Processo nº 697/2011 Data: 17.11.2011
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “roubo”.
Concurso real.
Pena única.
SUMÁRIO
1. Na determinação da pena única são considerados, “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.
Na consideração dos factos, ou melhor, do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso.
Por sua vez, na consideração da personalidade – que se manifesta na totalidade dos factos – devem ser avaliados e determinados os termos em que a personalidade se projecta nos factos e é por estes revelada, ou seja, importa aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, uma tendência para a prática do crime ou de certos crimes, ou antes, se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente.
O relator,
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José Maria Dias Azedo
Processo nº 697/2011
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. No Tribunal Judicial de Base e em audiência colectiva, respondeu, A, com os sinais dos autos, vindo a ser condenado pela prática em concurso real de 2 crimes de “roubo qualificado”, sendo um na forma tentada, p. e p. pelo art. 204, n.° 2, al. b) do C.P.M., nas penas parcelares de 4 anos e 6 meses de prisão e 2 anos e 9 meses de prisão (para o cometido na forma tentada) e, 1 outro de “detenção de estupefaciente para consumo”, p. e p. pelo art. 14° da Lei n.° 17/2009, na pena de 2 meses de prisão.
Em cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão; (cfr., fls. 369 a 369-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, vem o arguido recorrer para, em síntese dizer que a decisão recorrida viola os art.°s 40° e 65° do C.P.M., pedindo uma pena única “inferior a 6 anos”; (cfr., fls. 387 a 393).
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Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da rejeição do recurso; (cfr., fls. 395 a 396-v).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Cinge-se o inconformismo do recorrente à determinação da medida concreta da pena aplicada, que reputa de demasiado severa, almejando a redução respectiva, fundado essencialmente no facto de, na sua perspectiva, não ter sido devidamente avaliada e sopesada a circunstância de ter cooperado com as entidades judiciárias, ter confessado os factos e encontrar-se arrependido, como, a seu ver, dará nota a missiva que dirigiu ao tribunal, razões por que não se impondo, no caso, especiais necessidades de prevenção, a pena a aplicar se deveria situar abaixo do determinado.
Mas, não se vê como.
É que, por um lado, ao contrário do que parece pretender o recorrente, ao que consta do douto aresto em escrutínio, aquele não confessou integralmente os factos imputados mas apenas parte deles, o que, por si, não será indiciador de verdadeira contrição, a qual também não poderá ser validamente revelada pela missiva a que o interessado alude, já que, além do mais, a mesma se reporta a momento posterior à condenação, sendo certo que, por outra banda e de todo o modo, as circunstâncias apontadas, com possível conteúdo atenuativo da sua responsabilidade, designadamente aquela confissão parcial e o facto de o recorrente ser primário, não deixaram de ser claramente expressas e valoradas no douto acórdão em crise, ao que acresce, finalmente, que, atentas as molduras penais abstractas dos vários ilícitos imputados e os circunstancialismos específicos apurados, as medidas concretas quer das penas parcelares quer do cúmulo alcançado (este, em cerca de metade daquela moldura), se apresentam proporcionadas, a não merecerem reparo, sendo certo que, seja quanto ao roubo qualificado, seja quanto ao consumo de estupefacientes se não deixarão de impor sérias necessidades de prevenção, dada a reiterada prática de tal tipo de crimes na Região, com real afectação da segurança e paz social, para além da premente necessidade de protecção das pessoas e bens.
Tudo razões por que entendemos ser de manter o decidido, negando-se provimento ao recurso”; (cfr., fls. 445 a 446).
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Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos elencados no Acórdão recorrido a fls. 366-v a 368 e que aqui se dão como reproduzidos para todos os efeitos legais.
Do direito
3. Insurge-se o arguido contra o decidido no Acórdão do T.J.B. pedindo a redução da pena única que lhe foi imposta e alegando que violados foram os art.°s 40° e 65° do C.P.M..
Afirma que na decisão recorrida não se ponderou a sua confissão dos factos assim como o seu arrependimento em relação aos mesmos, batendo-se, a final, por uma pena única “inferior a 6 anos de prisão”.
Cremos porém que razão não tem o ora recorrente, sendo antes de subscrever, na íntegra, o entendimento assumido no douto Parecer que se deixou transcrito.
Vejamos.
Não questiona o recorrente a decisão da matéria de facto, e a sua qualificação jurídico-penal, que, seja como for, se mostra de confirmar.
E, como resulta da sua motivação e conclusões de recurso, suscita unicamente a questão da adequação da pena única, resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares em que foi condenado.
Como deixamos adiantado, afigura-se-nos que nenhuma censura merece a decisão recorrida, sendo o presente recurso de rejeitar, dada a sua manifesta improcedência.
Com efeito, e como sabido é, atento o estatuído no art. 71° do C.P.M., a pena aplicável em sede de concurso de crimes tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (…), e, como limite mínimo, a mais elevada das ditas penas concretamente aplicadas; (cfr., n.° 1).
Por sua vez, e em conformidade com o n.° 2 do aludido comando legal, na determinação da pena única são considerados, “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.
Na consideração dos factos, ou melhor, do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso.
Por sua vez, na consideração da personalidade – que se manifesta na totalidade dos factos – devem ser avaliados e determinados os termos em que a personalidade se projecta nos factos e é por estes revelada, ou seja, importa aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, uma tendência para a prática do crime ou de certos crimes, ou antes, se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente; (cfr., v.g., o Acórdão de 17.05.2007, Processo n.° 185/2007).
No caso, foi o recorrente condenado nas seguintes penas:
- 4 anos e 6 meses de prisão; (“roubo qualificado”).
- 2 anos e 9 meses de prisão; (“roubo qualificado tentado”); e,
- 2 meses de prisão; (“consumo de estupefacientes”).
Em causa está assim uma moldura penal com um limite mínimo de 4 anos e 6 meses de prisão, e, com um limite máximo de 7 anos e 5 meses de prisão.
E, perante tal moldura, adequado não é dizer-se que inflaccionada é a pena única de 6 anos de prisão pelo Tribunal a quo decretada.
De facto, e desde já, há que dizer que provado está apenas que o arguido ora recorrente “confessou parte dos factos”, e, como é bom de ver, com uma confissão parcial, inexiste “arrependimento”, não sendo também de se atribuir grande relevância a tal “circunstância”.
Por sua vez, a factualidade provada demonstra ter o arguido uma personalidade violenta, pois que, de forma algo gratuita, agrediu, à facada, as duas vítimas dos seus crimes de “roubo”, agindo assim com dolo (directo) muito intenso, não olhando a meios para atingir os seus fins.
Nesta conformidade, fortes sendo as necessidades de prevenção criminal, tanto especial, como geral, exagerada não se mostra pois a pena única de 6 anos de prisão fixada em resultado do cúmulo jurídico operado, pois que, perfeitamente em sintoma com os art. 40°, (“fins das penas”), 65° (“critérios para a determinação da pena”) e o mencionado art. 71° do C.P.M..
Dest’arte, impõe-se a rejeição do presente recurso.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).
Pagará o recorrente 5 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 4 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$1,200.00.
Macau, aos 17 de Novembro de 2011
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
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