arguido A agiu livre, consciente e voluntariamente o supracitado.
   Ele sabia perfeitamente a natureza e as características dos estupefacientes acima referidos.
   A sua conduta não era permitida por lei.
   Ele bem sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
   Esta foi a segunda vez que o arguido trazia estupefaciente para Macau.
   Na primeira vez, trouxe vinte comprimidos “ecstasy” e recebeu, como remuneração, a quantia de MOP$300,00.
   E desta vez, era para receber do tal indivíduo “B” a quantia de MOP$500,00 como recompensa.
   O arguido confessa os factos e mostra-se arrependido.
   Auferia, mensalmente, cerca de MOP$3.500,00 e tem a seu cargo os seus pais. Possui o curso primário.
   Nada consta em seu desabono do seu CRC junto aos autos.
   O peso líquido total de Metanfetamina contida nos 40 comprimidos apreendidos ao arguido e enviados ao exame do Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária, realizado a pedido dele formulado e deferido na audiência de 10 de Dezembro de 2001, é de 1,198 gramas.”
   Nenhum facto ficou por provar.
   
   
   2. Questões a resolver
   No presente recurso, o recorrente suscitou duas questões: uma refere ao enquadramento jurídico das suas condutas, entendendo que se tratam apenas de quantidade diminuta os 1,198g de Metanfetamina contida nos 40 comprimidos apreendidos ao recorrente e, em consequência, praticou simplesmente um crime de tráfico de quantidades diminutas previsto no art.° 9.°, n.°s 1 e 3 do Decreto-Lei n.° 5/91/M e não o crime mais grave de tráfico de droga previsto no art.° 8.°, n.° 1 do mesmo diploma. A outra questão respeita ao pedido de nova fixação da pena concreta se entender que o recorrente cometeu apenas o crime de tráfico de quantidades diminutas.
   
   
   2.1 De acordo com a matéria de facto fixada pelo tribunais das duas instâncias, o recorrente chegou a trazer duas vezes comprimidos de ecstasy a Macau. Na primeira vez trouxe 20 comprimidos de ecstasy e recebeu 300 patacas como remuneração. Na segunda vez em que foi detido, na alfândega de Macau, foram encontrados 40 comprimidos no corpo do recorrente, vindo de Zhuhai para Macau. Submetidos ao exame laboratorial, foi confirmado que os comprimidos continham Metanfetamina e Ketamina, substâncias de droga incluídas nas tabelas II-B e II-C. A Metanfetamina contida tem o peso total de 1,198g. Desta vez, o recorrente era para receber 500 patacas como recompensa.
   No Tribunal Judicial de Base, o recorrente foi condenado pela prática de um crime de tráfico de droga previsto e punido pelo art.° 8.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 5/91/M na pena de oito anos e um mês de prisão e multa de 8000 patacas convertível em 50 dias de prisão. Posteriormente, a decisão foi sempre mantida pelo Tribunal de Segunda Instância nos julgamentos dos dois recursos contra aquele acórdão.
   Prescreve, assim, o art.° 8.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 5/91/M:
   “1. Quem, sem se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 23.º, substâncias e preparados compreendidos nas tabelas I a III será punido com a pena de prisão maior de 8 a 12 anos e multa de 5 000 a 700 000 patacas.”
   Por seu lado, o recorrente entende que, por conterem os tais 40 comprimidos apenas 1,198g de Metanfetamina, a sua conduta deve ser integrada no crime de tráfico de quantidades diminutas previsto no art.° 9.°, n.° 1 do mesmo diploma.
   Segundo o referido art.° 9.°, n.° 1:
   “Se os actos referidos no artigo anterior tiverem por objecto quantidades diminutas de substâncias ou preparados compreendidos nas tabelas I a III, a pena será a de prisão de 1 a 2 anos e multa de 2 000 a 225 000 patacas.”
   Assim, o recorrente só pode ser punido por este crime menos grave quando a droga que estava na sua posse era de quantidade diminuta.
   
   
   2.2 O conceito da quantidade diminuta
   Dispõem os n.°s 3 a 5 do art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M:
   “3. Quantidade diminuta para efeitos do disposto neste artigo é a que não excede o necessário para consumo individual durante três dias, reportando-se à quantidade total das substâncias ou preparados encontrados na disponibilidade do agente.
   4. Ouvidos os Serviços de Saúde, o Governador (entende-se por Chefe do Executivo da Região Administrativa Especial de Macau), mediante decreto-lei, poderá concretizar, para cada uma das substâncias e produtos mais correntes no tráfico, a quantidade diminuta, para efeitos do disposto no presente artigo.
   5. A concretização a que se refere o número anterior será apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”
   Da entrada em vigor deste Decreto-Lei em 1991 até agora, nunca foi publicado diploma normativo para fixar concretamente as quantidades diminutas nos termos do art.° 9.°, n.° 4. Face a esta situação, deve determinar a amplitude de quantidades diminutas de acordo com as regras da experiência e o princípio da livre convicção mencionados no n.° 5 do mesmo artigo.
   
   No presente recurso, a droga apreendida ao recorrente apresenta a forma de comprimidos, contendo duas substâncias de droga proibidas, Metanfetamina e Ketamina. Em relação à droga sintética na forma de comprimidos, na questão de saber se constituir quantidade diminuta, o Tribunal de Última Instância, no seu acórdão de 30 de Maio de 2002 do recurso penal n.° 7/2002, entende assim:
   “Um comprimido contendo uma substância estupefaciente e outros componentes pode ter, em abstracto, quantidades muito diversas da substância estupefaciente, como é de toda a evidência e não necessita de qualquer explicitação.”
   “Pois bem, sendo quantidade diminuta a que não excede o necessário para consumo individual durante três dias, é de meridiana clareza que, em regra, será necessário conhecer a quantidade de substância estupefaciente contida nos comprimidos apreendidos, posto que seja possível fazer o exame apropriado, por isso que tal quantidade poderá variar de uns casos para outros.
   É que se, por exemplo, uma unidade contiver alto grau de pureza, cinco comprimidos poderão já não constituir quantidade diminuta. Se a unidade contiver uma quantidade ínfima de estupefaciente já o número de algumas dezenas de comprimidos poderá ser o necessário para consumo individual durante três dias e, por isso, constituir ‘quantidade diminuta’ para efeitos do disposto no art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M.”
   Posteriormente, o Tribunal de Última Instância reafirmou a referida posição no seu acórdão de 9 de Outubro de 2002 do recurso penal n.° 10/2002. Entendemos que este é o caminho correcto para resolver a questão ligada a quantidades diminutas.
   Na droga sintética sob a forma de comprimidos ou pílulas, normalmente a percentagem de estupefacientes e substâncias psicotrópicas contidas varia muito. Se fixar a quantidade da droga contida simplesmente através do número de unidades ou peso total dos comprimidos ou pílulas, então ao determinar o crime cometido e fixar a pena concreta, considerará quase necessariamente como droga proibida as substâncias que não o sejam, o que não é intenção do legislador e contraria o princípio nullum crimen sine lege, nulla poena sine lege.
   Os n.°s 1 e 2 do art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M, normas definidoras dos crimes de tráfico de quantidades diminutas, dispõem claramente que os objectos dos respectivos actos ilícitos são as substâncias ou preparados incluídos nas tabelas anexas ao referido diploma, mas não qualquer objecto que contiver as drogas.
   Assim, considerando a definição da quantidade diminuta consagrada no n.° 3 do mesmo artigo, deve ter por critério a quantidade das respectivas substâncias ou preparados ao determinar se é subsumível ao crime de tráfico de quantidades diminutas. Para os objectos que contêm droga, como os comprimidos ou as pílulas, a quantidade diminuta é igualmente determinada pela quantidade líquida da droga neles contida, desde que seja possível em razão das condições técnicas, e não de outra aparência dos objectos. Só assim é possível proceder ao enquadramento jurídico objectivamente.
   
   
   2.3 A quantidade diminuta da Metanfetamina
   O recorrente salienta que houve decisão do antigo Tribunal Superior de Justiça que fixou a quantidade diminuta da Metanfetamina, também conhecida por ice, em 6g.
   O respectivo acórdão do antigo Tribunal Superior de Justiça foi proferido em 2 de Junho de 1999 no processo n.° 1073:
   “... 6 gramas de ‘ice’, quantidade integradora do conceito a que se refere o n.° 3 do citado artigo 9.°.3
   É que, ‘ice’ é uma Anfetamina que pode ser consumida por via oral ou parentérica.
   Um consumidor médio gasta 0,6 gramas de cada vez, fazendo-o uma a três vezes diariamente.
   Tal dá um total diário máximo de 1,8 gramas, sendo que, nos termos e para os efeitos daquele artigo 9.°, n.° 3, se deve fixar o consumo individual, (em três dias) em 6 gramas, por arredondamento. (cfr. Octávio Agual, cit. pelo Cons. Lourenço Martins, ob. cit.4 308, nota 1).5
   Esta parte do acórdão respeita a uma dos recorrentes daquele processo, em que considera que 5,87g Metanfetamina (ice) apreendida na casa desta, para além das que foram trazidas de Hong Kong a Macau por várias vezes, sendo 5 ou 6 gramas por vez, ultrapassam muito os 6g, quantidade diminuta da Metanfetamina. Na matéria de facto provada, está explícito que 5,87g (0,23g+5,64g) é o peso ilíquido da Metanfetamina na forma de cristal apreendida.6
   Assim, não são da substância pura os 6g de Metanfetamina referidos no acórdão, mas sim de peso ilíquido do objecto que contém Metanfetamina.
   O Ministério Público considera também que o peso de 6g apontado naquele acórdão não é o peso da substância da Metanfetamina pura, mas sim de peso ilíquido.
   Na realidade, o Tribunal de Segunda Instância, nos seus acórdãos de 16 de Maio de 2002 do processo 41/2002 e de 5 de Setembro de 2002 do processo 31/2002-II, entende igualmente que a quantidade de 6g da Metanfetamina fixada pelo então Tribunal Superior de Justiça não se refere ao peso líquido desta substância.
   Mais ainda, na obra citada pelo acórdão do então Tribunal Superior de Justiça, a quantidade de consumo de 0,6g por vez e de uma a três vezes por dia é para o consumo elevado, e a substância respectiva não é Metanfetamina, também conhecida por ice, mas sim Anfetamina.
   Anfetamina e Metanfetamina são estimulantes do tipo de Anfetamina. Mas a natureza e os efeitos das duas substâncias têm bastante diferença, nomeadamente os efeitos de estimulação sobre nervo central da segunda é mais forte dos da primeira e produz efeitos mais rapidamente.
   
   A Metanfetamina é um estimulante do nervo central. Após o seu consumo, pode criar o estado de forte estimulação psicológica e física e permanece por bastante tempo. O uso da dose demasiado forte pode provocar intoxicação aguda, mostrando o aumento da tensão arterial, respiração mais rápida, taquicardia, aumento da temperatura corporal e até confusão mental. Na intoxicação grave aparece temperatura corporal de mais de 40°C e as sintomas de coma, hemorragia cerebral, choque e morte, etc.
   De acordo com o relatório de informações dos Serviços de Saúde, apresentam grande diferença as reacções após o consumo da Metanfetamina para pessoas diferentes. A dose terapêutica diária de adulto normal é de 2,5 a 25mg (miligramas). Houve relato de que a dose de 1,3mg/kg pode provocar a morte (será 78mg para o peso corporal de 60kg). A pequena dose de 50mg pode ser demasiada e suficiente para provocar reacção tóxica para os não tolerantes. Considera-se normalmente que a dose máxima de consumo de uma vez (dose letal) é de 1000mg.
   No Decreto-Lei n.° 15/93, diploma de combate à droga de Portugal, há normas semelhantes ao art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M em que é referida a quantidade diminuta. Para os seus art.°s 26.°, n.° 3 e 40.°, n.° 2, constitui o elemento típico dos respectivos crimes a quantidade do consumo médio individual durante o período de cinco dias. Para concretizar este elemento, foi publicada posteriormente a Portaria n.° 94/967 em que é fixado em 100mg o limite máximo para cada dose média individual diária da Anfetamina.
   Na Itália, de acordo com o Decreto Ministerial n.° 186 de 12 de Julho de 1990, a dose média diária da Anfetamina é fixada em 50mg. Para Metanfetamina, é fixada até em 25mg.8
   Por seu lado, a dose diária definida para a Metanfetamina é de 15mg segundo o Órgão Internacional de Fiscalização de Estupefacientes da Organização das Nações Unidas.9
   Conjugadas as informações científicas e de direito comparado acima mencionadas, as características da Metanfetamina e o hábito de consumidores normais, segundo as regras de experiência e o princípio da livre convicção previstos no n.° 5 do art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M, deve ser fixada em trezentos miligramas a quantidade diminuta da Metanfetamina pura, a necessária para o consumo individual durante três dias, prevista no n.° 3 do mesmo artigo.
   
   
   2.4 O enquadramento jurídico-penal da conduta do recorrente
   Segundo a matéria de facto provada, os 40 comprimidos apreendidos ao recorrente contém, além da Ketamina, o total de 1,198g de Metanfetamina. Por outro lado, o recorrente chegou a trazer ainda outros 20 comprimidos do mesmo tipo a Macau. Considerando apenas o componente de Metanfetamina, a sua quantidade já excede a quantidade diminuta desta substância acima referida.
   Em relação à Ketamina, não foi possível realizar a análise quantitativa devido às razões técnicas da altura.
   A Metanfetamina é um estimulante e a Ketamina alucinante. Ambos têm efeitos diferentes. Por meio de comprimidos com estas duas substâncias de droga, o consumidor pode procurar alcançar a sensação de estimulação e alucinação.
   Se estamos perante objectos que contêm duas ou mais drogas incluídas nas tabelas conexas ao Decreto-Lei n.° 5/91/M e os efeitos de cada tipo de drogas contidas não são manifestamente neutralizados, não é subsumível ao crime de tráfico de quantidades diminutas previsto no art.° 9.° do mesmo diploma o tráfico dos referidos objectos quando o peso líquido de uma das drogas contidas exceda a sua quantidade diminuta nos termos do n.° 3 do mesmo artigo. Mas se os pesos líquidos das drogas não excedam as respectivas quantidades diminutas, ao averiguar se a quantidade total da mistura das drogas é diminuta, deve converter os pesos das drogas contidas para o de uma destas, segundo a proporção das quantidades diminutas das mesmas, e comparar o resultado com a quantidade diminuta legal desta droga.
   Por isso, em relação aos comprimidos que contêm Metanfetamina e Ketamina, não são consideradas de quantidade diminuta prevista no mencionado art.° 9.°, n.° 3 as drogas contidas nos comprimidos quando o peso líquido de uma daquelas substâncias ultrapassa o necessário para o consumo individual durante três dias da mesma.
   A quantidade total da Metanfetamina nos tais 60 comprimidos já excede a quantidade diminuta desta, pelo que não se pode considerar que o recorrente comete simplesmente o crime de tráfico de quantidades diminutas previsto e punido pelo n.° 1 do art.° 9.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M. Deve ser mantida, por ser correcta, a decisão constante dos acórdãos recorridos que condena o recorrente pela prática de um crime de tráfico previsto e punido pelo n.° 1 do art.° 8.° do Decreto-Lei n.° 5/91/M.
   Com base nesta posição, não é admitida a redução da pena pedida pelo recorrente que tem por fundamento na convolação para crime menos grave.
   Improcedem os fundamentos do recurso do recorrente.
   
   
   
   3. . Decisão
   Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso.
   Mais condena o recorrente em 6 UC (três mil patacas) da taxa de justiça e outras custas.
   
   Aos 15 de Novembro de 2002.
   
   
   

            Juízes:Chu Kin (relator)
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai



1 Deve ser manifesto lapso de escrita, dado que as normas referidas são do Decreto-Lei n.° 5/91/M.
2 Proferido em 30 de Maio de 2002 no recurso penal n.° 7/2002.
3 Norma do Decreto-Lei n.° 5/91/M.
4 Droga e Direito, Aequitas e Editorial Notícias, 1994.
5 Jurisprudência, 1999, I tomo , p. 772 e 773.
6 Jurisprudência, 1999, I tomo , p. 767.
7 No Diário da República de Portugal, I série-B, n.° 73 de 1996.3.26, p. 611.
8 Cfr. Lourenço Martins, Droga e Direito, Aequitas e Editorial Notícias, 1994, p. 307 e 308. O texto do Decreto Ministerial consta de: http://droghe.aduc.it/leggi/1990-07-12.htm.
9 Cfr. O Órgão Internacional de Fiscalização de Estupefacientes, Psychotropic Substances, 2001, ONU, Nova Iorque, 2002, p. 22.
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Processo n.° 11 / 2002 26