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Proc. nº 312/2011
(Recurso Cível e Laboral)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 29 de Setembro de 2011
Descritores: - Contrato de trabalho
- Salário
- Gorjetas
- Descanso semanal, anual, feriados obrigatórios
SUMÁRIO:
I- A composição do salário, através de uma parte fixa e outra variável, admitida pelo DL n. 101/84/M, de 25/08 (arts. 27º, n.2 e 29º) e pelo DL n. 24/89/M, de 3/04 (arts. 25º, n.2 e 27º, n.1) permite a integração das gorjetas na segunda.
II- Ao abrigo do DL 24/89/M (art. 17º, n.1,4 e 6, al. a), tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”); mas se nele prestar serviço terá direito ao dobro da retribuição (salário x2).
III- De acordo com o DL 101/84/M, os feriados obrigatórios do 1 de Janeiro, 1 de Maio e 1 de Outubro, são gozados sem perda de remuneração. Mas se o empregado trabalhar nesses dias, terá direito a remuneração complementar (+50%) se o serviço for indispensável para fazer face a acréscimo de trabalho não previsível (art. 21º, n. 2) e, nesse caso, a fórmula a utilizar será salário x1,5. Nos outros casos, deverá receber um dia de salário, porque a tanto o obriga o art. 28º (salário x1).
IV- Na vigência do DL 24/89/M, terá o trabalhador a auferir, durante os dias de descanso anual, o triplo da retribuição, mas apenas se tiver sido impedido de os gozar pela entidade patronal. À falta de prova do impedimento desse gozo de descanso, tal como sucedeu com o DL n. 101/84/M, que continha disposição igual (art. 24º, n2), também aqui, ao abrigo do art.21º, n.2 e 22º, n.2, deverá receber também um dia de salário (salário médio diário x1).
V- Se o trabalhador prestar serviço em feriados obrigatórios remunerados na vigência do DL 24/89/M, além do valor do salário recebido efectivamente pela prestação, terá direito a uma indemnização equivalente a mais dois de salário (salário médio diário x3).

































Proc. N. 312/2011

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I- Relatório

A, com os demais sinais dos autos, moveu contra a STDM acção de processo comum de trabalho pedindo a condenação desta no pagamento de uma indemnização (inicialmente, no valor de Mop$ 1.908.144,65 posteriormente, reduzida em função da desistência parcial do pedido), em razão dos descansos semanais, feriados obrigatórios e descansos anuais não gozados desde o início da relação laboral até ao seu termo.
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Tendo os autos prosseguido até ao seu termo – depois de uma primeira sentença que julgou improcedente a acção, posteriormente revogada - foi na altura própria proferida nova decisão, datada de 08/03/2011, uma vez mais improcedente, depois da “compensação” entre o direito que reconheceu ao autor de Mop$ 14.909,25 e o valor que a STDM lhe havia já pago.
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É desta sentença que, inconformado, a autora recorre, em cujas alegações apresentou as seguintes conclusões:
A. Com interesse para a caracterização da parte variável da remuneração como salário da A. ficaram provados os factos indicados nas alíneas c) a u) dos Factos Assentes e na resposta ao quesito 1.º da Base Instrutória.
B. A quase totalidade da remuneração da A. era paga pela Ré a título de rendimento variável (cfr. na alínea c) dos Factos Assentes), o qual integra o salário.
C. Ao contrário do que sucede noutros ordenamentos jurídicos, o legislador de Macau recortou o conceito técnico jurídico de salário nos artigos 7.º, b), 25.º, n.º 1 e 2 e 27.º, n.º 2 do RJRL.
D. É o salário tal como se encontra definido nos artigos 7.º, b), 25.º, n.º 1 e 2 e 27.º, n.º 2 do RJRL que serve de base ao cálculo de inúmeros direitos dos trabalhadores, designadamente do acréscimo salarial devido pelo trabalho prestado nos períodos de descanso obrigatório.
E. A interpretação destas normas não deverá conduzir a um resultado que derrogue, por completo, a sua finalidade, a qual consiste em fixar, de forma imperativa, a base de cálculo dos direitos dos trabalhadores.
F. A doutrina invocada na douta sentença recorrida não serve de referência no caso “sub judice” por ter subjacente diplomas (inexistentes em Macau) que estabelecem o salário mínimo, e definem as regras de distribuição pelos empregados das salas de jogos tradicionais dos casinos das gorjetas recebidas dos clientes.
G. Em Portugal quem paga as gorjetas aos trabalhadores dos casinos que a elas têm direito não é a própria Concessionária, que nunca tem a disponibilidade do valor percebido a título de gorjetas, mas as Comissões de distribuição das gratificações (CDG), as quais, sendo distintas e autónomas da empresa concessionária são moldadas como entidades equiparáveis a pessoas colectivas, sujeitas a registo, com sede em cada um dos casinos.1
H. Ao contrário, em Macau, quem paga aos trabalhadores a quota-parte a que eles têm direito sobre o valor das gorjetas é a própria concessionária que o faz seu, e não a comissão responsável pela sua recolha e contabilização.
I. O primitivo carácter de liberalidade das gorjetas diluiu-se no momento e na medida em que as gorjetas dadas pelos clientes não revertiam directamente para os trabalhadores mas, ao invés, eram reunidas, contabilizadas e distribuídas pela Ré, segundo um critério por ela fixado (distribuição essa, sublinhe-se, que, como ficou provado, era feita por todos os trabalhadores da Ré e não apenas por aqueles que contactavam com os clientes - alíneas c) a u) dos Factos Assentes e na resposta ao quesito 1.º da Base Instrutória.
J. No caso dos autos, as gorjetas que se discutem não pertencem aos trabalhadores a quem são entregues pelos clientes dos casinos (nas alíneas c) a u) dos Factos Assentes e na resposta ao quesito 1.º da Base Instrutória).
K. Estas gorjetas pertencem à Ré que com elas faz o que entende, nomeadamente o especificado alíneas c) a u) dos Factos Assentes e na resposta ao quesito 1.º da Base Instrutória.
L. A Ré tinha o dever jurídico de pagar à A. quer a parte fixa, quer a parte variável da remuneração do trabalho (alíneas c) a u) dos Factos Assentes e na resposta ao quesito 1.º da Base Instrutória).
M. O pagamento da parte variável da retribuição da A. - que corresponde à quase totalidade da contrapartida do seu trabalho - traduziu-se numa prestação regular, periódica, não arbitrária e que sempre concorreu durante todo o período da relação laboral para o orçamento pessoal e familiar do trabalhador.
N. Tais gratificações sendo de montante superior à remuneração-base são tidas como parte integrante da retribuição, dada a sua regularidade e o seu carácter de permanência, independentemente de quem as atribua.2
O. Assim, nos termos do disposto nos artigos 7.º, n.º 1, b) e 25.º, n.º 1 e 2 e 28.º, n.º 1, todos do RJRL, a parte variável da retribuição da A. deverá considerar-se como salário para efeitos do cômputo da indemnização pelo trabalho prestado nos períodos de dispensa e descanso obrigatório.
P. As gorjetas dos trabalhadores dos Casinos e, em especial as auferidas pela A. durante todo o período da sua relação laboral com a Ré, em ultima ratio devem ser vistas como «rendimentos do trabalho», porquanto devidos em função, por causa e por ocasião da prestação de trabalho, ainda que não necessariamente como correspectivo dessa mesma prestação de trabalho, mas que o passam a ser a partir do momento em que pela prática habitual, montantes e forma de distribuição, com eles o trabalhador passa a contar, sendo que sem essa componente o trabalhador não se sujeitaria a trabalhar com um salário que, na sua base, é um salário insuficiente para prover às necessidades básicas resultantes do próprio trabalho.
Q. Acaso se entenda que o salário da A. não era composto por duas partes: uma fixa e uma variável, então o mesmo será manifestamente injusto - porque intoleravelmente reduzido ou diminuto - e, em caso algum, preenche ou respeita os condicionalismos mínimos fixados no Regime Jurídico das Relações Laborais da RAEM, designadamente nos artigos 7.º, b), 25.º, n.º 1 e 2 e 27.º, n.º 2 desse diploma.
R. De tudo quanto se expôs resulta que, a douta Sentença do Tribunal de Primeira Instância, na parte em que não aceita que a quantia variável auferida pela A. durante toda a relação de trabalho com a Ré seja considerada como sendo parte variável do salário da A., terá feito uma interpretação incorrecta do disposto nos artigos 7.º, n.º 1, b) e 25.º, n.º 1 e 2 e 28.º, n.º 1, todos do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril.
S. Os trabalhadores dos casinos não são remunerados em função do resultado ou do período de trabalho, nem são eles que fixam o seu período e horário de trabalho, sendo-lhes vedado trabalhar quando e quanto lhes convém, conforme resulta também das alíneas ac) e ad) dos Factos Assentes.
T. O salário diário destina-se a remunerar os trabalhadores nas situações em que não é fácil, nem viável, prever, com rigor, o termo do trabalho a realizar, como sucede, e.g., nas actividades sazonais, irregulares, ocasionais e/ou excepcionais, bem como na execução de trabalho determinado, precisamente definido e não duradouro, ou na execução de uma obra, projecto ou outra actividade definida e temporária.
U. O salário diário é, pois, próprio dos contratos de trabalho onde a prestação do trabalho não assume carácter duradouro, o que não sucede com o desempenho da actividade de trabalhador de casino, que consiste num trabalho continuado e duradouro, a que, automaticamente, corresponde o estatuto de trabalhador permanente no termo do primeiro ano de trabalho consecutivo.
V. O entendimento de que a remuneração da A. em particular, consiste num salário diário, não ficou provado por se tratar de matéria de direito, nem se coaduna com o tipo de funções do Autor, nem com as condições de trabalho, nem com estatuto de trabalhador permanente definido no artigo 2.º, f) do RJRL), o qual pressupõe o exercício de uma determinada função dentro da empresa, de forma continuada e duradoura no tempo.
W. Nesta parte, a douta sentença deve ser alterada com as legais consequências, designadamente no que respeita à configuração e base de cálculo do salário e ao cômputo da indemnização pelo trabalho prestados nos períodos de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios.
X. Por conseguinte, a decisão relativa ao montante da compensação por descanso semanal ao período de 1/1/1996 a 26/7/2002, deverá ser revogada por interpretação incorrecta do disposto nos art.os 7.º, n.º 1, al. b); 17.º, n.º 6, a), 25.º, n.º 2; e 27.º, n.º 2, todos do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, fixando-se esse valor em MOP292,494.72, por aplicação da fórmula (salário médio diário X2).
Y. O montante da compensação por descanso anual relativo ao período de 1/1/1996 a 26/7/2002, deverá, pois, ser fixado em MOP$50,364.23.
Z. A decisão relativa à fórmula (salário médio diário X 2) de cálculo do montante da compensação por feriados obrigatórios remunerados ao período de 1/1/1996 a 26/7/2002, deverá ser revogada por violação do disposto no art.º 20.º, n.º 1 do RJRL, fixando-se esse valor em MOP$51,865.64, por aplicação da fórmula (salário médio diário X 3).
AA. A decisão relativa ao montante da compensação por licença de parto no 1993 deverá ser revogada por violação do disposto quanto ao salário nos art.os 7.º, n.º 1, alínea b) e f); 25.º, n.º 2; e 27.º, n.º 2 do RJRL, devendo fixar-se em MOP$15,250.20 ($435.72 x 35dias), por aplicação da fórmula (salário médio diário X1).
BB. O total da indemnização devida à Autora pelo trabalho prestado nos períodos remunerados de suspensão obrigatória da prestação de trabalho cifra-se, portanto, em MOP409,974.79 (MOP292,494.72 + MOP50,364.23 + MOP$5l,865.64 + MOP$15,250.20).
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A STDM contra-alegou, sustentando o que segue nas respectivas conclusões:
1 - Com o devido respeito por entendimento diverso, as gratificações ou gorjetas recebidas dos clientes pelos empregados de casino não fazem parte do salário de um trabalhador.
2 - A retribuição ou salário, em sentido jurídico (laboral), encerra quatro elementos essenciais e cumulativos:
i. É uma prestação regular e periódica;
ii. Em dinheiro ou em espécie;
iii. A que o trabalhador tem direito por título contratual e normativo e que corresponde a um dever jurídico da entidade patronal;
iv. Como contrapartida pelo seu trabalho.
3 - No caso dos autos, estando em causa gorjetas comprovadamente oferecidas por clientes de casino, dependendo o seu recebimento do animus donandi de terceiros, estranhos à relação jurídico-laboral, nunca poderia o(a) trabalhador(a) ter exigido à sua entidade empregadora o seu pagamento inexistindo aquela oferta por parte dos clientes.
4 - Se, por hipótese, em determinado mês, não existissem quaisquer gorjetas entregues pelos clientes da Recorrida a distribuir pelo(a) A., ora Recorrente, e restantes trabalhadores, nenhum dever jurídico impendia sobre a Recorrida no sentido de suprir aquela falta e nenhum direito de crédito podiam os seus trabalhadores exigir a este respeito.
5 - Com efeito, é sabido que em anos em que o montante das gorjetas era inferior ao do ano anterior (variação que se constata pela análise dos rendimentos do(a) A., ora Recorrente), nunca o(a) Recorrente reclamou da ora Recorrida o seu pagamento.
6 - O(a) Recorrente sabia que a parte do rendimento respeitante às gorjetas dependia exclusivamente das liberalidades dos clientes de casino, nada podendo exigir à ora Recorrida a esse título caso essa parte do seu rendimento fosse zero.
7 - Dispõe o artigo 25º, n.º 1 do RJRT que “Pela prestação dos seus serviços ou actividade laboral, os trabalhadores têm direito a um salário justo.”.
8 - Salvo o devido respeito por opinião contrária, analisando a certidão de rendimentos do(a) Recorrente, não se pode dizer que ao(à) A. não foi proporcionado um rendimento justo, maxime porque os rendimentos globais auferidos eram claramente superiores à média do rendimento / remuneração auferida por cidadãos de Macau com formação académica e profissional equivalente às suas que não trabalhassem em casino, os quais eram mais que bastantes para prover a uma vida digna e decente do(a) Recorrente e sua família.
9 - Deste modo, na esteira do entendimento do mais Alto Tribunal da RAEM, do douto tribunal Recorrido e, bem assim, da doutrina maioritária, é entendimento da R. que “As gratificações ou gorjetas recebidas pelos empregados de casino dos clientes não fazem parte do salário.”
10 - Admitindo a Recorrida, apenas por cautela e por hipótese, que de forma alguma se concede, a obrigação de indemnizar o(a) Recorrente tendo em conta o valor das gorjetas oferecidas pelos clientes de casino, devem ser as seguintes as fórmulas aplicáveis para aferir das compensações adicionais devidas:
i. Trabalho prestado em dias de descanso semanal:
a. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
b. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x1 (e não x2, porque uma parcela já foi paga);
c. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x0 (e não x1, porque uma parce1ajá foi paga).
ii. Trabalho prestado em dias de descanso anual:
a. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
b. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x1 (e não x3, porque uma parcela já foi paga e a R. não impediu o(a) A. de gozar quaisquer dias de descanso);
c. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x1 (e não x3, porque uma parcela já foi paga e a R. não impediu o(a) A. de gozar quaisquer dias de descanso).
iii. Trabalho prestado em dia feriado obrigatório:
a. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
b. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x1 (e não x2, porque uma parcela já foi paga);
c. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x1 (e não x2 porque uma parcela já foi paga).
11 - Caso se entenda que as fórmulas supra expostas não são adequadas para o cálculo de uma indemnização eventualmente devida à Recorrente, remete-se para as fórmulas adoptadas nos já referidos acórdãos do Tribunal de Última Instância, proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007 e 58/2007, datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007 e 27 de Fevereiro de 2008, respectivamente.
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Cumpre decidir.
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II- Os Factos
Vem dada como provada a seguinte factualidade:
a) Durante o período compreendido entre 1 de Julho de 1987 e 26 de Julho de 2002, a Autora prestou trabalho para a aqui Ré.
b) Como contrapartida do trabalho prestado para a Ré, no período temporal compreendido entre 1 de Julho de 1987 e 30 de Junho de 1989, a Autora, auferiu uma remuneração fixa diária de MOP4,10; no período compreendido entre 1 de Julho de 1989 e 30 de Abril de 1995, de HKD$10.00 e no período compreendido entre 1 de Maio de 1995 até ao termo da relação laboral, de HKD$15.00.
c) Além disso, a Autora, ao longo do período referido na alínea a) recebeu uma quota-parte, variável, do total das gorjetas entregues pelos clientes da Ré a todos os seus trabalhadores, cujo montante era diariamente reunido e contabilizado e, em cada dez dias, distribuído por todos os seus trabalhadores, lidassem ou não directamente com os clientes e de acordo com a respectiva categoria profissional.
d) Desde o início da relação laboral até 26 de Julho de 2002, a Autora recebeu da Ré as seguintes quantias:
- Ano de 1987: MOP$21,634.00;
- Ano de 1988: MOP$46,435.00
- Ano de 1989: MOP$100,474.00;
- Ano de 1990: MOP$120,355.00;
- Ano de 1991: MOP$126,596.00;
- Ano de 1992: MOP$118,139.00;
- Ano de 1993: MOP$104,608.00;
- Ano de 1994: MOP$170,703.00;
- Ano de 1995: MOP$205,973.00;
- Ano de 1996: MOP$205,063.00;
- Ano de 1997: MOP$204,553.00;
- Ano de 1998: MOP$195,090.00;
- Ano de 1999: MOP$176,786.00;
- Ano de 2000: MOP$171,863.00;
- Ano de 2001: MOP$153,885.00;
- Ano de 2002: MOP$73,514.00.
e) Nos últimos três meses do ano de 1987, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$9,574.40, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$104.07.
f) Nos últimos três meses do ano de 1988, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$14,018.70, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$152.38.
g) Nos últimos três meses do ano de 1989, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$27,286.80, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$296.60.
h) Nos últimos três meses do ano de 1990, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$26,332.50, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$286.22.
i) Nos últimos três meses do ano de 1991, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$29,597.50, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$321.71.
j) Nos últimos três meses do ano de 1992, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$23,846.30, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$259.02.
k) Nos últimos três meses do ano de 1993, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$40,086.10, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$435.72.
l) Nos últimos três meses do ano de 1994, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$44,559.00, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$484.34.
m) Nos últimos três meses do ano de 1995, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$49,340.20 correspondente a uma remuneração média diária de MOP$536.31.
n) Nos últimos três meses do ano de 1996, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$45,651.00, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$496.21.
o) Nos últimos três meses do ano de 1997, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$49654.90, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$539.73.
p) Nos últimos três meses do ano de 1998, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$44,369.10, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$482.27.
q) Nos últimos três meses do ano de 1999, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$38,707.00, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$420.73.
r) Nos últimos três meses do ano de 2000, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$35,635.70, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$387.34.
s) Nos últimos três meses do ano de 2001, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$31,888.60, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$346.62.
t) Nos últimos três meses do ano de 2002, como contrapartida do trabalho prestado ao serviço da Ré, a Autora auferiu MOP$23,021.70, correspondente a uma remuneração média diária de MOP$250.24.
u) No dia 20 de Julho de 2003, a Autora subscreveu a declaração cujo teor consta de fls. 181, com o seguinte teor: “Eu, (.........) titular do BIR nº 5/050526/2 recebi, voluntariamente, a título de prémio de serviço, a quantia de MOP$30,399.68 da STDM, referente ao pagamento de compensação extraordinária de eventuais direitos relativos a descansos semanais, anuais, feriados obrigatórios, eventual licença de maternidade e rescisão por acordo do contrato de trabalho, decorrentes do vínculo laboral com a STDM. Mais declaro e entendo que, recebido o valor referido, nenhum outro direito decorrente da relação de trabalho com a STDM subsiste e, por consequência, nenhuma quantia é por mim exigível, por qualquer forma, à STDM, na medida em que nenhuma das partes deve à outra qualquer compensação relativa ao vínculo laboral”.
v) Tal declaração foi aceite pela Ré.
w) Em meados de Julho de 2003, o departamento da Inspecção do Trabalho enviou à Autora o ofício cuja cópia se encontra a fls. 201 a 207 e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
x) A Sociedade de Jogos de Macau SA, é uma sociedade anónima com um capital social de duzentos milhões de patacas, dividido e representado por dois milhões de acções, com o valor nominal de cem patacas cada, das quais um milhão e seiscentas mil (privilegiadas) e cento e noventa e nove mil e novecentas e noventa (ordinárias simples) são detidas pela sociedade Investimentos – STDM, Limitada.
y) A STDM é sócia da Sociedade Investimentos – STDM, Limitada, representando a sua quota 99% do capital desta.
z) Em 26 de Julho de 2002, a Autora celebrou com a Sociedade de Jogos de Macau, S.A. (SJM) um contrato de trabalho cujos termos constam do documento de fls. 238 a 240 e que aqui se dão por reproduzidos.
aa) Até 1998, a Autora trabalhava em ciclos contínuos de três dias:
- no primeiro dia a Autora começava a trabalhar às 14.00 horas e interrompia às 18.00 horas, recomeçava às 22.00 horas e acabava às 2.00 horas.
- No segundo dia, a Autora começava às 10.00 e interrompia às 14 horas, depois recomeçava às 18.00 horas e acabava às 22.00 horas.
- No terceiro dia, a Autora começava às 6.00 horas e interrompia às 10.00 horas, depois recomeçava às 2.00 horas e acabava às 6.00 horas.
bb) A partir de 1998, a autora passou a trabalhar em ciclos contínuos de 9 dias:
- No primeiro, segundo e terceiro dias, a Autora começava às 7.00 horas e acabava às 15.00 horas;
- No quarto, quinto e sexto dias, a Autora começava às 23.00 horas e acabava às 7.00 horas;
- No sétimo, oitavo e nono dias, a Autora começava às 15.00 horas e acabava às 23.00 horas.
cc) A Autora tem uma filha, XXX, que nasceu em XX de XXX de XXXX.
dd) Durante o ano de 1987, a Autora não gozou 26 dias de descanso semanal, nem 3 dias de descanso anual, nem 1 dia de feriado obrigatório remunerado nem 2 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
ee) Durante o ano de 1988, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual, 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
ff) Durante o ano de 1989, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
gg) Durante o ano de 1990, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
hh) Durante o ano de 1991, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
ii) Durante o ano de 1992, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
jj) Durante o ano de 1993, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
kk) Durante o ano de 1994, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
ll) Durante o ano de 1995, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
mm) Durante o ano de 1996, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
nn) Durante o ano de 1997, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
oo) Durante o ano de 1998, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
pp) Durante o ano de 1999, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriados obrigatórios não remunerados.
qq) Durante o ano de 2000, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriado obrigatório não remunerado.
rr) Durante o ano de 2001, a Autora não gozou 52 dias de descanso semanal, 6 dias descanso anual e 6 dias feriados obrigatórios remunerados e 4 dias de feriado obrigatório não remunerado.
ss) Durante o ano de 2002, a Autora não gozou 29 dias de descanso semanal, 3 dias descanso anual e 5 dias feriados obrigatórios remunerados e 2 dias de feriado obrigatório não remunerado.
tt) A Autora, pela ocasião do parto da sua filha, foi informada pela Ré de que não tinha direito a gozar qualquer período de dispensa de trabalho sem perda de remuneração.
uu) Por causa das condições de trabalho impostas pela Ré, a Autora deixou de poder viajar e passar férias com a sua família e de poder celebrar e gozar os feriados obrigatórios na companhia dos seus familiares e amigos.
vv) A Autora viu-se, ao longo dos anos, exposta à inalação continuada de poluentes como o alcatrão, a nicotina e o monóxido de carbono.
ww) Em 20 de Julho de 2003, a Autora encontrava-se ao serviço da SJM.
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III- O Direito

A sentença ora em apreciação decidiu que o salário não era composto das gorjetas que a autora foi recebendo ao longo da duração do contrato que a ligava à STDM. É esta a nossa primeira tarefa: a de saber se a sentença da 1ª instância deve manter-se quanto a esta matéria concreta.
A recorrente começou a trabalhar para a recorrida como empregada do casino, recebendo como contrapartida diária uma quantia fixa, desde o início até à cessação da relação laboral. Para além disso, recebia uma quantia variável em função de gorjetas recebidas dos clientes do casino, que a recorrida reunia, contabilizava e posteriormente distribuía por todos os seus empregados.
Ora, tal como o TSI tem defendido, o contrato em causa é de trabalho, porque reúne todas as características próprias deste.
Socorramo-nos do aresto lavrado no Ac. de 19/03/2009, Proc. nº 690/2007:
“Em face do artigo 1079.º do Código Civil, artigos 25º e 27º do anterior RJRL - cfr. artigos 1º, 4), 9º, 2), 57º da actual LRT, Lei 7/2008, de 12 de Agosto, em princípio não aplicável aos contratos findos, face à redacção do disposto no art. 93º -, art. 23°, n.º 3 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 7º do Pacto sobre Direitos Económicos Sociais e Culturais e pela Convenção da OIT n.º 131, direitos que por essa via não deixam de ser tutelados pela própria Lei Básica no seu artigo 40º, decorre, face à factualidade apurada, que parece não restarem quaisquer dúvidas de que nos encontramos perante um verdadeiro e puro contrato de trabalho entre a autora e a ré, em que esta, mediante uma retribuição, sob autoridade, orientações e instruções daquela, começou a trabalhar na área de actividade ligada à exploração de jogos de fortuna ou azar”.
Concordamos com a posição e nada mais temos a acrescentar-lhe.
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No que se refere ao valor do salário, pergunta-se: Será que ele apenas é constituído pela parte fixa ou também englobará a parte variável em resultado das gorjetas?
Também neste ponto estamos de acordo com a posição deste TSI, no sentido de que as gorjetas não foram sendo atribuídas a título de mera liberalidade. A liberalidade, em princípio, para assim ser entendida, não deveria ter sido atribuída com carácter de regularidade. E o que está demonstrado nos autos é, precisamente, o contrário.
Depois, não eram gorjetas que o trabalhador do casino guardava para si vindas directamente do cliente apostador. Se assim fosse, poderia dizer-se que o empregador a elas era totalmente alheio, que nenhuma interferência exercia nem na sua distribuição, nem no seu quantitativo e que, portanto, apenas pagava ao seu subordinado o valor remuneratório previamente determinado. Mas não. Eram somas de dinheiro que o trabalhador recebia, sim, mas que tinha que entregar à sua entidade patronal, de quem, posteriormente, apenas recebia uma parte. Locupletamento à custa alheia seria a situação se, tendo o jogador entregue pessoalmente o dinheiro ao trabalhador, a entidade patronal dela, sem mais, se apropriasse totalmente. Mais, haveria aí uma manifesta superioridade de parte a roçar a ilicitude se, contra a vontade do empregado, este fosse obrigado a abrir mão daquilo que o jogador voluntariamente lhe tinha dado. Nenhuma relação laboral assente numa base lícita toleraria tal atitude de ingerência na vida do trabalhador por parte do empregador se não tivesse havido entre ambos um acordo que permitisse a distribuição das gorjetas, que não haviam sido dadas a este, mas àquele. Só um modelo de distribuição pré-determinado confere licitude à acção do empregador. Mas, ao mesmo tempo que assim acontece, não podemos deixar de pensar que, afinal, a entidade empregadora tinha alguma margem de superioridade nessa relação, pois era ela quem geria o dinheiro e, posteriormente, o distribuía segundo um esquema para o qual nenhuma contribuição o trabalhador dera. Ou seja, há aqui assim uma atitude que é própria da supremacia do empregador e que revela bem que este não era um simples “guardador” ou mero “depositário” do dinheiro proveniente das gorjetas.
De resto, mal se compreenderia que qualquer trabalhador aceitasse trabalhar por tão poucas patacas diárias (a parte fixa), se não soubesse que, a elas, acresceria uma quantia bem mais razoável em resultado da distribuição da soma de todas as gorjetas recebidas por si e pelos restantes colegas do casino. Se o salário tem uma função social, que visa conferir dignidade de vida ao trabalhador e ao seu agregado familiar, e de que o empregador dos tempos modernos já não pode alhear-se, então parece que esta entrega permanente ao trabalhador de dinheiro recebido do jogador não pode deixar de ter um sentido remuneratório.
E neste quadro, todos – jogadores, trabalhadores e empregador - ficam bem. Os primeiros, porque satisfeitos, cumprem o seu desejo de generosidade e altruísmo (mas é questão que aqui não tem valor jurídico); os segundos, porque, ao cabo e ao resto, vêem devidamente compensado o resultado do seu trabalho; e o último, porque vê feliz e empenhado o seu empregado, a quem vai pagar com dinheiro que nem sequer sai do seu bolso.
E, já agora, não deixaria de ser contraditório e injusto, e por isso mal se perceberia, que a reclamada “unidade do sistema” consentisse que, para efeito de salário, a gorjeta assim distribuída ficasse de fora do conceito, enquanto para efeito tributário já passasse a ser considerada como “rendimento do trabalho variável” (cfr. art. 2º, Lei n. 2/78/M, de 25 de Fevereiro).
Tudo isso, para concluir que a composição do salário, através de uma parte fixa e outra variável, admitida pelo DL n. 101/84/M, de 25/08 (arts. 27º, n.2 e 29º) e pelo DL n. 24/89/M, de 3/04 (arts. 25º, n.2 e 27º, n.1) permite a integração das gorjetas na segunda.
É para nós, portanto, questão ultrapassada a de que o salário integra uma parte fixa e outra variável. Problema é como calculá-lo: se ao dia, se ao mês e qual o seu valor.
Verdade que o trabalhador recebia uma quantia fixa diária. Verdade também que nos dias em que não trabalhava não recebia remuneração.
Aliás, a questão está consolidada neste TSI em termos tais que deles não somos capazes de divergir. Veja-se, por exemplo, o que foi dito no Ac. de 14/09, no Rec. N. 407/2006:
  “…a “quota-parte” de “gorjetas” a ser distribuída ao Autor, em montante definido unilateralmente pela Ré, integra precisamente o salário mensal do Autor, pois caso contrário e vistas as coisas à luz de um homem médio colocado na situação concreta do ora Autor, ninguém estaria disposto a trabalhar por conta da Ré em tantos anos seguidos nos seus casinos em horários de trabalho por esta fixados…ou seja, em horários de turnos necessariamente árduos para qualquer pessoa humana, se tivessem de ser cumpridos continuadamente em anos seguidos, sabendo entretanto, de antemão, que a prestação fixa do seu salário era de valor muito reduzido”.
E também o Ac. de 15/07/2010, Proc. n. 928/2010:
“…o qual o trabalhador estava obrigado a trabalhar por turnos de seguinte forma:
1º e 6º turnos: das 07h00 às 11h00, e das 03h00 às 07h00;
3º e 5º turnos: das 15h00 às 19h00, e das 23h00 às 003h00 do dia seguinte;
2º e 4º turnos: das 11h00 às 15h00, e das 19h00 às 23h00
Como se sabe, é por imposição legal e pelos termos do contrato de concessão para exploração dos jogos de fortuna e azar que os casinos têm de funcionar ininterruptamente durante 24 horas. Ora, se é compreensível e justificável a fixação dos turnos, nos termos que vimos supra, pela entidade patronal para fazer face à necessidade de assegurar o funcionamento contínuo legalmente imposto dos seus casinos, já custa perceber como é quê é possível os seus trabalhadores afectados aos casinos, em vez de auferirem um salário mensal, que é única forma de pagamento conciliável com a organização dos turnos durante 24 horas para assegurar a continuidade do funcionamento dos casinos, auferirem antes um salário diário determinado em função do número de dias de trabalho em que quis trabalhar e efectivamente prestou serviço. Na verdade, basta dar uma vista de olhos aos turnos fixados e à forma como os turnos estão organizados e distribuídos durante as 24 horas, em especial o 5º turno que se inicia às 23h00 num dia e termina às 03h00 de madrugada no dia seguinte, já se apercebe da impossibilidade prática de determinar o período de trabalho diário para efeitos de cálculo do alegado salário diário”.
Assim sendo, tal como este TSI tem admitido em casos similares, é de considerar que o salário era mensal, para cujo apuramento médio diário entrará o valor conjunto da parte fixa e da variável, tal como feito nos autos.
Neste sentido, entre os mais recentes, vejam-se os acórdãos proferidos nos Processos nºs 780/2007, de 31/03/2011, 423/2008, de 23/06, por exemplo.
Significa isto que a sentença não pode manter-se e deverá ser revogada nesta parte.
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2- Ultrapassada esta questão, resta extrair as devidas consequências indemnizatórias.
Para o cálculo da indemnização, teremos que partir de diferente base salarial, que agora incluirá toda a massa remuneratória, incluindo as gorjetas, e não apenas o valor diário-base percebido.
Depois, haverá que relevar as desistências parciais do pedido de fls. 863 e 974, sendo que a indemnização se circunscreverá ao período que decorre entre o ano de 1996 e 26 de Julho de 2002.
Considerar-se-á, por outro lado, face ao rendimento apurado (facto d), dos factos assentes) que o valor do salário diário (incluindo as gorjetas) foi de Mop$. 569,61, 568,20, 541,91, 491,07, 497,39, 427,45, 350,06, nos anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001 e 2002, respectivamente.
Dito isto, avancemos para a atribuição da indemnização, desconsiderando, portanto, o DL nº 101/84/M, na medida em que o período de trabalho a que está circunscrita a pretensão indemnizatória apenas se situa, agora – após as desistências verificadas - sob o âmbito temporal de aplicação do DL nº 24/89/M.
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a) Descanso semanal

Na vigência do DL n. 24/89/M

A sentença entendeu que o factor multiplicador era o 1 na fórmula AxBx1 (em que A é o número de dias vencidos e não gozados e B o valor do salário diário).
A recorrente cuida, porém que o factor multiplicador deve ser o 2, ao passo que a STDM, no seu recurso subordinado, ampara o julgado.
Apreciemos.
Vale aqui o disposto no art. 17º, n.1, 4 e 6, al. a).
Assim:
N.1: Tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”).

N.4: Mas, se trabalhar nesse dia, fica com direito a gozar outro dia de descanso compensatório e, ainda,

N.6: Receberá em dobro da retribuição normal o serviço que prestar em dia de descanso semanal.

Ora, como o trabalhador trabalhou o dia de descanso semanal terá direito ao dobro do que receberia, mesmo sem trabalhar (n.6, al. a)).
Numa 1ª perspectiva, se o empregador pagou o devido (pagou o dia de descanso), falta pagar o prestado. E como o prestado é pago em dobro, tem o empregador que pagar duas vezes a “retribuição normal” (o diploma não diz o que seja retribuição normal, mas entende-se que se refira ao valor remuneratório correspondente a cada dia de descanso, que por sua vez corresponde a um trinta avos do salário mensal).

Numa 2ª perspectiva, se se entender que o empregador pagou um dia de salário pelo serviço prestado, continuam em falta:

- Um dia de salário (por conta do dobro fixado na lei), e ainda:
- O devido (o valor de cada dia de descanso, que não podia ser descontado, face ao art. 26º, n.1).

Portanto, a fórmula será sempre: AxBx2, tal como o defende a recorrente/autora.

Logo, nesta parte a sentença não pode ser confirmada. E assim sendo, tendo em atenção o número de dias fixado na sentença reportado aos anos de 1996 a Julho de 2002, que a ora recorrente não contraria nas suas alegações, a indemnização a atribuir seria de Mop$342.249,00. A diferença entre este valor e o encontrado pela recorrente (Mop$ 292.494,72) deve-se ao facto de ter reduzido o valor do salário médio diário ao computo dos três meses finais de cada ano, em atenção ao disposto no art. 26º, nº4 do DL nº 24/89/M. Todavia, este dispositivo explica-se com referência aos nºs 2 e 3 do artigo em causa e o que ali está previsto é um cálculo para as situações em que salário é pago ao dia ou em função do resultado efectivamente produzido, o que não é o caso dos autos. No entanto, sendo superior o valor por nós encontrado ao peticionado, a este valor se reduzirá a indemnização a atribuir: Mop$ 292.494,72.
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b) Descanso anual

Na vigência do DL n. 24/89/M

Considerou a sentença que o factor multiplicativo era o 3. A recorrente aceita este factor, apenas se insurgindo contra o valor do salário médio diário.
Ora, assim sendo, porque esta questão não está sob censura, apenas haverá que apurara indemnização em razão do método de cálculo que atrás definimos. E tendo em atenção o valor médio acima encontrado em III.2 supra, a indemnização seria de Mop$ 58.871,88, que será reduzida, porém, a Mop$ 50.364,23, pelos motivos referidos na análise efectuada ao apuramento da indemnização pelos dias de descanso semanal.
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c) Feriados obrigatórios

Na vigência do DL n. 24/89/M

Esta lei trouxe inovações: introduziu uma indemnização especial, chamemos-lhe assim, que a lei anterior não previa e alargou o leque dos dias feriados remunerados, pois aos previstos na lei anterior, somaram-se agora os três dias do Ano Novo Chinês (cfr. art. 19º, n.3). Portanto, o gozo desses dias é feito, não apenas sem perda de remuneração (já era assim na lei anterior), como ainda deve ser extraordinariamente compensado.
Se o trabalhador prestar serviço nesses dias, diz o diploma, além da remuneração normal, receberá ainda um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal (art. 20º, n. 1). O que quer dizer não inferior? Quer dizer que pode ser igual, mas não descer desse limite. E até pode ser superior, mas nesse caso só o empregador poderá fixar o valor, singularmente ou por acordo com o empregado. O que não pode é o tribunal, arbitrariamente subir acima dessa barreira.
Aqui chegados, de novo pensemos nas duas perspectivas acima avançadas: a de o trabalhador ter sido pago pelo valor do devido e a de ter sido remunerado pelo valor do serviço prestado. É bom que se equacionem estas duas acepções para se ver até que ponto a solução pode diferir.
1ª Perspectiva (pagamento do devido)
O empregador pagou ao trabalhador o valor remuneratório que, pela lei, sempre lhe seria devido (ou seja, pagou a “remuneração correspondente aos feriados…”: art. 19º, n.3, até porque não lhos podia descontar: art.26º, n.1).
Sendo assim, falta pagar ao trabalhador o seguinte: a remuneração do trabalho efectivamente prestado (um dia de salário), mais um acréscimo em dobro, nos termos do art. 20º, n. 1(mais dois dias). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
2ª Perspectiva (pagamento do prestado)
Nesta óptica, o empregador o que fez foi pagar ao trabalhador em singelo o valor do serviço prestado.
Todavia, falta pagar o acréscimo em dobro (2 x salário) e ainda o valor do devido (um dia). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
Como se vê, qualquer que seja o prisma por que se encare a situação, o resultado é o mesmo. A fórmula é, em ambas, salário diário x 3.
A sentença, porém, considerou que o factor multiplicador seria o 2, a autora/recorrente defende que deve ser o 3 e a STDM pugna pelo 1.
Tem razão, como se vê, a trabalhadora. A ser assim, a indemnização ascenderia a Mop$ 60.972,24, que será reduzida, porém, em função da pretensão impugnativa a Mop$ 51.865,54.
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As importâncias parcelares citadas atingem o montante de Mop$ 394.724,59.
A este valor, porém, pretende a recorrente que se adicione o relativo aos dias de parto (35) não gozados em 1993 em razão do salário médio mensal da altura, que era de Mop$ 290,57, e que no seu entender deveria ser de Mop$ 15.250,20, mas que nas nossas contas não passaria de Mop$ 10.169,95.
Sucede, contudo, que essa indemnização havia feito parte da desistência parcial do pedido de fls. 974, o que foi homologado por sentença datada de 10/07/2008, a fls. 978. Significa que a eventual indemnização pelo não pagamento da licença de parto não pode ser mais equacionada em obediência ao caso julgado material.

O valor total será assim de Mop$ 394.724,49, a que se abaterá a quantia de Mop$ 30.399,68 que a recorrente recebeu, conforme o teor da alínea u) da matéria de facto, tudo resultando na indemnização global de Mop$ 364.324,81.
***
IV- Decidindo

Face ao exposto, acordam em conceder provimento parcial ao recurso interposto pela recorrente trabalhadora e, em consequência, revogar parcialmente a sentença recorrida e condenar a STDM a pagar àquela a quantia de Mop$364.324,81, acrescida de juros legais calculados pela forma decidida pelo TUI no seu acórdão de 2/03/2011, no processo nº 69/2010.
Custas pelas partes em ambas as instâncias, na proporção do decaimento.
TSI, 29 / 09 / 2011.
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong (com declaração de voto)
Choi Mou Pan





Processo nº 312/2011
Declaração de voto

Subscrevo o Acórdão antecedente à excepção da parte que diz respeito à existência dos direitos do trabalhador à compensação e aos factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios, em tudo quanto difere do afirmado, concluído e decidido, nomeadamente, nos Acórdãos por mim relatados e tirados em 27MAIO2010, 03JUN2010 e 27MAIO2010, nos processos nºs 429/2009, 466/2009 e 410/2009, respectivamente.

RAEM, 29SET2011

O juiz adjunto


Lai Kin Hong

1 Despacho Normativo n.º 24/89 que revogou o Despacho Normativo n.º 82/85, de 28 de Agosto junto à Contestação.
2 Vidé Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa supra citado.
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