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Processo n.º 20/2003. Recurso jurisdicional em matéria penal.
Recorrentes: B e A.
Recorrido: Ministério Público.
Assunto: Recurso em processo penal para o Tribunal de Última Instância. Concurso de infracções. Custas.
Data da Sessão: 17 de Setembro de 2003.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Sam Hou Fai e Chu Kin.
SUMÁRIO:
I – A expressão “mesmo em caso de concurso de infracções” constante das alíneas f) e g) do n.º 1 do art. 390.º do Código de Processo Penal, significa que, para que seja admissível recurso de decisão do Tribunal de Segunda Instância para o Tribunal de Última Instância, é necessário que a penalidade aplicável, em abstracto, a cada crime, exceda 8 ou 10 anos de prisão, respectivamente, nos casos das alíneas f) e g) do n.º 1 do art. 390.º, ainda que esteja em causa um concurso de infracções.
   II – De acórdãos do Tribunal de Segunda Instância em processo penal, só é admissível recurso para o Tribunal de Última Instância de decisão sobre custas ou outras em que estejam em causa interesses económicos, quando a decisão seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do primeiro daqueles tribunais, ou seja, de MOP$500.000,00, por aplicação analógica do n.º 2 do art. 390.º do Código de Processo Penal.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
O Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base, por Acórdão de 30 de Janeiro de 2003, decidiu o seguinte:
a) Condenou o arguido A pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 138.º, n.º 1, alínea d) do Código Penal, na pena de seis anos de prisão e pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de três anos e nove meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena unitária de sete anos e seis meses de prisão.
b) Condenou o arguido B pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 138.º, n.º 1, alínea d) do Código Penal, na pena de quatro anos de prisão e pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de três anos e nove meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena unitária de cinco anos e três meses de prisão.
Interposto recurso jurisdicional o Tribunal de Segunda Instância, por Acórdão de 26 de Junho de 2003, negou provimento ao recurso do arguido A e concedeu parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido B, tendo reduzido a pena pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1, do Código Penal, para dois anos e nove meses de prisão, mantendo a outra pena parcelar.
Em cúmulo jurídico, condenou este arguido na pena unitária de cinco anos de prisão.
Mas, oficiosamente, por decorrência do provimento parcial do recurso interposto pelo arguido B, reduziu as penas aplicadas na primeira instância ao arguido A, e pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 138.º, n.º 1, alínea d) do Código Penal fixou a pena em cinco anos e seis meses de prisão e pela prática de um crime previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1, do Código Penal fixou a pena em dois anos e nove meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, condenou este arguido na pena unitária de seis anos e seis meses de prisão.
Não conformados recorrem os mesmos arguidos para este Tribunal de Última Instância, tendo o A terminado a sua motivação com as seguintes conclusões:
    I. O ora Recorrente alegou a existência de uma da "desproporcionalidade da pena aplicada" na sua minuta de Recurso.
II. Não conhecendo o Tribunal a quo tal matéria incumpriu, assim, o preceituado no N.° 1, art.º 400.º do CPP.
III. O N.°1, art.º 400.º do CPP deveria ter sido interpretado e aplicado pelo Tribunal a quo no sentido de conhecer a matéria proposta pelo Recorrente, mesmo que este não tivesse feito apresentação da mesma de forma cristalina e suficiente.
IV. Aliás, sendo matéria de Direito, o Tribunal a quo podia conhecer a matéria oficiosamente.
V. Visto que em sede penal vale o princípio do conhecimento amplo das decisões recorridas.
O arguido B termina com as seguintes conclusões:
1. Continuamos a pugnar que peca por demasiado severa no que tange ao ora recorrente, a pena aplicada de 5 anos de prisão efectiva, em cúmulo, pelo Tribunal a quo uma vez que a mera redução da pena parcelar aplicada ao crime de detenção de arma proibida para 2 anos e 9 meses (em vez da pena de 3 anos e 9 meses aplicada pelo Tribunal Judicial de Base), mantendo-se a outra pena parcelar de 4 anos quanto ao crime de ofensas graves à integridade, continua a ser francamente desproporcional face aos factos provados relativamente ao ora recorrente.
2. E é igualmente desproporcionada se compararmos com a condenação sofrida pelo co-arguido A, que foi quem empunhou a arma proibida e desferiu o golpe no ofendido, o qual acabou por ver reduzido o cúmulo das penas em um ano enquanto para o recorrente foram-lhe retirados apenas 3 meses da pena global determinada pelo Tribunal Judicial de Base.
3. Por uma questão de justiça relativa sempre se impunha que a pena aplicada anteriormente para o crime de ofensas graves à integridade física fosse ela também reduzida para medida mais próxima do mínimo legal.
4. Tendo sido aplicada pena de 4 anos quando a medida da pena para aquele crime varia entre um mínimo de 2 e um máximo de 10 anos, cremos ser de reduzir a pena aplicada para o crime de ofensas graves à integridade para medida não superior a 2 anos e meio de prisão.
5. Da mesma forma, deverá reduzir-se a pena aplicada ao crime de detenção de arma proibida para 2 anos de prisão, ficando assim satisfeitas as exigências de prevenção geral e especial.
6. Uma alteração, nestes termos, das penas parcelares, impõe um abaixamento da pena resultante do cúmulo jurídico, afigurando-se justa pena global não superior a três anos de prisão, que deverá ser suspensa na sua execução, o que facilitaria a ulterior reintegração social do recorrente, atenta a sua idade e menor participação nos factos, que possibilitam um juízo de prognose favorável.
7. Ou, caso assim não se considere e uma vez que o ora recorrente beneficia de algum circunstancialismo atenuado - como a delinquência primária, a sua jovem idade (à data dos factos tinha apenas 16 anos de idade), baixa condição social, o menor grau de ilicitude das suas acções que revela uma decrescente intensidade do dolo face ao co-arguido A - pelo que de mitigador tem da culpa, sempre justificaria penas parcelares mais próximas dos mínimos legais dos tipos de ilícito praticados e provados.
8. É nosso entendimento ainda que a falta de ponderação por parte do Tribunal Judicial de Base, da menoridade do ora recorrente, consubstancia falta de fundamentação da decisão de direito já que esta alínea f) do n.º 2 do art.º 66.° é de verificação objectiva e o Tribunal de Primeira Instância simplesmente nem analisou a verificação in casu ou não desta circunstância.
9. Esta omissão do acórdão proferido pelo Tribunal Judicial de Base não foi considerada relevante pelo Tribunal a quo, que se limitou a referir que o art.º 65.°, n.º 3 do CP impõe expressamente que na sentença são referidos os fundamentos da determinação da pena, "então caso a pena em causa não tenha sido determinada nos termos do art.º 66.° do mesmo Código, o tribunal não fica onerado com o dever legal de dizer que a mesma pena não tenha sido achada nos termos do citado art.º 66.°".
10. Com o que discordamos, pois o art.º 66.° obriga à ponderação de quaisquer uma das suas circunstâncias, e, no caso de alguma delas se verificar, haverá lugar à atenuação especial da pena nos limites previstos pelo art.º 67.°.
11. Não o tendo feito o Tribunal Judicial de Base, e tendo validado o Tribunal de Segunda Instância tal omissão, incorreram ambos em erro de direito ao violar, ressalvado o devido respeito, a norma do art.º 65.° do C. Penal.
12. Muito embora o ora recorrente beneficie de apoio judiciário na modalidade de isenção de pagamento de custas, não deixa de lhe caber legitimidade para se insurgir quanto ao montante em que foi condenado em sede de custas na instância recursória, pois poderá mais tarde ser obrigado a proceder ao seu pagamento, caso tenha poder económico para tal.
13. É que o ora recorrente foi condenado em 6 UC de taxa de justiça pelo Tribunal a quo em virtude do decaimento parcial do seu recurso, tendo o co-arguido recorrente A sido condenado em apenas 3 UC de taxa de justiça individual pelo decaimento total do seu recurso.
14. Ora, a condenação em custas deverá ser proporcional ao provimento obtido em sede de recurso e sempre caberia ao recorrente cujo recurso caiu na sua totalidade, por uma questão de justiça relativa, ser condenado em montante superior ao ora recorrente, cujo recurso mereceu provimento parcial, o que não aconteceu, pelo que se verifica erro de direito.

Na sua resposta à motivação do recurso interposto pelo arguido B, a Exm.ª Procuradora-Adjunta suscitou a questão da irrecorribilidade da decisão, pois que:
- O Tribunal de Segunda Instância (TSI) confirmou a decisão de primeira instância no que tange ao crime de ofensa grave à integridade física, previsto e punível pelo art. 138.º do Código Penal, com a penalidade de 2 a 10 anos de prisão
Tal decisão é irrecorrível face ao disposto na alínea g) do art. 390.º do Código de Processo Penal;
- Quanto ao crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal, com a penalidade de 2 a 8 anos de prisão, o TSI alterou a pena, mas a decisão é irrecorrível nos termos da alínea f) do art. 390.º do Código de Processo Penal;
- Se do acórdão não cabe recurso, também não deve ser admitido recurso na parte relacionada com as custas. E no processo civil, face ao valor (6 UC) também não caberia recurso para o Tribunal de Última Instância, nos termos dos arts. 638.º e 583.º do Código de Processo Civil.
Ouvido o recorrente, não se pronunciou sobre as questões suscitadas.
Relativamente ao arguido A, a Exm.ª Procuradora-Adjunta pronunciou-se pela rejeição do recurso, pois que, estando em causa matéria de direito, nos termos do art. 402.º n.º 2 do Código de Processo Penal, as conclusões do recurso devem indicar as normas jurídicas violadas, o que não foi o caso do recorrente, que se limitou a invocar o n.º 1 do art. 400.º do Código de Processo Penal.
Por despacho do relator, foi o recorrente convidado a dar cumprimento ao disposto no art. 402.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Penal, em 10 dias, o que não fez.

II – Apreciação das questões suscitadas que obstam ao conhecimento do objecto dos recursos

Recurso do arguido B
Recorribilidade de decisões do TSI
1. São duas, fundamentalmente, as questões suscitadas, ambas relativas à irrecorribilidade do recurso interposto pelo arguido B. Uma atinente à parte penal do julgado. Outra, relativa às custas da decisão.

Recorribilidade quanto à decisão penal:
O TSI confirmou a decisão de primeira instância no que tange ao crime de ofensa grave à integridade física, previsto e punível pelo art. 138.º do Código Penal, com a penalidade de 2 a 10 anos de prisão.
Quanto ao crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal, com a penalidade de 2 a 8 anos de prisão, o TSI alterou a pena, baixando-a.
Em matéria penal, a regra geral é a da recorribilidade das decisões, expressando-se o art. 389.º do Código de Processo Penal da seguinte forma:
“Artigo 389.º
(Princípio geral)
É permitido recorrer dos acórdãos, sentenças e despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei”.
O art. 390.º estabelece as excepções a tal princípio geral da recorribilidade das decisões:

“Artigo 390.º
(Decisões que não admitem recurso)
1. Não é admissível recurso:
a) De despachos de mero expediente;
b) De decisões que ordenam actos dependentes da livre resolução do tribunal;
c) De decisões proferidas em processo sumaríssimo;
d) De acórdãos proferidos, em recurso, pelo Tribunal de Segunda Instância, que não ponham termo à causa;
e) De acórdãos absolutórios proferidos, em recurso, pelo Tribunal de Segunda Instância, que confirmem decisão de primeira instância;
f) De acórdãos proferidos, em recurso, pelo Tribunal de Segunda Instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de multa ou pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de infracções;
g) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelo Tribunal de Segunda Instância, que confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a dez anos, mesmo em caso de concurso de infracções;
h) Nos demais casos previstos na lei.
2. O recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil é admissível desde que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal recorrido”.
Ora, por um lado, o TSI confirmou a decisão de primeira instância no que tange ao crime de ofensa grave à integridade física, previsto e punível pelo art. 138.º do Código Penal, com a penalidade de 2 a 10 anos de prisão.
Cai-se, assim, na previsão da alínea g) do n.º 1 do art. 390.º
Por outro lado, no que toca ao crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal, com a penalidade de 2 a 8 anos de prisão, o TSI alterou a pena, baixando-a.
Está-se, assim, aparentemente, na situação da alínea f) do n.º 1 do art. 390.º.
Contudo, como se tratava de uma situação de concurso (real) de infracções, o limite máximo abstracto 1 da penalidade aplicável seria superior aos 10 anos de prisão de que fala a alínea g), de acordo com o disposto no art. 71.º, n.º 2 do Código Penal.
É certo que tanto a alínea f), como a alínea g) usam a expressão “mesmo em caso de concurso de infracções”.
Mas, em primeiro lugar, a letra da lei aponta para a penalidade aplicável em abstracto a cada crime. Se se pretendesse referir à penalidade unitária concretamente aplicável em caso de concurso, não deixaria de se expressar de outra forma.
Em segundo lugar, manifestamente, o que se pretende é limitar o recurso para o TUI aos casos de crimes mais graves. Ora, isto só é assim relativamente a cada crime, independentemente da pena unitária aplicável em caso de concurso de infracções. Quer dizer, por vezes, o máximo da penalidade unitária, em concreto, é superior a 8 ou 10 anos de prisão, em caso de crimes de pouca gravidade, bastando que se trate de um grande número de infracções. Ora, não seria razoável, em tais casos, permitir, o recurso para o TUI.
Por último, quando no art. 12.º, n.º 1, alínea c) se fixa a competência do tribunal colectivo, a lei é clara ao fixar tal competência tendo em conta o limite máximo da penalidade unitária abstractamente aplicável em caso de concurso. Ao passo que nas alíneas f) e g) do n.º 1 do art. 390.º se levou em conta apenas a penalidade abstracta aplicável a cada crime, mesmo que esteja em causa um concurso de infracções.
Portanto, a interpretação a dar à expressão “mesmo em caso de concurso de infracções” é a de que é necessário que a penalidade aplicável a cada crime exceda 8 ou 10 anos de prisão, respectivamente, nos casos das alíneas f) e g) do n.º 1 do art. 390.º, ainda que esteja em causa um concurso de infracções
É esta, aliás, a opinião de GERMANO MARQUES DA SILVA,2 a propósito de norma semelhante do Código português, quando refere que “...a expressão mesmo em caso de concurso de infracções significa aqui que não importa a pena aplicada no concurso, tomando-se em conta aqui a pena abstractamente aplicável a cada um dos crimes...”.
Não é, pois, admissível o recurso do arguido B em matéria penal.

Recorribilidade de decisão sobre custas, em processo penal
2. Apreciemos, agora, a questão relativa à recorribilidade da decisão sobre custas, quanto ao mesmo arguido B.
Pretende este arguido que a taxa de justiça que lhe foi aplicada (6 UC) o seja em montante inferior, tendo invocado a desproporção relativamente à taxa de justiça cominada ao outro recorrente.
A questão que se levanta é a da recorribilidade da decisão sobre custas tomada em recurso jurisdicional pela segunda instância.
Como se disse, em matéria penal, a regra geral é a da recorribilidade das decisões, de acordo com o disposto no art. 389.º do Código de Processo Penal.
Mas o art. 390.º é uma norma delimitadora do alcance da anterior, especificando o n.º 1 quatro casos em que não cabe recurso do TSI para o TUI.
Todos estes casos do n.º 1 do art. 390.º se referem às decisões em matéria penal tomadas pelo TSI (decisões não finais e decisões absolutórias e condenatórias dos arguidos).
O n.º 2 do art. 390.º trata da recorribilidade das decisões relativas à indemnização civil.
E não há outras normas que rejam os demais casos em que não esteja em causa nem matéria penal nem matéria atinente à indemnização civil.
Ou seja, não há norma expressa a prever a recorribilidade ou a irrecorribilidade das decisões relativas a custas, multas (ao arguido, partes civis e simples intervenientes processuais, como testemunhas e peritos) e outras decisões que o TSI possa ter que proferir em processo penal.
Quid juris?
Uma possível solução seria aplicar a estes casos o princípio geral da recorribilidade das decisões tomadas em processo penal.
Mas esta solução não teria em conta que, em matéria penal, o TUI só intervém na apreciação dos crimes mais graves em termos de pena abstractamente aplicável3 e que, no que toca à parte da decisão relativa à indemnização civil, o TUI só conhece das decisões desfavoráveis para o recorrente em valor superior a metade da alçada do TSI, ou seja, a MOP$500.000,00.
Logo, parece evidente que o conhecimento por parte do TUI de decisões não penais nem relativas à indemnização civil do TSI, designadamente em matéria de custas, multas e outras, não pode ser genérico.
Pois se, em matéria penal e de indemnização civil, a sua intervenção é, respectivamente, limitada aos crimes mais graves e aos interesses económicos mais valiosos, seria totalmente desacertado admitir o conhecimento dos recursos em outras matérias muitos menos importantes e relevantes.
Mas, então, o TUI nunca pode conhecer de tais questões?
Uma possível solução seria admitir o conhecimento de tais questões quando fossem colocadas em acumulação com outras de que o TUI pode conhecer, nos termos legais.
Mas tal solução chocaria o senso comum.
A que título, por exemplo, é que em acumulação com a apreciação de um crime de homicídio voluntário, o TUI poderia apreciar a discussão de custas no valor de 3 UC e já não o faria se estivesse em causa um valor de 40 UC ou até muito superior - porventura ilegalmente fixado - mas em que não estivesse em apreciação outra questão de que pudesse conhecer, como acontece com o crime de injúria, punível com pena de prisão até 3 meses ?
Quer dizer, estando em causa, no caso de decisão sobre custas, uma questão económica, não faz sentido atrelar o seu conhecimento às matérias estritamente penais, em que os valores em causa são de outra natureza.
Mas a ser assim, parece haver maior analogia (art. 9.º do Código Civil) de tais questões económicas (custas, multas), com a questão relativa à indemnização civil, em que também estão em causa valores de ordem económica.
Ora, estabelecendo a lei que só há recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil desde que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal recorrido, é curial só admitir o recurso respeitante à decisão sobre custas tomada pelo TSI, quando a decisão seja desfavorável para o recorrente em valor superior a MOP$500.000,00.4 5
Aplicando o critério exposto, estando em causa um valor de 6 UC (três mil patacas) não é de admitir o recurso de tal parte da decisão.

Recurso do arguido A
Não indicação da norma violada, em questão de direito
Relativamente ao recurso do arguido A, que versa apenas matéria de direito, este não indicou a norma jurídica violada, o que lhe é imposto pela alínea a) do n.º 2 do art. 402.º do Código de Processo Penal.
Na verdade, o recorrente limitou-se a invocar o art. 400.º n.º 1 do Código de Processo Penal, que dispõe que “O recurso pode ter como fundamento quaisquer questões de direito de que pudesse conhecer a decisão recorrida”.
Ora, como é bem de ver, não é esta, nem pode ser, a norma violada, pois que apenas trata dos fundamentos do recurso em matéria de direito que podem ser invocados pelos recorrentes em processo penal.
Convidado a corrigir o vício – o que de acordo com certa jurisprudência nem seria possível - não o fez, pelo que nada mais resta senão rejeitar o seu recurso.

III – Decisão
Face ao expendido:
A) Não conhecem do recurso interposto pelo arguido B por irrecorribilidade da decisão;
B) Rejeitam o recurso interposto pelo arguido A por não ter indicado a norma jurídica violada.
Custas pelos recorrentes, fixando a taxa de justiça em 3 e 2 UC, respectivamente, para os arguidos B e A. Este pagará, ainda, 3 UC pela rejeição do recurso, nos termos do art. 410.º, n.º 4 do Código de Processo Penal.
Macau, 17 de Setembro de 2003
Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) - Sam Hou Fai - Chu Kin
 1 Mas não concreto, face às penas concretas aplicadas ao arguido.
  2 GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de processo penal, Editorial Verbo, Lisboa, 2000, 2.ª ed., vol. III, p 325.
  3 E não em todos, já que não pode apreciar, por exemplo, as decisões absolutórias do TSI, confirmativas de decisões de primeira instância[art. 390.º, n.º 1, alínea d)], por mais graves que sejam os crimes imputáveis aos arguidos.
  4 O que pode suceder não só em casos de fixação de taxa de justiça em montante superior ao legalmente admitido, como também face a valor elevado dos encargos, como despesas efectuadas, retribuições a peritos, etc.
  5 Parece preferível esta solução a outra que privilegiasse o recurso à alçada do TSI, a que recorre o processo civil (art. 583.º do respectivo Código), sendo, no entanto, certo que face à lei processual civil a recorribilidade das decisões depende não só do critério do valor da acção, como da sucumbência, sendo esta, também, tal como na indemnização civil em processo penal, metade da alçada do tribunal de que se recorre.
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