Recurso Contencioso nº 295/2010
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 17 de Novembro de 2011
Descritores: Contribuição Predial Urbana
Prédio devoluto
Oferecimento a arrendamento
Erro sobre os pressupostos de facto
SUMÁRIO:
I- O art. 19º, nº1, al. f) do Regulamento da Contribuição Predial Urbana permite que o titular do direito possa divulgar o oferecimento ao arrendamento de prédio através da aposição de escrito (cartaz em papel ou em suporte electrónico, por exemplo).
II- A divulgação não tem que ser feita no próprio local da situação do bem. Por isso é que a lei permite que a publicitação da intenção seja feita por qualquer outro meio (através de publicitação através de agência imobiliária, por exemplo).
III- Desde que a publicitação contenha os elementos de uma mensagem inequívoca, que revele bem a intenção do anunciante, que não esconda, nem deforme os factos e que cumpra os requisitos de veracidade e identificabilidade, estarão cumpridos os ditames da lei que impõe o oferecimento a arrendamento para que o titular possa beneficiar em termos tributários da situação de prédio devoluto.
IV- O erro sobre os pressupostos perde autonomia nos casos em que a actividade da Administração é vinculada. Nesse caso, se a Administração pratica uma má decisão com base em pressuposto de facto errado, diz-se que ela violou a lei.
Proc. nº 295/2010
(Recurso Contencioso)
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I- Relatório
“Empresa Industrial A”, com sede na Estrada marginal da Ilha Verde, Parque Industrial Transfonteiriço, Parcela A da Zona de Macau, Edifício Industrial, X andar, em Macau, interpôs recurso contencioso do despacho do Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças de 22/01/2010, que indeferiu o seu pedido de revogação da decisão do Senhor Director Substituto da Direcção dos Serviços de Finanças e o substituísse por outra que restituísse a condição de prédio devoluto das fracções A6, A7, A8 e A11 do prédio urbano sito na Avenida Venceslau de Morais, nº X, Fábrica de Brinquedos A, em Macau.
Na petição formulou as seguintes conclusões:
1- De acordo com o despacho proferido pelo Senhor Secretário para a Economia e Finanças de Macau em 22 de Janeiro de 2010 - que corrobora na integra a tese constante do Parecer da NAJ - e de que se ora recorre, as Fracções Autónomas não se enquadram na situação prevista no artigo 19º, n.º1, alínea f) do RCPU, por a Sociedade, ora Recorrente, não as ter oferecido para arrendamento pela aposição de escritos ou por qualquer outro meio de publicidade.
2- Todavia, aquando da fiscalização efectuada pela DSF ao local onde situam as Fracções Autonómas, não obstante os inspectores terem observado que o cartaz que oferecia as Fracções para arrendamento tinha sido removido,
3- Não foi realizado qualquer tipo averiguação a respeito do caso, em particular, não foi confirmado, nem esclarecido pela DSF se, de facto, aquelas Fracções tinham sido, ou não, oferecidas a arrendamento “por qualquer outro meio de publicidade”.
4- Na verdade, existem várias formas e meios de publicidade para dar conhecimento ao público da existência de imóveis que estão para arrendar, sendo a própria legislação que refere esta alternativa: “Que não tenham sido oferecidos a arrendamento, pela aposição de escritos ou por qualquer outro meio de publicidade, durante o tempo em que estiverem desocupados;” (negrito nosso) - cfr. alínea f) do n.º1 do artigo 19º da RCPU.
5- A Sociedade/Recorrente é da opinião que na altura em que foi observada a remoção do cartaz pelos inspectores da DSF, teria sido adequado por parte dos serviços competentes terem feito uso do Princípio da Colaboração entre a Administração e os particulares, consagrado no artigo 9º do CPA, o que não se verificou!
6- Pelo contrário, a fiscalização limitou-se a reportar a remoção do cartaz e de imediato foi decidido pela DSF que as Fracções Autónomas não se encontravam mais em condição de “devolutas”.
7- Os Serviços de Finanças desconsideraram por completo como meio de publicidade o anúncio afixado na porta da acima mencionada Agência Imobiliária, com a qual a Sociedade/Recorrente contactou de modo a que esta se responsabilizasse, a partir de 2 de Agosto de 2008, por arranjar um interessado para receber de arrendamento as referidas Fracções Autónomas.
8- A aqui Recorrente considera que o seu anúncio, cujas fotografias se encontram em anexo a este Recurso como Documento n.º10, identificam no essencial de que imóvel se trata, a finalidade a que se destina, o número de fracções disponíveis e, bem assim, menciona que o valor da renda é barato, embora sujeito a negociação;
9- O anúncio em questão vai totalmente ao encontro do formato usado em tantos outros anúncios de arrendamento ou cartazes que se encontram afixados pelas agências em Macau, seguindo a prática do comércio imobiliário da Região.
10- É de salientar que não existe na legislação de Macau uma norma que exija uma maior especificação ou detalhe de um simples anúncio de arrendamento respeitante a um bem imóvel, que se encontre divulgado no exterior de uma imobiliária, como sejam a identificação precisa do prédio, das respectivas fracções disponíveis e a indicação exacta de um valor da renda a cobrar.
11- Acresce que a própria pessoa - referida no parecer da NAJ dos Serviços de Finanças como “responsável pela Agência Imobiliária” - acaba por corroborar a existência do contacto/pedido efectuado pela ora Recorrente, já mencionado acima.
12- Quer pela carta da Sociedade dirigida à Agência e junta ao presente Recurso como Documento n.º9, quer pelas afirmações constantes do Parecer da NAJ, que reproduzem o que foi referido pela pessoa dita “responsável pela Agência”, comprovam que a Sociedade/Recorrente diligenciou para que fosse encontrando um potencial interessado para receber de arrendamento as Fracções Autónomas.
13- Segundo a lei de Macau não é exigida a formalização, por escrito, do acordo que se estabeleceu entre a Sociedade e a Agência Imobiliária.
14- Logo, das provas existentes resulta claro que a Sociedade/Recorrente ofereceu para arrendamento as Fracções Autónomas, de modo que só se pode concluir por considerar as mesmas como “devolutas”, e não o contrário!
15- A decisão ora recorrida incorreu, pois, “em vício de erro” nos pressupostos, tendo a Administração Tributária indeferido o pedido da Recorrente, erroneamente, isto é, com base em factos que não se verificaram, decisão que - salvo mais douto entendimento - se afigura ser censurável.
16- In casu, com o devido respeito, a Sociedade/Recorrente considera que o facto do cartaz para arrendamento das Fracções Autónomas poder ter sido - eventualmente - retirado da entrada do Prédio não é condição sine qua non de que as referidas Fracções tenham deixado de estar oferecidas para arrendamento.
17- Do mesmo modo, tal não pode ser razão ou fundamento bastante e suficiente para as Fracções Autónomas deixarem, automática e necessariamente, de ser consideradas como devolutas pela DSF.
18- Como já foi afirmado antes, hoje em dia são diversas as formas que se encontram disponíveis aos particulares para darem conhecimento ao público que determinado prédio ou fracção está disponível para arrendar.
19- E, para que mais rapidamente encontrasse um possível interessado no arrendamento das Fracções em apreço, a Sociedade/Recorrente, não só afixou o cartaz na entrada do Prédio, mas também recorreu a uma Agência Imobiliária da Região.
20- Salvo melhor entendimento, o despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças de 22 de Janeiro de 2010, ora recorrido é ilegal, devendo ser anulado, por estar afastado o requisito negativo previsto na alínea f) do n.º1 do artigo 19º do RCPU.
21- De facto, não obstante as várias diligências efectuadas pela Recorrente no sentido de que as ditas Fracções Autónomas fossem dadas de arrendamento, até à presente data, aquela não logrou obter qualquer resultado nesse sentido.
22- Porém, a verdade é que a Sociedade, ora Recorrente, nunca deixou de oferecer para arrendamento as Fracções Autónomas, e se estas não foram arrendadas, tal não se deve à inércia da Recorrente ou a qualquer outro motivo que lhe possa ou deva ser imputável.
23- Para reforçar a posição aqui defendida pela Sociedade, é relevante, neste contexto, recapitular parte da argumentação contida no Recurso Contencioso n.º588/2007, -relativo às fracções A6 e A11, e no Recurso Contencioso n.º14/2008, relativo às fracções A7 e A8, ambos interpostos pela Sociedade e que correm seus termos, por apenso, no Tribunal de Segunda Instância de Macau.
24- Em Abril de 2006, a Sociedade submeteu junto da DSSOPT um pedido para efeitos de licenciamento de obras, que vão implicar necessariamente a construção, no terreno onde está agora erigido o Prédio (e, por conseguinte, as Fracções Autónomas), de um novo edifício destinado à “habitação” e ao “comércio”;
25- Logo, o futuro prédio a ser construído terá uma finalidade completamente diferente da actual, que é a “industria”.
26- A Recorrente foi informada pela DSSOPT que a respectiva licença necessária à demolição será emitida, em princípio, já no final deste mês de Março, o que permitirá dar de imediato início às mencionada obras.
27- Está, por isso, justificado porque é que desde a submissão do referido pedido de licenciamento junto da DSSOPT, a Sociedade/Recorrente tenha tido tantas dificuldades em encontrar um potencial interessado para o arrendamento das referidas Fracções Autónomas.
28- Crê a Recorrente, que esta circunstância é absolutamente incompatível com quaisquer projectos industriais, que necessariamente são pensados a médio ou longo prazo, dado o elevado investimento que normalmente implicam, pelo que fica inviabilizado qualquer arrendamento com aquela finalidade.
29- Consta, ainda, do parecer emitido pela Senhora Coordenadora da NAJ, que “São considerados como não devolutos, nomeadamente, os prédios que estando desocupados o senhorio se recuse injustificadamente a dá-los de arrendamento (…)” (negrito nosso) - em conformidade com o disposto na alínea g) do n.º1 do artigo 19º do RCPU.
30- A este respeito, considera a Sociedade/Recorrente que as razões supra expostas justificam plenamente o facto de não ter ainda dado de arrendamento as Fracções Autonómas acima identificadas.
31- Assim sendo, na medida em que a decisão administrativa de que se recorre não tem acolhimento legal no disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 19º RCPU, nem na sua alínea g), nem em outra norma jurídica, então, a contrario sensu aquela padece de ilegalidade,
32- Devendo, portanto, ser anulada e revogada pelo douto Tribunal nos termos do disposto no CPA.
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Na contestação, a entidade recorrida apresentou as seguintes conclusões:
I. O rendimento dos prédios urbanos quando não arrendados, é a utilidade imediatamente decorrente do uso ou fruição do prédio ou da simples possibilidade desse mesmo uso ou fruição.
II. Há rendimento tributável não só quando o prédio está efectivamente a ser usado ou fruído mas também quando há a possibilidade de o usar ou fruir.
III. O regime tributário dos prédios devolutos decorre da norma de incidência prevista no artigo 4.º do Regulamento da Contribuição Predial Urbana fornecendo-nos o artigo 19.º do mesmo Regulamento, a medida e o sentido da utilidade potencial do prédio urbano enquanto elemento constitutivo de rendimento.
IV. As fracções não se encontravam devolutas quando se verificam as circunstâncias previstas nas alíneas f) e g) do n.º 1 do artigo 19.º do RCPU, aquando as acções de fiscalização externa.
V. Enquadram-se as fracções da recorrente nas alíneas g) e f) porque não foram oferecidas de arrendamento, riem existe qualquer justificação para a recusa desse arrendamento.
VI. O facto de se encontrar pendente junto da DSSOPT um pedido de alteração da finalidade do prédio, não justifica a intenção de não oferecer de arrendamento as fracções em causa, por falta de fundamento legal que permita à Administração Fiscal considerar as mesmas na situação de devolutas.
Nestes termos, deve o presente recurso contencioso de anulação ser julgado improcedente, em virtude de o acto administrativo recorrido não padecer de ilegalidade.
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O digno Magistrado do MP opinou no sentido do provimento do recurso.
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Cumpre decidir.
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II- Os Factos
1- A Recorrente é uma sociedade comercial que tem por objecto o “ (…) fabrico e comercialização de brinquedos, artigos em matéria plástica, artigos e equipamentos eléctrico, artigos e equipamentos e componentes electrónicos, a fabricação de outro equipamento eléctrico não especificado, reprodução de gravações de sons, reprodução de gravações de vídeo, e reprodução de suportes informáticos, e, bem assim, a importação e comercialização de coberturas em relva e a elaboração de estudos e projectos ambientais (…).” (cfr. Documento de fls. 36).
2- A Sociedade Recorrente é titular do direito à concessão por arrendamento do prédio urbano sito na Avenida Venceslau de Morais, nºs X, para “indústria”, inscrito na matriz sob o artigo n.07.868 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.021.510 e no qual se integram as Fracções Autónomas acima identificadas (cfr. Certidão do Registo Predial de 22 de Março de 2010: doc. de fls. 50).
3- A Recorrente em 17/09/2007, ao abrigo do disposto no artigo 18º - “Participação de prédios devolutos”- do Regulamento da Contribuição Predial Urbana (doravante “RCPU”), aprovado pela Lei n.º19/78/M, de 12 de Agosto (com as subsequentes alterações legislativas), requereu a atribuição da condição de “prédio devoluto” às Fracções Autónomas A6, A 7, A8 e A9 do Prédio.
4- A Sociedade/Recorrente foi notificada por Ofício da DSF, identificado com o n.º025INAJ/SM/2008, que os seus pedidos de Setembro de 2007 foram parcialmente deferidos por Despacho da Senhora Directora dos Serviços de Finanças, de 1 de Abril de 2008, exarado na Informação n.º69INAJ/SM/2008 (cfr. Documento fls. 57 dos autos).
5- Nesse sentido, os serviços competentes da DSF decidiram atribuir a condição de “prédio devoluto” às ditas Fracções Autónomas, a contar do mês de Setembro de 2007, para efeitos de benefício de isenção no pagamento do Imposto de Contribuição Predial Urbana.
6- Porém, no decurso do ano de 2009, mediante Oficio n.º368/NCP/DISR/RFM/2009, datado de 9 de Julho (Documento n.º4 a fls. 62 dos autos) a Sociedade foi notificada pela DSF de que, tendo sido efectuada uma fiscalização ao local onde se situam as Fracções Autónomas, a equipa de inspectores da DSF verificou que as mesmas não preenchiam os requisitos estipulados na alínea f) do n.º1 do artigo 19º do RCPU.
8- Consequentemente, o Senhor Sub-Director da DSF, através de Despacho constante do Relatório n.º517/NCP/DISR/2009, de 8 de Julho 2009, decidiu que as Fracções Autónomas acima mencionadas passariam, a partir de 7 de Maio de 2009, a ser consideradas como “não devolutas” (fls. 195 do apenso instrutor).
9- Esta decisão do Senhor Sub-Director da DSF foi impugnada pela Sociedade recorrente, mediante Reclamação apresentada junto da DSF em 15 de Julho de 2009 (cfr. cópia da carta de Reclamação e duas fotografias anexas, que se juntam ao presente Recurso como Documento de fls. 63 e 64 dos autos).
10- Posteriormente, já em inícios do mês de Setembro de 2009, a Sociedade/Recorrente recebeu da DSF um novo Ofício n.0511/NCP/DISR/RFM/2009 (Documento de fls. 65).
11- Através desse ofício, foi a recorrente notificada do seguinte:
i) Aquando de uma nova fiscalização realizada às Fracções Autónomas em 14 de Agosto de 2009, os inspectores da DSF observaram que o anúncio para o arrendamento daquelas, tinha sido removido do Prédio;
ii) O Senhor Director Substituto da DSF, mediante Despacho constante do Relatório n.º736/NCP/DISR/RFM/2009, de 26 de Agosto de 2009, decidiu indeferir a Reclamação Graciosa apresentada pela Recorrente, por as Fracções Autónomas não se encontrarem em situação devoluta ao abrigo do disposto na alínea f) do n.º1 do artigo 19º do RCPU.
12- Perante a situação acima descrita, a Sociedade interpôs Recurso Hierárquico dessa decisão administrativa, em 22 de Setembro de 2009 tendo pedido a sua revogação e substituição por outra que restituísse a condição de “prédio devoluto” às supra identificadas Fracções Autónomas (doc. de fls. 66 dos autos e 16 a 27 do apenso instrutor).
13- Todavia, o pedido apresentado pela Sociedade/Recorrente foi indeferido por Despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças de 22 de Janeiro de 2010, exarado na Informação nº 0227/NAJ/VP/10, datada de 29 de Janeiro de 2010 (Documento de fls. 67 a 73 dos autos).
14- Tal Informação apresenta o seguinte teor:
1. Foi a recorrente notificada do despacho do Senhor Subdirector, de 8/07/2009, exarado na Inf. n.º 517/NCP/DISR/RFM/2009, de 25/06/2009, mediante o Oficio n.º 368/NCP/DISR/RFM/09, de 2 de Julho, segundo o qual, após fiscalização efectuada às fracções autónomas em questão, as mesmas não preenchiam os requisitos estipulados na alínea j) do n.º 1 do artigo 19º do RCPU sendo consideradas não devolutas a partir de 7/05/2009;
2. despacho do qual apresentou reclamação graciosa a 16/07/2009 indeferida mediante despacho da Senhora Directora, de 26/08/2009, constante da 1nf.736/NCP/DlSR/RFM/2009, de 21 de Agosto de 2009.
3. Foi a recorrente notificada do despacho indeferimento mediante o Oficio n.º 511/NCP/DlSR/RFM/2009, de 28/8/2009;
4. onde se informa que após nova fiscalização às fracções autónomas a 14/08/2009 foi observado que o anúncio para arrendamento havia sido retirado do local;
5. e, logo, as fracções autónomas não se encontram na situação de prédio devoluto ao abrigo do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 19º do RCPU.
6. Alega como fundamentos da não verificação do requisito previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo 19º do RCPU:
a) o facto do anúncio para arrendamento das fracções autónomas poder ter sido retirado da entrada do prédio não é condição sine qua non de que as referidas fracções tenham deixado de estar oferecidas para arrendamento;
b) “nem pode ser razão bastante e suficiente para as fracções deixarem, automática e necessariamente, de ser consideradas como devolutas”;
c) são diversas as formas que se encontram disponíveis aos particulares para darem conhecimento ao público que determinado prédio ou fracção está para arrendar;
d) daí que a recorrente tenha recorrido aos serviços de uma agência imobiliária, à qual, afirma ter dado “instruções expressas para que a mesma se responsabilizasse, a partir de 2 de Agosto de 2008, por arranjar um interessado para receber de arrendamento as mencionadas fracções”;
e) sendo que se encontra afixado na porta da dita agência um anúncio referente às fracções autónomas cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido;
f) inexistindo dúvidas de que a recorrente diligenciou no sentido de que as fracções fossem oferecidas para arrendamento;
g) vem, afinal, alegar a invalidade do acto administrativo, por força dos artigos 3º n.º 1, 124º e 125 n.º 1 todos do Código de Procedimento Administrativo, por não ter “qualquer cabimento no disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 19º do RCPU nem em qualquer outra norma jurídica”.
Apreciação
A contribuição predial urbana incide sobre os rendimentos dos prédios urbanos situados na RAEM sendo devida pelos titulares do direito aos rendimentos daqueles, presumindo-se como tais as pessoas singulares ou colectivas em nome de quem os mesmos se encontrem inscritos na matriz ou que deles tenham efectiva posse - Cfr. artigos 2.º e 5.º n.º 1 do Regulamento da Contribuição Predial Urbana (RCPU).
Estabelece o artigo 4.º do mesmo Regulamento, que “o rendimento dos prédios urbanos, quando arrendados, é o valor da respectiva renda e, quando o não estejam, a utilidade económica que deles obtiver, ou tiver a possibilidade de o obter, quem os possa usar ou fruir.”
Porém, e no seguimento do Prof Dr. João Ruiz de Almeida Garret (in Impostos de Macau), “A par destes dois tipos de rendimento estabeleceu a lei um conceito ou tipo de não incidência - o dos prédios devolutos quando destinados a arrendamento - embora sem expressa menção qualificativa do regime jurídico. O regime da situação destes prédios encontra-se nos artigos 18º, 19º e 20º, n.º 2, donde se deduz a exclusão da incidência por a situação do prédio urbano devoluto, quando destinado a arrendamento, não se enquadrar em nenhum dos dois tipos de incidência de prédio arrendado e prédio não arrendado não destinado a arrendamento”.
Portanto, o RCPU prevê um regime específico relativo aos prédios denominados devolutos que, para efeitos fiscais, são considerados como não geradores de rendimentos, não se verificando, assim, qualquer base susceptível de justificar o pagamento da Contribuição Predial Urbana.
Assim, estabelece o artigo 18º n.º 1 do RCPU que os titulares do direito aos rendimentos de prédios que fiquem devolutos são obrigados a participar o facto à Repartição de Finanças mediante a apresentação de modelo M/10, no prazo de 15 dias a contar da sua verificação, ou seja, da data a partir da qual o prédio considera-se devoluto.
A fim de se confirmar a veracidade das declarações prestadas pelos contribuintes, e posteriormente aos prédios serem considerados devolutos, são efectuadas acções de fiscalização externa regulares aos locais.
São considerados como não devolutos, nomeadamente, os prédios que estando desocupados o senhorio se recuse injustificadamente a dá-los de arrendamento e que não tenham sido oferecidos a arrendamento pela aposição de escritos ou por qualquer outro meio de publicidade durante o tempo em que estiverem desocupados - Cfr. alíneas f) e g) do nº 1 do artigo 19º do RCPU.
Do relatório n.º CP7/2136/NFE/DAIJ/2009, de 22 de Julho, e fotos anexas, resulta que após a apresentação da reclamação, a 15 de Julho, foi confirmada a existência do cartaz do anúncio do arrendamento. Do relatório n.º CP7/2383/NFE/DIFT/DAIJ/09, de 19 de Agosto, resulta que após fiscalização realizada ao local - sem aviso prévio ao proprietário - o referido cartaz havia sido removido não tendo sido encontrado qualquer outro meio de publicidade do arrendamento.
Ainda que a recorrente venha alegar que tenha dado instruções a uma agência imobiliária, em Agosto do ano transacto, para que a mesma se responsabilizasse por um potencial interessado ao arrendamento, do teor dos anúncios ora apresentados pela recorrente como does. n.ºs 8 e 9 não resultam os factos alegados, visto que não contêm os elementos necessários de uma proposta ao arrendamento, como sejam a identificação precisa do prédio, das fracções e o valor da renda. A lei não determina que os contribuintes pressuponham que as acções de fiscalização externa são realizadas a todas as agências imobiliárias da Região, a fim de se comprovar a existência de anúncios de arrendamento de prédios participados como devolutos através de modelo M/10 e, mesmo que o determinasse, o que apenas por mera hipótese se enuncia, tais anúncios de arrendamento sempre teriam de identificar claramente quais os prédios e fracções e respectiva localização/morada estão “oferecidos a arrendamento “, através de tais agências.
Além do mais, a alegação da existência da contratação da Agência Imobiliária não corresponde à realidade na medida em que contactada esta, nos termos que melhor constam da fiscalização realizada em 7, 10 e 12 de Dezembro - cfr. documento 1 em anexo à presente informação, cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais - a responsável por essa Agência declarou que não existe qualquer documento ou registo que comprove ter a recorrente contratado aquela Agência, embora se recorde de ter existido um contacto no final de 2007 ou no início de 2008.
Acresce que, ao invés da presente situação, aquando o Ofício n.º 025/NAJ/SM/2008, de 8 de Maio, os pressupostos, para que as referidas fracções fossem consideradas devolutas, encontravam-se reunidos conforme o teor dos relatórios das fiscalizações então realizadas.
Importa salientar que, a Administração Fiscal no exercício da sua actividade e prossecução do interesse público age vinculada ao princípio da legalidade, e à luz deste princípio os nossos serviços só podem actuar com base na lei, de acordo com os critérios determinados no RCPU, e não com fundamento e pressupostos alegados pelos particulares.
Conclusão
Pelo exposto, da análise dos factos apresentados e salvo melhor entendimento, somos da opinião que é não é possível enquadrar a situação das fracções sub judice nas normas reguladoras do estatuto de “prédio devoluto”, por não reunirem os requisitos necessários.
Neste sentido, estão preenchidos os pressupostos da tributação da Contribuição Predial Urbana, devendo, por isso, proceder-se à sua liquidação como resultado da aplicação da lei fiscal aos factos nela previstos, sendo o presente recurso hierárquico declarado improcedente por não existirem razões de facto ou de direito que o justifiquem sendo de manter o acto de indeferimento.” (loc. cit.)
15- A citada informação foi objecto de parecer da Senhora Coordenadora do NAJ , com o seguinte teor:
“Exma Senhora Directora dos Serviços, Substituta
Concordo com o presente parecer no sentido de não se encontrarem preenchidos os requisitos legais para que as fracções autónomas em causa (A6, A7, A8 e A11 do prédio silo na Av Venceslau de Morais n. o 186) possam ser consideradas devolutas, nos termos que melhor resultam do presente parecer que aqui dou por reproduzido para todos os efeitos legais.
Assim, solicito de V.Exa que, em caso de concordância seja o presente processo levada à superior consideração do Senhor SEF com proposta de indeferimento.”
Ass: B, aos 23/12/10 (loc. cit.)
16- O Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças, decidiu então em 22/01/2010 o seguinte:
“Concordo com o parecer e indefiro o pedido.
Assinat: Tam Pak Yuen, aos 22/1/2010” (loc. cit.).
17- A recorrente contactou a agência “Companhia de Fomento Predial C” para publicitar o arrendamento das referidas fracções em 1998 e, na sequência disso, foi afixado na porta do estabelecimento da agência um cartaz em papel com os seguintes dizeres: “Baixa renda. Fábrica com a área de 80 000 pés. Av. Venceslau de Morais. X andares. Podem ser arrendadas individualmente, incluindo despesas de condomínio. O preço é extremamente baixo, podendo ser discutido pessoalmente” (fls. 55 a 61 do apenso instrutor).
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III- O Direito
1- A definição da situação de facto
Por mais do que uma vez, ao que emana do processo instrutor e dos próprios elementos dos autos, apresentou a recorrente a declaração Mod. 10 com referência às fracções autónomas imobiliárias A6, A7, A8 e A11 (devidamente identificadas nos autos). A apresentação que viria a provocar a decisão impugnada no presente recurso contencioso teve lugar em 17/09/2007.
A facticidade essencial que importa muito bem destacar é a seguinte:
a) Face ao pedido apresentado pelo recorrente, foi deferida parcialmente a pretensão e, em consequência disso, foram considerados devolutas as referidas fracções a partir de Setembro de 2007, tendo ficado consignado que eram devidas contribuições até essa data.
b) Feita posteriormente uma acção inspectiva ao prédio, foi constatado que não estavam afixados no local das fracções quaisquer cartazes publicitando a disponibilidade para serem dadas de arrendamento.
c) A mesma acção inspectiva deu conta de que o prédio e as fracções em causa se encontravam em muito mau estado de conservação e em condições de demolição (fls. 195 e 196 do apenso instrutor).
d) Foi informado que a previsão de demolição não constituía causa justificativa para que as fracções não sejam consideradas não devolutas (fls. 195/196 apenso instrutor).
e) E o Senhor Sub-Director da DSF, seguindo o teor de proposta de 25/06/2009, concordou em dar por cessada a situação de devolutas as fracções em causa (fls. 195/196 do apenso instrutor).
f) A recorrente apresentou reclamação, a qual viria a ser indeferida pelo Director Substituto da DSF nos termos da informação nº 736/NCP/DISR/RFM/09 (fls. 155 do apenso instrutor). E isto porque, na sequência de acção de fiscalização sem aviso prévio, fora detectado que não havia no local nenhum aviso de oferecimento das fracções para arrendamento.
g) Interposto recurso hierárquico para o Ex.mo Chefe do Executivo (fls. 66 dos autos e 16 a 27 do apenso instrutor), viria o mesmo a ser apreciado e decidido pelo Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças em 22/01/2010 com os termos que constam da informação nº 227/NAJ/VP/09 (fls. 147 do apenso instrutor; fls. 67 dos autos).
2- Da legalidade da decisão
2.1- Como atrás se viu, os fundamentos específicos que determinaram a tomada de decisão de que ora vem interposto foram sendo sucessivamente sempre os mesmos: a falta de indicação expressa no local através de cartaz ou outro meio de publicitação de oferecimento das fracções para arrendamento.
A recorrente mostra-se inconformada com tal decisão e logo à cabeça desfere-lhe o vício de erro nos pressupostos de facto, com o argumento de que a situação de facto não era aquela. Diz que, sendo embora sendo certo que no local não havia um cartaz aquando da realização da fiscalização efectuada, há outros meios e formas de dar publicidade para dar conhecimento ao público da existência de imóveis para arrendar. O que diz ter feito – alegado e documentado no recurso hierárquico - através de uma agência imobiliária.
Portanto, a primeira questão é a seguinte: comprovou a recorrente a sua intenção de dar de arrendamento as referidas fracções pelo meio próprio? É o que vamos ver.
2.2- O art. 18º do Regulamento da Contribuição Predial Urbana dispõe da seguinte maneira:
Artigo 18.º
(Participação de prédios devolutos)
1. O titular do direito aos rendimentos de prédios que fiquem devolutos, no todo ou em parte, é obrigado a participar o facto à Repartição ou Delegação de Finanças competente, mediante a apresentação do modelo M/10, no prazo de 15 dias contados da sua verificação.
2. Se a participação for apresentada fora do prazo fixado neste artigo, não será considerada qualquer dedução ou anulação com referência aos duodécimos correspondentes aos meses decorridos desde aquele em que o prédio, ou parte dele, ficou devoluto, até ao termo do mês em que a participação tenha sido entregue.
E o art. 19º reza assim:
Artigo 19.º
(Prédios não considerados devolutos)
1. Para efeitos deste regulamento, não se consideram devolutos os prédios ou partes de prédios:
a) Que se encontrem arrendados, embora o locatário os não habite ou ocupe;
b) Que estejam ocupados pelos titulares do direito aos respectivos rendimentos;
c) Que, estando mobilados, não sejam oferecidos para arrendamento com mobília;
d) Que hajam sido cedidos gratuitamente pelos titulares do direito aos seus rendimentos;
e) Que costumem ser arrendados periodicamente, desde que na fixação do rendimento colectável tal circunstância já tenha sido atendida;
f) Que não tenham sido oferecidos a arrendamento, pela aposição de escritos ou por qualquer outro meio de publicidade, durante o tempo em que estiverem desocupados (negrito nosso);
g) Que, não obstante encontrarem-se desocupados, o senhorio se recuse injustificadamente a dá-los de arrendamento (negrito nosso).
2. Será havida como recusa injustificada a exigência pelo senhorio de renda exorbitante, como tal se considerando a que exceda em mais de 30% a última renda contratual, quando actualizada, ou o valor locativo da matriz, se o prédio ou parte do prédio não se encontrava anteriormente em regime de arrendamento.
3. No caso de desactualização da última renda ou quando se tenham introduzido no prédio melhoramentos apreciáveis, a renda pretendida pelo senhorio deve comparar-se com a de prédio ou parte de prédio, arrendado em regime de liberdade contratual, que melhor sirva de padrão.
Como oferecer o arrendamento de prédios?
A lei diz: pela aposição de escritos ou por qualquer outro meio de publicidade.
Uma aposição de escritos pode ser um cartaz em suporte papel ou até mesmo um “placard” em suporte electrónico. Na verdade, o que importa é que traduza a afirmação expressa da intenção do titular do direito em dar de arrendamento o prédio anunciado.
Mas, a par disso, outra questão se nos coloca já em fila: terá aquela intenção de ser manifestada no local da situação do bem? Nós cremos que para a lei isso é indiferente porque não distingue a propósito do local onde a publicidade deva ser feita. Será uma questão de eficácia que apenas resulta em benefício do titular do direito, tudo dependendo da sua argúcia e estratégia de bem apelar ao negócio. E nesse sentido, ao senhorio caberá a escolha do melhor sítio, embora seja lógico que um bom cartaz no local do prédio se mostre bem adequado ao fim em vista. Mas também pode acontecer que o próprio prédio esteja em sítio pouco conhecido, pouco frequentado, pouco movimentado, enfim. E então já faz sentido que o cartaz (sendo esse o caso) possa ser colocado em local mais afastado do ponto exacto da situação do bem, desde que anuncie eficazmente a sua localização, para o que até podem ser utilizados elementos acessórios de indicação (setas, por exemplo). A estratégia persuasiva, porque funciona em benefício do anunciador, deve ficar ao seu critério e nesse ponto não quis o legislador interferir.
É preciso admitir, contudo, que o anúncio colha eventualmente mais êxito junto de uma empresa dedicada à intermediação imobiliária(1). Também aí o caso é de oferecimento ao arrendamento, agora, porém, através de um qualquer outro meio de publicidade. Estamos nesse caso ante uma empresa que suporta custos da publicitação, nomeadamente derivados da utilização de meios mais amplos de divulgação, como jornais, revistas, etc., e que pode atrair mais facilmente o interessado leitor ou despertar nele um interesse mais forte. Uma vez mais, isso é, porém, questão que passa à margem do legislador, que se mostrou indiferente a respeito do modo como o oferecimento ao arrendamento é feito.
Desta maneira, a resposta à pergunta está dada: o local não é condição legal de legalidade ou de existência jurídica do anúncio.
Dito isto, importa perguntar: Fez a recorrente a publicitação através de uma agência imobiliária?
No recurso hierárquico ela juntou os documentos 8 e 9 na tentativa de o demonstrar ter feito (ver fls. 58 a 61 do apenso instrutor). O facto de a Administração ter contactado a agência e esta ter respondido que não existe qualquer documento ou registo que comprove tê-la a recorrente contratado (conforme informação que antecede a decisão: ver fls. 72 dos autos) nada prova em contrário e só prova o que ali está escrito. Isto é, admitindo como verdadeiro que a fiscalização contactou a agência para obter a confirmação, o resultado da diligência só revela que não há registo de contrato! Mas não está provado que o contrato inexiste, podendo até ter-se dado o caso – coisa frequente – de ele poder ter sido verbal, o que já justificaria a existência do anunciado arrendamento. A responsável pela agência acabou por dissipar a dúvida acerca do negócio.
Portanto, estava feito um anúncio através de agência imobiliária, sim.
Mas nem tudo está ainda esclarecido. A existência desse anúncio pode não corresponder aos desígnios da lei, ao propósito do oferecimento, tal como imposto na norma.
Por isso é que importa averiguar se a circunstância de a recorrente ter feito esta publicitação através de uma agência de mediação imobiliária deveria ou não ter levado a Administração Fiscal a agir de outra maneira. E a conclusão a que se chegar há-de servir para responder à recorrente acerca do vício em apreço.
Quanto a nós, o que agora está em causa é saber se os elementos fornecidos pela agência ao público tal como constam de fls. 60 e 61 do apenso instrutor, com a tradução de fls. 59 do mesmo apenso(2) são suficientes. Entendeu a Administração Fiscal que um tal anúncio não correspondia aos ditames da lei, porque lhe faltariam “os elementos necessários de uma proposta de arrendamento, como sejam a identificação precisa do prédio, das fracções e o valor da renda” (fls. 71 dos autos).
Mas, a verdade é que a lei não determina nenhum modo especial de anunciar a intenção de arrendamento. Nem diz, sequer, quais sejam os elementos necessários ao preenchimento da noção de “oferecimento ao arrendamento”. Aliás, se um simples escrito aposto num vidro do prédio anunciando “Arrenda-se” pode bastar, não se vê que o valor da renda deva estar na informação veiculada ao público no anúncio da agência. De qualquer maneira, a questão do valor da renda perde aqui importância porque o anúncio já dizia que ele seria de “baixa renda” ou “extremamente baixo”, além de poder ser “discutido pessoalmente”. Ou seja, transmitiu-se à generalidade das pessoas interessadas que o valor, por ser tão baixo e ainda por cima negociável, não carecia de ser indicado. Na verdade, o que o anúncio transmite, no rigor da interpretação dos seus termos, é que não havia valor base e que a renda seria ajustada entre os interessados. Ora, melhor exemplo do que este, de persuasão e convencimento à realização de futuro negócio, não pode haver. Isto é, a intenção da lei está ali realizada.
E quanto ao local do prédio e das fracções, apenas falta informar no anúncio o número de polícia (número de porta), já que se informa que o prédio está localizado na Av. Venceslau de Morais. Mas, qualquer interessado que quisesse deslocar-se ao local certamente o faria com o auxílio de um responsável da agência e não seria por isso que deixaria de se inteirar sobre o estado do prédio e das condições das suas fracções.
Portanto, não cremos que a falta destes dois dados, perfeitamente supríveis ante o que se acaba de dizer, seja de molde a retirar qualquer eficácia ao propósito do anúncio: ele divulga, indica o local, diz qual é o objecto e sugere uma renda muito baixa. Logo, é uma mensagem publicitária inequívoca, que revela bem a intenção do anunciante, que não esconde, nem deforma os factos e que cumpre os requisitos de veracidade e identificabilidade (ver arts. 5º e 6º da Lei nº 7/89/M, de 4/09: Regime Geral da Actividade Publicitária).
Eis a razão pela qual também somos a pensar que a falta do cartaz não significa que a recorrente o tenha retirado intencionalmente3. Nada disso está aqui provado. Mas, mesmo que ela o tivesse retirado, nem por isso a conclusão podia deixar de ser a mesma que temos vindo a apontar, se tivermos em consideração que o anúncio ao arrendamento deixou de ser feito no local, para passar a ser num sítio específico para agenciamento da actividade imobiliária.
A este respeito, nem seria preciso que a Administração tivesse feito uso do princípio da colaboração (tal como agora apelado pela recorrente nos arts. 32º a 34º da petição inicial), uma vez que uma tal cooperação, quando muito apenas serviria para reforçar o que estava já feito em anúncio público. Nesse sentido, a colocação de novo cartaz pela parte privada no local da situação dos bens podia servir como modo de manifestar “ex abundanti” a intenção de dar de arrendamento, mas não como modo de substituir a publicitação através da agência, pois isso seria o mesmo que reconhecer que este meio não era legítimo ou eficaz ao fim em vista. Portanto, a colaboração da Administração podia ser observada, sim, mas para permitir à interessada o reforço de meios de divulgação da notícia de que as fracções estavam para ser dadas de arrendamento.
Para dizer, pois, que se a intenção da recorrente ao invocar este princípio era uma tentativa de demonstrar a sua violação, o propósito fica pelo caminho, até por inútil.
Em suma, e ao contrário do que esteve subjacente no acto administrativo em apreço, importa concluir que a recorrente ofereceu expressamente as fracções a arrendamento através de um meio legal de publicidade, revelando aí a sua verdadeira intenção de as colocar novamente no mercado de arrendamento.
Dizendo de outro modo, o acto administrativo pecou por partir de um pressuposto de facto errado, o de que as fracções não foram anunciadas para arrendamento.
Mas, se assim concluímos, o vício em causa (erro sobre os pressupostos de facto invocado) perde autonomia, na medida em que a actuação da Administração não se pauta neste caso pelo exercício de poderes discricionários. Quando a lei diz que não são considerados devolutos os prédios que não tenham sido oferecidos a arrendamento, podendo sê-lo (art. 19º, nº1, al. f), cit.), quer que a Administração actue vinculadamente e extraia daí as consequências tributárias próprias da situação. E nesse caso, o que acontece é que, se a Administração falha na densificação do pressuposto e daí parte para uma decisão administrativa com suporte fáctico errado, tal decisão está viciada por ter violado a lei: O fundamento normativo invocado por si não lhe permitia decidir como decidiu, face à situação material e objectiva verificada.
Porque assim, o erro detectado subsume-se ao conceito de vício de violação de lei (4), vício que a recorrente também acabou por invocar no art. 74º da petição inicial e nas conclusões 20ª a 22ª do articulado, e que nós damos por verificado.
*
2.3- Seguir-se-ia a análise das conclusões 23ª e seguintes, onde a recorrente traz à liça parte dos argumentos que levou aos recursos contenciosos 588/2007 (relativo às fracções A6 e A11) e 14/2008 (relativo às fracções A7 e A8), ainda pendentes neste TSI.
Em sua opinião, seriam argumentos que reforçariam a ideia de que a sociedade recorrente desde 2006 continua aguardando decisão sobre pedido de licenciamento de obras no prédio que implicarão a demolição e a construção de um prédio totalmente novo destinado a habitação e comércio, em vez do destino industrial que até agora vem cumprindo.
Pretende a recorrente interessada com isso demonstrar quão difícil é encontrar um potencial interessado no arrendamento das fracções com tão curto prazo de vista, na medida em que teria que cessar a actividade logo que chegasse a hora de demoli-lo para a construção de novo prédio com diferente objectivo.
Serviria, por fim, este argumento para preencher a noção que emana do art. 19º, nº1, al. g), do RCPU ao prescrever que “ São considerados como não devolutos, nomeadamente, os prédios que estando desocupados o senhorio se recuse injustificadamente a dá-los de arrendamento…”. Quer dizer, haveria assim uma razão justificada para não serem postos a arrendamento.
Todavia, eis aqui uma fundamentação melindrosa e arriscada. Na verdade, este argumento, alicerçado na alínea g) do referido normativo, embora também utilizado na fundamentação do acto (por remissão para a Informação que o antecedeu) pode parecer contraditório com o argumentário exposto pela recorrente a respeito do vício sobre o erro nos pressupostos de facto que ela mesmo invocou. Efectivamente, pode sugerir que, efectivamente, se a recorrente está interessada em demolir e construir de novo, já não tem o mesmo interesse em dar de arrendamento, face aos inconvenientes daí derivados, nomeadamente em sede de eventuais indemnizações provocadas pela antecipação do termo do contrato de arrendamento que celebrasse com algum inquilino industrial. (ver a propósito o art. 95º da petição inicial). E se não tem interesse em dar de arrendamento, talvez esteja aí a razão por que o cartaz não esteja no local (admitindo-se plausível – mas sem prova disso - que tenha sido ela a retirá-lo) e que tenha preferido concretizar a intenção do arrendamento para uma agência, por “presumir” que por esse meio não seria mais possível obter um interessado numa relação de inquilinato. E estaria assim satisfeita a sua intenção última: obter a ideia de prédio devoluto (e assim escapar às consequências tributárias) e ao mesmo tempo fugir à necessidade de arrendamento.
Pois bem. São pensamentos “quo est demonstrandum” que podem surgir à flor da mente, daí o perigo da fundamentação trazida aos autos.
De qualquer maneira, eles não podem fazer baixar a intensidade da objectividade que resulta do facto provado de que o interessado deu os prédios para arrendamento através de agência imobiliária. E a explicação para a necessidade de um arrendamento muito curto, face à necessidade de demolição para os novos fins projectados (ver razão explanada nos arts. 90º, 93º, 94) serve para a livrar de culpas na circunstância de não ter aparecido ninguém para contratar consigo. O que é o mesmo que dizer que, com estas razões, ele consegue revelar que, se a desocupação ainda persiste, não obstante o anúncio, isso não traduz a noção de “recusa injustificada” a que se refere o art. 19º, nº1, al. g), do RCPU.
E, por isso, se este foi outro dos fundamentos do acto, também ele tem que cair, por insustentável.
*
Para concluir, portanto, que o acto em apreço não pode manter-se.
***
IV- Decidindo
Nos termos expostos, acordam em conceder provimento ao recurso e, em consequência, anulam o acto impugnado.
Sem custas.
TSI, 17 / 11 / 2011
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José Cândido de Pinho
(Relator)
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Lai Kin Hong
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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Vitor Manuel Carvalho Coelho
(Magistrado do M.oP.o) (Presente)
1 Para nós, os serviços desta intermediação podem ser prestados por uma ou mais empresas simultaneamente. Não se intromete a lei nesse campo, porque tal só diz respeito ao anunciante, consoante a eficácia que pretende dar à publicidade.
2 O texto do anúncio é o seguinte: “Baixa renda. Fábrica com a área de 80 000 pés. Av. Venceslau de Morais. 4 andares. Podem ser arrendadas individualmente, incluindo despesas de condomínio. O preço é extremamente baixo, podendo ser discutido pessoalmente”.
3 Na realidade, nem sequer se sabe se foi retirado pela recorrente ou se retirado por quem quer que fosse com desconhecimento daquela.
4 Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, pag. 402.
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