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(Tradução)
  
  Lei de Imigração Clandestina
  Art.° 4.°, n.° 2, da Lei n.° 2/90/M, de 3 de Maio
  Ordem de expulsão de imigrante clandestino
  Período de proibição de reentrada e forma da sua indicação

SUMÁRIO

  I. A legiferação da Lei n.° 2/90/M, de 3 de Maio (Imigração Clandestina), foi para combater e reprimir a imigração clandestina e diversos actos ilícitos daí oriundos e com ela conexos, e não para impedir actividades imigratórias legais.
  II. A exigência imposta pelo art.° 4.°, n.° 2, da mesma Lei sobre o conteúdo da ordem de expulsão daqueles que tenham entrado clandestinamente em Macau, destina-se essencialmente a garantir ao indivíduo a ser expulso a possibilidade de saber quando é que poderia ele reentrar em Macau de modo legal, e não visa proibir a entrada em Macau por parte de pessoas munidas de documentos de identificação ou de viagem exigidos pela Legislação de Macau para o efeito.
  III. Por isso, caso as Autoridades Policiais de Macau adoptem, sob o ponto de vista de operações práticas na matéria, a expressão literal congénere à de “até à obtenção de documentos legalmente exigidos para a entrada ou permanência em Macau” para indicar o período durante o qual o indivíduo expulso fica interditado de reentrar em Macau, este método de trabalho não compromete a exigência prevista no n.° 2 do referido art.° 4.° da Lei n.° 2/90/M: É que isto não só não retira nem enfraquece o direito do indivíduo expulso a entrar legalmente em Macau no futuro, bem como, até pelo contrário, está materialmente conforme com o fim de se fazer dissuadir o indivíduo expulso da sua reentrada ilegal em Macau, pretendido pelo Legislador da mesma Lei de Imigração Clandestina.
  IV. Ademais, a pessoa expulsa não fica por aquela forma de indicação do período de interdição de reentrada, sem saber do período da proibição da sua reentrada em Macau, porquanto sempre que ela ainda não tenha conseguido obter documentos necessários à sua entrada legal em Macau, não pode vir a Macau de modo legal, por um lado, e, por outro, e ao invés, desde que ela venha a adquirir tal documento ou documentos legalmente exigidos, já poderá vir a qualquer tempo a Macau.
  V. Assim sendo, se ela não vier a conseguir entrar de modo legal a Macau devido à não obtenção ainda de documentos legais para este efeito, isto nunca será pecado da ordem de expulsão redigida nos termos literais materialmente acima referidos, mas sim resultará de um factor inerente à sua própria pessoa, porquanto mesmo sem a dita ordem de expulsão, qualquer indivíduo não possuidor de documentos legalmente exigidos por lei para poder entrar legalmente em Macau naturalmente não pode para aqui vir de modo legal.
Acórdão de 25 de Março de 2004
Processo n.º 58/2004
Relator: Chan Kuong Seng


ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.

I. RELATÓRIO E FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA E JURÍDICA DA SENTENÇA RECORRIDA
1. No âmbito dos autos de processo comum penal n.º PCS-088-03-3 do 3.º Juízo Singular do Tribunal Judicial de Base em que era arguida (A), entretanto julgada à revelia com consentimento da própria arguida e sob acusação pública do Ministério Público, foi proferida em 3 de Fevereiro de 2004 a respectiva sentença de primeira instância, nos termos seguintes (cfr. o teor de fls. 41 a 43 dos presentes autos, e sic):
“O Digno. Magistrado do Ministério Público acusa:

Arguida:
(A), de sexo femenino, solteira, sem emprego, indocumentada, nascida a XX de Novembro de XXXX na XXX, filha de (B) e de (C), sem residência fixa em Macau, residente na XXX..
*
1) Factos acusados:
A arguida, interceptada pela polícia no dia 23 de Abril de 2001 por permanência clandestina em Macau, declarou perante a investigação feita pela P.S.P identificando-se como (D), nascida a XX de Janeiro de XXXX na XXX, e filha de (E) de (F). (Cfr. fl. 8 dos presentes autos).
No mesmo dia, a arguida, após assinar na respectiva ordem de expulsão, foi expulsa pela polícia para ser recambiada para o Interior da China, bem sabendo nessa altura que não podia reentrar ou permanecer ilegalmente em Macau, sob pena de ser punida pela lei. (Cfr. fl. 7 dos autos)
No dia 22 de Julho de 2002, a arguida foi detectada pelo agente da polícia por ter permanecido ilegalmente em Macau. No dia seguinte, declarou perante a investigação feita pela PSP identificando-se como (A), nascida a XX de Novembro de XXXX na XXX, e filha de (B) e de (C).
Pelos dados de impressões digitais, a polícia confirma que (A) e (D) se tratam da mesma pessoa.
A arguida veio a reconhecer que não são verdadeiros os elementos de identificação por ela declarados em 2001.
Aquando da prática do acto supracitado, a arguida agiu livre e conscientemente.
A arguida forneceu duma forma dolosa os referidos elementos de identificação falsos, escondendo a sua identidade verdadeira, com o fim de enganar as autoridades policiais desta Região Administrativa Especial.
A arguida bem sabia que não podia entrar ou permanecer nesta RAE sem obter documento legal que permitisse a sua entrada e permanência no Território, mas continuou a permanecer ilegalmente no Território sem documentos legalmente exigidos.
Bem sabia que a sua conduta é proibida e punida pela lei.
*
Pelo exposto, o Ministério Público imputa e acusa a arguida da prática de um crime de declaração falsa sobre a identidade p. e p. pelo artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, de 3 de Maio, alterado pela Lei n.º 8/97/M, de 4 de Agosto e um crime de violação de ordem de expulsão, p. e p. pelo artigo 14.°, n.° 1, da Lei n.° 2/90/M, de 3 de Maio, alterado pelo Decreto-Lei n.º 11/96/M, de 12 de Fevereiro.
*
Mantendo-se inalterado o pressuposto processual já estatuído, procede-se ao julgamento com observância do procedimento exigido pela lei.
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2) Factos globais:
(1) Depois de ter analisado os autos, foram dados como assentes os factos seguintes:
A arguida, interceptada pela polícia no dia 23 de Abril de 2001 por permanência clandestina em Macau, declarou perante a investigação feita pela P.S.P identificando-se como (D), nascida a XX de Janeiro de XXXX na XXX, e filha de (E) e de (F).
No mesmo dia, a arguida, após assinar na respectiva ordem de expulsão, foi expulsa pela polícia para ser recambiada para o Interior da China, bem sabendo nessa altura que não podia reentrar ou permanecer ilegalmente em Macau, sob pena de ser punida pela lei.
No dia 22 de Julho de 2002, a arguida foi detectada pelo agente da polícia por ter permanecido ilegalmente em Macau. No dia seguinte, declarou perante a investigação feita pela PSP identificando-se como (A), nascida a XX de Novembro de XXXX na, e filha de (B) e de (C).
Pelos dados de impressões digitais, a polícia confirma que (A) e (D) se tratam da mesma pessoa.
A arguida veio a reconhecer que não são verdadeiros os elementos de identificação por ela declarados em 2001.
Aquando da prática do acto supracitado, a arguida agiu livre e conscientemente.
A arguida forneceu duma forma dolosa os referidos elementos de identificação falsos, escondendo a sua identidade verdadeira, com o fim de enganar as autoridades policiais desta Região Administrativa Especial.
A arguida bem sabia que não podia entrar ou permanecer nesta RAE sem obter documento legal que permitisse a sua entrada e permanência no Território, mas continuou a permanecer ilegalmente no Território sem documentos legalmente exigidos.
Bem sabia que a sua conduta é proibida e punida pela lei.
Nada se consta no seu registo criminal.
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(2) Não há outros factos a assinalar.
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(3) Os factos acima referidos são dados por assentes com prova suficiente alicerçada nas provas constantes dos presentes autos, nomeadamente na ordem de expulsão a fl. 7, nas declarações dos dados de identificação pessoal a fls. 2 e 8 e nos depoimentos prestados pelas testemunhas na audiência de julgamento.
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3). Enquadramento juridico-penal:
Efectuando a análise de factos para decidir a lei aplicável.
Dispõe o artigo 12.º n.º 1 da Lei n.º 2/90/M de 3 de Maio, alterado pela Lei n.º 8/97/M de 4 de Agosto que: “Quem, com a intenção de se eximir aos efeitos da presente lei, declarar ou atestar falsamente, perante autoridade pública ou funcionário no exercício das suas funções, identidade, estado ou outra qualidade a que a lei atribua efeitos jurídicos, próprios ou alheios, é punido com pena de prisão até 3 anos.”
O art.º 14.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, alterado pelo Dec.-Lei n.º 11/96/M de 12 de Fevereiro dispõe como segue: “O indivíduo expulso que violar a proibição de reentrada no Território prevista no n° 2 do artigo 4.º é punido com pena de prisão até um ano”.
Dispõe o artigo 2.º do mesmo Dec.-Lei: “Os indivíduos em situação de clandestinidade devem ser expulsos do Território, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que incorram e das demais sanções previstas na lei”.
Estipula-se no seu artigo 4.º, n.ºs 2 e 3 que: “a ordem de expulsão deve indicar o prazo para a sua execução, o período durante o qual o indivíduo fica interditado de reentrar no Território e o seu local de destino. Na fixação dos prazos previstos no número anterior devem ser considerados os prazos de procedimento processual, designadamente para os efeitos do artigo 2.º da Lei n.º 8/97/M, de 4 de Agosto”.
Na medida em que na ordem de expulsão a fl. 7 dos autos não se considerou os prazos de procedimento processual para determinar, nos termos da lei, o prazo de interdição da entrada nesta Região, a ordem em causa deve ser considerada nula e termos em que deve improceder a referida acusação da prática de um crime de violação da ordem de expulsão.
Apurados os factos em causa, verifica-se que a arguida cometeu o supracitado “crime de falsas declarações” e que estão preenchidos todos os requisitos subjectivos e objectivos do tipo legal de crime, previstos no referido diploma legal e que são imputáveis à arguida.
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Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição e proteger os respectivos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. (artigos 64.º e 40.º do Código Penal). Com vista à protecção de bens jurídicos e à exigência de prevenção especial, o Tribunal entende que deve condenar a arguida na pena privativa da liberdade.
*
Ao abrigo do disposto no artigo 65.º do Código Penal, a determinação da medida da pena concreta é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal, atendendo ao grau de ilicitude do facto, ao modo de execução deste e à gravidade das suas consequências, bem como ao grau de violação dos deveres impostos ao agente, à intensidade do dolo, aos sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram, às condições pessoais do agente e a sua situação económica, à conduta anterior ao facto e a posterior a este e às demais situações concretas apuradas, pelo que a arguida deve ser condenada na pena de 7 meses de prisão em relação à pratica de um crime de falsas declarações sobre a identidade.
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4). Decisão:
Face ao acima exposto, e nos termos da lei, o tribunal entende parcialmente procedente a acusação e em consequência decide como segue:
A arguida (A):
-- É absolvida de um “crime de violação de ordem de expulsão” p. e p. pelo art.º 14.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, de 3 de Maio.
- É condenada pela prática de um “crime de falsas declarações sobre a identidade” p. e p. pelo art.º 12.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, de 3 de Maio, alterada pela Lei n.º 8/97/M, de 4 de Agosto, na pena de 7 meses de prisão.
Após consideradas a personalidade da arguida, o seu comportamento anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste, o Tribunal considera que a simples censura dos factos e a ameaça da prisão já bastam para realizar as finalidades da punição, pelo que segundo o art.º 48.º, do Código Penal, decide suspender a execução da pena acima referida pelo período de dois anos.
Condenar a arguida (A) a pagar um montante no valor de MOP$500,00 (quinhentas patacas), a favor do Cofre de Justiça e dos Registos e do Notariado, ao abrigo do disposto no artigo 24º/2 da Lei nº 6/98/M, de 17 de Agosto.
Condenar, ainda a arguida a pagar o mínimo da taxa de justiça e nas custas do processo, e fixar em MOP$400 os honorários devidos ao ilustre defensor oficioso;
Notifique e elebore o registo criminal.
...”.
2. Inconformado com esse veredicto, veio o Digno Representante do Ministério Publico recorrer do mesmo para este Tribunal de Segunda Instancia (TSI), pugnando, em jeito de conclusão, pela procedência à condenação da arguida pela prática de um “crime de violação de ordem de expulsão” p. e p. pelo art.º 14.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, de 3 de Maio.
3. Ao recurso do M.P., o defensor oficioso da arguida não exerceu a faculdade conferida pelo n.º1 do artº. 403º do CPP.
4. Subido o recurso para este TSI, a Digna Procuradora-Adjunta junto desta Instância teve vista do processo nos termos do art.° 406.° do CPP, emitiu o seguinte douto Parecer constante de fls. 57 a 59 dos autos, pugnando pela concessão de provimento ao recurso.
5. Subsequentemente, foi pelo relator do presente processo feito o exame preliminar dos autos à luz do art.° 407.°, n.° 3, do CPP, em sede do qual se entendeu poder este TSI conhecer do mérito da causa.
6. Em seguida, foram postos pelos dois Mm.°s Juízes-Adjuntos os seus vistos nos autos de acordo com o art.° 408.°, n.° 1, do CPP.
7. Depois, o tribunal colectivo realizou a audiência de julgamento nos termos dos art.°s 411.° e 414.° do CPP, durante a qual, tanto o Ministério Público como a recorrida apresentaram alegações orais sobre o objecto do recurso (cfr. actas de audiência constantes dos autos).
8. Cumpre, pois, decidir do recurso sub judice nos termos infra.

II. FUNDAMENTAÇÃO DO PRESENTE ACÓRDÃO
Tendo em consideração que o tribunal ad quem só vai resolver as questões concretamente postas pelo recorrente e delimitadas pelas conclusões da sua motivação de recurso (apud nomeadamente os acórdãos deste TSI: de 4/3/2004 no Processo n.º 33/2004; de 12/2/2004 no Processo n.º 297/2003; de 11/12/2003 no Processo n.º 266/2003; de 23/10/2003 no Processo n.º 214/2003; de 24/10/2002 no Processo n.º 130/2000; de 25/7/2002 no Processo n.º 47/2002; de 17/5/2001 no Processo n.º 63/2001; de 3/5/2001 no Processo n.º 18/2001; de 7/12/2000 no Processo n.º 130/2000 e de 27/1/2000 no Processo n.º 1220), e considerando a doutrina do saudoso Professor José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, Lim., 1984, pág. 143, aplicável mesmo aos recursos penais, de que “Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (cfr. neste sentido, nomeadamente os acórdãos deste TSI: de 4/3/2004 no Processo n.º 33/2004; de 12/2/2004 no Processo n.º 297/2003; de 11/12/2003 no Processo n.º 266/2003; de 23/10/2003 no Processo n.º 214/2003; de 24/10/2002 no Processo n.º 130/2002; de 25/7/2002 no Processo n.º 47/2002; de 30/5/2002 nos Processos n.ºs 84/2002 e 87/2002; de 17/5/2001 no Processo n.º 63/2001; de 7/12/2000 no Processo n.º 130/2000, sem prejuízo, obviamente, da possibilidade de o tribunal ad quem se pronunciar, caso entender conveniente, sobre qualquer das razões invocadas nas conclusões da motivação de recurso), o objecto do presente recurso a conhecer é constituído pela questão de saber: de acordo com os factos dados como provados pelo tribunal “a quo”, se tinha a arguida cometido o crime de “violação à ordem de expulsão”, p. e p. pelo art.º 14º, n.º 1 da Lei n.º 2/90/M. Claro que este tribunal vai proceder, nos termos do artigo 393º n.º 3 do Código de Processo Penal, à correspondente alteração da sentença a quo se for julgado procedente o recurso.
Para resolver a questão em causa, temos em primeiro lugar estudar o devido teor consagrado no artigo 4.º, n.º 2 da mesma lei sobre a ordem de expulsão dos indivíduos em situação de clandestinidade.
O referido artigo 4.º n.º 2 estipula expressamente que: “A ordem de expulsão deve indicar o prazo para a sua execução, o período durante o qual o indivíduo fica interditado de reentrar no Território e o seu local de destino. ”
Na presente lide recursória, o ponto de discussão reside exactamente na questão de que consta ou não na ordem de expulsão que lhe foi dada o período durante o qual ficava a arguida proibida de reentrar em Macau.
Eis o conteúdo da ordem de expulsão mencionada na sentença a quo constante de fls. 7 dos autos:
“Ao abrigo do disposto no Art. 4.º n.º 1 da Lei n.° 2/90/M, de 3 de Maio, e nos termos do n° 2.1) do Despacho do Secretário para a Segurança n° 27/2000, de 3 de Maio, ordeno, de acordo com a competência aí subdelegada, a expulsão para o Interior da China da cidadã chinesa abaixo identificada, por ter sido encontrada em situação de clandestinidade, ficando interditada de entrar no Território até à obtenção dos documentos legalmente exigidos para a entrada ou permanência no Território. Em caso de violação, é punível com pena de prisão até 1 ano nos termos do disposto no art.º 14.º da Lei 2/90/M, de 3 de Maio com a redacção dada pelo n° 1 do Dec.-Lei n.º 11/96/M, de 12 de Fevereiro.
Nome (D) Data de nascimento XX/1/XXXX ,
Filha de (E) e de (F)
Sexo F Est. Civil Solteira Naturalidade XXX .
......”(cfr. o teor da ordem de expulsão constante a fls. 7 dos autos, e sic).
Ora bem, como se sabe, como o que foi indicado nos 4 acórdãos sobre recursos penais lavrados por este TSI (de 4/3/2004 no Processo n.º 33/2004, de 12/2/2004 no Processo n.º 297/2003, de 11/12/2003 no Processo n.º 266/2003 e de 23/10/2003 no Processo n.º 214/2003):
A legiferação da Lei n.° 2/90/M, de 3 de Maio, foi para combater e reprimir a imigração clandestina e diversos actos ilícitos daí oriundos e com ela conexos, e não para impedir actividades imigratórias legais. Para a sua comprovação basta ver a denominação desta lei (Imigração Clandestina) e os diversos crimes estabelecidos pela mesma disposição legal.
A exigência imposta pelo art.º 4.°, n.° 2, da mesma Lei sobre o conteúdo da ordem de expulsão daqueles que tenham entrado clandestinamente em Macau, destina-se essencialmente a garantir ao indivíduo a ser expulso a possibilidade de saber quando é que poderia ele reentrar em Macau de modo legal, e não visa proibir a entrada em Macau por parte de pessoas munidas de documentos de identificação ou de viagem exigidos pela Legislação de Macau para o efeito.
Por isso, caso as Autoridades Policiais de Macau adoptem, sob o ponto de vista de operações práticas na matéria, a expressão literal congénere a de “até à obtenção de documentos legalmente exigidos para a entrada ou permanência em Macau” para indicar o período durante o qual o indivíduo expulso fica interditado de reentrar em Macau, este método de trabalho não compromete a exigência prevista no n.° 2 do referido art.° 4.° da Lei n.° 2/90/M: E que isto não só não retira nem enfraquece o direito do indivíduo expulso a entrar legalmente em Macau no futuro, bem como, até pelo contrário, está materialmente conforme com o fim de se fazer dissuadir o indivíduo expulso da sua reentrada ilegal em Macau, pretendido pelo Legislador da mesma Lei de Imigração Clandestina.
O mais importante é que, a pessoa expulsa não fica por aquela forma de indicação do período de interdição de reentrada, sem saber do período da proibição da sua reentrada em Macau, porquanto sempre que ela ainda não tenha conseguido obter documentos necessários à sua entrada legal em Macau, não pode vir a Macau de modo legal, por um lado, e, por outro, e ao invés, desde que ela venha a adquirir tal documento ou documentos legalmente exigidos, já poderá vir a qualquer tempo a Macau. Assim sendo, se ela não vier a conseguir entrar de modo legal a Macau devido à não obtenção ainda de documentos legais para este efeito, isto nunca será pecado da ordem de expulsão redigida nos termos literais materialmente acima referidos, mas sim resultará de um factor inerente à sua própria pessoa, porquanto mesmo sem a dita ordem de expulsão, qualquer indivíduo não possuidor de documentos legalmente exigidos por lei para poder entrar legalmente em Macau naturalmente não pode para aqui vir de modo legal. Termos em que, a partir deste ponto de vista, não podemos considerar que a arguida em causa ficava proibida de reentrar em Macau por tempo “vitalício” ou pelo menos durante um período indeterminado.
Assim, e em suma do acima explanado, é de concluir que o conteúdo da ordem de expulsão em causa nos presentes autos já satisfez materialmente a exigência em questão prevista no n.° 2 do art.° 4.° da supramencionada Lei n.° 2/90/M. Por isso, e em conjugação com outros factos já dados por assentes na sentença ora recorrida, este Tribunal ad quem realiza que a arguida deve ser condenada como autor material, na forma consumada, de um “crime de violação de ordem de expulsão”, p. e p. pelo art.° 14.°, n.° 1, da Lei n.° 2/90/M, de 3 de Maio.
Ora, tendo em conta a moldura penal aplicável e ponderando todas as circunstancias já apuradas e escritas na sentença recorrida e pertinentes a determinação da pena concreta mormente sob a égide do art.º 65.º do Código Penal de Macau, é mister impor a arguida a pena de 2 (dois) meses de prisão, a qual não pode ser substituída por multa devido à necessidade de prevenção do crime em causa (cfr. o art.º 44.º, n.º 1, do mesmo Código Penal).
Ademais, quanto a esta pena concreta, após cumulada com a pena de 7 meses de prisão a que o Tribunal “a quo” condenou a arguida pela prática do “crime de declaração falsa sobre a identidade”, o presente Tribunal entende que nos termos do artigo 71.º n.ºs 1 e 2 do mesmo Código convém condenar a arguida na pena única de 8 meses de prisão e suspende-se a sua execução pelo período de 2 anos segundo o artigo 48.º n.º 1 do mesmo Código.

III. Decisão
Face ao expendido, acordam em conceder provimento ao recurso; e, em consequência, revogar a sentença recorrida então proferida em 3 de Fevereiro de 2004 no processo penal n.º PCS-088-03-3 do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Base, na parte respeitante a absolvição da arguida (A) de um crime de violação de ordem de expulsão, p. e p. pelo art.º 14.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, de 3 de Maio; e condenar a mesma arguida (A), pela autoria material e na forma consumada, de um crime de violação de ordem de expulsão, p. e p. pelo art.º 14.º, n.º 1, da Lei n.º 2/90/M, de 3 de Maio, tal como vinha acusada pelo Ministério Publico, na pena de 2 (dois) meses de prisão, pena de prisão essa é cumulada com outra pena de 7 (sete) meses de prisão condenada pelo Tribunal “a quo”, pela prática de um “crime de declaração falsa sobre a identidade” p. e p. pelo art.º 12.º, n.º 1, da mesma Lei, a arguida (A) fica condenada na pena única de 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 (dois) anos.
Sem custas nesta Segunda Instancia. Fixam em MOP$800,00 (oitocentas patacas) os honorários devidos o mesmo Ex.mo Defensor Oficioso do arguido, a adiantar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instancia.

Chan Kuong Seng (Relator) –Lai Kin Hong – José M. Dias Azedo (vencido, nos termos da declaração de voto que anexei ao Ac. de 11.12.2003, Proc. n.º 266/2003, e que aqui dou como reproduzida para todos os efeitos legais)