Processo n.º 5/2005. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Conselho de Administração da Autoridade Monetária de Macau.
Assunto: Norma Jurídica. Generalidade. Abstracção.
Data da Sessão: 4 de Maio de 2005.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Sam Hou Fai e Chu Kin.
SUMÁRIO:
A deliberação n.º 154/CA, de 11 de Março de 2004, do Conselho de Administração da Autoridade Monetária de Macau, que determinou que algumas regalias, de que beneficiam os directores e directores-adjuntos, são apenas atribuídas ao pessoal que efectivamente exerça funções de direcção e que, os trabalhadores que deixem de exercer efectivamente estas funções, embora mantendo aquelas categorias, deixam de beneficiar das ditas regalias, tem as características da generalidade e da abstracção, sendo um acto normativo.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
I – Relatório
A, directora-adjunta na Autoridade Monetária de Macau, requereu, perante o Tribunal de Segunda Instância, a declaração de ilegalidade de normas, com força obrigatória geral, contidas na deliberação n.º 154/CA, de 11 de Março de 2004, do Conselho de Administração da Autoridade Monetária de Macau (doravante designada por AMCM ou por entidade requerida), ao abrigo do disposto nos arts. 88.º e seguintes do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Na sua contestação, a entidade requerida, para além de se pronunciar sobre o mérito da causa (acerca da invocada ilegalidade das normas), veio suscitar questões que obstavam à apreciação do mérito, designadamente, que a deliberação impugnanda seria um acto de gestão interna relativo a matéria laboral, e não normas, pelo que não poderia ser objecto de pedido de declaração de ilegalidade de normas.
Ouvido seguidamente o Digno Magistrado do Ministério Público, pronunciou-se favoravelmente à tese da entidade recorrida, pugnando pela rejeição do pedido.
De seguida, e sem que a requerente tenha sido ouvida sobre a questão prévia suscitada pela entidade requerida, o Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 18 de Novembro de 2004, deu razão a esta entidade e rejeitou o pedido de declaração de ilegalidade de normas com fundamento em que a deliberação impugnada era um acto de gestão, não tendo a qualidade de norma, não podendo, portanto, ser pedida a declaração da sua ilegalidade.
Inconformada interpõe a requerente A, o presente recurso jurisdicional, para o Tribunal de Última Instância (TUI), terminando a respectiva alegação com a formulação das seguintes conclusões:
l.ª - O Acórdão recorrido rejeitou, por inidoneidade do meio processual, o pedido de declaração de ilegalidade da deliberação n.º 154/CA da AMCM, por entender que a deliberação impugnada não tinha a qualidade de norma, por ser antes um acto de gestão;
2.ª - A questão da inidoneidade do meio processual foi suscitada pela entidade requerida (ainda que imperfeitamente) e pelo magistrado do MP, no seu visto inicial;
3.ª - O Tribunal a quo não promoveu a audição do requerente sobre a questão aduzida e tinha o dever de a promover, de acordo com o n.º 1 do artigo 61.º do CPCA, dado que se tratava de questão suscitada pelas entidades referidas no n.º 1 do 59.º do mesmo diploma e de questão que obstava, como obstou, ao conhecimento do pedido;
4.ª - O princípio do contraditório, que se encontra consagrado no artigo 3.º do CPC, impõe que cada uma das partes num processo seja chamada a deduzir as suas razões de facto e de direito, a oferecer as suas provas, a controlar as provas do adversário e a discretear sobre o valor de umas e de outras;
5.ª - A norma do n.º 1 do artigo 61.º do CPAC é uma expressão privilegiada do princípio do contraditório;
6.ª - O Tribunal a quo, ao não ter procedido à audição da ora recorrente, violou de forma flagrante e patente a norma do n.º 1 do artigo 61.º do CPAC que, como manifestação concreta do princípio do contraditório, consagra a favor da requerente uma posição jurídico-processual favorável e que se traduz no direito de ser ouvida ou direito de responder às razões aduzidas pela entidade requerida e pelo MP relativas à questão suscitada;
7.ª - E tendo omitido, como omitiu, a notificação da requerente para responder à questão suscitada, incorreu o douto Tribunal a quo na nulidade do n.º 1 do artigo 147.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.º do CPAC, na medida em que a omissão verificada não pode ter deixado de influir negativamente na decisão tomada, pois que nada garante que a decisão não fosse outra, se a requerida tivesse sido oportunamente ouvida;
8.ª - Ao consagrar-se, no n.º 1 do artigo 61.º do CPAC, um direito subjectivo do recorrente, foi porque o legislador entendeu que a sua intervenção, naquele momento processual, se afigurava de importância decisiva, em termos de poder influir na decisão da causa, doutra forma, o legislador não teria consagrado expressamente aquele direito a favor do recorrente;
9.ª - Mesmo que assim se não entendesse, ainda assim o Acórdão recorrido não poderia deixar de ser censurado por ter rejeitado o pedido de declaração de ilegalidade, numa situação em que o não poderia rejeitar;
10.ª - A deliberação impugnada, contrariamente ao entendido pelo Tribunal recorrido, constitui um comando geral e abstracto;
11.ª - Ao Tribunal a quo não bastava dizer que a deliberação não tem a qualidade de norma, e que não tem as características da generalidade e da abstracção, seria necessário dizer porque é que se não verificam estas características, porque é que não é um acto geral e abstracto ou porque é um comando individual e concreto, ou individual e abstracto, ou ainda geral e concreto, pois que, não se verificando as características da generalidade e abstracção, algumas destas características e combinações teriam de se verificar sempre;
12.ª - Os critérios habitualmente usados na doutrina e na jurisprudência para distinguir acto administrativo de regulamento são o critério da generalidade e da abstracção, o critério mais facilmente operativo nos casos mais simples e nítidos, e, nos casos em que a distinção é menos nítida, entre outros, os critérios suplementares da permanência ou da instantaneidade da execução e da operacionalidade do comando administrativo sobre a esfera jurídica dos destinatários;
13.ª - A generalidade relaciona-se com as pessoas e a um acto jurídico é geral quando - com referência ao momento da sua entrada em vigor - tem por destinatários um número indeterminado e indeterminável de pessoas; o acto genérico dirige-se a um círculo de pessoas não individualizadas ou singularizadas a priori, não circunscritas por notas ou características de particularidade; os destinatários são, pois, determinados por classes ou categorias, mas classes ou categorias abertas, não fechadas ou já fixadas quanto às pessoas que as integram;
14.ª - A abstracção relaciona-se com «as situações de facto», os «casos» e um acto é abstracto quando é susceptível de se aplicar a uma ou mais situações definidas pelos elementos típicos constantes da previsão normativa, quando prevê ou hipotisa de forma categorial e aberta uma situação de facto, aplicando-se, portanto, a todas as situações de facto da vida real que se verifiquem durante o âmbito da sua vigência, ou, noutras palavras, quando a situação regulada é descrita através de características típicas por forma a reproduzir-se recorrentemente na realidade, podendo ocorrer, por isso, em número indeterminável de vezes;
15.ª - O carácter geral contrapõe-se o individual; o carácter abstracto ao concreto;
16.ª - Um comando é individual quando o seu enunciado identifica, de imediato e eo nomine, o seu ou seus destinatários;
17.ª - Um enunciado é concreto quando a situação nele regulada é uma, e uma só; quando a situação da vida é identificada como única e irrepetível ou, por outras palavras, quando a situação de facto é delimitada espacio-temporalmente na sua individualidade;
18.ª - A deliberação não pode deixar de ser caracterizada como sendo um acto geral e abstracto;
19.ª - É um acto geral, exactamente porque tem por destinatários um número indeterminado e indeterminável de pessoas, e isto na medida em que os seus destinatários, rectius as pessoas que podem ser afectadas na sua esfera jurídica por este comando, são definidas enquanto elementos de um conjunto ou grupo de pessoas, através de características objectivas e comuns, de tal modo que a identidade individual de cada um dos seus elementos resulta indeterminada no momento da emanação da norma, sendo necessário um qualquer acto que proceda a essa identificação;
20.ª - Os enunciados «pessoal que exerça funções de direcção, nomeadamente Directores e Directores-Adjuntos, e enquanto exerçam efectivamente essas funções» e «aqueles que, não sendo contratados a prazo e ainda que Directores ou Directores-Adjuntos, sejam afastados daquelas funções de direcção» definem de forma aberta as pessoas a que se dirigem, isto é: os seus destinatários são todos aqueles que exerçam funções de direcção, nomeadamente Directores e Directores-Adjuntos e enquanto exerçam efectivamente essas funções e aqueles que, não sendo contratados a prazo, e ainda que sejam Directores ou Directores-Adjuntos, forem afastados das funções de direcção;
21.ª - A instrução que é dada no ponto 5 da deliberação ao Serviço de Pessoal do Departamento Financeiro e de Recursos Humanos bem como ao Serviço Administrativo para mandarem cumprir a presente deliberação, em relação aos Srs. Drs. B e A é um comprovativo claro de que a deliberação é um acto genérico;
22.ª - A deliberação impugnada é ainda um acto abstracto, na medida em que a situação que veio regular, os efeitos decorrentes do afastamento de cargos de direcção, é uma situação que se verificará todas as vezes quando, quem exerce funções de direcção as deixar de exercer por virtude da não renovação da designação para o exercício dessas funções;
23.ª - A situação configurada é uma situação de facto susceptível de se verificar recorrentemente na realidade, que pode ocorrer em número indeterminável de vezes; é uma situação que não está identificada na deliberação como única e irrepetível, não está delimitada temporalmente na sua individualidade, antes, pelo contrário, a estatuição abarca todas as situações da mesma espécie que vierem a ocorrer no âmbito da vigência daquela deliberação;
24.ª - Também o critério suplementar da permanência da execução confirmar a natureza normativa da deliberação impugnada, uma vez que ela não se esgota na primeira aplicação, mas antes tem a pretensão de se aplicar, reiteradamente, a todas as vezes que a situação abstractamente prevista se verifica em concreto;
25.ª - Também a referência que é feita na deliberação ao artigo 3.º do EPP é de molde a confirmar a natureza normativa daquela deliberação, ali se consagra que «Dentro dos limites do presente Estatuto, compete ao Conselho de Administração o poder de o regulamentar, fixando os termos em que deve ser prestado o trabalho, estabelecendo o regime de férias e de licença especial, definindo os benefícios de carácter social e elaborando quaisquer normas de disciplina de execução ou de carácter organizacional»;
26.ª - O Acórdão invoca como obstáculo àquela qualificação a al. c) do n.º 3 do artigo 17.º do Estatuto da AMCM, que atribui ao CA a competência para «Contratar e gerir os recursos humanos em conformidade com as necessidades da AMCM, os orçamentos privativos aprovados e o estatuto privativo do pessoal, exercendo, nomeadamente, o poder disciplinar», para concluir que «sendo um acto de gestão, não pode a sua deliberação obter a qualidade de norma ou conter norma, de natureza genérica e abstracta, não pode, portanto, ser a deliberação objecto de "impugnação de normas", por não satisfazer os pressupostos previstos no artigo 88.º do CPAC»;
27.ª - Este é um argumento insustentável, dado assentar numa inversão metodológica de partir daquela norma (e porque não outra qualquer?), que refere a competência relativa à gestão dos recurso humanos, para concluir que aquela deliberação não pode ser um acto normativo, porque é um acto de gestão;
28.ª - Pelo contrário, deve partir-se das manifestações autoritárias e ver se estão ou não em conformidade com a ordem jurídica, para, caso o não estejam, utilizar o meio adequado para reagir contra eles, invocando a desconformidade identificada;
29.ª - Importante seria aferir, de acordo com os critérios doutrinais (e legais), se a deliberação, do ponto de vista substancial, é um acto administrativo ou regulamento;
30.ª - Não há obstáculo a que a gestão de recursos humanos se possa fazer através de actos normativos;
31.ª - O CA está vinculado ao Estatuto Privativo do Pessoal, que é também um diploma normativo, e o artigo 3.º deste diploma confere inequivocamente ao CA poderes regulamentares em matéria, entre outras, de definição de benefícios de carácter social;
32.ª - A al. l) do n.º 3 do artigo 17.º do Estatuto da AMCM consagra uma cláusula geral atributiva de competência ao CA, que lhe permite praticar todos os demais actos (inclusive actos normativos) necessários ao bom funcionamento da AMCM e à realização das suas atribuições;
33.ª - Os conceitos de acto administrativo e de regulamento não são o resultado da exigência da lógica formal, mas antes conceitos finalísticos voltados também para as exigências de protecção jurisdicional dos particulares em face da Administração;
34.ª - No passado, em virtude das amplas restrições à impugnação de normas jurídicas, a tendência foi para a doutrina ampliar o conceito de acto administrativo e restringir o conceito de regulamento, uma vez que, contrariamente ao que se passava com o contencioso dos regulamentos, eram amplas as possibilidades de utilização do recurso de anulação de actos; hoje, e em virtude das melhorias significativas do regime da impugnação de regulamentos, a tendência é para afirmar um conceito restrito de acto administrativo e para admitir um conceito mais amplo de regulamento;
35.ª - O Código do Procedimento Administrativo, artigo 110.°, foi ao ponto de consagrar expressamente um conceito de acto administrativo, também para efeitos do contencioso administrativo, em que não prescinde do carácter individual e concreto: "decisão de um órgão administrativo que ao abrigo de normas de direito público visa a produção de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta";
36.ª - A deliberação impugnada é um verdadeiro acto normativo;
37.ª - O Acórdão recorrido, ao rejeitar o pedido de declaração de ilegalidade desse acto com fundamento de que a deliberação não era um acto normativo, violou as normas do n.º 1 do artigo 88.° e do n.º 1 do artigo 90.°, na medida em que o pedido de declaração de ilegalidade da deliberação era o meio processualmente adequado e próprio à pretensão formulada pela requerente.
A entidade requerida pronuncia-se pelo improvimento do recurso.
No seu despacho inicial, o relator do processo neste Tribunal de Última Instância ponderou afigurar-se-lhe que o pedido deduzido na alínea a) no final das alegações de recurso e a que se referem as conclusões 1.ª a 8.ª (anulação do processado no TSI por preterição de formalidade legal) não pode ser deduzido em recurso, mas devê-lo-ia ter sido antes em incidente de arguição de nulidade, perante o tribunal que terá praticado a invocada nulidade (o TSI), no prazo de 10 dias a contar da notificação do Acórdão recorrido, nos termos dos arts. 147.º, 151.º e 152.º do Código de Processo Civil.
Ouvida sobre a questão, veio a recorrente a concordar com a questão suscitada pelo relator.
O relator proferiu despacho, transitado em julgado, não admitindo o recurso no que concerne à referida pretensão de anulação do processado.
A Exm.ª Procuradora-Adjunta emitiu o seguinte parecer:
“No presente recurso foi suscitada a única questão que é de saber se a impugnação de normas é o meio adequado e próprio para questionar a deliberação n.º 154/CA tomada pelo Conselho de Administração da Autoridade Monetária de Macau (AMCM).
Ao douto Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância imputa a recorrente erro de direito por errada interpretação do n.º 1 do art.º 88.º e do n.º 1 do art.º 90.º do CPAC.
A primeira norma prevê a finalidade da impugnação de normas que é "a declaração de ilegalidade, com força obrigatória geral, de normas contida em regulamento administrativo", enquanto a segunda dispõe que "a declaração de ilegalidade pode ser pedida quando a norma tenha sido julgada ilegal por qualquer tribunal em três casos concretos ou quando os seus efeitos se produzam imediatamente, independentemente de um acto administrativo ou jurisdicional de aplicação".
Na óptica da ora recorrente, tendo a natureza normativa/regulamentar, a deliberação em causa pode ser impugnada por meio de declaração de ilegalidade de normas.
Não nos parece que tem razão. Vejamos.
Como se sabe, o regulamento administrativo, tal como outras normas jurídicas, caracteriza-se pela sua generalidade e abstracção.
A generalidade da doutrina administrativa define o regulamento "como sendo uma 《norma jurídica emanada por uma autoridade administrativa no desempenho do poder administrativo》. Nesta noção constata-se, em primeiro lugar, que o regulamento é uma regra de conduta social que se caracteriza pela generalidade e abstracção: entende-se por generalidade a susceptibilidade de aplicação do dispositivo a um número indeterminado e indeterminável de pessoas não singularizadas a priori; e por abstracção a susceptibilidade de aplicação da situação típica prevista a um número indeterminado e indeterminável de casos".
Daí que a distinção entre regulamento e acto administrativo é feita com base também no critério da generalidade e da abstracção, sendo o regulamento uma regra geral e abstracta e o acto administrativo uma decisão individual e concreta. (cfr. Lino Ribeiro e Cândido Pinho, Código do Procedimento Administrativo de Macau, Anotado e Comentado, pág. 526, 530 e 531)
Também conforme Jorge Manuel Coutinho de Abreu, a generalidade relaciona-se com as pessoas, no sentido de "ter por destinatários um número indeterminado e indeterminável de pessoas".
E a abstracção refere-se às situações de facto, no sentido de "ser aplicável a um número indeterminado e indeterminável de casos". (cfr. Sobre os Regulamentos Administrativos e o Princípio da Legalidade, pág. 23 e 24)
Da análise do teor da Deliberação ora posta em causa e os elementos constantes dos autos, constata-se que aquela deliberação foi tomada em consequência da não renovação da nomeação de dois trabalhadores, Sr. Dr. B e a ora recorrente, no cargo de Director e no cargo de Directora-Adjunta, respectivamente, facto pelo qual os mesmos deixam de desempenhar qualquer cargo de direcção na AMCM, com perda das regalias inerentes ao seu efectivo exercício.
Tendo como assunto "Afastamento dos Cargos de Director ou de Director-Adjunto" e para responder às dúvidas levantadas pelos respectivos serviços sobre se algumas das regalias atribuídas aos detentores de cargos de direcção, também referidas na deliberação, podem ser consideradas como retribuição mensal efectiva, a referida deliberação faz a sua interpretação sobre n° 8 do art° 15º do Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM na parte respeitante à perda das regalias inerentes ao cargo exercido, esclarecendo, para além dos outros pontos, que aquelas regalias "são apenas atribuídas ao pessoal que efectivamente exerça funções de direcção, nomeadamente a Directores e Directores-Adjuntos, e enquanto eles exercerem efectivamente essas funções", acabando por "instruir o Serviço de Pessoal do Departamento Financeiro e de Recursos Humanos bem como o Serviço Administrativo de mandarem cumprir a presente deliberação", em relação aos dois trabalhadores afectados.
Daí que a deliberação em causa foi tomada em consequência das dúvidas suscitadas em dois casos concretas, tendo por destinatários os referidos dois interessados afastados do cargo de direcção da AMCM.
Salvo o devido respeito, parece-nos que a deliberação padece da generalidade e abstracção para ser considerada como regulamento jurídico, norma jurídica ou acto normativo, sendo certo que a sua aplicação a casos futuros carece de outros actos, individuais e concretos.
Por outro lado, resulta da própria deliberação que esta se limita a clarificar e esclarecer as regalias de carácter social inerentes aos cargos de director e director-adjunto, nomeadamente aquelas que os trabalhadores devem deixar de beneficiar no caso de serem afastados de tais cargos.
Trata-se de um acto de gestão corrente, respeitante à relação jurídico-laboral entre a entidade recorrida e os seus trabalhadores, praticado pelo Conselho de Administração da AMCM no exercício das suas competências.
Nas suas contra-alegações, a entidade recorrida cita as várias disposições legais sobre a relação laboral entre si e a recorrente bem como sobre as competências do Conselho de Administração da AMCM, salientando a sujeição da ora recorrente "ao estatuto privativo do pessoal e a lei reguladora das relações de trabalho no território de Macau" (n° 1 do art° 33º do Estatuto da Autoridade Monetária de Macau) e mostrando que foi no exercício das suas competências (de conceder benefícios sociais e de definir os benefícios de carácter social) que o Conselho de Administração tomou a deliberação em causa.
Na concordância com as considerações aí expendidas, parece-nos que aquela deliberação não pode ser objecto de "impugnação de normas".
Pelo exposto, entendemos que o recurso interposto não merece provimento”.
II – Os factos
Estão provados os seguintes factos:
A) A deliberação n.º 29/CA, de 31 de Julho de 1990, do Conselho de Administração da AMCM, é do seguinte teor:
"Deliberação n.º 29/CA
Assunto: Recursos Humanos - Gestão de Quadros
O Conselho de Administração analisou a política de gestão de quadros, nomeadamente quanto à imprescindível necessidade de se garantirem as condições mínimas que permitam a estabilização do pessoal de direcção, no contexto de um mercado local que se revela cada vez mais competitivo.
E, considerando a premência da questão em análise e a inoportunidade de, no momento, se proceder a reabertura do processo de actualização da tabela salarial em vigor, deliberou o seguinte:
1. Atribuir aos Directores e Directores-Adjuntos o direito ao pagamento, por parte da AMCM, das despesas com água, electricidade e telefone, na habitação que lhe tiver sido distribuído, até aos seguintes máximos anuais:
Água - MOP1.200,00
Electricidade - MOP12.000,00
Telefone - MOP12.000,00
2. Submeter o teor da presente deliberação à superior consideração de Sua Excelência o Governador de Macau, para eventual homologação tutelar .";
B) Os valores mencionados na deliberação anterior foram aumentados por deliberação de 23 de Julho de 1994, do mesmo órgão;
C) Por deliberação de 16 de Março de 1996, a requerente A, foi nomeada definitivamente na categoria de directora-adjunta da AMCM;
D) A deliberação n.º 794/CA, de 5 de Dezembro de 2003, do Conselho de Administração da AMCM, rectificada pela deliberação n.º 32/CA, é do seguinte teor:
"Deliberação n.º 794/CA
Assunto: Situação Jurídico-Laboral da Dra. A.
Considerando que o Conselho de Administração, mediante a deliberação n.º 671/CA, adoptada na sua sessão de 16 de Outubro passado, decidiu não renovar a nomeação da Dra. A, no cargo de Directora-Adjunta, afecta ao Núcleo de Bonificação e Reserva;
Considerando que o Conselho de Administração, mediante a deliberação n.º 715/CA, de 7 do mês findo, extinguiu o Núcleo de Bonificação e Reserva;
Considerando que o n.º 8 do artigo 15º do Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM exige que a Dra. A, regresse ao grupo, funções, categoria e nível de origem; - Considerando que, pela deliberação n.º 082/CA, de 12 de Março de 1996, o Conselho de Administração deliberou "... promover a técnica-coordenadora, Sra. Dra. A, a Directora-Adjunta, nível 10 de entrada";
O Conselho de Administração delibera o seguinte:
1. Regresso da Sra. Dra. A, ao seu Grupo, categoria e nível de origem, ou seja, ao Grupo IV, como Directora-Adjunta do nível 11, com efeitos a partir de 19.12.2003;
2. Não designar a Sra. Dra. A, de momento, para o desempenho de qualquer cargo de direcção, com perda das regalias inerentes ao seu exercício, designadamente do subsídio de função;
3. Cometer à Sra. Dra. A, funções de coadjuvação no âmbito da gestão financeira e patrimonial da AMCM do Departamento Financeiro e de Recursos Humanos, reportando-se directamente à respectiva Sra. Directora;
4. Dar conhecimento da presente deliberação ao Senhor Secretário para a Economia e Finanças.";
E) A deliberação n.º 154/CA, de 11 de Março de 2004, do Conselho de Administração da AMCM, cuja declaração de ilegalidade foi pedida ao TSI, é do seguinte teor:
"Deliberação n.º 154/CA
Assunto: Afastamento dos cargos de director ou de director-adjunto.
Atendendo a que o artigo 15.º no. 8 alínea b) do Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM, estabelece que os trabalhadores não contratados a prazo que forem afastados de cargos de direcção e chefia perdem as "regalias inerentes ao cargo exercido não ressalvadas na alínea a)" do mesmo número, sendo salvaguardados o tempo de serviço e a retribuição mensal efectiva;
Considerando que as regalias atribuídas aos detentores de cargos de direcção são as seguintes:
- O consumo de energia, água e telefone, com os limites estabelecidos na Deliberação n° 220/CA, de 1994, exceptuadas as que decorram expressamente do contrato de trabalho;
- Parque automóvel, de acordo com a Deliberação no. 647/CA, de 2002;
- Uso de cartão de crédito facultado pela instituição, de acordo com a Ordem de Serviço no. 46/CA/2002;
- Inscrição na "International Airline Passengers Association";
- Utilização de gabinete individual de trabalho;
- Utilização de telemóvel com chamadas pagas; e
- Atribuição de dois jornais diários, de acordo com a deliberação n.º. 100/CA/97.
De acordo com o proposto no memorando no. 4/2004/CA-RR, de 18.02.04, e o esclarecimento constante do parecer no. 046/2004/GAJ, de 02.03.04, do Gabinete Jurídico, sobre se algumas daquelas regalias podem ser consideradas como sua retribuição mensal efectiva, o Conselho de Administração delibera:
1. Ao abrigo do artigo 3.º do EPP, esclarecer que as regalias supramencionadas são apenas atribuídas ao pessoal que efectivamente exerça funções de Direcção, nomeadamente a Directores e Directores-Adjuntos, e enquanto eles exercerem efectivamente essas funções;
2. Os trabalhadores não contratados a prazo que forem afastados daquelas funções deixam de beneficiar das respectivas regalias, nos termos da alínea b) do no. 8 do artigo 15º do EPP;
3. Exceptuam-se do disposto no número anterior aquelas regalias que forem expressamente previstas no respectivo contrato de trabalho;
4. A perda das regalias reporta-se à data em que as funções deixarem de ser desempenhadas, podendo-se admitir, em relação ao cartão de crédito e à filiação na IAPA, que se mantenha o gozo das respectivas regalias durante a validade do contrato celebrado com essas entidades;
5. Instruir o Serviço de Pessoal do Departamento Financeiro e de Recursos Humanos bem como o Serviço Administrativo de mandarem cumprir a presente deliberação, em relação aos Srs. Drs. B e A."
Esta é a deliberação impugnada.
III – O Direito
1. Delimitação do objecto do recurso
A entidade requerida, no pedido de declaração de ilegalidade de normas, com força obrigatória geral, suscitou questões que obstam ao conhecimento de mérito.
Por um lado, entendeu que a questão dos autos é de direito laboral privado, uma vez que os trabalhadores da AMCM, como é o caso da requerente, estão sujeitos – de acordo com norma expressa - à lei reguladora das relações de trabalho em Macau, sendo que também está estabelecido que os tribunais competentes para apreciar a impugnação das decisões disciplinares dos órgãos da AMCM são os competentes para julgar os conflitos de trabalho. Simplesmente, a entidade requerida não tirou todas as consequências jurídicas que caberiam à dita alegação, ou seja, não arguiu a incompetência do TSI para apreciar a causa. Donde não viria grande mal, por se tratar de questão de conhecimento oficioso do tribunal.
Por outro lado, a entidade requerida considerou que a deliberação impugnada não continha normas, por lhe faltar o carácter geral e abstracto, sendo um acto de gestão corrente.
O acórdão recorrido rejeitou o pedido com base neste segundo fundamento. Quanto ao primeiro fundamento, não se pronunciou expressamente sobre a questão de saber se o litígio era laboral, nem se os trabalhadores da AMCM estão sujeitos ao regime geral das relações de trabalho. Mas a final, o acórdão recorrido contem o seguinte segmento: “Ainda por cima, entende-se que tais actos 1 praticados no exercício da função de administração, o conhecimento da consequência por eles gerada contém-se dentro dos limites da jurisdição administrativa”.
Considera-se que com a transcrita pronúncia, o tribunal a quo se considerou competente para conhecer do litígio. Na verdade, foi proposta uma acção do contencioso administrativo no TSI. Este considerou que o acto impugnado foi praticado no exercício da função administrativa, pelo que, em consequência, cabia o seu conhecimento à jurisdição administrativa. Esta decisão não pode deixar de se entender como considerando o tribunal competente para apreciar a questão.
Tal pronúncia fez caso julgado, que impede que, agora, ainda que, eventualmente, discordando, possamos decidir em sentido contrário. Na verdade, a excepção de incompetência é de conhecimento oficioso e poderíamos suscitar a questão, nos termos do art. 3.º do Código de Processo Administrativo Contencioso e do n.º 1 do art. 31.º do Código de Processo Civil, se não tivesse sido, como foi, expressamente decidida, sem que a entidade requerida – vencedora da causa – tenha requerido ao tribunal ad quem para conhecer de tal fundamento, nos termos do n.º 1 do art. 590.º do Código de Processo Civil.
E, estabelecida a competência do TSI para conhecer da questão, a competência do TUI para o recurso jurisdicional resulta do disposto nos arts. 44.º, n.º 2, alínea 4) da Lei de Bases da Organização Judiciária e 148.º e 150.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Administrativo Contencioso, em virtude de o acórdão recorrido ser uma decisão proferida em primeiro grau de jurisdição.
De outra banda, está decidido já, como se disse no relatório, que não se irá conhecer da questão atinente à anulação do processado, por preterição de formalidade legal.
Em suma, este Tribunal apenas irá apreciar a questão de saber se a deliberação n.º 154/CA, de 11 de Março de 2004, do Conselho de Administração da AMCM constitui um acto normativo, isto é, se contém normas jurídicas, ou se se trata de mero acto individual ou concreto.
2. A fundamentação do Acórdão recorrido
A fundamentação do Acórdão recorrido para justificar que a deliberação impugnada não é um acto normativo, é algo confusa.
Na verdade, começa por dizer que uma norma se caracteriza pela generalidade e pela abstracção, definindo estas em termos que colhem o assentimento da ora recorrente. Seguidamente, considera que a mesma deliberação constitui um acto de gestão do Conselho de Administração da AMM, por lhe competir gerir os recursos humanos em conformidade com as necessidades da instituição. Mas, sem que tenha tentado demonstrar que a deliberação não tem natureza genérica e abstracta, nos termos que antes definiu, concluiu que “... sendo um acto de gestão, não pode a sua deliberação obter a qualidade de norma ou conter norma, de natureza genérica e abstracta, não pode, portanto, ser a deliberação objecto de impugnação de normas...”.
Vamos, pois, examinar:
- Se um acto normativo tem de ter as características da generalidade e da abstracção;
- Se a deliberação impugnada constitui um acto de gestão;
- Se os actos de gestão não podem ter a qualidade de normas.
3. A norma jurídica. A generalidade e a abstracção
Relativamente à característica da generalidade pode dizer-se que há unanimidade doutrinal quanto à sua definição e que a mesma é um atributo indispensável da norma jurídica.
O geral contrapõe-se ao individual. A generalidade, como característica da norma jurídica, consiste em a norma não se dirigir a destinatários determinados, mas a uma generalidade mais um menos ampla de pessoas. O preceito poderá ter, ainda, a característica da generalidade, mesmo que se refira a uma só entidade, como quando se refere aos poderes do Presidente da República ou do Chefe do Executivo. Neste caso, o comando será genérico se se referir à generalidade das pessoas que ocuparem o cargo e não visar, em concreto, apenas, as pessoas individualmente determinadas que são os titulares do cargo.2
Já quanto à abstracção, as coisas não são pacíficas. Quanto à sua caracterização há, fundamentalmente, duas concepções.
Se todos concordam que o abstracto se contrapõe ao concreto, para uns “[D]iz-se abstracto o preceito que disciplina ou regula um número indeterminado de casos, uma categoria mais ou menos ampla de situações, e não casos, situações ou hipóteses determinadas, concreta ou particularmente visadas. Note-se que isto não significa que se não possa tratar de situações já concretizadas ou realizadas”. 3
Para outros, “[Q]uando se fala da abstracção como característica da regra jurídica quer-se normalmente dizer que os factos e as situações previstas pela regra não hão-de estar já verificados; são factos ou situações que de futuro se prevê que surjam”.4
Simplesmente, os que defendem esta última concepção entendem que a abstracção não é característica da norma jurídica. Que esta se basta com a característica da generalidade.
4. Generalidade e abstracção. O caso dos autos
No nosso caso, a deliberação impugnada é genérica e abstracta, mesmo na acepção mais exigente, que impõe que o comando se aplique a acontecimentos eventuais e futuros.
Efectivamente, a Deliberação n.º 154/CA veio, em síntese, determinar que determinadas regalias (fringe benefits) são apenas atribuídas ao pessoal que efectivamente exerça funções de direcção e que os trabalhadores que deixem de exercer estas funções deixam de beneficiar das ditas regalias.
Ora, o comando aplica-se, manifestamente, não só aos trabalhadores que tenham já deixado de exercer efectivamente as funções de direcção, mas também, no futuro, àqueles que deixem de exercer tais funções.
A deliberação é genérica porque se dirige a uma categoria geral de destinatários (os trabalhadores que deixem de exercer efectivamente as funções de direcção), sem nenhuma discriminação quanto a estes.
E trata-se de preceitos abstractos – mesmo na concepção mais exigente - porque regulam um número indeterminado de casos, uns já concretizados, outros ainda não realizados.
E o facto de a aplicação futura do acto normativo impugnado poder necessitar de actos administrativos de concretização – o que não é certo – não o descaracteriza como regulamento, já que a própria lei (n.º 1 do art. 90.º do Código de Processo Administrativo Contencioso) distingue as normas cujos efeitos se produzem imediatamente, das normas cujos efeitos necessitam de actos administrativos de aplicação. Aliás, a regra até é a de os regulamentos necessitarem de actos administrativos de aplicação e não o contrário.
5. Acto de gestão
Considerou o Acórdão recorrido que deliberação impugnada constitui um acto de gestão do Conselho de Administração da AMM, por lhe competir gerir os recursos humanos em conformidade com as necessidades da instituição, de acordo com o disposto no art. 17.º, n.º 3, alínea c) do Estatuto da AMM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 14/96/M, de 11 de Março, nos termos do qual compete ao Conselho de Administração gerir os recursos humanos em conformidade com as necessidades da AMCM, os orçamentos privativos aprovados e o estatuto privativo do pessoal.
Pode-se concordar que a deliberação impugnada tenha sido tomada ao abrigo da norma referida e que constitua, portanto, um acto de gestão de pessoal. Mas já não se entende em que é que exista oposição entre um acto de gestão e um acto normativo. Ou seja, não explicou o acórdão recorrido e não se vislumbra porque é que um acto de gestão não possa ter as características da generalidade e da abstracção.
O Acórdão recorrido ao decidir que a deliberação n.º 154/CA, de 11 de Março de 2004, do Conselho de Administração da AMM, não era um acto normativo porque não tinha as características da generalidade e abstracção e porque era um acto de gestão violou o disposto nos arts. 88.º, n.º 1 e 90.º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso.
III – Decisão
Face expendido, dá-se provimento ao recurso e revoga-se o Acórdão recorrido, devendo o tribunal a quo conhecer da questão de mérito, se nada obstar a tal.
Sem custas, em ambas as instâncias.
Macau, 4 de Maio de 2005
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) - Sam Hou Fai - Chu Kin
Fui presente:
Song Man Lei
1 Referia-se ao actos do Conselho de administração da AMM, como a deliberação impugnada.
2 Cfr. J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 1995, Almedina, Coimbra, 8.ª reimpressão, p. 92 e 93, J. OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito, Introdução e Teoria Geral, uma Perspectiva Luso-Brasileira, 1999, Almedina, Coimbra, 10.ª edição, p. 496 e seg., D. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, 2001, Almedina, Coimbra, Vol. II, p. 154 e 226 e A. MENEZES CORDEIRO, entrada “Norma Jurídica”, Polis, Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, Verbo, Lisboa/São Paulo, 1986, p. 671 e 672.
3 J. BAPTISTA MACHADO, obra citada, p. 92. No mesmo sentido, D. FREITAS DO AMARAL, obra e volume citados, p. 231.
4 J. OLIVEIRA ASCENSÃO, obra citada, p. 499. No mesmo sentido, A. MENEZES CORDEIRO, estudo citado, p. 672 e 673.
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Processo n.º 5/2005
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Processo n.º 5/2005