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Processo n.º 13/2002. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: Secretário para a Economia e Finanças.
Recorrido: A.
Assunto: Recursos. Competência do Tribunal de Última Instância. Excepções ou questões prévias de conhecimento oficioso. Irrecorribilidade contenciosa das ordens ou instruções de serviço. Aclaração confirmativa. Direito ao alojamento do pessoal recrutado no exterior. Reembolso de rendas.
Data da Sessão: 27 de Novembro de 2002.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Sam Hou Fai e Chu Kin.

SUMÁRIO:
   I – No recurso de decisões do Tribunal de Segunda Instância, pode o Tribunal de Última Instância conhecer de excepções ou questões prévias de conhecimento oficioso – como a falta de pressuposto processual do recurso contencioso - e não decididas com trânsito em julgado.
II – Não produzem efeitos externos as ordens ou instruções de serviço, dirigidas por órgãos superiores da hierarquia aos órgãos (ou aos seus titulares) colocados na sua dependência sobre a forma como devem actuar em casos concretos, pelo que não são contenciosamente recorríveis.
III – Quando um despacho interpreta um despacho anterior do mesmo autor, escolhendo uma das interpretações que ele comporta, estamos perante uma aclaração confirmativa, não recorrível contenciosamente.
IV - O direito ao alojamento do pessoal recrutado no exterior compreendia duas modalidades:
a) Alojamento definitivo em moradia, equipada ou não;
b) Atribuição de um subsídio para arrendamento e de um subsídio para equipamento.
V - Quando, por acordo entre a Administração e o trabalhador recrutado no exterior, este arrenda casa cuja renda é suportada pela Administração, que suporta também o pagamento de caução da renda, bem como as despesas de obras e reparações da casa, e as de alojamento em unidade hoteleira do trabalhador e agregado familiar, quando houver impossibilidade de uso e fruição da moradia e quando a execução de obras não for compatível com a utilização normal da moradia, a situação enquadra-se no regime de atribuição de moradia pela Administração, equipada ou não.
VI - Os trabalhadores nas situações previstas na conclusão anterior estão obrigados ao pagamento da contraprestação a que alude o n.º 5, do art. 21.º do Decreto-Lei n.º 60/92/M, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 37/95/M.

O Relator

Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
O A interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário para a Economia e Finanças, de 3 de Maio de 2001.
Por acórdão de 30 de Maio de 2002, do Tribunal de Segunda Instância, foi dado provimento ao recurso e anulado o acto recorrido.

É deste acórdão que vem interposto o presente recurso jurisdicional, terminando a entidade recorrida no recurso contencioso, ora recorrente, a respectiva alegação com a formulação das seguintes conclusões:
1. O Acórdão recorrido apreciou matéria excluída do seu âmbito de cognição no tocante à integração do administrado numa outra modalidade de alojamento definitivo da que havia sido determinada pela Administração.
2. Foi pelo Tribunal examinada e implicitamente decidida a forma de alojamento na qual se integra o administrado, o que se deduz da solução conferida pela decisão à questão da natureza revogatória do acto recorrido, porquanto se não houvesse considerado o enquadramento do administrado no regime previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 21.º do DL 60/92/M, de 24/08 não decidiria o Tribunal pelo carácter constitutivo de direitos do despacho de 17/08/2000 e a consequente anulação do acto recorrido por revogatório daquele.
3. E sendo o recurso contencioso de mera legalidade não pode o Tribunal de Segunda Instância controlar o mérito dos actos da Administração violando, por isso, o Douto Acórdão, o disposto no artigo 20.º do CPAC.
4. Para além desta violação, encontrando-nos perante o exercício de poderes discricionários legalmente conferidos à Administração pelo artigo 5.º do DL 71/92/M, de 21/09 e pela alínea h) do artigo 2.º do DL 30/99/M, de 5/07, dados os termos da causa, pressuposto necessário da Decisão expressa no Acórdão recorrido de anular o acto contenciosamente impugnado foi questão de o administrado se encontrar na forma de atribuição de subsídio, e não de moradia da administração, em clara violação, assim, do disposto no artigo 20.º do CPAC.
5. O Acórdão recorrido restringiu o objecto do recurso à interpretação conjugada dos despachos de 17/08/2000 e de 3/05/2001, mas fundamenta a sua decisão na interpretação da vontade do Director dos Serviços de Finanças e não no acto contenciosamente impugnado.
   6. Sendo a fundamentação do acto administrativo um meio de apuramento da legalidade e um limite ao seu controle jurisdicional o Tribunal de Segunda Instância ultrapassou os exactos termos em que a mesma se traduziu e baseou-se a Decisão recorrida em motivos que não os constantes do acto recorrido, substituindo-se à Administração nos seus fundamentos factuais e jurídicos, padecendo de erro de julgamento e violação de lei nos termos do artigo 20.º do CPAC.
7. Resultando provado, na decisão recorrida, não conter a notificação do acto de 17/08/2000 os seus elementos essenciais - o sentido integral da decisão - porquanto tal facto é ressalvado no Douto Acórdão, com base na transcrição exacta da tradução requerida pelo Tribunal de Segunda Instância, a saber "Concordo com a entrega à Direcção dos Serviços de Finanças para efeito de referência".
8. Manifestando-se a vontade da Administração através de actos administrativos, e não da notificação, formalidade da respectiva comunicação aos interessados e desprovido de sentido decisório, viola a Decisão recorrida o disposto no artigo 70.º do CPA.
9. A Decisão recorrida qualificando o acto contenciosamente impugnado como revogatório de acto anterior não especifica quais os novos pressupostos de facto ou qual o outro quadro legal definido pelo acto recorrido, julgando para além dos seus poderes de cognição que se limitam aos vícios do acto impugnado.
10. Visando o recurso contencioso, com a anulação do acto contenciosamente impugnado, remover qualquer obstáculo que impeça o particular de exercer o direito que entende ser por aquele violado, e que se traduzia na revogação do acto administrativo de 30/06/2000 e a directiva de abertura do procedimento administrativo conforme prevê o artigo 93.0 do CPA, o recurso contencioso do acto impugnado carecia de objecto, nulidade alegada pelo M. do Ministério Público e transformada em questão prejudicial pelo Tribunal, em violação do disposto no artigo 74.º do CPAC.

O recorrente no recurso contencioso, ora recorrido deu por reproduzida alegação apresentada no recurso contencioso.
A Ex.ma Procuradora-Adjunta emitiu o seguinte parecer:

“Inconformando com o douto acórdão do Tribunal de Segunda Instância no sentido de dar provimento ao recurso interposto por A e anular o acto recorrido, vem o Senhor Secretário para a Economia e Finanças interpor recurso para o Tribunal de Última Instância.
Nos termos do art. 152.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), e permitido o recurso dos acórdãos do Tribunal de Segunda Instância que tem por fundamento a violação ou a errada aplicação de lei substantiva ou processual ou a nulidade da decisão impugnada.
O recorrente assaca ao acórdão recorrido vícios de violação de lei, tanto substantivo como processual, de errada aplicação de lei substantiva e de nulidade do acórdão.
Com o recurso interposto para o Tribunal de Segunda Instância, A pretende impugnar o despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças, de 3-5-2001, que tem o seguinte conteúdo:
1. Adere à análise jurídica efectuada pela DSF sobre "reembolso de rendas" vertida na informação n.º 30037/DGP/01;
2. Por ter verificado o erro na tradução do despacho (de 17-8-2000) exarado na informação 082/GC-SEF/2000 de 9-8-2000 que, não obstante na realidade determinou apenas o envio da respectiva informação à DSF para estudo, levou a DSF a notificar A de que o Senhor Secretário para a Economia e Finanças teria concordado com o conteúdo e propostas aí veiculadas, dando lhe razão, manda rectificar a situação dando sem efeito tal notificação;
3. Revoga a decisão da DSF consubstanciada no despacho do Sr. Director dos Serviços, de 30-6-2000, que determinou que A repusesse as contraprestações devidas;
4. Determina que se inicie o procedimento administrativo tendente a regularizar a situação de falta de pagamento mensal da contraprestação devida pelo uso e fruição da moradia equipada de A, informando-o do início do procedimento e garantindo o seu direito de audiência, antes de ser proferida decisão final.
Sobre a referida informação 082/GC-SEF/2000 de 9-8-2000, elaborada na sequência da reclamação apresentada por A, que conclui que o reclamante tem razão e não se deve efectuar quaisquer descontos a título de rendas, o Senhor Secretário para a Economia e Finanças proferiu em 17-8-2000 o seguinte despacho: "同意交財政局參考。", cuja tradução fiel e rigorosa é "concordo com a entrega à Direcção dos Serviços de Finanças para efeito de referência". (fls. 104 a 107 dos autos)
Recebido tal despacho, a DSF procedeu à notificação do reclamante, para a transcrevendo apenas uma parte do despacho - "Concordo", juntamente com a informação 082/GC-SEF/2000. (fls. 154 a 158).
No douto acórdão ora recorrido, o tribunal entende que tal despacho de 17-8-2000 "é constitutivo de direito, ..., pois ao recorrente foi afirmado não ter de pagar quaisquer contraprestações por se entender ilegal esse pagamento" e "o despacho recorrido - de 3 de Maio de 2001 - vem não rectificar, mas sim revogar, aquele acto", o que implica o vício de violação de lei uma vez que "não podia fazê-lo, sem ser com fundamento na sua ilegalidade, nos termos do n.º 1 do artigo 130.º do Código de Procedimento Administrativo".
A entidade ora recorrente sustente o contrário.
A questão essencial reside na interpretação do referido despacho do Sr. Secretário para a Economia e Finanças proferido em 17-8-2000.
Para nós, ao dizer concordar com a entrega à DSF para efeito de referência o Sr. Secretário para a Economia e Finanças não está a tomar uma decisão (de indeferimento ou não) sobre a reclamação apresentada por A, não obstante tal reclamação foi submetida à sua apreciação pela DSF e a informação elaborada pelo assessor jurídico é de teor favorável à pretensão do reclamante, mas sim manda remeter tal parecer jurídico à DSF "para efeito de referência", cabendo a este serviço decidir, tendo também em consideração aquele parecer, da reclamação em causa.
Acresce ainda que, com a mesma data de 17-8-2000 e sobre a informação n.º 259/NAJ/CA/00 de 2-8-2000 onde o Sr. Director da DSF concordou com o parecer do técnico superior da DSF no sentido de indeferir a reclamação apresentada, o Sr. Secretário para a Economia e Finanças proferiu o outro despacho – 宜先參考本辦公室法律顧問之意見,再作建議 (Convém estudar o parecer do assessor jurídico do Gabinete e depois fazer de novo proposta) - fls. 108 a 122 dos autos.
Conjugando estes dois despachos, resulta claramente que a intenção do Sr. Secretário para a Economia e Finanças é não tomar já uma decisão sobre a reclamação, mas sim entregar o assunto à DSF. Mesmo entendendo que aquele já tomou uma posição favorável porque remeteu à DSF o parecer do assessor jurídico no sentido de dar razão ao reclamante, tal não significa que a decisão já foi tomada por ele.
É certo que ao reclamante foi dado conhecimento de que foi deferida a sua pretensão.
No entanto, tal notificação (errada por a DSF ter interpretado mal o despacho do Sr. Secretário para a Economia e Finanças) não tem a virtualidade para transformar um acto não decisório num acto de tomar decisão (indeferimento ou não) sobre a reclamação em causa.
Como defende a entidade ora recorrente, "a vontade da Administração manifesta-se através de actos administrativos, e não da notificação, formalidade da respectiva comunicação aos interessados e desprovido de sentido decisório".
E nem se pode dizer que com a notificação do despacho, a DSF fez a sua decisão, deferindo o pedido do reclamante, o que se resulta da própria notificação (fls. 28), em que a DSF apenas transcreveu o despacho (uma parte) do Sr. Secretário para a Economia e Finanças.
Nos termos do art.º 129.º n.º 1, al. b) do CPA, é proibida a revogação dos actos administrativos constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos, como uma das excepções à regra da livre revogabilidade dos actos válidos.
No regime actual não é definido o conceito de actos constitutivos de direitos.
Nas palavra dos Drs. Lino Ribeiro e Cândido de Pinho, "a noção de actos constitutivos de direitos compreende os seguintes actos: actos criadores de direitos, poderes, faculdades e, em geral, situações de vantagem; acto que ampliem ou reforcem esses direitos, poderes, faculdades ou situações jurídicas subjectivas; actos que extinguem restrições ao exercício de direitos, nomeadamente as autorizações; actos meramente declarativos que reconhecem a existência ou validade de direitos, poderes ou situações jurídicas. E consideram-se actos não constitutivos de direitos os seguintes: actos internos; actos declarativos que não consistem no reconhecimento da existência de direitos, poderes, faculdades ou situações jurídicas subjectivas; actos constitutivos de deveres e encargos; autorizações e licenças de natureza policial; actos precários; actos com a cláusula «reserva de revogação»; actos nulos; actos sujeitos, por lei ou cláusula acessória, à condição «sem prejuízo de terceiros» (não são constitutivos apenas em relação a terceiros) - Código do Procedimento Administrativo de Macau, Anotado e Comentado, pág. 753 e 754.
E "a revogação é o acto administrativo que se destina a extinguir os efeitos de outro acto administrativo anterior. Com a prática de revogação, ou acto revogatório, extinguem-se os efeitos jurídicos do acto revogado". (Prof. Freitas do Amaral, Direito Administrativo, vol. III, pág. 351)
Ora, se fosse decidida favoravelmente a reclamação apresentada, estaríamos perante um acto constitutivo de direitos. No entanto, como não tomou decisão sobre se são devidas ou não as contraprestações pelo uso e fruição da moradia por parte do reclamante, o despacho de 17-8-2000 exarado na informação 082/GC-SEF/2000 não pode ser qualificado como acto constitutivo de direitos.
Daí que também não se pode dizer que com o despacho em crise de 3-5-2001, o Sr. Secretário para a Economia e Fianças praticou um acto que revogou outro acto anterior constitutivo de direitos (que nem existe), revogação esta é proibida nos termos do art.º 129.º n.º 1, al. b) do CPA.
Também não está em causa a rectificação dos actos administrativos, figura prevista no art.º 135.º do CPA, já que não se notam erros de cálculo ou erros materiais na expressão da vontade do órgão administrativo.
O que há é o erro cometido pela DSF que interpretou mal o despacho e que não cumpriu o art.º 70.º do CPA, o que deve ser corrigido, como o despacho impugnado de 3-5-2001 determinou fazer, rectificando a situação originada pela errada notificação do despacho anterior.
Concluindo, parece-nos que é de dar razão ao recorrente, neste ponto, ficando prejudicadas as outras questões suscitadas pelo recorrente, e anular o douto acórdão ora recorrido.

II – Os factos
Os factos considerados provados no Acórdão recorrido são os seguintes (com subordinação a alíneas da nossa autoria para facilitar a remissão que houver que fazer):
A) O recorrente foi recrutado a Portugal, em 1990, para exercer funções no, então, Gabinete para a Modernização Legislativa;
B) Ficou a residir, provisoriamente, numa unidade hoteleira, aguardando que a Direcção dos Serviços de Finanças lhe atribuísse casa de habitação;
C) Em 25 de Março de 1991 requereu ao Director dos Serviços de Finanças autorização para arrendar casa a expensas do Território;
D) Por despacho de 16 de Abril seguinte foi autorizado a arrendar moradia tipo T.1, com renda que não excedesse $2.750,00 patacas;
E) Por despacho, de 23.05.91, do mesmo Director dos Serviços, foi-lhe autorizado o reembolso de caução da renda, no montante de MOP$2.750,00 pago através do título M/3 nº1024, de 29.05.91, tendo sido comunicado ao então serviço do requerente, GAL, através do oficio nº7259/SGP/91, de 13.06.91, de que não poderiam ser autorizados quaisquer abonos relativos à cessação de funções no Território sem que se mostrasse integralmente liquidado o montante daquele reembolso;
F) Em 29.07.91 o recorrente reclamou da decisão do facto de ter sido ordenado o desconto no vencimento para renda de casa, que não foi objecto de decisão final expressa;
G) Em 16.08.91 recorreu hierarquicamente do despacho que impôs o desconto para renda da casa;
   H) Por despacho do Senhor Secretário-Adjunto para a Economia e Finanças, de 27.09.91, exarado na Informação nº235/GE/MA/91, foi homologado o parecer dela constante - que conclui que o direito a moradia mobilada previsto no artº 20° do DLº53/89/M, de 28.08, pode revestir a forma do reembolso ao titular do direito do montante (previamente fixado) que este despende quando, subrogando-se ao Território é por este autorizado a celebrar contrato de arrendamento, e em consequência lhe é descontada a renda a que alude o DLº1/91/M - e negado provimento ao recurso interposto;
I) Esse despacho foi notificado ao recorrente através do ofício nº12792/127/GE/MA/91, de 03.11.91;
J) Pelo oficio n°669/GAL/92, de 14.11.92, do Gabinete para os Assuntos Legislativos, foi a DSF informada de que o recorrente deixou de exercer funções nesse Gabinete, a partir de 11.11.92, passando a trabalhar Assembleia Legislativa de Macau;
K) Por despacho, de 03.03.93, do Director dos Serviços, exarado no requerimento datado de 08.02.93, foi autorizado o abono dos subsídios previstos nos nºs 2 e 3 do Despacho nº98/GM/92, de 21.09, no montante de MOP$11.000,00;
L) Por despacho, de 11.05.93, do Director dos Serviços, exarado no requerimento datado de 22.04.93, pelo qual foi solicitado o aumento do subsídio de renda, foi autorizado o reajustamento do valor do reembolso de renda para MOP$3.300,00, a partir de Maio, o que foi comunicado ao interessado através do oficio nº8582/DAP/SGP/93, de 21.05.93;
M) Em 27.07.93, o recorrente solicitou o subsídio de residência no montante de MOP$4.700,00 correspondente ao tipo de moradia T2 (porquanto celebrou contrato de arrendamento de nova moradia, com efeitos a partir de 01.01.93) bem como transporte e demais operações necessárias ao apetrechamento da nova moradia, tendo por despacho, de 10.08.93, do Director dos Serviços, autorizado o pedido de arrendamento de outra moradia e a transferência do mobiliário e equipamento e a elevação do reembolso até ao montante estipulado no Despacho nº98/GM/92, de 21.09, para a tipologia T2 (montante único de MOP$4.700,00) o que foi comunicado pelo oficio nº 14405/00886/DAP/SGP/93, de 12.08.93;
N) Por despacho de 24.03.94, do Director dos Serviços, exarado no requerimento de 27.01.94, foi indeferido o pedido de pagamento das despesas de condomínio dado que o montante estipulado pelo despacho nº98/GM/92, de 21 de Setembro, para tipologia T2 (no valor de MOP$4.700,00) já inclui as despesas do condomínio, o que foi comunicado ao interessado através do oficio 4765/00616/DAP/SGP/94, de 28.03.94;
O) Pelo requerimento datado de 10.07.95, invocando razões várias, designadamente de conforto e segurança, o recorrente solicitou autorização para arrendar nova moradia, tendo tal pedido sido indeferido por despacho de 26.07.95, do Director dos Serviços, subst., de 27.07.95, exarado no citado requerimento, tendo o interessado sido notificado do despacho referido através o oficio nº13465/01308/DAP/SGP/95, de 31.07.95;
P) Pelo oficio nº34, da Assembleia Legislativa, de 19.01.96, foi solicitado o reembolso da quantia de MOP$5.940,00, indevidamente deduzida das remunerações nos meses de Agosto a Dezembro de 1995 para a renda de prédios urbanos por este ter vindo a receber um subsídio para arrendamento ao abrigo do disposto no artº21° do DL nº60/92/M, de 24.08 e nos termos do nº5 da disposição citada na redacção dada pelo DL nº37/95/M, de 07.08, ao pessoal recrutado ao exterior ter deixado de ser devida a contraprestação para renda de prédios urbanos;
Q) Por requerimento de 23.08.96, o recorrente, declarou que desde Março de 1996, se verificam todos os pressupostos da união de facto mantida há mais de dois anos, na sua relação com B, apresentando duas testemunhas;
R) Por ofício nº15964/01158/DGP/96, 10.09.96, foi solicitado à Assembleia Legislativa o ajustamento do desconto para renda de prédios urbanos de 3% para 5% a efectuar no vencimento do referido trabalhador, a partir de 01.03.96, nos termos do DL nº1/91/M, de 14.01;
S) Por despacho do Subdirector dos Serviços, de 18.10.96, foi autorizado o aumento de reembolso de renda correspondente à tipologia T3, na sequência da declaração referida no ponto 14;
T) Na sequência do ofício referido no ponto 13 da presente informação foi elaborada a informação nº367/SACM/96, de 14.10.96, que se transcreve na parte relevante:
  "(...) 1- Em 3 de Maio de 1991 celebrou o A um contrato de arrendamento referente à moradia sita no [Endereço].
2 - A celebração desse contrato de arrendamento foi autorizada por despacho do Sr. Director destes Serviços de 17.04.91, tendo como fundamento o facto da D.S.F. não possuir moradias devolutas em n° suficiente para fazer face ao alojamento de dezenas de agregados familiares que se encontravam alojados em unidade hoteleira a expensas do Território.
3 - Aos trabalhadores com direito a moradia mobilada a expensas da Administração que naquela época optaram pelo arrendamento de moradias, foi-lhes igualmente conferido o direito ao reembolso de renda, segundo critérios por nós desconhecidos.
  (.. .)
7 - O Decreto-Lei nº37/95/M, de 7 de Agosto ao dar nova redacção ao nº5 do artº 21° do Decreto-Lei nº60/92/M, de 24 de Agosto, veio isentar do desconto para renda dos prédios urbanos os recrutados no exterior a quem foi atribuído direito a alojamento definitivo na modalidade de subsídios, prevista nos artsº 21º e 22° do Decreto-Lei nº71/92/M, de 21 de Setembro, mantendo-se para os trabalhadores a quem foi atribuída moradia, equipada ou não, a obrigatoriedade de pagar a contraprestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da APM.
7.1 - Não existem assim dúvidas, salvo melhor opinião em contrário, relativamente ao dever desconto para R.P.U. dos trabalhadores a quem tenha sido atribuída moradia, equipada ou não.
7.2 - Assim sendo, temos que, a quem foi atribuída moradia equipada deverá ser descontado 3% ou 2%, consoante se trate de moradia mobilada ou não, respectivamente.
7.3 - Contrariamente, não é devida qualquer contraprestação quando o alojamento definitivo tenha sido conferido na modalidade de subsídios.
8 - Antecipando desde já a solução a que chegámos, parece-nos, salvo melhor opinião em contrário, que a situação relativa ao alojamento do A se enquadra perfeitamente na modalidade de alojamento definitivo prevista ao artº 15º do Decreto-Lei nº71/92/M, de 21 de Setembro (moradia equipada), isto porque:
a) Do processo nada consta quanto à atribuição de alojamento definitivo na modalidade de subsídios (artº 21º e 22° do Decreto-Lei nº71/92/M, de 21 de Setembro);
b) Consta sim, que o montante do reembolso deverá ser igual ao montante estipulado do Despacho nº98/GM/92, para a tipologia T2;
c) Nunca a D.S.F. nas comunicações que efectuou ao A utilizou o termo "subsídios", mas sim "reembolso de renda" (vide ex. Em oficio nº14405/00886/DAP/SGP/93);
d) Foi negada por despacho do Sr. Director dos Serviços, substº, de 26.07.95, a pretensão de transferência de moradia formulada pelo A em 10.07.95 (se se tratasse de concessão de subsídios o trabalhador poderia mudar de moradia sem que a Administração a tal se pudesse opor);
e) O A sempre se comportou como arrendatário de moradia atribuída pelo Território, nomeadamente solicitando a realização de obras de manutenção (vide, requerimento datado de 8 de Janeiro de 1993, no qual solicitava a pintura da parede da sala de jantar).
8.1 - Tal com foi referido na Informação n.º 235/GE/MA/91 do Gabinete de Estudos destes Serviços, elaborada na sequência de recurso hierárquico interposto pelo A, parece-nos que houve sim uma subrogação voluntária por parte daquele trabalhador, relativamente ao Território, quanto à celebração dos contratos de arrendamento.
9 - Pelo que supra fica exposto julgamos que deverá ser oficiada a Assembleia Legislativa comunicando-lhe que os descontos foram devidamente efectuados, não havendo lugar a qualquer tipo de reembolso;
9.1 - Deverá por outro lado ser descontado o montante devido desde o mês de Janeiro até à data em que aquele trabalhador cessar funções naquela Assembleia.
9.2 - Dado o A se encontrar a viver em condições análogas às dos cônjuges, com a Sra. B (conforme declaração apresentada nestes Serviços) deverá o mesmo passar a descontar 5%, de acordo com o estipulado nos artºs 2° e 3° do Decreto-Lei nº1/91/M, de 14 de Janeiro."
U) Em 15.10.96, na informação descrita, o Subdirector dos Serviços exarou o seguinte despacho:
"Concordo com a análise e conclusões desta informação, pelo que deve oficiar-se a Assembleia Legislativa nos termos propostos em 9.2, conjugados com o parecer da Sr. Chefe do DGP."
V) Transcreve-se, igualmente o mencionado parecer da Chefe do DGP:
"Compulsado o processo, é opinião da signatária que o A usufrui de alojamento do Território, no regime de reembolso de renda, pelo que concordo absolutamente com o indeferimento do reembolso, conforme e pelas razões fundamentadas na presente informação.
Mais deverá o A descontar 5% do vencimento para r.p.u. a partir da data da declaração da união de facto e conforme já foi comunicado à Assembleia Legislativa"
W) Por oficio nº19090/711/DGP/SACM/96, de 29.10.96, foi o recorrente, notificado do despacho do Subdirector dos Serviços, de 18.10.96, que autorizou o reajustamento do reembolso de renda de acordo com o valor do contrato, ou seja, MOP$5.666,00 face ao critério definido na informação no187/SGP/92, de 16.11.92;
X) A Assembleia Legislativa não procedeu ao ajustamento do desconto referido;
Y) O recorrente encontra-se a ser abonado do "reembolso de renda" no montante mensal de MOP$5.666,00 (cinco mil seiscentas e sessenta e seis patacas);
Z) Em 27 de Junho de 2000 a Chefe do D.G.P. elaborou informação onde concluiu:
"Seja ordenado ao trabalhador A a reposição das contraprestações, de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da Administração Pública de Macau (RPU), em dívida, desde 01.01.96 a 30.06.2000, no montante de MOP$116.676,00 (cento e dezasseis mil seiscentas e setenta e seis patacas);
Seja oficiada a Assembleia Legislativa no sentido de proceder ao desconto da quantia referida no vencimento do interessado e que a respectiva reposição seja remetida, a esta Direcção dos Serviços, com documento comprovativo da liquidação efectuada;
Mais, seja a Assembleia Legislativa, igualmente, oficiada para proceder ao desconto de 5% para RPU, a partir de 01.07.2000."
AA) O Director dos Serviços de Finanças proferiu sobre aquela informação, em 30 de Junho de 2000, o seguinte despacho: "Concordo. Notifique-se";
BB) Em 20 de Julho de 2000 o recorrente reclamou para o Director dos Serviços de Finanças;
CC) No dia 14 de Setembro de 2000 foi notificado do despacho em que o Senhor Secretário para a Economia e Finanças se pronunciou sobre o parecer exarado naquela reclamação, nestes termos:
"Assunto: Notificação do despacho do Exmoº Sr. SEF de 17.08.00, exarado sobre a Informação nº082/GC-SEF/2000, de 9 de Agosto.
Nos termos dos artigos 68° e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA) aprovado pelo DL n057/99/M, de 11.10.99, fica por este meio notificado do despacho de 17.08.00, do Exmoº Senhor Secretário para a Economia e Finanças, exarado na Informação nº082/GC-SEF /2000, de 9 de Agosto, sendo o seu teor o que a seguir se transcreve:
"Concordo."
Ass: Francis Tam"
Da informação referida reproduzem-se os fundamentos de facto e de direito que sustentam o presente despacho e que são os seguintes:
"(...)
A DSF solicita ao Senhor SEF a homologação do parecer contido em Informação 259/NAJ/CA/00, de 02.08.00, o qual surge na sequência de uma reclamação apresentada por A. Embora várias questões de direito se levantem, quer na reclamação quer no parecer da DSF, uma há que tem carácter prévio em relação a todos as outras: a de saber se o reclamante está ou não sujeito ao desconto no respectivo ordenado do montante previsto na lei (DL 1/91/M, de 14 de Janeiro) como correspectivo da atribuição de residência pela Administração.
Sendo esta a questão central a decidir, da qual dependem todas as outras só dela nos ocuparemos nesta informação e podemos desde já avançar a resposta: o reclamante não está sujeito ao desconto acima referido e o entendimento contrário não tem qualquer apoio legal e baseia-se num enorme equívoco criado há vários anos pela própria DSF. A explicação é a seguinte:
O artº 21° do DL nº53/89/M, de 28 de Agosto, (posteriormente revogado pelo DL nº60/92/M) obrigava a Administração a atribuir moradia a todos os recrutados ao exterior, querendo com isto significar "moradia propriedade da Administração". Tal como ainda hoje acontece, a atribuição da moradia propriedade da Administração ao trabalhador era compensada, a título de renda, pelo desconto de determinado montante no ordenado do interessado.
Todavia o número de moradias propriedade da Administração relevou-se insuficiente para fazer face ao número de recrutamentos ao exterior feitos nos finais de década de 80 e princípios da década de 90. Foi então que a DSF, com o intuito de fazer face ao problema, criou, à margem da lei e com o beneplácito do Secretário Adjunto respectivo, um novo regime que ficaria conhecido como de "reembolso de renda". Baseava-se tal regime na interpretação algo peregrina de que o direito a moradia garantido pela lei também podia ser exercido através do reembolso ao trabalhador da renda paga por este por uma moradia por ele próprio arrendada. E como de "atribuição de moradia" de tratava, na interpretação da DSF, o trabalhador teria que pagar mensalmente à Administração o montante devido por aqueles que habitavam em casas propriedade da Administração. Além disso, eram também consideradas pela DSF aplicáveis ao novo regime as demais normas reguladoras do regime de atribuição de moradia. Assim, por exemplo, o trabalhador teria que solicitar à DSF autorização para, para fins de mudança de residência, pôr termo ao contrato de arrendamento que ele próprio tinha celebrado com um terceiro e celebrar novo contrato com outro terceiro, apesar da Administração não ter qualquer papel em nenhum dos contratos!
Para justificar a referida ficção, temos visto usar explicações como, por exemplo, a da existência de sub-rogação. Trata-se de um absurdo jurídico: a sub-rogação pessoal verifica-se quando uma pessoa substitui outra em determinado relação jurídica pré-existente. Ora no caso em análise o contrato de arrendamento era celebrado entre o senhorio e o trabalhador e a Administração nunca se substitui ao segundo, nem nas suas obrigações nem nos seus direitos perante o senhorio. Isto é, a Administração nem era parte no contrato nem se substituía posteriormente a nenhuma das partes na execução desse mesmo contrato e vice-versa. Consequentemente é despropositado falar de sub-rogação. O que a DSF de facto fez foi unicamente criar, antes da própria lei o fazer, um regime de subsídios, miscigenado com algumas prestações típicas do regime de atribuição de moradia propriedade da Administração (como, por exemplo, o fornecimento de mobília). Tudo isto, repita-se, à margem da lei!
Foi a aplicação desta interpretação de duvidosa legalidade - embora, sublinhe-se, motivada pela intenção de resolver um grave problema com a Administração se deparava - a origem do problema que hoje, cerca de dez anos depois, estamos a discutir. De facto, durante a última década, a ficção criada pela DSF singrou, embora não tenham faltado oportunidades e bons pretextos para corrigir o erro e repor a legalidade!
A primeira oportunidade para corrigir a situação surgiu em 1992, com a entrada em vigor do DL nº60/92/M, de 24 de Agosto, o qual, mantendo o regime de atribuição de moradias propriedade da Administração, criou em alternativa, um novo regime se subsídio para habitação propriamente dito, cujo gozo dependia - tal como no regime criado anteriormente pela DSF - do pagamento pelo beneficiário de uma contraprestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores que habitavam em moradias da Administração (artº 21, nº2, b) e 5). Esperar-se-ia que a partir desta altura todas as situações práticas existentes tivessem sido reduzidas a uma das duas previstas no DL nº60/92/M, mas tal não aconteceu! De facto a partir de 1992 passam a existir na prática três regimes diferentes:
Os dois consagrados do DL nº60/92/M (atribuição de moradia da Administração ou subsídio de habitação), e portanto perfeitamente legais;
O tal regime sui generis de "reembolso de renda" criado anteriormente por iniciativa da DSF, constituído por subsídio de habitação mas sujeito pela própria DSF às regras do regime de atribuição de moradia (por exemplo, necessidade de autorização para mudança de residência!) por via da equiparação forçada com este último.
Em 1995 a lei deu um novo golpe no regime do "reembolso de renda", que no entanto logrou sobreviver. Na verdade o DL nº37/95/M, de 7 de Agosto, veio dar nova redacção ao nº5 do artº 21° do DL nº60/92/M e acabou com o pagamento, por parte dos beneficiários do regime legal de subsídio de renda, do montante correspondente à renda devida pelas moradias da Administração. Tratou-se, diga-se de passagem, de uma medida coerente, pois não fazia sentido que a Administração por um lado atribuísse a determinado trabalhador um subsídio de renda em substituição de uma moradia e, por outro, lhe exigisse um pagamento a título de renda!! Todavia esta coerência do legislador de 1995 não impressionou a DSF a qual, ao abrigo do "seu" regime de "reembolso de renda" continuou a exigir aos trabalhadores abrangidos pelo mesmo o desconto devido por aqueles a quem foi atribuída moradia da Administração. Em suma, a ficção continuou o seu curso.
É esta a situação em que se encontra o reclamante, bem como outros trabalhadores da Administração, a quem a DSF, em nome de um equívoco que já tem 10 anos, exige o desconto no ordenado, sem qualquer suporte legal, de um montante equivalente ao da renda paga pelas moradias da Administração. Bem andou a Assembleia Legislativa em suspender os referidos descontos ao seu trabalhador!
Conclusões e proposta:
O reclamante tem razão.
A DSF não pode efectuar quaisquer descontos a titulo de rendas urbanas a trabalhadores que não habitem em moradias da Administração, sendo tal prática ilegal.
A DSF deve urgentemente tomar as medidas necessárias à regularização desses trabalhadores, delas dando conta ao Senhor Secretário para a Economia e Finanças.
(...)"
Com os melhores cumprimentos,
Direcção dos Serviços de Finanças, em Macau, aos 14 de Setembro de 2000.
O Director dos Serviços
(Carlos F .A. Ávila)
DD) Posteriormente, já em 9 de Maio de 2001 foi o recorrente notificado do despacho recorrido, assim:
"Assunto: Notificação - A
Nos termos dos artigos 68º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo (CPA) aprovado pelo DL nº57/99/M, de 11-10, fica V. Exa. por este meio notificado do despacho do Exmº Senhor Secretário para a Economia e Finanças de 03.05.01, com referência à Informação nº30037/DGP/01, de 13/03/01, sendo o seu teor o que a seguir se transcreve:
Do despacho do Exmº Senhor Secretário para a Economia e Finanças:
" 1 - Concordo com a análise jurídica efectuada pela DSF sobre ., "reembolso de rendas", constante do ponto "B" e com as conclusões do ponto "C", da Informação nº30037/DGP/01, de 13.03.01.
Saliento, para além do referido, que nos termos do artigo 5º do Decreto-Lei nº71/92/M de 21 de Setembro (que regulamenta o direito a alojamento do pessoal recrutado no exterior), a opção pela modalidade pela qual se concretiza o direito a alojamento compete à Administração e não ao seu titular.
Em consequência, determino o seguinte:
A DSF deve continuar a assegurar o reembolso das rendas nas situações em que essa responsabilidade foi assumida pelos arrendatários, em substituição da RAEM, como dispõe a alínea d) do artigo 16º do Decreto-Lei nº30/99/M de 05 de Julho e, anteriormente, a alínea m) do artigo 16º do Decreto-Lei nº61/95/M, de 27 de Novembro;
Os reembolsados estão sujeitos ao pagamento mensal de uma renda ou de uma contra prestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da APM (artigo 9° do Decreto-Lei nº71/92/M, de 21.09), consoante o caso, pela moradia atribuída, conforme disposto no artigo 1º do Decreto-Lei nº1/91/M, de 14 de Janeiro, calculada e a liquidar nos termos dos artigos 2º, 3º e 4º, do mesmo diploma legal.
II - Verifico que a DSF, no caso da reclamação do A, traduziu mal o meu despacho exarado na Informação 082/GC-SEF/2000, de 09 de Agosto de 2000, tendo notificado o reclamante de que eu teria concordado com o conteúdo e propostas aí veiculadas, quando o meu despacho determinou apenas o envio daquela informação à DSF para estudo.
Impõe-se, em consequência, com urgência, rectificar a situação dando sem efeito a notificação efectuada pela DSF do meu despacho, de 17/08/00, exarado na Informação nº082/GC-SEF/2000, de 09 de Agosto, que foi efectuada através do oficio com a referência nº242/NAJ/CA/00, de 14.09.00.
Revogo a decisão final da DSF consubstanciada no despacho do Sr. Director dos Serviços, de 30.06.00, exarado na Informação nº30292/DGP/00, por preterição dos comandos dos artigos 58º e 93º e ss, do Código do Procedimento Administrativo.
A DSF deve iniciar o Procedimento Administrativo tendente a regularizar a situação de falta de pagamento mensal da contra prestação devida pelo uso e fruição da moradia equipada que foi atribuída ao A na modalidade de reembolso de renda, tendo em atenção o referido no ponto I do presente despacho, informando-o do início do mesmo e garantindo o seu direito de audiência, previsto no artigo 93º do Código de Procedimento Administrativo, antes de ser proferida a decisão final sobre o procedimento pela entidade competente.
A DSF deve notificar o A deste despacho e proceder em conformidade com o mesmo."
Da informação jurídica:
"(...)
B - Análise
I - Introdução:
3 - Em fins dos anos 80, verificou-se que o então Território de Macau não possuía moradias em número suficiente para garantir o alojamento a alguns funcionários que, por lei, tinham esse direito.
Em consequência, aqueles funcionários formularam à Administração pedidos de autorização para arrendarem moradias propriedade de terceiros ficando a Administração responsável pelo pagamento da respectiva renda e pelas demais despesas inerentes ao respectivo contrato.
(...)
II - Natureza e Legalidade do Reembolso de renda:
4 - A Administração deferiu aqueles pedidos. Paralelamente a este deferimento, estabeleceram-se as fronteiras delimitadoras do exercício do direito de reembolso como forma de evitar desigualdades e potenciais abusos ou conluios entre o beneficiário e o locador, através, nomeadamente:
- Da fixação de uma contraprestação a cargo do beneficiário, a favor da Administração.
- Do estabelecimento de limites máximos de renda reembolsável e equipamento a disponibilizar;
- Estamos, pois, em presença de um pedido e da atitude da Administração face a esse pedido, mais concretamente, de um acto administrativo de deferimento de um pedido formulado por um particular, seguido de outros actos administrativos, proferidos na sua sequência. É irrelevante o facto de não existir um regime definido por lei uma vez que os actos são perfeitamente legais. Com efeito, trata-se de um acto que preenche todos os requisitos de legalidade (1) de um acto administrativo, designada mente:
a.) voluntário;
b.) praticado no exercício de um poder público e para prossecução de interesses postos por lei a cargo da Administração, como sejam o direito de alojamento, e que,
c.) produz efeitos jurídicos num caso concreto.
6 - Aliás, mesmo que se considerassem tais actos ilegais, apenas os praticados no último ano seriam impugnáveis ou revogáveis, posto que decorrido um ano sobre a data da sua prática ou da sua tomada de conhecimento pelos interessados, qualquer ilegalidade do acto administrativo fica automaticamente sanada, salvo os casos de nulidade, neles não se enquadrando a situação ora em apreço (cfr. artigo 25º, nº2, alínea c) do Decreto-Lei nº110/99/M, de 13 de Dezembro, que aprova o Código de Processo Administrativo Contencioso, em conjugação com o artigo 130° do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei nº57/99/ M, de 11 de Outubro).
7 - Não obstante, a legalidade do acto administrativo de deferimento do pedido de reembolso de renda, aparece, ainda, confirmada posteriormente pela lei. Na verdade, é a própria lei que obriga a Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) a assegurar o pagamento do reembolso de rendas.
Assim o estatuía a alínea m) do artigo 16° do Decreto-Lei nº61/95/M, de 27 de Novembro, que aprovou a anterior Lei Orgânica da DSF e assim o estatui a alínea d) do artigo 16º do Decreto-Lei nº30/99/ M, de 05 de Julho, que aprova a actual Lei Orgânica da DSF, nos termos da qual:
"À Divisão de Administração e Conservação de Edifícios, abreviadamente designada por DACE, compete, designada mente:
d) Assegurar o reembolso das rendas nas situações em que essa responsabilidade foi assumida elos arrendatários em substituição do Território; (...)".
Não há um "regime jurídico" do reembolso de renda, mas este deriva da prática de uma sequência de actos administrativos válidos que encontra acolhimento na própria lei a qual, além do mais, atribui competência à DSF para o seu processamento.
III - Delimitação do direito e RPU:
8 - O direito a reembolso de renda tem as suas próprias fronteiras claramente definidas pela sequência de actos administrativos praticados a que se fez alusão, uma vez que em todos os casos em que foi atribuído sempre obedeceu a critérios uniformes de tratamento igual para situações iguais. Esses critérios consistiam essencialmente no seguinte:
a.) Fixação da tipologia do arrendado em função do agregado familiar do requerente;
b.) Fixação de limites máximos de reembolso de renda em função da tipologia do arrendado e preços de mercado;
c.) Fixação de uma contraprestação a cargo do reembolsado, a favor da Administração, com referência ao regime previsto para os titulares de moradias atribuídas pelo então Território (sua propriedade ou por si arrendadas) - DL nº1/91/M, 14 de Janeiro.
São critérios estritamente objectivos, aplicados por força de actos administrativos, inclusivamente confirmados em despachos proferidos por elementos do próprio Executivo, nos poucos casos em que foram objecto de recurso hierárquico por parte dos particulares.
9 - A referida informação nº082/GC-SEF/2000, entende, também, que a Administração não pode efectuar quaisquer descontos a título de RPU nos casos de reembolso de renda, uma vez que os reembolsados não habitam "moradias propriedade da Administração". Para fundamentar esta conclusão, a informação recorre à seguinte interpretação:
“O artigo 21º do DL nº53/89/M, de 28 de Agosto, (posteriormente revogado pelo DL nº60/92/M) obrigava a Administração a atribuir moradia a todos os recrutados ao exterior, querendo com isto significar “moradia propriedade da Administração”. ”
No entanto, a redacção do artigo 1º do Decreto-Lei nº 1/91/M, de 14 de Janeiro, utiliza a expressão “moradias atribuídas pelo Território” o que é bastante diferente e não pode deixar de ser intencional por parte do legislador1. Na verdade, a seguir-se a interpretação daquela informação ao considerar que “mordias atribuídas” são “moradias propriedade da Administração”, esta ficaria impossibilitada de arrendar moradias a terceiros e atribuí-las a quem de direito, a menos que fossem sua ,. propriedade.
Tal situação traduzir-se-ia numa violação grosseira do disposto no artigo 16º, nº1, alínea b) do DL nº61/95/M, de 27 de Novembro, e da alínea h) do artigo 16º do DL nº30/99/M, de 05 de Julho, nos termos das quais:
Artº 16º-1-b): “Ao Departamento de Gestão Patrimonial (...) compete (...) proceder aos arrendamentos necessários (...) ao alojamento dos trabalhadores que a ele tenham direito”.
Artº 16º-al. h): “Á Divisão de Administração e Conservação de Edifícios (...) compete (...) proceder aos arrendamentos necessários (...) ao alojamento dos trabalhadores que a ele tenham direito”.
Estes preceitos apenas visam possibilitar, precisamente, o arrendamento de moradias que não são propriedade da RAEM, para em seguida as atribuir aos trabalhadores que a elas tenham direito. E estes casos, como se sabe e a própria informação que vimos referindo não coloca em causa, implicam o pagamento de RPU nos termos do artigo lodo DL nº 1/91/M, de 14.01.
Acresce que,
11 - Nunca nenhum dos despachos proferidos por elementos do Executivo que, decidindo de recursos hierárquicos, confirmaram o pagamento daquela contra prestação pelo reembolsado, foi impugnado contenciosamente, modificado ou revogado até ao momento.
12 - Pelo que, para além de contrariar a lei, o entendimento veiculado naquela informação, entra em choque com todas as informações que anteriormente se debruçaram sobre este assunto e contraria as decisões de elementos do Executivo em sede de recurso hierárquico que, na sua totalidade, sempre concordaram com aquelas informações, em despachos, aliás, exarados nas próprias.
(...)
Finalmente, se a questão em apreço depende de apurarmos se a Administração é substituída pelo reembolsado na qualidade de arrendatário ou não (no primeiro caso, a Administração poderia exigir a contraprestação ao passo que no segundo, não o poderia2), tal questão é resolvida pela própria lei e o legislador considerou e considera, que o reembolsado se limita a substituir a Administração assim confirmando a prática administrativa que tem vindo a ser adoptada.
Com efeito,
Dispunha a já mencionada al m) do artigo 16º do DL nº61/95/M, de 27.11.95, que:
“Ao Departamento de Gestão Patrimonial. abreviadamente designado por DGP. compete a gestão do património duradouro do Território e da execução dos contratos de concessão de exclusivos e terras. cabendo-lhe nomeadamente:
...
m) Desenvolver o processamento administrativo referente aos subsídios para arrendamento e para equipamento e respectivos complementos, desencadeando o reembolso das rendas, nas situações em que essa responsabilidade foi assumida pelos arrendatários, em substituição do Território (...)”.
Este preceito legal, bem como o diploma em si, foram revogados pelo acima referido Decreto-Lei nº30/99/M, de 05 de Julho. No entanto, o legislador manteve a sua posição de forma inequívoca na supra citada al. d) do artigo 16º:
“À Divisão de Administração e Conservação de Edifícios, abreviadamente designada por DACE, compete, designadamente:
  ...
d) Assegurar o reembolso de rendas nas situações em que essa responsabilidade foi assumida pelos arrendatários, em substituição do Território (...)”;
14 - De acordo com a redacção destes preceitos legais, embora o Território não assine o contrato de arrendamento enquanto parte, a posição de arrendatário que detém o reembolsado é meramente formal. O reembolsado, de facto, era (e é) arrendatário em substituição do Território, com a sua autorização.
Contudo, a referida Informação nº082/GC/SEF/2000 não faz qualquer referência a estas normas.
O próprio comportamento dos reembolsados demonstra que estes reconhecem e aceitam a situação de meros intermediários entre a Administração e o locador, quando:
a) Solicitam autorização para a concretização do arrendamento;
b) Solicitam autorização da Administração sempre que pretendem mudar de arrendado;
c) Solicitam reajustamentos do nível do reembolso; e,
d) Solicitam à Administração a realização de obras que consideram que o arrendado necessita;
e) É a Administração quem paga as despesas do contrato de arrendamento, a caução arbitrada pelo locador, as despesas de condomínio e todas as demais despesas inerentes ao arrendamento;
f) É a Administração quem equipa a moradia (o que não é compatível com o subsídio de arrendamento).
15 - Deste modo, a relação jurídica que se configura é semelhante à situação em que a RAEM atribui moradias que arrendou a terceiros em cumprimento do estipulado nas supra transcritas alíneas b) do nº1 do artº 16º e h) do artigo 16º, respectivamente dos DL nº61/95/M, de 27.11 e DL nº30/99/M, de 05.07.
Assim, inicialmente pelos princípios da imparcialidade e justiça e, posteriormente, por disposição da própria lei, legítima a aplicação aos casos de reembolso de renda, do artigo 1º do Decreto-Lei nº1/91/M, de 14 de Janeiro, nos termos do qual:
“(...) os funcionários e agentes que sejam inquilinos de moradias atribuídas pelo território (...), ficam sujeitos ao pagamento de uma renda mensal calculada e a liquidar nos termos dos artigos seguintes”.
É desnecessário transcrever a fórmula de cálculo prevista nos artigos seguintes, bastando acrescentar que foi essa a fórmula que a Administração seguiu e que se trata da forma legal de cálculo das rendas de prédios urbanos (rpu).
  
C - Conclusões
1º - O reembolso de renda e sua delimitação derivam da prática, confirmada por elementos do próprio Executivo, de actos administrativos válidos que traçaram objectivamente o seu enquadramento;
2º - Mesmo que assim se não entendesse, qualquer vício daqueles actos administrativos assim praticados encontrar-se-ia, há muito, sanado (Artigo 25º, nº2, alínea c) do CPAC em conjugação com o artigo 130º do CPA).
3º - De qualquer forma, o reembolso de renda encontra ulterior acolhimento inequívoco na própria lei que, além do mais, atribui competência à DSF para o seu processamento (artº 16º, alínea d) do DL nº30/99/M, de 5 de Julho).
4º - Do mesmo modo, é o próprio legislador que confirma toda a prática administrativa anterior de cobrança de uma contra prestação (R PU) pela Administração aos particulares, quando refere expressamente que aqueles apenas substituem a Administração na relação de arrendamento (al. d) do artigo 16º do DL nº30/99/M, de 05.07, in fine).”
Mais se informa V. Exa. de que, nos termos do artigo 25º, nº2 do Código de Processo Administrativo Contencioso, aprovado pelo Decreto-Lei nº110/99/M, de 13 de Dezembro, e do artigo 36º, nº1 da Lei nº9/1999, de 20 de Dezembro, do acto administrativo ora notificado e praticado pelo Senhor Secretário para a Economia e Finanças, cabe recurso contencioso imediato, a interpor no prazo de 30 dias para o Tribunal de Segunda Instância da Região Administrativa Especial de Macau.
Informa-se, finalmente, que em cumprimento do ora notificado despacho do Senhor SEF, foi dado início ao procedimento administrativo tendente ao apuramento da existência de contra prestações não liquidadas inerentes ao reembolso de rendas percebido por V. Exa..
Para qualquer esclarecimento, V. Exa. poderá contactar com os Técnicos Superiores C e D através, respectivamente, dos telefones nºs XXXX-XXX/XXX.
Com os melhores cumprimentos,
Macau, aos 09 de Maio de 2001
O Director dos Serviços, Substituto
Ho Hou Yin”
EE) O despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças de 17 de Agosto de 2000 - exarado na Informação nº082/GC-SEF/2000 de 9 de Agosto - foi proferido em língua chinesa nestes termos: “同意交財政局參考”.
FF) A sua tradução é exactamente: "Concordo com a entrega à Direcção dos Serviços de Finanças para efeito de referência".

Foram juntos com a contestação do recurso contencioso outros dois documentos, não mencionados no Acórdão recorrido, e que importa considerar:
GG) Em cumprimento do acto recorrido (despacho de 3 de Maio de 2001), por despacho do Director da DSF, de 23.5.01, foi determinado a notificação do A, para querendo se pronunciar, nos termos dos arts. 58.º e 93.º do Código de Procedimento Administrativo, da seguinte proposta de decisão - de que estava em dívida para com a Administração, dos montantes indicados - que deveria repor:
“a) Solicitar ao interessado a liquidação da quantia de MOP $99.702,00 (Noventa e nove mil, setecentas e duas patacas) a título de contraprestações em atraso em função do reembolso de renda percebido, até ao fim do corrente mês, resultante das somas dos seguintes valores: 3% do vencimento mensal relativamente ao mês de Novembro de 1995; 3% do vencimento mensal relativamente ao período compreendido entre 01/01/96 e 31/08/96; 5% do vencimento mensal percebido entre 01/09/96 e 30/10/97; e 3% do vencimento mensal percebido entre 01/11/97 e a presente data - conforme quadro em anexo.
b) Solicitar igualmente ao interessado, a reposição da quantia de MOP $42.504,00 (Quarenta e duas mil, quinhentas e quatro patacas), resultante da diferença entre o valor do reembolso de renda percebido (MOP $5.666,00 mensais) e o valor do reembolso de renda a que o interessado tinha, no máximo, direito (MOP $ 4700,00 mensais), durante o lapso de tempo compreendido entre 01/11/97 e a presente data (44 meses)”.
HH) Por despacho do Director da DSF, de 15.6.01, foi determinado que o A liquidasse à Administração os montantes indicados na alínea anterior.
O acto recorrido é o constante da alínea DD).

III – O Direito
Conhecimento da falta de um pressuposto processual do recurso contencioso
1. No seu parecer final, o Ex. mo Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de Segunda Instância suscitou a questão da irrecorribilidade do acto administrativo recorrido, por considerar que o mesmo não era o acto final do procedimento, não era o acto que afecta os direitos e interesses do recorrente.
Sobre esta matéria, o Acórdão recorrido não se pronunciou expressamente, dizendo o seguinte:
«Embora o ilustre Magistrado do Ministério Público tenha opinado pela rejeição do recurso, por considerar irrecorrível o acto, não se abordará o tema a título de questão prévia.
É que tudo passa pela interpretação conjugada dos despachos de 17 de Agosto de 2000 e de 3 de Maio de 2001 o que se fará “infra”, sob o n.º 3.2».
Mas acabou apenas por se pronunciar sobre o despacho de 17 de Agosto de 2000, considerando-o como acto final e não se pronunciou sobre a questão de saber se o acto recorrido, de 3 de Maio de 2001 era ou não a decisão final do procedimento administrativo e, portanto, se era contenciosamente recorrível.
Será essa a matéria que iremos abordar, por ser de conhecimento oficioso.
Sobre a questão não tem que ser ouvido o ora recorrido, A, para efeitos do disposto na segunda parte do n.º 3, do art. 3.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável subsidiariamente, nos termos do art. 1.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), já que o ora recorrente suscitou a questão de o acto recorrido não ser a decisão final do caso concreto, no art. 16.º da contestação do recurso contencioso, embora a tenha qualificado indevidamente - juntamente com outras questões que então levantou, como a não quantificação da dívida do interessado - como ineptidão da petição, por contradição entre o pedido e a causa de pedir.
Ora, o recorrente do recurso contencioso, A, teve a oportunidade de se pronunciar sobre a questão, no seu articulado de resposta à excepção e pronunciou-se efectivamente, dizendo que o acto recorrido definiu a situação jurídica do recorrente.
Por outro lado, o Acórdão recorrido, quando apreciou a excepção de ineptidão da petição, não conheceu da questão em apreço, tendo-se limitado a dizer que a causa de pedir é “um despacho, que na sua (do recorrente) óptica, violou a lei, e explicou o porquê dessa violação.
De seguida, e em perfeita coerência e lógica, formulou o pedido de declaração da sua invalidade.
Não há, por conseguinte, qualquer contradição, improcedendo a invocada excepção dilatória”.
Não há, portanto, caso julgado que obste a que este Tribunal conheça da falta deste pressuposto processual do recurso contencioso.

A situação dos autos
2. Para conhecer da questão, importa resumir a complexa situação factual e jurídica do caso em apreço.
O recorrente foi recrutado a Portugal, em 1990, para exercer funções no, então, Gabinete para a Modernização Legislativa e passou a exercer funções na Assembleia Legislativa, a partir de 11.11.92.
Em 25 de Março de 1991 requereu ao Director dos Serviços de Finanças autorização para arrendar casa a expensas do Território.
Por despacho de 16 de Abril seguinte foi autorizado a arrendar moradia tipo T1, com renda que não excedesse $2.750,00 patacas.
Em 29.07.91 o recorrente reclamou da decisão do facto de ter sido ordenado o desconto no vencimento para renda de casa.
Em 16.08.91 recorreu hierarquicamente do despacho que impôs o desconto para renda da casa.
Por despacho do Secretário-Adjunto para a Economia e Finanças, de 27.09.91, foi homologado o parecer que conclui que o direito a moradia mobilada previsto no art. 20.° do DL 53/89/M, de 28.08, pode revestir a forma do reembolso ao titular do direito do montante (previamente fixado) que este despende quando, sub-rogando-se ao Território é por este autorizado a celebrar contrato de arrendamento, e em consequência lhe é descontada a renda a que alude o Decreto-Lei n.º 1/91/M - e negado provimento ao recurso interposto.
Por ofício de 10.09.96, foi solicitado à Assembleia Legislativa o ajustamento do desconto para renda de prédios urbanos de 3% para 5% a efectuar no vencimento do referido trabalhador, a partir de 01.03.96, nos termos do Decreto-Lei n.º 1/91/M, de 14.01.
A Assembleia Legislativa não procedeu ao ajustamento do desconto referido.
O recorrente encontra-se a ser abonado do "reembolso de renda" no montante mensal de MOP$5.666,00 (cinco mil seiscentas e sessenta e seis patacas).
Em 27 de Junho de 2000 a Chefe do D.G.P. da Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) elaborou informação onde concluiu:
“Seja ordenado ao trabalhador A a reposição das contra prestações, de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da Administração Pública de Macau (RPU), em dívida, desde 01.01.96 a 30.06.2000, no montante de MOP$116.676,00 (cento e dezasseis mil seiscentas e setenta e seis patacas);
Seja oficiada a Assembleia Legislativa no sentido de proceder ao desconto da quantia referida no vencimento do interessado e que a respectiva reposição seja remetida, a esta Direcção dos Serviços, com documento comprovativo da liquidação efectuada;
Mais, seja a Assembleia Legislativa, igualmente, oficiada para proceder ao desconto de 5% para RPU, a partir de 01.07.2000.”
O Director dos Serviços de Finanças proferiu sobre aquela informação, em 30 de Junho de 2000, o seguinte despacho: “Concordo. Notifique-se”.
Em 20 de Julho de 2000 o recorrente reclamou para o Director dos Serviços de Finanças.
Em 9 de Agosto de 2000 é elaborado um parecer jurídico, por um Assessor do Gabinete do Secretário para a Economia e Finanças, em que se conclui que o reclamante tem razão e que a DSF não pode efectuar descontos a título de rendas urbanas a trabalhadores que não habitem em moradias da Administração, por ser ilegal.
Sobre este parecer, o Secretário para a Economia e Finanças, emitiu, em 17 de Agosto de 2000, o seguinte despacho: “同意交財政局參考 “.
A DSF traduziu este despacho por “Concordo” e notificou o recorrente que o Secretário para a Economia e Finanças dera provimento à sua reclamação.
Contudo, em 13 de Março de 2001, é elaborada uma informação por dois técnicos da DSF, em que faz a história do aparecimento das situações semelhantes à do recorrente (reembolsos de renda em situações em que, por falta de moradias da Administração, os funcionários arrendavam os imóveis e a Administração ficava responsável pelo pagamento das rendas, gestão e demais despesas, incluindo de manutenção).
Conclui-se nessa informação que tal prática (arrendamento pelos funcionários e pagamento das rendas pela Administração, descontando nos respectivos vencimentos 3% ou 5 %) é legal.
O Secretário para a Economia e Finanças profere um despacho em 3 de Maio de 2001, que é o acto recorrido em que decide o seguinte:
a) Concordou com a análise jurídica da informação de 13 de Março de 2001 e determinou à DSF que continuasse a assegurar a cobrança das contraprestações relativas ao reembolso das rendas, nas situações em que o arrendamento foi directamente efectuado pelos funcionários;
b) Constata que a DSF traduzira mal o seu despacho de 17 de Agosto de 2000, proferido sobre a reclamação do A, e notificara erradamente este de que a reclamação fora deferida.
Mais esclareceu que o seu despacho apenas determinara o envio do parecer do Assessor para estudo da DSF e que não concordara com o seu teor.
Em consequência, deu sem efeito a notificação da DSF ao reclamante.
c) Relativamente ao procedimento administrativo atinente ao A, determina a reinstrução do mesmo, especificando que antes da decisão final pela entidade competente, deve ser garantido o seu direito de audiência, nos termos do art. 93.º do Código de Procedimento Administrativo.
Determina, no entanto, que na decisão final a tomar deve ser seguida a instrução genérica, atrás referida na alínea a).
Mais tarde, o ora recorrente foi ouvido nos termos do art. 93.º do Código de Procedimento Administrativo (fls. 135 a 139).
E, por despacho de 15.6.01, o Director da DSF determina que o A proceda à liquidação de MOP$99.702,00 a título de contraprestações em atraso relativo a reembolsos de renda, devidos desde Novembro de 1995 até 30 de Junho de 2001 e ainda que reponha a quantia de MOP$42.504,00, resultante da diferença entre o valor do reembolso de renda percebido e o valor a que tinha efectivamente direito.

Irrecorribilidade do acto recorrido por não ter produzido efeitos externos, não ser a decisão final do procedimento, nem lesar direito ou interesse legalmente protegido do interessado
3. É de meridiana clareza e aparente, mesmo à vista desarmada, que o acto recorrido, nas primeira e terceira partes [alíneas a] e c]] não é um acto administrativo contenciosamente recorrível, por não se tratar de um acto que lese direito ou interesse legalmente protegido do A. Não se trata de um acto que tenha produzido efeitos externos.
Na verdade, a primeira parte [alínea a], mencionada atrás] do despacho de 3 de Maio de 2001 dá o seu apoio à tese jurídica atinente ao dever jurídico de pagamento das contraprestações relativas aos reembolsos de renda, que é desfavorável ao interessado, mas é uma instrução genérica à DSF, não decide o caso concreto do reclamante.
Na terceira parte, [alínea c] mencionada atrás] o mesmo despacho de 3 de Maio de 2001, determinou que se prosseguisse no procedimento relativo ao A, mandando que este fosse ouvido antes da decisão final, como impõe o art. 93.º do Código do Procedimento Administrativo, que diz:
“Artigo 93.º
(Audiência dos interessados)
1. Salvo o disposto nos artigos 96.º e 97.º, concluída a instrução, os interessados têm direito a ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
2. ...
3. ...”

E mais tarde, ouvido o interessado, o Director da DSF, por despacho de 15.6.01, tomou, então, a decisão final, determinando que o interessado procedesse ao pagamento das contraprestações relativas ao reembolso das rendas.
Foi este, indiscutivelmente, o acto que decidiu, autoritariamente a situação final do interessado, pondo fim ao procedimento. Foi este acto - e não o acto recorrido - que visou produzir efeitos no caso concreto.3
E parece que deveria ser este acto que o ora recorrido deveria ter impugnado. Não cabendo agora saber se, primeiro, hierarquicamente, ou logo, contenciosamente. Nem interessando saber se o impugnou ou não.

4. Mas, dir-se-á, o despacho recorrido na sua terceira parte indicava já a solução jurídica a ser seguida, desfavorável ao interessado. Não se poderia considerar que este acto já lesava o ora recorrido?
Entende-se que não. A sua lesão era ainda, meramente potencial. Na verdade, não estava excluído que a ordem do superior não fosse seguida pelo inferior. Não interessa se isso era provável, mas era possível e, neste caso, a que título admitir o recurso de um acto que não afectara o interessado?
Por outro lado, a lei actual refere como contenciosamente recorríveis os que, produzindo efeitos externos, não se encontram sujeitos a impugnação administrativa necessária (art. 28.º, n.º 1 do CPAC)
Ora, não produzem efeitos externos as ordens ou instruções de serviço, dirigidas por órgãos superiores da hierarquia aos órgãos inferiores sobre a forma como devem actuar em casos concretos, pelo que não são contenciosamente recorríveis.
Como explica MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA4 “São actos internos, em primeiro lugar, as ordens ou instruções de serviço dirigidas por órgãos superiores da hierarquia aos órgãos (ou aos seus titulares) colocados na sua dependência sobre a forma como devem actuar em casos concretos: assim se a Câmara Municipal ordena ao Conselho de Administração dos Serviços Municipalizados que demita um funcionário, este só poderá recorrer do acto daquele Conselho de Administração que, em cumprimento da ordem recebida, o demitir; mas não lhe é admitido impugnar a ordem dada. Logicamente, aliás, porque a sua situação perante a Administração só fica definida se e quando a ordem for cumprida”. 5

5. Resta apurar se a segunda parte do despacho é acto administrativo recorrível.
Na segunda parte [alínea b) mencionada atrás], o autor do despacho de 3 de Maio de 2001 interpreta autenticamente o seu despacho de 17 de Agosto de 2000 e diz que foi mal traduzido pela DSF, que o considerou como concordando com parecer que dava razão ao reclamante, quando assim não acontecera. E, assim, dá sem efeito a notificação que a DSF fizera, comunicando ao interessado o deferimento da sua reclamação.
Na perspectiva do autor do acto, o vício do procedimento estava na errada tradução do seu despacho anterior, de chinês para português, e consequente errada notificação ao reclamante. E por isso, coerentemente, não alterou, nem revogou o seu despacho anterior.
Nem sequer rectificou o acto anterior.
Limitou-se a corrigir o vício da errada tradução do acto e a errada notificação ao reclamante, que deu sem efeito, circunstâncias exteriores e posteriores ao acto.
Na perspectiva do autor do acto recorrido este não revogou o despacho de 17 de Agosto de 2000.
Mas não foi esse o entendimento do Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, que considerou que o acto recorrido revogou efectivamente o despacho de 17 de Agosto de 2000. Para tal, entendeu que, com este último despacho, o seu autor concordou com o parecer que dava razão ao reclamante. E, que por outro lado, o acto recorrido não pode ser considerado mera rectificação oficiosa, pois não se perfilava nenhum erro material. Concluiu, assim, o Acórdão recorrido que o despacho de 3 de Maio de 2001, revogou o despacho de 17 de Agosto de 2000.
Há, portanto, que apurar se o despacho de 3 de Maio de 2001, revogou o despacho de 17 de Agosto de 2000.

Se o despacho de 3 de Maio de 2001, revogou o despacho de 17 de Agosto de 2000.
6. É sabido que a revogação de acto administrativo é o acto que extingue os efeitos jurídicos de um acto anterior.
Por seu lado, a rectificação de acto administrativo é o acto que corrige erros de escrita ou de cálculo, ou outras irregularidades manifestas de que enferma um certo acto administrativo.6
O despacho de 17 de Agosto de 2000 é do seguinte teor:
“同意交財政局參考”.
Foi traduzido para português por “Concordo” pela DSF, o que deu origem às confusões que vêm sendo assinaladas.
A tradução efectuada por uma tradutora do Tribunal de Segunda Instância foi: “Concordo com a entrega à Direcção dos Serviços de Finanças para efeito de referência”.
Este Tribunal de Última Instância considera que a tradução correcta é:
“Concordo com a entrega à Direcção dos Serviços de Finanças para consideração”.
Tudo está em saber se o despacho de 17 de Agosto de 2000 pretendeu concordar com o parecer que dava razão ao reclamante, decidindo a reclamação que fora dirigida ao Director da DSF.
Entendemos que o despacho de 17 de Agosto de 2000, não pretendeu decidir a reclamação apresentada pelo interessado. Não pretendeu ser o acto definitivo do procedimento.
Temos isto por indiscutível. Se o despacho tivesse querido concordar com o parecer do Assessor, decidindo a reclamação, não teria, certamente, empregue os termos que empregou. Teria dito “Concordo” ou “Defiro a reclamação” ou “Estou de acordo” ou “Dou provimento à reclamação”. Mas não disse. Limitou-se a mandar remeter o parecer à DSF, para esta o ter em consideração ao tomar a decisão final, isto porque havia informações da DSF contrárias ao parecer do Assessor do Gabinete.
A contrário do que se afirma no Acórdão recorrido, o despacho de 3 de Maio de 2001, o acto recorrido, não rectificou o acto anterior. Interpretou autenticamente o acto anterior e rectificou a situação criada com a errada tradução do despacho de 17 de Agosto de 2000 e a errada notificação ao reclamante, que lhe havia sido feita, comunicando-lhe o deferimento da reclamação.
Ora, como ensina D. FREITAS DO AMARAL7 “se o acto interpretativo se contém nos limites do acto interpretado, escolhendo uma das interpretações que ele na verdade comporta, estamos em presença de uma aclaração confirmativa; se porém a interpretação do órgão administrativo excede aqueles limites, já não haverá aclaração, mas, antes, revogação ou modificação do acto primário: o órgão aclarante, sob a capa de uma pretensa interpretação, dá a um acto administrativo anterior um sentido que ele não comportava de acordo com as regras gerais da interpretação”.
Ora, se o autor do acto recorrido diz claramente que o seu despacho anterior não concordou com o parecer que dava razão ao reclamante; se, manifestamente as suas palavras – no 1.º despacho - não foram de concordância com o parecer; se é indiscutível que não pretendeu ser a decisão final do procedimento;8 se a interpretação que se faz no segundo despacho é compatível com um dos sentidos possíveis do primeiro acto. Atento também, o nível de decisão do autor do acto, não vemos razão para duvidar da auto-interpretação que dá ao acto anterior.
Não subscrevemos, pois, a tese do Acórdão recorrido que o despacho de 3 de Maio de 2001 é revogatório do despacho de 17 de Agosto de 2000.
Deste modo, também na segunda parte, o acto recorrido não é um acto contenciosamente recorrível.
Em conclusão, o acto recorrido não era contenciosamente recorrível e, por isso, o recurso contencioso devia ter sido rejeitado.

7. Mas, ainda que fosse exacta a tese do Acórdão recorrido, de que o acto recorrido revogara o despacho de 17 de Agosto de 2000, sendo, portanto, contenciosamente recorrível, isso não significa que o acto revogatório fosse ilegal, pois os actos administrativos constitutivos de direito podem ser revogados com fundamento em ilegalidade, no prazo do recurso contencioso, nos termos do art. 130.º do Código de Procedimento Administrativo.9
Ora, o Acórdão recorrido não examinou a questão de saber se o acto alegadamente revogado era ilegal, caso em que poderia ser revogado.
É o que iremos fazer, o que redunda em conhecer da questão de fundo.

O direito a alojamento do pessoal recrutado ao exterior
8. O Decreto-Lei n.º 53/89/M, de 28.8, estabeleceu o estatuto do pessoal recrutado no exterior para exercer funções nos serviços públicos de Macau.
No art. 2.º esclarecia-se que o recrutamento no exterior era aquele que incidia sobre pessoal não residente no território de Macau, incluindo o recrutado ao abrigo do Estatuto Orgânico de Macau.
Entre outros direitos, o pessoal recrutado no exterior beneficiava de alojamento por conta da Administração, que se efectivava pelo “direito a moradia mobilada de acordo com o seu agregado familiar, mediante o pagamento da renda em vigor para os trabalhadores da Administração Pública de Macau” (art. 20.º).
Entretanto, o Decreto-Lei n.º 1/91/M, de 14.1, mas produzindo efeitos desde 26 de Dezembro de 1989, estatuía o regime do pagamento de renda mensal para os funcionários e agentes que fossem inquilinos de moradias atribuídas pelo Território, e a que se referia o art. 20.º do Decreto-Lei n.º 53/89/M.10
O Decreto-Lei n.º 60/92/M, de 24.8, veio estabelecer um novo regime de recrutamento de pessoal recrutado no exterior para exercer funções nos serviços públicos de Macau, revogando o Decreto-Lei n.º 53/89/M.
E veio consagrar, em novos moldes, o direito a alojamento de tal pessoal, passando a prever, ao lado da possibilidade de alojamento em moradia fornecida pelo Território, a possibilidade de atribuição de um subsídio para arrendamento e de um subsídio para equipamento.
Na verdade, dispunha o art. 21.º deste diploma que:
“Artigo 21.º
(Alojamento)
1. Ao pessoal recrutado no exterior é atribuído direito a alojamento, a expensas do Território, em função do seu agregado familiar.
2. O direito, referido no número anterior, é exercido consoante as disponibilidades habitacionais da Administração e compreende:
a) Alojamento definitivo em moradia, equipada ou não;
b) A atribuição de um subsídio para arrendamento e de um subsídio para equipamento, no caso de não ser atribuída moradia;
c) Alojamento provisório em unidade hoteleira.
3. Caso seja atribuída moradia não equipada, o trabalhador tem direito a subsídio de equipamento.
4. A tipologia das moradias e os montantes dos subsídios são fixados por despacho do Governador.
5. O exercício do direito definido nas alíneas a) e b) do n.º 2 implica o pagamento pelo trabalhador de uma contraprestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da Administração Pública de Macau.
6. ...
   7. ...
   8. ...”.

Entretanto, o Decreto-Lei n.º 37/95/M, de 7.8, alterou o n.º 5, do art. 21.º do Decreto-Lei n.º 62/92/M, que passou a dispor:
   
   “5. O exercício do direito definido na alínea a) do n.º 2 implica o pagamento pelo trabalhador de uma contraprestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da Administração Pública de Macau”.
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 71/92/M, de 21.9, veio regulamentar o direito a alojamento previsto no estatuto do pessoal recrutado no exterior.
Aqui se dispõe que a opção pela atribuição de moradia, equipada ou não, ou de subsídios compete à Administração (art. 5.º).
Relativamente às modalidades de alojamento definitivo e que são a atribuição de moradia, equipada ou não, 11 ou atribuição de subsídios para arrendamento e equipamento, 12 importa assinalar que quando a moradia é arrendada pelo Território, as despesas ordinárias de condomínio são suportadas pela Administração (n.º 4, do art. 15.º).
E, no regime de atribuição de moradia, a Administração é responsável por obras e reparações nas moradias e equipamentos atribuídos que sejam decorrentes de deficiências de construção e da sua normal utilização (art. 31.º).
Bem como é obrigada a pagar alojamento em unidade hoteleira do trabalhador e agregado familiar quando houver impossibilidade de uso e fruição da moradia e quando a execução de obras não for compatível com a utilização normal da moradia (arts. 29.º, n.º 2 e 34.º).
No regime dos subsídios, o trabalhador recebe apenas um subsídio mensal para arrendamento processado e pago em conjunto com o vencimento, e um subsídio para equipamento da casa, abonado por inteiro e de uma só vez (art. 21.º, n os 2 e 3).13 E não tem direito a outras prestações, designadamente, não tem direito a serem-lhe realizadas quaisquer obras e reparações na casa.

Os ditos reembolsos de renda

9. No caso dos autos, e noutros que agora não estão em causa, a situação parecia não se enquadrar exactamente num dos dois regimes expostos a traços largos.
Os funcionários procederam formalmente ao arrendamento de imóveis ou fracções autónomas,14 mas a semelhança com o regime de subsídios ficou-se por aqui.
No mais, a situação enquadrou-se no regime de atribuição de moradias.
Por vezes, era a Administração que pagava directamente a renda ao senhorio, ou quando assim não acontecia, pagava o montante da renda ao trabalhador.
Era a Administração que suportava o valor da caução da renda, aquando do arrendamento, como sucedeu com o caso do ora recorrido.
E foi também a Administração que equipou a moradia, bem como era a Administração que se responsabilizava pelas despesas com obras e reparações na casa.
E, por isso, a Administração exigia o pagamento da contraprestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da Administração Pública que, como se viu, a partir do Decreto-Lei n.º 37/95/M, que alterou o n.º 5, do art. 21.º do Decreto-Lei n.º 62/92/M, passou a ser apenas devida pelos trabalhadores com casa atribuída pela Administração (e não mais, como anteriormente, pelos trabalhadores no regime dos subsídios).
A tese do ora recorrido é a de que é ilegal o regime instituído pela Administração, dito de reembolso de rendas, pelo que não deve pagar qualquer contraprestação de valor equivalente ao da renda devida pelos trabalhadores da Administração. E no mesmo sentido, foi o parecer no qual foi exarado o despacho de 17 de Agosto de 2000.
Será assim?
Antes de mais, não é exacto um dos pressupostos em que assenta o referido parecer, segundo o qual no regime de atribuição de moradia pela Administração, as casas têm que ser propriedade do Território, agora da RAEM.
Não é assim, nenhuma norma exige que as moradias pertençam à Administração e não seria razoável que assim acontecesse, de acordo com as regras de boa gestão. E há, por outro lado, normas expressas a prever a possibilidade de a Administração atribuir moradias que arrende.
Efectivamente, como já se disse, no n.º 4, do art. 15.º do Decreto-Lei n.º 71/92/M, prevê-se que a Administração suporte as despesas de condomínio “quando a moradia é arrendada pelo Território”.
Mas é indiferente o meio pelo qual a Administração pode dispor de casas para atribuir, seja por usufruto, por comodato, por arrendamento, etc.

10. Mas haverá algum 3.º regime, de reembolso de renda, como também a Administração chegou a defender?
Entende-se que não.
As situações como a dos autos enquadram-se no regime de atribuição de moradia pela Administração, com a única particularidade de os imóveis ou fracções serem formalmente arrendadas pelos trabalhadores e nada mais.
Mas o regime do ora recorrido não era o dos subsídios, porque a Administração não lhe pagava o subsídio de arrendamento. O que lhe pagava era a própria renda da fracção arrendada.
E a Administração pagou ao senhorio a caução relativa ao contrato de arrendamento, o que não faria no regime dos subsídios, mas já teria, naturalmente, que fazer se a própria Administração arrendasse uma casa para atribuir a um trabalhador.
E a Administração mobilou a casa do ora recorrido, o que também não se compreenderia no regime dos subsídios, mas enquadra-se no regime de atribuição de moradia.
E a Administração pagava-lhe o montante efectivo da renda contratual e não o montante que lhe seria devido se estivesse no regime do subsídio de arrendamento, previstos no já mencionado Despacho n.º 98/GM/92.
Por outro lado, não descaracteriza o regime como de atribuição de moradia por parte da Administração, o facto desta estabelecer montantes máximos da renda, pois tal faculdade também lhe teria de ser reconhecida se fixasse montantes máximos das rendas, nos arrendamentos que celebrasse como arrendatária, para proporcionar a atribuição de moradias aos trabalhadores.

11. Mas poderiam as fracções serem formalmente arrendadas pelos trabalhadores, no regime de atribuição de moradias pela Administração?
Afigura-se-nos que nada obstava a que isso tivesse acontecido, já que arrendatário actuava em seu nome próprio, mas por conta da Administração (é o ora recorrido que alega no art. 22.º da petição de recurso contencioso que foi a Administração que lhe propôs que procurasse habitação e celebrasse um normal contrato de arrendamento) parecendo configurar um mandato sem representação (arts. 1157.º e 1180.º e seguintes do Código Civil de 1966, correspondendo, actualmente, aos arts. 1083.º e 1106.º e seguintes do Código Civil vigente).
De todo o modo, a qualificação jurídica não é o mais importante, já que a situação estava a coberto da lei, dado que a alínea m), do art. 16.º, do Decreto-Lei n.º 61/95/M, de 27.11 (que aprovou o diploma orgânico da DSF), e respeitante à competência do Departamento de Gestão Patrimonial, dispunha que cabia a esta:
   
   “m) Desenvolver o processamento administrativo referente aos subsídios para arrendamento e para equipamento e respectivos complementos, desencadeando o reembolso das rendas, nas situações em que essa responsabilidade foi assumida pelos arrendatários, em substituição do Território”.

E na actual lei orgânica da DSF (Decreto-Lei n.º 30/99/M, de 5.7) continua a prever-se, no art. 16.º, alínea d), que cabe à DSF, por intermédio da Divisão de Administração e Conservação de Edifícios:
   
   “d) Assegurar o reembolso das rendas nas situações em que essa responsabilidade foi assumida pelos arrendatários, em substituição do Território”.

A situação dos autos

12. Em conclusão:
- O direito ao alojamento do pessoal recrutado no exterior compreendia duas modalidades:
b) o alojamento definitivo em moradia, equipada ou não;
b) A atribuição de um subsídio para arrendamento e de um subsídio para equipamento.
- As situações como a dos autos enquadram-se no regime de atribuição de moradia pela Administração, equipada ou não, com a única particularidade de os imóveis ou fracções serem formalmente arrendadas pelos trabalhadores;
- Por conseguinte, os trabalhadores nestas situações estão obrigados ao pagamento da contraprestação a que alude o n.º 5, do art. 21.º do Decreto-Lei n.º 60/92/M, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 37/95/M.

13. Quer isto dizer que, mesmo a ser adoptada a tese do Acórdão recorrido, de que o despacho de 17 de Agosto de 2000 dera provimento à reclamação do ora recorrido e que, nesse pressuposto, o despacho de 3 de Maio de 2001 (acto recorrido) revogara aquele despacho, tal revogação teria sido legal, pois que os actos constitutivos de direitos podem revogados, quando ilegais, no prazo do recurso contencioso.
Ora, no mesmo pressuposto, o despacho de 17 de Agosto de 2000 teria sido ilegal, por não poder desonerar o reclamante do pagamento da contraprestação a que alude o n.º 5, do art. 21.º do Decreto-Lei n.º 60/92/M, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 37/95/M, com fundamento em ilegalidade da cobrança.15
E de 17 de Agosto de 2000 até 3 de Maio de 2001 não decorrera, ainda, o prazo mais longo do recurso contencioso, que é de 365 dias.
Em conclusão, mesmo que o acto recorrido fosse recorrível contenciosamente, o recurso contencioso não poderia ser procedente.

IV - Decisão
Face ao expendido, rejeitam o recurso contencioso e revogam o Acórdão recorrido.
Custas pelo ora recorrido neste Tribunal de Última Instância e no Tribunal de Segunda Instância, com taxa de justiça que se fixa em 10 UC, e a procuradoria em 3 UC, em ambos os casos.
Macau, 27 de Novembro de 2002
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
Chu Kin
Fui presente
Song Man Lei
       1 Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador (...) soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 8°, nº3 do Código Civil).
       2 Vd., entre outras, a favor da existência de substituição: Informações nºs 233/GE/MA/91 de 24/09/91, 367/SACM/96 de 14/06/96, 045/NAJ/SM/99 de 02/02/99, 30259/DGP/00 de 23/65/00, 233/NAJ/CA/00 de 12/07/00, etc......, e contra esta: apenas a referida informação 082/GC-SEF/2000.
      3 Sobre o elemento do conceito do acto administrativo como acto produtor de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, cfr. D. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 2001, vol. II, p. 225 e segs.
      4 MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Livraria Almedina, Lisboa, 1980, volume I, p. 413.
      5 No mesmo sentido, cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo Comentado, Livraria Almedina, Coimbra, 1997, 2.ª ed., p. 561 e 562.
   
      6 J. ROBIN DE ANDRADE, A revogação dos actos administrativos, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, 2.ª ed., p. 40 e 41.
      7 D. FREITAS DO AMARAL, obra e volume citados, p. 378.
      8 Na verdade, ainda que fosse exacta a tradução do despacho, feita por tradutora do Tribunal, de tal tradução resulta que o despacho não decidiu a reclamação.
      9 O prazo de recurso contencioso é o mais longo, que, no caso, nos termos do disposto no art. 25.º, n.º 1, alínea c) do CPAC, seria o prazo de 365 dias, do Ministério Público.
      10 De acordo com os arts. 2.º e 3.º deste diploma legal, a renda mensal base a pagar pelo funcionário seria de valor igual às percentagens de 3% ou 2% sobre o vencimento, consoante o imóvel ou fracção dispusesse ou não de mobiliário fornecido pelo Território, percentagens estas a que acresciam mais 2% por cada pessoa que coabitasse com o inquilino e que tivesse rendimento mensal igual ou superior ao vencimento mínimo mensal do funcionalismo.
      11 O apetrechamento das moradias equipadas, atribuídas pela Administração estava previsto no Despacho n.º 16/GM/94, de 28.3.
      12 O subsídio para equipamento não constitui qualquer modalidade própria do direito a alojamento, sendo atribuído conjuntamente com o subsídio de arrendamento e com a atribuição de moradia não equipada [art. 21.º, n. os 2, alínea b) e 3 do Decreto-Lei n.º 60/92/M].
      13 Os montantes dos subsídios para arrendamento e equipamento foram fixados pelo Despacho n.º 98/GM/92, de 21.9.
      14 Ao que parece porque a Administração tinha dificuldades em arrendar directamente as fracções, por razões que não vêm ao caso.
      15 Não estão aqui em causa as situações em que a Administração pode perdoar dívidas, com fundamento em critérios de oportunidade.
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Proc. n.º 13/2002

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Proc. n.º 13/2002