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卷宗編號: 879/2023
日期: 2024年04月11日
關鍵詞: 正當性、延訴抗辯

摘要:
- 作為協議的簽署人及涉及其自身利益下,根據《民事訴訟法典》第61條之規定,相關人士必須參與宣告相關協議為無效的訴訟。倘其沒有參與有關訴訟,那便存在欠缺正當性的情況。
- 欠缺正當性構成延訴抗辯(《民事訴訟法典》第413條e)),法院可依據職權作出審理(《民事訴訟法典》第414條)。而隨著延訴抗辯的成立,法院須依法駁回起訴,不能對實體問題作出審理。
裁判書製作人

何偉寧












民事及勞動上訴裁判書

卷宗編號: 879/2023
日期: 2024年04月11日
上訴人: (A) (原告)
被上訴人: (B) (被告)
*
一. 概述
原告(A),詳細身份資料載於卷宗內,不服初級法院民事法庭於2023年05月31日作出的決定,向本院提出上訴,有關結論內容如下:
1. Vem o presente recurso interposto do saneador-sentença proferido pelo Tribunal Judicial de Base de Macau em 31 de Maio de 2023, que julgou totalmente improcedente a acção declarativa de condenação sob a forma ordinária instaurada pela ora Recorrente contra o ora Recorrido (i.e. a Sentença);
2. Em concreto, o objecto do presente recurso diz respeito à decisão formulada pelo Tribunal a quo sobre a não qualificação do contrato assinado pela ora Recorrente em 19 de Setembro de 2020 com o Recorrido e os seus filhos (C) e (D) como nulo, nos termos e para os efeitos dos artigos 273.º, n.º 2, 279.º e 282.º, n.º 1 do CC;
3. Por outro lado, e ainda sobre a mesma temática, é possível assacar uma nulidade à Sentença ora em crise, com fundamento em falta de especificação da fundamentação de facto, na medida em que o Tribunal a quo não especifica os fundamentos de facto que o levaram a concluir: i) quais foram as “vicissitudes que o casal tinha encardo”, e ii) os motivos pelos quais levaram o Tribunal a concluir que tais “vicissitudes” não impactavam de maneira alguma o Contrato;
4. Em jeito de contextualização, será de recordar que o Contrato é imposto pelo Recorrido à Recorrente como forma de penalizar esta última por um alegado comportamento atentatório dos deveres conjugais de fidelidade;
5. A demonstração do propósito sancionatório do Contrato resulta de uma análise cuidada do seu conteúdo. A título de exemplo, refira-se que neste mesmo Contrato se estabelece que:
i) obrigação de venda de um bem próprio da Recorrente, a saber a Fracção Autónoma I, conforme vertido na cláusula 1.ª do Contrato (imóvel este que veio a ser efectivamente vendido por HKD7.700.000,00, montante predeterminado pelo Recorrido), bem como do seu respectivo recheio;
ii) obrigação de suportar sozinha o reembolso de 3 empréstimos bancários solidários contraídos originalmente pelo Recorrido e pela Recorrente perante o ICBC e o OCBC, conforme vertido na cláusula 6.ª do Contrato, obrigação essa que se totalizou no montante de HKD1,783,948.35 (um milhão, setecentos e oitenta e três mil, novecentos e quarenta e oito Dólares de Hong Kong e trinta e cinco cêntimos);
iii) obrigação da entrega do remanescente do preço de venda da Fracção Autónoma I (no montante de HKD4.382.103.30 - quatro milhões, trezentos e oitenta e dois mil, cento e três Dólares de Hong Kong e trinta cêntimos - ao Recorrido, conforme vertido na cláusula 7.ª do Contrato.
6. Por força do Contrato, o Recorrido enriqueceu injustificada e ilegitimamente às expensas da Recorrente, tendo não só beneficiado da obtenção de um montante de HKD4.382.103.30 (quatro milhões, trezentos e oitenta e dois mil, cento e três Dólares de Hong Kong e trinta cêntimos), mas também beneficiado de ver saldados os seus créditos bancários perante o ICBC e OCBC, os quais se totalizam em HKD1,783,948.35 (um milhão, setecentos e oitenta e três mil, novecentos e quarenta e oito Dólares de Hong Kong e trinta e cinco cêntimos), ao qual acresce ainda o benefício, também ele de carácter patrimonial, de o Recorrido ter consigo distratar as hipotecas que incidiam sobre uma fracção autónoma e parque de estacionamento que este detinha em compropriedade com a Recorrente;
7. Com excepção da obrigação que incidia sobre o Recorrido de, com fundos que pertencem por direito à Recorrente (i.e. com o remanescente do produto da venda da Fracção Autónoma I) disponibilizar à Recorrente um montante máximo mensal de MOP13.000,00, o Contrato não atribuía quaisquer outros direitos à Recorrente - sendo forçado, de resto e pelas circunstâncias que rodeavam a celebração do Contrato, considerar tal circunstância como um verdadeiro direito;
8. Com o devido respeito, é convicção da Recorrente que o Tribunal a quo fez uma errada contextualização da factualidade relevante e a sua subsequente subsunção jurídica;
9. Desde logo, o Tribunal Judicial de Base de Macau, considerou na Sentença - erradamente na modesta opinião da Recorrente - que o Contrato não é mais do que um “acordo entre cônjuges quanto ao manuseamento da vida conjugal e à gestão financeira e ao uso dos bens ou recursos de cada um dos cônjuges na contribuição da vida conjugal no seio familiar” (negrito nosso) e que como tal, o mesmo não fere a moral imposta pelos bons costumes e ordem pública.
10. Conforme referido no capítulo III das presentes alegações, o Contrato apenas impõe obrigações quanto aos bens próprios da Recorrente, nomeadamente impondo a venda da Fracção Autónoma I e subsequentemente impondo a alocação de parte da venda para o reembolso total de 3 empréstimos bancários contraídos pelo Recorrido e pela Recorrente solidariamente e a transferência do remanescente do produto de tal venda exclusivamente para o Recorrido;
11. O Contrato não impõe qualquer obrigação ao Recorrido de dispor de bens próprios seus e/ou disponibilizar montantes por ele detidos à Recorrente ou sequer para proveito comum do casalou dos filhos;
12. O Contrato acaba, na modesta opinião da Recorrente, por ter uma natureza leonina, uma vez que é altamente desequilibrado em desfavor da Recorrente e em chocante benefício do Recorrido;
13. Não obstante as obrigações acima descritas, o Tribunal Judicial de Base de Macau não considerou o Contrato como imoral e como tal, não julgou procedente o pedido de declaração de nulidade do Contrato peticionado pela Recorrente, nos termos e para os efeitos dos artigos 273.º, n.º 2, 279.º e 282º, n.º 1 do CC;
14. Acaba por ser deveras chocante que um negócio jurídico com o conteúdo do Contrato, imposto por um cônjuge ao outro como forma de manutenção de uma relação matrimonial, não seja considerado pelo Tribunal Judicial de Base de Macau como imoral e, por inerência, nulo por afronta aos bons costumes e também à ordem pública;
15. Não poderão existir dúvidas de que um negócio jurídico através do qual um cônjuge impõe obrigações de cariz patrimonial sobre o outro com vista a enriquecer injustificadamente às expensas deste será nulo - neste sentido, dentre outros, vide a título de exemplo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo n.º 43/09.9YFLSB de 26/05/2009, disponível para consulta online em www.dgsi.pt;
16. Com efeito, inversamente ao propugnado pelo douto Tribunal a quo, não pode razoavelmente concluir-se que o Contrato não fere a moralidade e, por inerência, que não existe lugar à aplicação do disposto nos artigos 273.º, n.º 2, 279.º e 282.º n.º 1 do CC;
17. À luz do ordenamento jurídico vigente na RAEM tem forçosamente que ser considerado imoral, um Contrato entre cônjuges através do qual:
i) um contrato pelo qual um dos cônjuges impõe ao outro que este venda bens próprios seus e lhe entregue sem qualquer justificação - legal ou qualquer outra - o produto de tais vendas;
ii) obrigações de natureza pecuniária têm como principal propósito reduzir no máximo possível a autonomia financeira de um dos cônjuges de forma a que este fique na medida do possível dependente do outro;
iii) um contrato que resulta na eliminação dos passivos ou obrigações de uma parte e a sua correspondente transferência para a esfera jurídica da outra; e
iv) um contrato cuja a ratio foi única e exclusivamente de castigar e humilhar um cônjuge por alegados comportamentos de infidelidade.
18. Conforme acima salientado, ao aceitarmos a decisão vertida na Sentença, estaremos a aceitar que em Macau é moral e socialmente aceite que um cônjuge possa castigar o outro por alegados comportamentos atentatórios dos deveres conjugais através de sanções patrimoniais vertidas num documento particular - sob o pretexto de que tal arranjo contratual se encontra compreendido na noção de “manuseamento da vida conjugal e gestão financeira e ao uso dos bens ou recursos de cada um dos cônjuges na contribuição da vida conjugal no seio familiar”;
19. Com efeito, entende assim a Recorrente que a interpretação feita pelo Tribunal Judicial de Base de Macau quanto ao conteúdo do Contrato e, bem assim, a completa desconsideração das circunstâncias que conduziram à celebração do Contrato, levou a uma decisão errada, que em nada se alinha com os princípios legais previstos no ordenamento jurídico da RAEM, nomeadamente no artigo 273.º, n.º 2 do CC;
20. Pelo exposto, entende assim a Recorrente que o Contrato deverá efectivamente ser declarado por este Douto Tribunal como nulo, por materialmente imoral e, como tal, atentatório da ordem pública e dos bons costumes, nos termos e para os efeitos dos artigos 273.º, n.º 2 e 279.º do CC;
21. Consequentemente, deverá o Recorrido ser condenado, nos termos e para os efeitos dos artigos 282.º, n.º 1 do CC a restituir à Recorrente o montante de HKD6.176.948,35 (seis milhões, cento e setenta e seis mil e novecentos e quarenta e oito Dólares de Hong Kong e trinta e cinco cêntimos) equivalente a MOP6.362.256,80 (seis milhões, trezentas e sessenta e duas mil e duzentas e cinquenta e seis Patacas e oitenta avos);
22. O Tribunal Judicial de Base de Macau veio julgar um pedido de anulação do Contrato com base em coacção moral que nunca foi peticionado pela Recorrente nos seus articulados;
23. Ao invés de o Tribunal a quo ter analisado a factualidade vertida nos artigos 9.º, 49.º, 57.º, 63.º e 65.º da Petição Inicial para perceber e determinar com exactidão as circunstâncias que rodeavam a celebração do Contrato, este órgão jurisdicional acabou por considerar que tais factos apenas relevariam para um alegado pedido de anulação do Contrato (algo que, reitere-se, nunca foi peticionado pela Recorrente);
24. Entende a Recorrente que os factos vertidos nos seus articulados, nomeadamente mas não limitado aos factos constantes dos artigos 9.º, 49.º, 57.º, 63.º e 65.º da Petição Inicial, são de extrema relevância para se perceber o contexto que ensombrava o Contrato;
25. O defendido na Sentença pelo Tribunal Judicial de Base de Macau quanto a questão descrita nas três conclusões anteriores terá forçosamente que ser considerada por este Douto Tribunal como um manifesto extravasar do poder jurisdicional do Tribunal Judicial de Base de Macau, uma vez que este julgou algo que nunca foi peticionado;
26. À CAUTELA, MAS SEM CONCEDER, e caso este Douto Tribunal venha a entender de outra forma, sufragando o entendimento do Tribunal a quo quanto à moralidade do Contrato, e por inerência quanto à não aplicação do disposto nos artigos 273.º, n.º 2, 279.º e 282.º, n.º 1 do CC, haverá ainda que apontar que não existe qualquer justificação legal que fundamente o porquê de o Recorrido obter um enriquecimento que se totaliza em HKD6.176.948,35 (seis milhões, cento e setenta e seis mil e novecentos e quarenta e oito Dólares de Hong Kong e trinta e cinco cêntimos) equivalente a MOP6.362.256,80 (seis milhões, trezentas e sessenta e duas mil e duzentas e cinquenta e seis Patacas e oitenta avos) às expensas da Recorrente;
27. O Tribunal Judicial de Base de Macau considerou que não há lugar a aplicação do instituto do enriquecimento sem causa, uma vez que como na sua opinião o Contrato não é imoral e por sua vez, não é atentatório da ordem pública e dos bons costumes, o Recorrido poderá utilizar o Contrato como causa para se enriquecer às expensas da Recorrente;
28. Na modesta opinião da Recorrente, não é justificável que um cônjuge beneficie de uma exoneração total das suas obrigações bancárias e bem assim veja distratadas duas hipotecas que incidiam sobre bens de que era comproprietário sem qualquer justificação para o efeito;
29. Tal linha de raciocínio terá que ser aplicável mesmo que tais benefícios estejam previstos num contrato. Aliás, neste sentido veja-se o defendido pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, quando considerou que “[t]oda a deslocação patrimonial, produtora de enriquecimento à custa de outrem, que não tenha justificação na ordem jurídica, é fundamento da obrigação de restituir, com base em enriquecimento sem causa ...”, mais referindo que o “enriquecimento não tem causa quando, segundo a lei, não devia pertencer àquele que dele beneficia, mas sim a outrem. A causa, cujo conteúdo é o próprio ordenamento jurídico, os valores defendidos, as ponderações de interesse realizadas caso por caso, visa evitar que o princípio do enriquecimento contrarie, fraude, a lei. Deste modo, quando o enriquecimento foi obtido à custa de outrem, é necessário averiguar, por interpretação e integração da lei, se esta o quer radicar no beneficiado ou não.” (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo n.º 99B686 de 23/09/1999, disponível para consulta online em www.dgsi.pt);
30. Ora, socorrendo-nos do supra entendimento do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, e na eventualidade de o Contrato não ser considerado nulo, teremos forçosamente que considerar que existe lugar à aplicação, de forma subsidiária, do instituto do enriquecimento sem causa previsto nos artigos 467.º e seguintes do CC, uma vez não existe qualquer justificação legal que possa fundamentar um enriquecimento do Recorrido equivalente ao montante de montante de HKD6.176.948,35 (seis milhões, cento e setenta e seis mil e novecentos e quarenta e oito Dólares de Hong Kong e trinta e cinco cêntimos) equivalente a MOP6.362.256,80 (seis milhões, trezentas e sessenta e duas mil e duzentas e cinquenta e seis Patacas e oitenta avos) no contexto do Contrato objecto dos presentes autos;
31. Assim sendo, deverá a decisão jurisprudencial aqui em crise ser revogada também no que toca a decisão quanto ao enriquecimento sem causa, devendo, caso este Douto Tribunal considere que o Contrato não é nulo, ser o Recorrido condenado a restituir à Recorrente o montante de HKD6.176.948,35 (seis milhões, cento e setenta e seis mil e novecentos e quarenta e oito Dólares de Hong Kong e trinta e cinco cêntimos) equivalente a MOP6.362.256,80 (seis milhões, trezentas e sessenta e duas mil e duzentas e cinquenta e seis Patacas e oitenta avos), nos termos e para os efeitos dos artigos 467.º e 473.º, n.º 1 do CC.
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被告(B)就上述上訴作出答覆,有關內容載於卷宗第559至576頁,在此視為完全轉錄。
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二. 理由陳述
先決問題:
本案裁判書製作人於2024年01月26日作出以下批示:
  “Ao preparar o projecto do acórdão, verifica-se que a Autora pediu a declaração da nulidade do acordo constante a fls. 182 a 184 dos autos.
Tal acordo foi celebrado entre a Autora, o Réu e o (C) (filho da Autora e do Réu), contendo interesses deste último.
No entanto, a presente acção apenas foi proposta contra o Réu, sem qualquer intervenção do (C), o que implicará uma eventual ilegitimidade passiva, que poderá determinar a absolvição da instância.
Pelo exposto e em nome do contraditório, notifique as partes para pronunciarem, querendo, o que tiverem por convenientes.”。
原告於2024年02月16日作出回覆,認同裁判書製作人的立場,認為確實存在正當性不足的情況,故應依法駁回起訴(見卷宗第593及其背頁)。
被告則不認為存在正當性不足的問題(見卷宗第594至597頁)。
現就有關問題作出審理。
《民事訴訟法典》第58條及第61條分別規定如下:
第五十八條
正當性之概念
  在原告所提出出現爭議之實體關係中之主體具有正當性,但法律另外指明者除外。
第六十一條
必要共同訴訟
一、 如法律或法律行為要求在出現爭議之實體關係中各主體均參與訴訟,則欠缺任一人即構成不具正當性之理由。
二、 如基於有關法律關係之性質,所有主體有需要參與訴訟,以便所獲得之裁判能產生正常有用之效果,則亦需要所有主體參與訴訟;只要就所提出之請求所作之裁判能確定性規範當事人之具體情況,該裁判即產生其正常有用之效果,即使該裁判不約束其他主體亦然。
在本個案中,原告在起訴狀中並沒有明確直接具體指出要求宣告為無效的協議是和誰人簽訂的,僅是提出相關協議的內容是由被告強加的,而該協議的內容違反公共秩序和善良風俗,故是無效的。
除上述請求外,還提出了以不當得利為由而要求被告返還金錢的補充請求。
卷宗第182至184頁的協議清楚顯示該協議是由三方所簽署,分別為:原告、被告及被告的兒子(C),當中包含後者的利益。
在(C)作為協議的簽署人及涉及其自身利益下,根據《民事訴訟法典》第61條之規定,其必須參與本案的訴訟。
由於(C)並沒有參與本案的訴訟,故存在欠缺正當性的情況。
欠缺正當性構成延訴抗辯(《民事訴訟法典》第413條e)),法院可依據職權作出審理(《民事訴訟法典》第414條)。而隨著延訴抗辯的成立,法院須依法駁回起訴,不能對實體問題作出審理。
基於此,原審法院就實體問題作出的判決不能繼續維持。
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三. 決定
綜上所述,廢止原審判決,改判處因欠缺被告完整正當性而駁回起訴。
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兩審訴訟費用由原告承擔。
作出適當通知。
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2024年04月11日

(裁判書製作人)
何偉寧

(第一助審法官) 唐曉峰

(第二助審法官)
李宏信



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879/2023