(Tradução)
Âmbito de conhecimento da causa
Crime de perigo comum
Crime de detenção de arma proibida
Sumário
Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão, razão pela qual o tribunal ad quem só se limita a resolver as questões concretamente postas e delimitadas pelo recorrente nas conclusões da sua motivação de recurso.
O chamado crime de perigo comum é um perigo abstracto, a lei não exige que é um perigo concreto, já causado ou que está em causa um determinado destinatário.
O crime de detenção de arma proibida é um crime de perigo comum e cujo bem jurídico violado é a segurança pública, sendo crime grave pela sua natureza.
Acórdão de 7 de Outubro de 2004
Processo n.º 218/2004
Relator: Chan Kuong Seng
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.
I. RELATÓRIO E FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA E JURÍDICA DA SENTENÇA RECORRIDA
Sob acusação pública deduzida pelo Ministério Público de Macau no dia 12 de Janeiro de 2004, o 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Base procedeu ao julgamento, com a intervenção do tribunal colectivo, do Processo Penal Comum n.º PCC-009-04-1 em que é arguido (A), proferindo o respectivo acórdão de 1.ª instância no dia 14 de Maio de 2004 (cfr. o teor do acórdão de fls. 60 a 61v dos autos):
<<1. Acordam os Juízes que compõem o Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base da RAEM.
O Digno Magistrado do Ministério Público acusa o seguinte arguido:
(A), de sexo masculino, solteiro, operário, portador do Salvo-Conduto da RPC para Deslocações a Hong Kong e Macau n.º XXX, nascido a XX de XXX de XXXX, na XXX, filho de XXX e XXX, sem residência fixa em Macau, residente em [Endereço (1)], ora preso preventivamente no EPM.
***
Factos acusados:
Depois da entrada em Macau em Dezembro de 2003, o arguido adquiriu numa loja sita na proximidade das Ruínas de S. Paulo uma faca de aço inoxidável de marca comercial “Sam Ieong” pelo preço de MOP25,00.
A faca em causa tem um comprimento total de 30 cm e a lâmina de 20,5 cm.
O arguido comprou essa faca com a intenção de cometer roubo em Macau.
Por volta das 3 horas da madrugada do dia 31 de Dezembro de 2003, o arguido trazia a referida faca andando a procurar objectos para serem roubados na proximidade do cruzamento entre Rua Cidade de Sintra e Avenida Zheng Guang Ying e foi interceptado neste momento por agentes policiais.
O arguido, na situação de saber bem perfeitamente, detinha e trazia consciente e voluntariamente uma faca cuja lâmina excede o comprimento estandardizado legalmente, não consegue justificar sobre os aspectos acima referidos.
O arguido sabia plenamente que a sua conduta era proibida e punida por lei.
***
Imputa-lhe, assim, o M.ºP.º e vem acusado o arguido da prática, em autoria material e na forma consumada, de:
- Um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal e art.º 1, alínea e) do Decreto-Lei n.º 77/99/M ;
***
2. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento.
Mantém-se a regularidade da instância.
Discutida a causa ficaram provados os seguintes factos:
Depois da entrada em Macau em Dezembro de 2003, o arguido adquiriu numa loja sita na proximidade das Ruínas de S. Paulo uma faca de aço inoxidável de marca comercial “Sam Ieong” pelo preço de MOP25,00.
A faca em causa tem um comprimento total de 30 cm e a lâmina de 20,5 cm.
O arguido comprou essa faca com a intenção de cometer roubo em Macau.
Por volta das 3 horas da madrugada do dia 31 de Dezembro de 2003, o arguido trazia a referida faca andando a procurar objectos para serem roubados na proximidade do cruzamento entre Rua Cidade de Sintra e Avenida Zheng Guang Ying e foi interceptado neste momento por agentes policiais.
O arguido, na situação de saber bem perfeitamente, detinha e trazia consciente e voluntariamente uma faca cuja lâmina excede o comprimento estandardizado legalmente, não consegue justificar sobre os aspectos acima referidos.
O arguido sabia plenamente que a sua conduta era proibida e punida por lei.
O arguido é solteiro e operário, auferindo um vencimento mensal de ¥500,00 Renminbis.
O arguido não confessou tais factos, sendo primário.
Não ficaram provados os seguintes factos: nenhum a assinalar.
***
Sintetizadas as declarações prestadas pelo próprio arguido, os depoimentos das testemunhas e outras provas documentais, este Tribunal Colectivo confirmou os factos.
Lida, nos termos do artigo 338.º n.º 1 al. b) do CPP, as declarações prestadas pelo arguido junto do Ministério Público de fls. 11 e 12 dos autos.
***
3. Resulta da matéria de facto provado que o arguido tomou claro conhecimento da característica e natureza do instrumento em causa, sem ter conseguido justificar a detenção desse instrumento, nem podendo explicar as razões quanto à sua posse naquele momento, por isso, o acto do arguido constitui um crime de detenção de arma proibida.
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4. Nos termos do artigo 65.º n.ºs 1 e 2 do Código Penal de Macau de 1995:
“1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.”
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5. Tendo em conta os comportamentos anteriores e posteriores ao crime do arguido e as circunstâncias do crime, este Tribunal Colectivo entende que a suspensão da execução da pena de prisão não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição através do seu efeito intimidador, na medida em que o crime imputado ao arguido é um crime grave, mostra-se adequada a execução da pena de prisão.
***
6. Face ao expendido e nos termos dos fundamentos acima referidos, acordam em julgar procedente a acusação e condenam o arguido pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal e art.º 1, alínea e) do Decreto-Lei n.º 77/99/M na pena de 2 anos e 9 meses de prisão.
Custas a cargo do arguido, com a taxa de justiça em 3 UC e em quinhentas patacas como honorários devidos ao ilustre defensor;
Condenam o arguido a pagar um montante no valor de MOP$500,00 (quinhentas patacas) ao abrigo do art.º 24º da Lei 6/98/M de 17/8.
Declaram perdido a favor da RAEM o apreendido.
Boletim ao registo criminal.
Passe mandados de condução do arguido para o cumprimento da pena de prisão no Estabelecimento Prisional.”
Inconformado, veio recorrer o arguido para esta Segunda Instância, tendo concluído e pedido na sua motivação de recurso de fls. 94 a 96v dos presentes autos, nos termos seguintes:
“1.) O Colectivo de juízes condenou o arguido na pena de 2 anos e 9 meses de prisão efectiva.
2.) Afigura-se excessiva a pena concretamente aplicada ao ora recorrente dentro de uma moldura penal de 2 a 8 anos de prisão.
3.) Ao determinar o quantum da pena concreta a aplicar, o Colectivo não considerou plenamente o artigo 40.º n.º 1 do Código Penal.
4.) Ao determinar o quantum da pena concreta a aplicar, o Colectivo não considerou plenamente o artigo 65.º do Código Penal.
5.) Em relação à prevenção geral, uma vez que os bens jurídicos já foram violados, a determinação de pena deve partir de um olhar para frente e a sua dosimetria deve ser iniciada a partir da pena mais atenuada.
6.) No que diz respeito à prevenção especial, no caso sub judice, apesar de ser facto de o recorrente não ter confessado o crime imputado perante o Colectivo, o recorrente confessou, durante o procedimento do recurso, que por volta das 3 horas da madrugada do dia 31 de Dezembro de 2003, trazia uma faca andando a procurar objectos para serem roubados na proximidade do cruzamento entre Rua Cidade de Sintra e Avenida Zheng Guang Ying e foi interceptado por agentes policiais no momento em que não conseguiu chegar a consumar o roubo. Agora, o recorrente admitiu ser ilícito o acto praticado e dando importância ao conteúdo do acórdão em causa, assumindo activamente a responsabilidade e mostrando arrependimento. No que diz respeito ao eventual ofendido, resulta dos autos que não há nenhum, pelo que se deve considerar este aspecto quanto à determinação da pena aplicada.
7.) O acórdão recorrido deve ponderar a prevenção geral e a prevenção especial e deve procurar um equilíbrio entre as duas prevenções ao proferir a decisão final, equilíbrio este que deve ser inferior a 2 anos e 9 meses.
8.) Ao determinar o quantum da pena concreta a aplicar, o Colectivo não considerou plenamente o disposto no artigo 65.º n.º 2 al. a) do Código Penal, ou seja, “a gravidade das consequências de ilicitude do facto, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente”, o qual o recorrente satisfaz, devendo portanto reduzir o grau da culpa para a determinação da pena.
9.) A pena concretamente aplicada dentro da moldura de 2 a 8 anos de prisão deve ser inferior a 2 anos e 9 meses, é só assim que se satisfaz o artigo 40.º n.º 1 e artigo 65.º do Código Penal.
10.) Pede-se aos Mm.ºs Juízes do Colectivo do Tribunal ad quem que se digne ponderem as supracitadas circunstâncias especiais e fixem uma pena adequada ao recorrente.
Pelo exposto, pede-se aos Mm.ºs Juízes que admitam o recurso, revogando nos termos do disposto no CPPM o acórdão recorrido e apliquem um pena mais atenuante ao recorrente.”
Ao recurso respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido nos termos do artigo 403.º n.º 1 do CPP do modo seguinte:
“O arguido enunciou nas alegações de recurso que é excessiva a pena condenada pelo Tribunal recorrido.
Na lide recursória, o arguido foi condenado na pena efectiva de 2 anos e 9 meses de prisão pela prática de um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal e art.º 1, alínea e) do Decreto-Lei n.º 77/99/M.
Este crime de detenção de arma proibida é punível com pena de prisão de 2 a 8 anos.
As finalidades da pena e a regra da determinação da medida da pena vêm consagradas nos artºs 40º e 65º do CP.
No caso sub judice, o arguido detinha uma arma proibida com a intenção de cometer roubo.
Durante a audiência de julgamento, nunca o arguido confessou o facto imputado, razão pela qual não se pode observar se tinha arrependimento.
Sendo primário o arguido.
As finalidades da pena visam a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
Os bens jurídicos violados por crime da detenção de arma proibida relacionam-se à segurança pública, pelo que a lei fixa as punições em seu patamar mais elevado. A pena aplicada no acórdão recorrido é dentro do patamar um pouco superior ao mínimo legal (2 a 3 anos), ademais, dos factos dados provados resulta claramente que o arguido detinha uma faca com a intenção de cometer roubo, o que demonstra que o grau de culpa do arguido é mais elevado em relação a outros actos normais de detenção de arma proibida, isto deve ser reflectido na determinação da pena.
Os crimes de perigo comum e os de violência (e.g. crime de roubo) têm merecido a particular atenção por parte do legislador e do público, o juiz, ao determinar a pena aplicada, tem de ponderar a eficácia preventiva geral e especial da pena aplicada a quem cometeu esses crimes e distinguir esses dos crimes não violentos.
Compulsando os elementos carreados aos autos, consideramos que os Mm.ºs juízes já tinham ponderado esses factores ao determinar a pena aplicada, sendo portanto correcta a aplicação da lei para determinar concretamente a pena, adequada a pena e não há nenhuma deficiência alegada pelo recorrente.
Nestes termos, pugnamos pelo improvimento do recurso e mantendo o acórdão recorrido.”
Subido o recurso para esta Instância ad quem, o Digno Procurador-Adjunto junto deste Tribunal, em sede de vista a ele aberta nos termos do artigo 406º do Código de Processo Penal, emitiu o parecer a fls. 110 a 111, pugnando materialmente pelo não acolhimento dos pontos jurídicos explanados na motivação de recurso.
Subsequentemente, foi pelo relator do presente processo feito o exame preliminar dos autos à luz do art.º 407.º, n.º 3, do CPP, em sede do qual se entendeu poder este TSI conhecer do mérito da causa.
Em seguida, foram postos pelos dois Mm.ºs Juízes-Adjuntos os seus vistos nos autos de acordo com o art.º 408.º, n.º 1, do CPP.
Depois, o tribunal colectivo realizou a audiência de julgamento nos termos dos art.ºs 411.º e 414.º do CPPM, durante a qual, tanto o representante do Ministério Público como o do recorrente, ora arguido apresentaram alegações orais sobre o objecto do recurso.
Cumpre agora decidir do recurso sub judice nos termos infra.
II. FUNDAMENTAÇÃO DO PRESENTE ACÓRDÃO
Tendo em consideração que o tribunal ad quem só vai resolver as questões concretamente postas pelo recorrente e delimitadas pelas conclusões da sua motivação de recurso (apud nomeadamente os acórdãos deste TSI: de 19/2/2004 no Processo n.º 32/2004; de 12/2/2004 no Processo n.º 297/2004; de 11/12/2003 no Processo n.º 266/2003; de 23/10/2003 no Processo n.º 214/2003; de 24/10/2002 no Processo n.º 130/2000; de 25/7/2002 no Processo n.º 47/2002; de 17/5/2001 no Processo n.º 63/2001; de 3/5/2001 no Processo n.º 18/2001; de 7/12/2000 no Processo n.º 130/2000 e de 27/1/2000 no Processo n.º 1220), e considerando a doutrina do saudoso Professor José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, Lim., 1984, pág. 143, aplicável mesmo aos recursos penais, de que “Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (cfr. neste sentido, nomeadamente os acórdãos deste TSI: de 19/2/2004 no Processo n.º 32/2004; de 12/2/2004 no Processo n.º 297/2004; de 11/12/2003 no Processo n.º 266/2003; de 23/10/2003 no Processo n.º 214/2003; de 24/10/2002 no Processo n.º 130/2002; de 25/7/2002 no Processo n.º 47/2002; de 30/5/2002 nos Processos n.ºs 84/2002 e 87/2002; de 17/5/2001 no Processo n.º 63/2001; de 7/12/2002 no Processo n.º 130/2000, sem prejuízo, obviamente, da possibilidade de o tribunal ad quem se pronunciar, caso entender conveniente, sobre qualquer das razões invocadas nas conclusões da motivação de recurso), a questão nuclear a conhecer nesta lide recursória traduz-se precisamente em saber se é excessiva a pena que lhe foi condenada pelo tribunal a quo?
Aliás, e em face dos elementos constantes dos presentes autos, havemos que manifestar também a nossa concordância com as seguintes considerações pertinentemente feitas pelo Digno Procurador-Adjunto junto deste TSI no seu parecer emitido:
O recorrente (A) alegou como fundamento na sua motivação de recurso que ao determinar concretamente a pena, o Tribunal a quo não considerou plenamente o disposto no artigo 40.º n.º 1 e artigo 65.º do Código Penal, entendeu que era excessiva a pena de 2 anos e 9 meses de prisão que lhe foi imposta.
Tal como a resposta dada pelo Delegado do Ministério Público à motivação do recurso, não podemos manifestar a nossa concordância com o opinado pelo recorrente.
Como se sabe, nos termos do artigo 40.º, n.º 1 do Código Penal, a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
Em situação geral, os fins das penas englobam dois aspectos: prevenção geral e prevenção especial, a prevenção geral assume o primeiro lugar como finalidade da pena, servindo não apenas para intimidar às actividades criminais e aos delinquentes potenciais através de castigos ou sanções, mas também para recuperar e robustecer a consciência jurídica dos cidadãos através da aplicação das penas, a fim de salvaguardar as expectativas comunitárias na validade e vigência das normas violadas pelos actos criminais e na segurança social e individual, bem como proteger os interesses públicos ou privados violados pelos crimes cometidos; enquanto a prevenção especial está direccionada ao delinquente concreto castigado com uma pena, especialmente através da execução da pena para que este aprenda lição, lembrando as graves consequências que lhe provoca pela prática de actos criminais, a fim de evitar o cometimento de novos crimes no futuro e reinserir-se na sociedade.
Analisando as circunstâncias do caso concreto, não se mostra que o Tribunal recorrido violou o artigo 40.º n.º 1 do Código Penal ao aplicar ao ora recorrente uma pena de 2 anos de 9 meses de prisão efectiva; ao contrário, o Tribunal recorrido, ao determinar concretamente a pena, atendeu como ponto de partida às necessidades da prevenção geral e especial para sancionar o ora recorrente que cometeu tal acto criminal.
Na determinação da medida da pena, o tribunal deve cumprir o disposto no artº 65º do CPM:
"1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
2. Na determinação da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deve ser censurada através da aplicação da pena.
3....”
Do acórdão recorrido resulta que o Tribunal a quo, ao determinar a medida concreta da pena a ser aplicada ao recorrente, atendeu os critérios consagrados no artigo 65.º nºs 1 e 2 do Código Penal, nomeadamente à moldura penal aplicável ao crime praticado pelo recorrente, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstância deste. Entendemos que não mostra inadequada a pena concreta nem há violação da respectiva disposição legal.
Por palavras simples, são 3 as fases de determinação concreta da pena: fixa-se a pena aplicável ao crime praticado pelo agente (pena punível); determina-se a medida concreta da pena que vai aplicar dentro da moldura penal abstracta; há ainda situação em que se escolham as espécies da pena que efectivamente deve ser cumprida (e.g. será a pena de prisão substituída por multa, será aplicada a suspensão da execução da pena de prisão, etc.).
No caso sub judice, o tribunal recorrido consignou o arguido ter praticado um crime de detenção de arma proibida p. e p. pelo art. 262.º, n.º 1 do Código Penal e art.º 1, alínea e) do Decreto-Lei n.º 77/99/M, crime este que é punível com pena de 2 a 8 anos de prisão.
Na determinação concreta da pena, o Tribunal recorrido deve fixar a pena concretamente aplicada ao recorrente dentro da moldura penal legalmente fixada e nos termos do artigo 65.º do Código Penal.
Antes de mais, o recorrente, na situação de saber bem perfeitamente, detinha uma arma proibida, embora tomasse claro conhecimento da característica e natureza da faca em causa, trazia consigo tal arma para cometer roubo e andando a procurar objectos para serem roubados, foi neste momento interceptado por agentes policiais. Face a isto, é muito elevada a intensidade de dolo do recorrente quanto à culpa subjectiva na prática do acto criminal.
Em segundo lugar, para além de ser primário, o recorrente não beneficia de quaisquer outras circunstâncias atenuantes. Do acórdão recorrido resulta que o recorrente não confessou o facto ilícito, e muito menos no que respeita ao arrependimento em relação ao cometimento deste acto. Apesar de ter declarado profundo arrependimento em relação a não confissão de tal acto ilícito perante o Tribunal durante a audiência de julgamento, ainda não pode ser provada, todavia, a sua veracidade. Ademais, nos presentes autos não há nenhuns elementos probatórios relativos aos fins ou motivos de crime que o Tribunal vale a pena ponderar para os efeitos da diminuição da pena condenada, ao contrário, a detenção de arma proibida tem o objectivo de cometer roubo, pelo que este acto deve ser punido severamente.
Em terceiro lugar, o crime de detenção de arma proibida é um crime de perigo comum, cujo bem jurídico violado é a segurança pública, sendo crime grave pela sua natureza. É certo, não obstante, que não detinha pistola ou substância explosiva, o acto de detenção de faca em si já pode colocar em grave risco a segurança pública. Como se sabe, o chamado crime de perigo comum é um perigo “abstracto”, a lei não exige que é um perigo concreto, já causado ou que está em causa um determinado destinatário. O acto de detenção de arma proibida deve ser punido devido às suas graves consequências eventuais e à grande danosidade causada tanto ao público como ao indivíduo. Assim sendo, não podemos acompanhar o entendimento do recorrente de que não há nenhum ofendido e relativamente baixa a danosidade causada ao respectivo bem jurídico. No caso sub judice, apesar de o recorrente não ter começado a cometer o acto de roubo, se não fosse interceptado por agentes policiais no momento em que procurar os objectivos de serem roubados, levaria grave consequência que pode causar dano à vida ou segurança patrimonial do determinado destinatário.
Como é sabido que na situação real de Macau, o crime de detenção de arma proibida é crime mais popular, tendo grande danosidade para a segurança social e individual, pelo que deve ser combatido severamente.
Estamos convictos de que, tanto no aspecto da prevenção especial como no da prevenção geral, necessária é a aplicação da pena de prisão efectiva ao recorrente, sendo adequada a pena concreta de 2 anos e 9 meses e não havendo a violação da disposição legal em apreço.
É, pois, à luz das judiciosas considerações do Digno Procurador-Adjunto que há que naufragar patentemente o recurso.
III. DECISÃO
Nos termos acima expendidos, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo réu recorrente (A), com 2 UC de taxa de justiça (ou seja, MOP1.000,00) e MOP$700,00 de honorários ora fixados a favor do seu Ilustre Defensor Oficioso.
Notifique pessoalmente o recorrente (A) da fotocópia do presente acórdão através do Senhor Director do Estabelecimento Prisional de Macau (artigo 100 n.º 7 e artigo 101 n.º 1 do CPP).
Chan Kuong Seng (Relator) - José M. Dias Azedo - Lai Kin Hong