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Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau



Recurso civil
N.° 15 / 2003

Recorrentes: A
B
C
Recorridos: D
E
F
G
H
I





1. Relatório
   A, B e C intentaram a acção declarativa de condenação na forma de processo comum ordinário de n.° 210/97-5° perante o então Tribunal de Competência Genérica de Macau contra D, E, F, G, H e I.
   Por sentença de 8 de Fevereiro de 1999 a fls. 142 a 157, foi a acção julgada procedente.
   Inconformados com a sentença, vieram os réus G e I interpor recurso de apelação para o então Tribunal Superior de Justiça que foi admitido pelo despacho de 10 de Março de 1999 a fls. 160 com a fixação do efeito suspensivo em relação à al. 1) da decisão da sentença e devolutivo para a al. 2) da mesma decisão, conforma o despacho de 14 de Maio de 1999 a fls. 168 a 169.
   Posteriormente foram elaboradas duas contas de n.° 898 e 899 constantes das fls. 173 e 174, a primeira refere ao preparo por interposição do recurso de apelação e a segunda às custas do processo.
   Em 9 de Julho de 1999, pelos dois réus-recorrentes foi apresentado um requerimento com o fim de “reclamar da conta” aí escrito, ao qual recai o despacho de 22 de Outubro de 1999 a fls. 195.
   Notificado deste despacho, os mesmos réus apresentaram em 8 de Novembro de 1999 novo requerimento a fls. 203 com a designação do objectivo idêntico. Por despacho de 7 de Janeiro de 2000 a fls. 218, o requerimento foi indeferido e o recurso de apelação julgado deserto.
   Sobre este último despacho o 4° réu G interpôs recurso para o Tribunal de Segunda Instância por requerimento de 24 de Janeiro de 2000 a fls. 221, substituído por outro de 14 de Fevereiro seguinte a fls. 231.
   O recurso foi admitido por despacho de 17 de Julho de 2000 a fls. 595 verso, em cumprimento da decisão proferida pelo Presidente do Tribunal de Segunda Instância nos autos de reclamação n.° 7/2000 já incorporados no processo principal.
   Após vários vicissitudes processuais, os autos subiram para o Tribunal de Segunda Instância.
   No exame preliminar, o relator conheceu do objecto do recurso interposto pelo 4° réu, entre outros recursos e questões, e julgou procedente este recurso, conforme o despacho a fls. 892 verso a 896 verso proferido em 11 de Julho de 2002.
   O despacho do relator foi objecto de reclamações para conferência requeridas pelos autores e a 1ª ré. Por acórdão do Tribunal de Segunda Instância proferido em 17 de Outubro de 2002, as reclamações foram indeferidas.
   É este acórdão do Tribunal de Segunda Instância o objecto do presente recurso para o Tribunal de Última Instância interposto pelos autores da acção mediante requerimento a fls. 996.
   O recurso foi admitido por despacho do relator do Tribunal de Segunda Instância de 7 de Abril de 2003 a fls. 1008 em consequência da decisão do Presidente do Tribunal de Última Instância proferida nos autos de reclamação n.° 1/2003/R apensados.
   
   Os recorrentes do presente recurso, autores da acção, apresentaram as seguintes conclusões da alegação:
“1. Tendo a parte recorrente vindo com reclamação da conta global de custas, pedindo que a conta fosse reformada para a forma e termos do art.º 76.° do CCJU, e, nessa conformidade fossem passadas as guias separadas de cada uma assim configurada; e pedindo notificação da conta parcelar do recurso, o despacho que recaiu sobre essa reclamação é uma decisão judicial que, quanto a esse incidente de reclamação da conta, tem mutatis mutandis a mesma função e produz os mesmos efeitos que a sentença quanto à acção, nomeadamente dos art.°s 157.º e 158.°, 666.° e segs., todos do Cód. Proc. Civil de 1961, então em vigor, e correspondentes aos art.° 107.° e 108.° e 569.° e segs. do actual CPCM;
2. Por isso que, tendo aquela decisão atendido o pedido de notificação da conta parcelar mas não alterado nem ordenado nem acolhido alteração da conta reclamada (nem qualquer outra), o meio próprio para atacar a não alteração da conta por essa decisão não era 2.ª reclamação da conta mas sim o recurso ou reclamação contra a decisão ao abrigo dos art.°s 668.º e 669.º do CPC de 1961, então em vigor (art.°s 571.º e 572.º do actual CPC de Macau), nomeadamente por eventual erro de julgamento, falta de pronúncia sobre questão que devesse apreciar, falta de fundamentação, contradição, ambiguidade, etc.;
3. Tendo decorrido, como decorreu, o respectivo prazo de recurso sem que os recorrentes depositassem as custas condição de subida de recurso nem a decisão que julgou a 1.ª reclamação contra a conta tivesse sido atacada com tal recurso nem reclamação, essa decisão transitou em julgado e, consequentemente, tornou-se definitiva (art.º 677.º do CPC de 1961, naquela data em vigor; art.º 582.º do actual CPC de Macau), e, por isso, não era admissível 2.ª reclamação da conta, devendo o recurso ser julgado deserto;
4. A 2.ª parte do § 2.º do art.º 85.º do CCJU significa que sobre a mesma conta nunca é admissível mais do que uma reclamação (mas sim, se for caso disso, recurso da decisão proferida sobre a mesma, nos termos gerais, se a alçada o admitir ou, se não o admitir, reclamação da mesma decisão (que não da conta) ao abrigo dos artigos 668.º e 669.º do CPC então em vigor e hoje art.° 571.º e 572.º do CPC de Macau), embora também seja reclamável a conta reformulada ou conta resultante da decisão da primeira reclamação mas, mesmo assim, a reclamação desta (primeira contra esta; e segunda na ordem e quantidade apresentada) também não pode ser admitida sem o prévio depósito das custas nesta contadas - entre outros, Desembargador Salvador da Costa, in anotação ao n.° 2 do art.º 61.° do C. Custas Judiciais de Portugal o qual tem a mesma redacção da 2.ª parte do § 2.º do art.º 85.º do CCJU;
5. por força da 1.ª parte do cit. § 2.º do art.º 85.º do CCJU, se tivesse havido reforma da conta reclamada (que não foi o caso), o prazo se contava-se a partir do aviso da nova conta ou conta ero depósito) e era admissível reclamação contra a nova conta, mediante prévio depósito das custas; mas não tendo havido reforma (que foi o caso dos autos), o prazo de pagamento conta-se a partir da notificação da decisão que julgou a 1.ª reclamação, salvo, evidentemente, se contra essa decisão (mas que não foi o caso dos autos) for interposto e for admitido recurso com efeito suspensivo ou reclamação nos termos dos cit. art.°s 668.º e 669.º do CPC então em vigor e hoje art.°s 571.º e 572.º do CPC de Macau;
6. Ora, não tendo sido ordenada a reforma da conta nem pela decisão que recaiu sobre a 1.ª reclamação da conta (nem por outra), nem tendo havido recurso contra essa decisão (nem reclamação) que impedisse de ser ela a decisão definitiva, nem tendo sido depositadas as custas dentro do prazo fixado e iniciado com a notificação da decisão e entrega das guias em 29.10.1999, e sucedendo que à data em que foi interposta a apelação e foi imposta obrigação de tal pagamento de custas sob pena de deserção do recurso vigoravam o referido CCJU e o Cód. Proc. Civil de 1961, julgou bem o juiz de primeira instância que julgou deserto tal recurso de apelação por falta de depósito das custas (nem admitiu a 2.ª reclamação da conta - mas o recurso julgado pelo Acórdão em apreciação apenas incidia quanto à parte relativa à desertação) - citados preceitos;
7. E, consequentemente, andou mal o aqui recorrido Acórdão do Tribunal de Segunda Instância:
- ao ter omitido que a soma das duas contas ou custas das duas contas se encontram somadas numa só conta, cfr. os autos certificam no seu próprio original, e contra a qual se tinha reclamado reforma mediante retirada dela da parte relativa à apelação e passagem de guias em conformidade com a reforma pedida;
- ao ter julgado admissível 2.ª reclamação contra a mesma conta (conta não reformulada nem em nada alterada);
- ao ter julgado admissível 2.ª reclamação da conta sem prévio pagamento ou depósito das custas;
- ao ter julgado que o pagamento ou depósito das custas condição de subida de recurso (isto é, custas a ser pagas antes de se tornarem definitivas as decisões) não devia ser feito antes ou contemporaneamente de eventual 2.ª reclamação da conta (isto é, em prazo a iniciar-se com a notificação da conta para pagar ou reclamar), mas sim em prazo a iniciar com a notificação da decisão da 2.ª reclamação (isto é, depois daquele prazo, depois da 2.ª reclamação, depois da decisão da 2.ª reclamação, depois do resultado desta);
- ao ter julgado que a decisão definitiva era a decisão que rejeitou a 2.ª reclamação que não a transitada decisão que recaiu sobre a 1.ª reclamação da conta.”
   Pedindo a revogação do acórdão recorrido e a manutenção do despacho de primeira instância de 7 de Janeiro de 2000 a fls. 218 que julgou deserto o recurso de apelação.
   
   A recorrida D, 1ª ré da acção, formulou as seguintes conclusões na sua resposta:
“1 - Os autores interpuseram o presente recurso por discordarem do douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que considerou extemporâneo o despacho do Mm.º Juiz a quo que julgara deserto o recurso de apelação interposto pelos réus uma vez que ainda não decorrera, à data daquela decisão do Juiz a quo, o prazo para pagamento das custas no processo em recurso;
2 - O entendimento do Venerando Tribunal de Segunda Instância baseia-se no despacho de fls. 195 dos autos (e na informação do Sr. Secretário Judicial de fls. 194 e 194v., e promoção do M.P. de fls. 195) que considerou a “primeira reclamação de conta” apresentada pelos réus como constituindo uma “Reclamação de falta de notificação de conta”, ou seja, como uma nulidade sanável, e ordenou, por consequência, a notificação e passagem de guias “como se requer a fls. 181”;
3 - Dúvidas não podem, por isso, restar de que a notificação feita de acordo com esta decisão de fls. 195, constitui, para todos os efeitos legais, a primeira notificação (correctamente feita e, logo, única válida) para exame, impugnação ou pagamento da mesma nos termos dos art.° 87.° e 89.°, parágrafo 3.°, do CCUJ, tal como, aliás, decorre dos despachos de fls. 195v., 197 a 198;
4 - Por essa razão, a reclamação apresentada no seguimento da nova notificação assim ordenada (e realizada nos moldes prescritos na lei), e decidida pelo Mm.º Juiz a quo em 7 de Janeiro de 2000 é, para todos os efeitos, a primeira “Reclamação de Conta” proprio sensu;
5 - Daqui decorre que, mesmo indeferindo (como o fez aquele Juiz) a Reclamação de Conta, o despacho que julgou deserto o recurso só poderia ser dado após o decurso do prazo para pagamento das custas que ainda não estava transcorrido na data em que foi proferido aquele despacho;
6 - Este foi o entendimento consagrado pelo Tribunal de Segunda Instância no douto Acórdão que proferiu;
7 - Descontentes com a linearidade de tal raciocínio, vieram os autores apresentar umas elaboradas alegações nas quais deturpam conscientemente o sentido do afirmado naquele aresto, sem se coibirem de afirmarem dizer o citado douto Acórdão aquilo que nele manifestamente não consta;
8 - Com efeito, afirmam os mesmos (sem qualquer base para isso) que “o douto Acórdão Recorrido entende que o douto despacho do TJB que a fls. 218 indeferiu a 2.ª reclamação da conta (...) obrigava o juiz a conceder aos reclamantes 3.º prazo de pagamento das custas, mediante terceira nova notificação das custas em dívida” (cfr. art.º 37.° das Alegações). O que em vão se procurará naquele Acórdão – e que simplesmente traduz uma litigância de má fé da parte dos autores;
9 - Vão mesmo mais além e, desregradamente, sustentam (também sem qualquer fundamento) que o Acórdão recorrido “parte do pressuposto de que a decisão que recaiu sobre a 1.ª reclamação não decidiu definitivamente a reclamação de conta” (cfr. art.º 38.°), quando é evidente, do teor do Acórdão recorrido e do despacho de fls. 195 dos autos, que fora ordenada “a notificação da conta e passagem de guias, conforme requerido pelos réus”, por verificação de uma nulidade processual;
10 - Sustentam ainda que “não é possível adoptar a interpretação pressuposta pelo Acórdão recorrido de que a decisão da 1.ª reclamação da conta mandou passar guias com o sentido defendido pela reclamação da conta (conta reformada em duas independentes, com guias independentes), porque isso seria o mesmo que dizer que a decisão ordenou implicitamente a reforma da conta.”;
11 - Porém, que tal entendimento não só é possível, como é, também, o entendimento legítimo e correcto, resulta, desde logo, textualmente do despacho em causa que afirma, como atrás também se disse, que “notifique-se e passe guias como se requer nas fls. 181”;
12 - Finalmente, mesmo que assim não se entendesse, nos termos do art.º 30.º do Decreto-Lei n.° 121/76 de 11 de Fevereiro, os réus deveriam considerar-se notificados da conta a 29 de Outubro de 1999 (sexta-feira). E porque à data vigorava ainda o Código de Processo Civil (CPC) de 1961, os prazos judiciais contavam-se por dias úteis;
13 - Por isso, o prazo para o pagamento da conta de custas pelos réus só começaria a correr no primeiro dia útil seguinte ao dia 29 de Outubro de 1999, que foi o dia 1 de Novembro de 1999 (segunda-feira), precisamente o dia em que entrou em vigor o novo Regime das Custas nos Tribunais Judiciais, nos termos do n.° 1 do art.º 12.º do Decreto-Lei n.º 63/99/M de 25 de Outubro, que aprovou aquele regime;
14 - Por outro lado, o prazo para o pagamento das custas só teria, em qualquer caso, começado a correr às 9.00 horas da manhã do dia 1 de Novembro, hora a que abrem os tribunais e assim é claro que quando entrou em vigor a nova lei, o prazo ainda não estava em curso;
15 - Em consequência, o despacho do Mm.º Juiz a quo proferido em 7 de Janeiro de 2000, ao declarar o recurso deserto por falta de pagamento da conta de custas no prazo legal, violou o disposto no n.° 1 artigo 39.º do RCTJ que considera que o pagamento das custas do processo deixou de ser condição de subida dos recursos interpostos de sentença final;
16 - Por fim, impõe-se a improcedência do recurso também por os autores se “esquecerem”, fundamentalmente, da razão por que recorreram ou, melhor dito, por se terem preocupado em negar razão ao entendimento propugnado pelos réus em vez de atacarem, como lhes competia, os fundamentos do douto Acórdão recorrido.”
   Pedindo que seja julgado improcedente o recurso.
   
   O outro recorrido G, 4° réu da acção, apresentou as seguintes conclusões na sua resposta:
“1 - Os autores interpuseram o presente recurso por discordarem do douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que considerou extemporâneo o despacho do Mmº Juiz a quo que julgara deserto o recurso de apelação interposto pelos réus uma vez que ainda não decorrera, à data daquela decisão do Juiz a quo, o prazo para pagamento das custas no processo em recurso;
2 - O entendimento do Venerando Tribunal de Segunda Instância baseia-se no despacho de fls. 195 dos autos (e na informação do Sr. Secretário Judicial de fls. 194 e 194v., e promoção do M.P. de fls. 195) que considerou a “primeira reclamação de conta” apresentada pelos réus como constituindo uma “Reclamação de falta de notificação de conta”, ou seja, como uma nulidade sanável, e ordenou, por consequência, a notificação e passagem de guias “como se requer a fls.181”;
3 - Dúvidas não podem, por isso, restar de que a notificação feita de acordo com esta decisão de fls. 195, constitui, para todos os efeitos legais, a primeira notificação (correctamente feita e, logo, única válida) para exame, impugnação ou pagamento da mesma nos termos dos art.°s 87.° e 89.°, parágrafo 3.°, do CCUJ, tal como aliás, decorre dos despachos de fls. 195v., 197 a 198;
4 - Por essa razão, a reclamação apresentada no seguimento da nova notificação assim ordenada (e realizada nos moldes prescritos na lei), e decidida pelo Mm° Juiz a quo em 7 de Janeiro de 2000 é, para todos os efeitos, a primeira “Reclamação de Conta”;
5 - Daqui decorre que, mesmo indeferindo (como o fez aquele Juiz) a Reclamação de Conta, o despacho que julgou deserto o recurso só poderia ser dado após o decurso do prazo para pagamento das custas que ainda não estava transcorrido na data em que foi proferido aquele despacho;
6 - Este foi o entendimento consagrado pelo Tribunal de Segunda Instância no douto Acórdão que proferiu;
7 - Com efeito, afirmam os mesmos que “o douto Acórdão Recorrido entende que o douto despacho do TJB que a fls. 218 indeferiu a 2.ª reclamação da conta (...) obrigava o juiz a conceder aos reclamantes 3.º prazo de pagamento das custas, mediante terceira nova notificação das custas em dívida” (cfr. art.º 37.° das Alegações). O que em vão se procurará naquele Acórdão – e que simplesmente traduz uma litigância de má fé da parte dos autores;
8 - Chegando ao descalabro de sustentarem a aberrante posição de que o Acórdão recorrido “parte do pressuposto de que recaiu sobre a 1.ª reclamação não decidiu definitivamente a reclamação de conta” (cfr. art.º 38.°), quando é evidente, do teor do Acórdão recorrido e do despacho de fls. 195 dos autos, que fora ordenada “a notificação da conta e passagem de guias, conforme requerido pelos réus”, por verificação de uma nulidade processual;
9 - Finalmente, mesmo que assim não se entendesse, nos termos do art.° 30.º do Decreto-Lei n.° 121/76 de 11 de Fevereiro, os réus deveriam considerar-se notificados da conta a 29 de Outubro de 1999. E porque à data vigorava ainda o Código de Processo Civil de 1961, os prazos judiciais contavam-se por dias úteis;
10 - Por isso, o prazo para o pagamento da conta de custas pelos réus só começaria a correr no primeiro dia útil seguinte ao dia 29 de Outubro de 1999, que foi o dia 1 de Novembro de 1999, precisamente o dia em que entrou em vigor o novo Regime das Custas nos Tribunais Judiciais, nos termos do n.° 1 do art.º 12.° do Decreto-Lei n.º 63/99/M de 25 de Outubro;
11 - Por outro lado, o prazo para o pagamento das custas só teria, em qualquer caso, começado a correr às 9.00 horas da manhã do dia 1 de Novembro, hora a que abrem os tribunais e assim é claro que quando entrou em vigor a nova lei, o prazo ainda não estava em curso;
12 - Em consequência, o despacho do Mm.º Juiz a quo proferido em 7 de Janeiro de 2000, ao declarar o recurso por falta de pagamento da conta de custas no prazo legal, violou o disposto no n.° 1 do artigo 39.º do RCTJ que considera que o pagamento das custas do processo deixou de ser condição de subida dos recursos interpostos de sentença final;
13 - Por fim, impõe-se a improcedência do recurso também por os autores se “ignorarem”, fundamentalmente, da razão por que recorreram ou, melhor dito, por se terem preocupado em negar razão ao entendimento propugnado pelos réus em vez de atacarem, como lhes competia, os fundamentos do douto Acórdão recorrido.”
   Pedindo igualmente a improcedência do recurso.
   
   Os outros réus da acção principal, ora recorridos, não apresentaram respostas.
   
   
   Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
   
   
   
   2. Fundamentos
   Os recorrentes, autores da acção, interpuseram o presente recurso contra o acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 17 de Outubro de 2002 que decidiu manter o despacho do relator e consequentemente julgar procedente o recurso interposto pelo 4° réu G e revogar o despacho do juiz titular do processo em primeira instância a fls. 218 na parte que julgou deserto o recurso de apelação interposto pelo mesmo réu.
   Para os recorrentes, o despacho a fls. 195 que decidiu a primeira reclamação da conta transitou em julgado, as contas não foram reformuladas e os reclamantes não depositaram as custas, pelo que estes não podem apresentar nova reclamação nem o tribunal pode conceder novo prazo para o respectivo pagamento. Entendem que o tribunal recorrido não respeitou o julgado formado pelo despacho que julgou a primeira reclamação das contas e violou os art.°s 698.° e 292.°, n.° 1 do Código de Processo Civil (CPC) de 1961 e 85.°, §2°, 89.°, §3° e 116.° do Código das Custas Judiciais do Ultramar1 (CCJU).
   
   O centro da discussão reside nos dois requerimentos apresentados pelos réus G e I e nos dois despachos que os apreciaram.
   Para aferir a justeza do acórdão recorrido, é mister apurar os efeitos dos referidos requerimentos e despachos.
   
   
   2.1 O primeiro requerimento dos 4° e 6° réus sobre as contas n.° 898 e 899 e o respectivo despacho (fls. 195)
   Proferida a sentença na primeira instância, interpuseram os 4° e 6° réus G e I o recurso de apelação (fls. 159). Após a decisão do efeito do recurso, o processo foi remetido para a conta.
   Foram elaboradas duas contas, uma, de n.° 898 (fls. 173), para o preparo do recurso e outra, de n.° 899 (fls. 174) sobre as custas da acção.
   Em 30 de Junho de 1999, foram expedidas cartas registadas para notificar os dois réus e seu mandatário “para, no prazo de 5 dias, examinar e impugnar a conta feita nos autos ou pagar custas, querendo.” com a remessa de uma cópia da conta n.° 899 e uma guia com o valor somado das duas contas (fls. 176, 182 a 185).
   No dia 9 de Julho seguinte, os dois réus apresentaram um requerimento a fls. 178 a 181, denominado “reclamação da conta”, pedindo a notificação da conta n.° 898 cuja cópia não foi enviada e a emissão de novas guias, correspondendo respectivamente às duas contas por entender que devia elaborar contas em separado e com prazos de pagamento também diferentes.
   Emitidos pareceres pelo contador e Ministério Público, foi proferido o seguinte despacho, na parte que ora interessa, datado de 22 de Outubro de 1999 (fls. 195):
   “Fls. 178 a 181: É evidente que não seja reclamação das contas, mas sim, reclamação de falta de notificação de uma conta. Assim, notifique-se e passe guias como se requer nas fls. 181 dos autos.
   ...”
   
   Assim, só em cumprimento deste despacho, os dois réus estariam em condições de conhecer o conteúdo da conta n.° 898 e permitiria consequentemente o conhecimento integral da conta n.° 899, por nesta conter uma verba “Da conta que antecede: $226.819,00”, referindo à conta n.° 898.
   Atendendo ainda que no despacho foi ordenado que “passe guias como se requer nas fls. 181 dos autos”, o que implica que foi deferido o pedido de emissão de novas guias correspondentes uma à conta de n.° 898 e outra à de n.° 899.
   Mesmo que entenda que o primeiro requerimento dos dois réus a fls. 178 a 181 fosse uma reclamação da conta, o deferimento dos respectivos pedidos não equivale, no presente caso, à decisão de primeira reclamação da conta que tem por consequência o disposto no art.° 85.°, §2° do CCJU, precisamente por os requerentes não terem tido ainda o conhecimento integral do conteúdo da conta n.° 899 nem toda a conta de n.° 898. Por isso, depois do primeiro requerimento, do subsequente despacho de deferimento e do seu efectivo cumprimento pela secretaria, os dois réus requerentes deviam ter novo prazo para examinar e impugnar as contas ou proceder ao seu pagamento nos termos do art.° 87.°, corpo do CCJU.
   Não procedem, assim, as afirmações dos ora recorrentes de que os dois réus não podiam apresentar nova reclamação da conta nem o tribunal podiam conceder novo prazo para o respectivo pagamento alegando que o primeiro requerimento constitui uma verdadeira reclamação da conta e com o trânsito do despacho que o apreciou os réus só podiam reclamar de segunda vez com o prévio depósito das custas nos termos do art.° 85.°, §2° do CCJU.
   
   
   2.2 O segundo requerimento dos 4° e 6° réus sobre as contas e o respectivo despacho (fls. 218)
   Em 26 de Outubro de 1999, a secretaria emitiu cartas para notificar os dois réus e o seu mandatário sobre o conteúdo do referido despacho a fls. 195 e “para examinar e impugnar ou pagar a conta de custas em 5 dias” (fls. 197 a 199), mas voltou a juntar apenas uma única guia para pagar o total das duas contas (fls. 207).
   Pelo facto de continuar a ser passada apenas uma guia para pagar as duas contas, os dois réus vieram apresentar outro requerimento em 8 de Novembro de 1999 (fls. 203 a 206) repetindo o anterior pedido de passagem de duas guias em separado.
   Sobre o requerimento, o Ministério Público emitiu o parecer constante das fls. 212v e 213:
   “Vi.
   Nos termos do art.° 116.° do CCJU, nenhum processo pode seguir em recurso sem estarem pagas ou asseguradas as custas.
   E o prazo para pagamento das custas é previsto no art.° 89.°, corpo e §1° do citado diploma.
   No entanto, tais prazos são previstos para casos normais e não para casos em que o pagamento de custas é condição do seguimento do recurso, pois nos termos do §3° do art.° 89.°, nestes casos o pagamento será feito no prazo de 5 dias, contados da notificação.
   Assim, a disposição do art.° 116.° torna o pagamento das custas do processo uma condição para o processo poder seguir os seus termos do recurso, tal como o pagamento das custas do recurso previstas no art.° 41.° do CCJU.
   Parece que nada impede que seja passada uma só guia para pagamento das custas das duas contas, pelo que é de indeferir o requerido pelos réus.”
   
   Depois, o juiz titular do processo proferiu, em 6 de Janeiro de 2000 e a fls. 218, o seguinte despacho:
   “Concordo com o douto parecer do Digno Magistrado do M.P. de fls. 212v e 213 e subscrevo-o para todos os efeitos legais.
   Assim, nos termos e fundamentos nele referidos, indefiro o requerido pelos R.R.
*
   Uma vez que os R.R. não pagaram as custas dentro do prazo fixado, julgo deserto o recurso interposto.
   Custas pelos apelantes.
   Notifique.”
   
   Portanto, no entendimento do juiz titular, só se podia passar uma única guia para pagar as custas do processo e do preparo de apelação e a decisão de julgar deserto o recurso de apelação por falta de pagamento das custas no prazo fixado significa que considerasse que os dois requerimentos de “reclamação da conta” não tinham efeitos de interromper o prazo de pagamento. Aqui, não se sabe a que prazo fixado se refere no despacho. Se fosse o prazo fixado na primeira guia, estaria em oposição com o julgado formado pelo primeiro despacho a fls. 195, se fosse da segunda guia, estaria mesmo perante uma situação de ciclo viciado como considera o relator do Tribunal de Segunda Instância.
   
   Analisadas bem as situações ocorridas, só com a carta emitida em 26 de Outubro de 1999 os dois réus estariam em condições de examinar e impugnar as contas n.° 898 e 899. O segundo requerimento dos réus (fls. 203 a 206) não deve ser considerado como uma segunda reclamação da conta sujeita ao depósito prévio das custas conforme o disposto na última parte do §2° do art.° 85.° do CCJU, no máximo, se fosse qualificável como reclamação da conta, será a primeira.
   Na realidade, este segundo requerimento aparece mais como uma reclamação contra o acto da secretaria de passagem de guias em desconformidade com o despacho anterior.
   A secretaria não pratica acto definitivo e deste cabe reclamação para o juiz.2 No novo CPC de 1999, tal mecanismo de impugnação está expressamente previsto no seu art.° 111.°, n.° 5.
   
   Assim, se não tomar em conta a alteração legislativa em matéria de custas entretanto ocorrida, o juiz titular do processo de primeira instância devia, em seguimento do decidido no primeiro despacho a fls. 195, permitir os réus pagarem as custas e preparo do recurso no prazo a correr de novo após a notificação do despacho que aprecia o segundo requerimento e a passagem de novas guias, em vez de, no referido despacho, julgar logo deserto o recurso de apelação por falta de pagamento das custas e preparo, tudo no âmbito do antigo regime do CCJU.
   
   
   2.3 Aplicabilidade do novo Regime das Custas nos Tribunais
   Mesmo que se entenda desta maneira, é de atender que no dia 1 de Novembro de 1999 entraram em vigor o Decreto-Lei n.° 63/99/M de 25 de Outubro e o Regime das Custas nos Tribunais (RCT) aprovado por aquele diploma. Ao mesmo tempo, foi revogado o Código das Custas Judiciais do Ultramar nos termos do art.° 11.°, n.° 1 do mesmo Decreto-Lei.
   Segundo o art.° 12.°, n.° 2 do Decreto-Lei n.° 63/99/M, este diploma e o novo RCT aplicam-se aos processos pendentes na referida data de entrada em vigor, salvo no que diz respeito à determinação da taxa de justiça, custas e multas decorrentes de decisões transitadas em julgado e aos prazos de pagamento de preparos, custas ou multas que estejam em curso.
   
   Para ajustar a sua aplicabilidade imediata com o regime dos recursos pendentes previsto no CPC de 1961, o n.° 4 do mesmo art.° 12.° determina:
   “4. Nos processos de natureza civil pendentes na data mencionada no n.° 1 (1 de Novembro de 1999), o recorrente que não alegue no tribunal recorrido paga o preparo inicial no prazo de 10 dias contado da data de notificação da distribuição no tribunal de recurso.”
   De facto, nos termos dos art.°s 613.°, n.° 2 e 645.° do novo CPC de 1999, que entrou em vigor no mesmo dia que o RCT, as alegações de recurso para o Tribunal de Segunda Instância e o Tribunal de Última Instância são sempre apresentadas no tribunal em que foi proferida a decisão objecto do recurso e o preparo inicial é pago com a apresentação das alegações, conforme o art.° 33.°, n.° 1, al. c) do RCT.
   Mas, no âmbito do CPC de 1961, o recorrente de apelação podia requerer que as alegações fossem apresentadas no tribunal recorrido, em vez de no tribunal superior (art.°s 699.°, n. 1 e 705.°, n.° 1 do CPC de 1961).
   A norma constante do n.° 4 do art.° 12.° do Decreto-Lei n.° 63/99/M, que fixa o momento do pagamento de preparo inicial do recurso para dez dias depois da notificação da distribuição no tribunal superior para os casos em que o recorrente optava alegar neste, revela-se claramente a intenção do legislador de aplicar novas regras em matéria de custas, incluindo as dos preparos, aos recursos que ainda correm com os trâmites ao abrigo das disposições da parte do recurso constantes do antigo CPC de 1961.
   
   Assim, o Decreto-Lei n.° 63/99/M e o RCT aplicam ao presente processo desde a data da sua entrada em vigor.
   
   Para o recurso de apelação interposto pelos 4° e 6° réus que foi julgado deserto pelo despacho agora em causa, por ser interposto antes de 20 de Dezembro de 1999, continua a aplicar o CPC de 1961 por força do art.° 2.°, n.° 6, al. a) do Decreto-Lei n.° 55/99/M.
   O art.° 698.° do CPC de 1961 prescrevia:
   “Deferido o requerimento de interposição do recurso e satisfeito o mais que fica disposto na subsecção anterior, serão contadas e pagas ou depositadas as custas que forem devidas.”
   Segundo esta norma, o pagamento ou depósito das custas era condição do prosseguimento do recurso de apelação.
   
   Por seu lado, o art.° 39.° do RCT dispõe assim:
   “Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, as contas dos processos são elaboradas no tribunal que funcionou em primeira instância, após o trânsito em julgado da decisão final.”
   Uma vez que, no novo regime das custas, a conta do processo só será elaborada depois de transitar em julgado a decisão final de primeira instância, o que significa que, para o caso de os autos terem de prosseguir os trâmites de recurso, não há conta do processo na fase inicial do recurso e por conseguinte o depósito das custas do processo deixar de ser condição do prosseguimento de recurso.
   E nos termos do art.° 33.°, n.° 1, al. c) do RCT, tendo em conta o novo regime de recursos consagrado no CPC aprovado em 1999, nos recursos é devido preparo a pagar com a apresentação das alegações, mas já não as custas. De facto, nas disposições do CPC de 1999 que regulam os recursos, deixa de existir norma como a do art.° 698.° do CPC de 1961 que exigia o pagamento ou depósito das custas do processo para o prosseguimento do recurso.
   Desta maneira, deve considerar revogada a norma do art.° 698.° do CPC de 1961 que impunha a contagem e o subsequente pagamento ou depósito das custas como condição do prosseguimento do recurso de apelação, a partir do dia 1 de Novembro de 1999, data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 63/99/M e o novo RCT aprovado por aquele.
   
   Voltando aos trâmites realizados no presente processo, a secretaria enviou carta registada em 26 de Outubro de 1999 para notificar os 4° e 6° réus do despacho a fls. 195 que apreciou e deferiu o primeiro requerimento destes a fls. 178 a 181 sobre as contas. Presumia-se que a carta foi recebida no dia 29 seguinte nos termos do art.° 1.°, n.° 3 do Decreto-Lei n.° 121/763 e o prazo de pagamento da nova guia começou a correr no primeiro dia útil seguinte, ou seja, precisamente no dia 1 de Novembro de 1999. Isso equivale a que o prazo de pagamento não terminou antes da entrada em vigor do novo regime das custas, pelo que deve aplicar o RCT à questão em apreço, ou seja, à obrigação do pagamento das custas no recurso de apelação. Em consequência, os dois réus deixaram de ser sujeitos ao pagamento das custas a partir daquela data e o recurso de apelação podia prosseguir, sem prejuízo de efectuar o preparo nos termos do referido art.° 12.°, n.° 4 do Decreto-Lei n.° 63/99/M.
   
   Assim, a decisão constante do acórdão recorrido deve ser mantida, embora com fundamento diferente, revogando o despacho do juiz titular de primeira instância a fls. 218 na parte impugnada, em que julgou deserto o recurso de apelação interposto com condenação nas custas, mas somente em relação ao 4° réu G, uma vez que só este réu recorreu do despacho, conforme o requerimento a fls. 221, substituído posteriormente pelo outro a fls. 231, e a procedência do recurso interposto pelo 4° réu não aproveita ao 6° réu, outro requerente das “reclamações da conta”, por não estar perante uma situação de litisconsórcio necessário prevista no n.° 1 do art.° 683.° CPC de 1961 nem outro casos previstos nas três alíneas do n.° 2 do mesmo artigo.
   
   
   
   3. Decisão
   Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso.
   Custas neste Tribunal de Última Instância e no Tribunal de Segunda Instância pelos recorrentes.




   Aos 17 de Dezembro de 2003.


           Juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
   
1 Aprovado pelo Decreto n.° 43809 de 20 de Julho de 1961, publicado no Boletim Oficial de Macau n.° 33 de 19 de Agosto de 1961.
2 Neste sentido, João de Castro Mendes, Direito Processual Civil, vol. II, revisto e actualizado, 1987, AAFDL, Lisboa, reimpressão, p. 325.
3 Publicado no Boletim Oficial de Macau n.° 40 de 6 de Outubro de 1987.
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Processo n.° 15 / 2003 24