I- Recurso nº 702/2011/A
Data: 24 de Novembro de 2011
Assuntos: - Adjudicação no concurso público
- Suspensão de eficácia
- Oposição à suspensão provisória
- Interesse público
Sumário
1. Quando se verificar que com a eventual suspensão de eficácia da adjudicação da Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau tratamento de águas residuais, advêm a forçada paralisação da ETAR e os graves prejuízos decorrentes, tais como a poluição do meio aquático e do ar ambiental nas imediações intensivamente populacionais, e ainda sério perigo para a saúde pública, torna-se obviamente subsistente o alegado interesse público para a oposição à suspensão provisória.
2. Os fundamentos que servem para a procedência da oposição à suspensão provisória da execução do acto, serve manifestamente para a (in)verificação do segundo requisito da suspensão previsto no artigo 121° n° 1 al. b), sendo embora referência das vertentes diferentes, pois, não se podem deixar de compaginar o mesmo conteúdo e alcance os invocados interesses públicos: a saúde pública e o ambiente.
O Relator,
Choi Mou Pan
Processo n.º 702/2011-A
Requerente: A
Requerida: Chefe do Executivo da R.A.E.M.
Contra-Interessadas:1 – B. e outros
2 – C, Lda /
D, S.A.
3 – E e outro
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:
A, sociedade com sede na Áustria, XXX, XXX, XXX XXX, e representação permanente em Macau, na Avenida da XXX, nº XXX, Edifício XXX, Xº andar “X”, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis da RAEM sob o nº 26XXX (SO), vem requerer o Procedimento de Suspensão de Eficácia do acto de adjudicação do Exm° Chefe do Executivo da RAEM, de 5 de Agosto de 2011, bem como da suspensão de eficácia dos actos que sejam daquele execução directa.
Citada a entidade recorrida, esta respondeu, alegando que:
1) Por ser o acto de conteúdo puramente negativo, não podendo a eficácia do acto administrativo ser suspensa, nos termos do artigo 120º do mesmo Código.
No entanto, para o caso de assim não se entender, sempre se requer a V.Exa se digne:
2) Considerar não verificados, muito menos cumulativamente, qualquer dos requisitos a que se referem as alíneas a), b) e c) do nº 1 do artigo 121º do CPAC.
- Por não se descortinarem prejuízos de difícil reparação para a requerente ou para os seus interesses, que possam resultar da execução do acto;
- Por a suspensão do acto em causa determinar grave lesão do interesse público concretamente prosseguido; e
- Por resultarem fortes indícios de ilegalidade do recurso interposto.
E, em consequência, dando razão à entidade ora requerida, considerar improcedente o pedido da requerente.
Foram citadas as contra-interessadas, (B, S.A., C, Lda / D, S.A. e E).
O Consórcio entre a B, S.A., F, S.A. e G Co., Ltd. (doravante “Contra-Interessado”), adjudicatário no Concurso Público Internacional para a “Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”, entendendo que deverá o presente pedido de suspensão de eficácia do acto administrativo de adjudicação, apresentado pela Requerente, ser declarado totalmente improcedente.
Veio também a E, contestar pugnando pelo deferimento do pedido suspensão de eficácia do acto de adjudicação.
No decurso do presente processo, veio a entidade recorrida deduzir a oposição à suspensão provisória do acto, com o fundamento de protecção dos interesses públicos (fl. 570 a 572).
O Digno Magistrado do Ministério Público apresentou douto parecer de que se transcreve o seguinte:
No Requerimento, a sociedade《A》pediu a Suspensão da Eficácia da adjudicação decretada pelo Exmo. Sr. Chefe do Executivo em 5/8/2011, bem como dos actos que sejam daquele execução directa.
Antes da contestação, o Exmo. Senhor Chefe do Executivo apresentou sucessivamente a Oposição à suspensão provisória consagrada no nº 1 do art. 126º do CPAC e, depois, a Contestação (vide. fls. 112 a 115 e fls. 125 a 137 dos autos).
Para não se perturbar o normal andamento do presente processo urgente, deixemos de fora o manifesto excesso na identificação dos contra-interessados surgido no art. 2º do Requerimento, em virtude de apenas o concorrente adjudicatário adquirir tal qualidade.
I – Da Oposição à suspensão provisória
Aduzida ao abrigo dos nºs 2 e 3 do art. 126º do CPAC, e como fundamento da Oposição, o Exmo. Senhor Chefe do Executivo invocou grave prejuízo para o interesse público exposto nos nºs 4 a 6 do Despacho nº 141/CE/2011, nomeadamente, a suspensão provisória provocaria a paralisação da ETAR e que as águas residuais se despejassem directamente para o mar, sem nenhum tratamento, poluindo de forma gravosa o meio aquático, tornando o ar irrespirável nas imediações muito populacionais e causando grave perigo para a saúde pública.
Respondendo (vide. Fls. 501 a 516 e fls. 517 a 523 dos autos), a ora requerente e a《E》, dita contra-interessada, não duvidaram da verosimilhança e credibilidade do grave prejuízo alegado pela entidade requerida, argumentando que o qual seria evitável com a adopção da solução por si proposta.
Ressalvado o respeito, entendemos que não têm razão.
Repara-se que a partir da caducidade do anterior contrato de concessão em 30/09/2011, a gestão e funcionamento da ETAR transferiu ao concorrente adjudicatário – o consórcio da《B, S.A.》e outros.
Sendo assim, torna-se previsível e, até notório que da suspensão provisória advêm a forçada paralisação da ETAR e os graves prejuízos decorrentes, tais como a poluição do meio aquático e do ar ambiental nas imediações intensivamente populacionais, e ainda sério perigo para a saúde pública.
Não se deixa de ser previsível que à solução transitória em alternativa proposta pela requerente é inerente a enorme inconveniência, senão o grave perigo para o atempado tratamento das águas residuais – uma necessidade pública de carência diária.
Este iminente interesse público não anui qualquer solução experimental ou arriscada.
Nestes termos, afigura-se-nos justificada a Oposição em apreço.
II – Quanto ao pedido da suspensão de eficácia
Com as contestação da entidade requerida e do contra-interessado, e a Resposta da requerente sobre aquela Oposição, o presente processo chega à fase final. Portanto e em homenagem do princípio da economia processual, vamos apreciar o pedido de Suspensão de Eficácia.
Adiantando a conclusão, entendemos que três (3) factores levam ao indeferimento da pretensão da Suspensão de Eficácia formulada pela ora requerente.
1. Recorde-se que como 6a concorrente do《Concurso Público Internacional para “Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”》, a Requerente foi excluída na fase de apreciação da proposta (doc. de fls. 60 a 78 nos autos do Processo nº 17/2011). Revela isto que a Requerente nem sequer entrou, nesse procedimento concursal, na fase final de adjudicação.
Nesta medida, tempos por certo que o acto suspendendo – adjudicação do Exmo. Sr. Chefe do Executivo em 5/8/2011 – não pode deixar de configurar-se no acto administrativo meramente negativo, na esteia da douta lição no sentido de que (Acórdão do TSI no Processo nº 41/2011/A):
III – é puramente negativo para um determinado concorrente o acto administrativo que, no termo de um concurso público, adjudica a outro a aquisição de certo tipo de serviços. Por isso, porque a suspensão de eficácia desse acto nenhum benefício ou vantagem lhe traria, não pode a providência ser decretada.
Daí decorre que não se preenche in casu o pressuposto consagrado no art. 120º do CPAC.
2. Importa reter que o Requerente perdeu, nos altos TSI e TUI, o pedido de suspensão de eficácia do acto de indeferir o recurso hierárquico interposto da dita exclusão (Acórdãos decretados pelos venerandos TSI e TUI nos Processos respectivamente nº 17/2011/A e nº 14/2011).
Os dois doutos Acórdãos asseveraram, e bem, que aquela exclusão não causaria prejuízo de difícil reparação à Requerente. E o Venerando TUI extraiu a seguinte doutrina: Sendo pessoas colectivas diferentes, os prejuízos causados pela execução do acto administrativo a uma não podem ser imputados pura e simplesmente a outra, mesmo com posição social dominante sobre aquela, com o fim de justificar a suspensão de eficácia do acto.
No recente Acórdão decretado no Processo nº 56/2011, anunciou o TUI: O requerente da suspensão de eficácia de acto administrativo não pode vir a defender os interesses de um terceiro, atento o disposto no artigo 33º do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), pelo que tais prejuízos não relevam como integradores do requisito da alínea a) do nº 1 do artigo 121º do esmo Código.
Óbvio e incontroverso que no procedimento administrativo conducente à adjudicação em causa, a Requerente se distancia mais longe da mesma adjudicação do que daquela exclusão da qual a Requerente tinha solicitado a Suspensão de Eficácia.
Por maioria da razão, a adjudicação ora suspendenda não lhe causa o prejuízo de difícil de reparação. O que implica que não se vislumbra, no caso sub judice, o requisito na a) nº 1 do art. 121º do CPAC.
3. Da outro lado, o grave prejuízo para interesse público que pode justificar a mencionada Oposição à suspensão provisória demonstra, de igual modo, que se verifica in casu o requisito impeditivo na b) nº 1 do art. 121º do CPAC.
Concluindo, parece-nos que tudo isto determina o indeferimento do pedido de suspensão de eficácia em apreço.
Por todo o exposto, somos do parecer de que se deverá:
- julgar procedente as razões em que se fundamentou a Oposição à suspensão provisória;
- indeferir o pedido de suspensão de eficácia da Requerente.
1. Da oposição à suspensão provisória do acto
Nos presentes autos, a requerente pretende suspender a eficácia do acto de adjudicação, praticado pelo Chefe do executivo no concurso público internacional denominado “modernização, operação e manutenção da estação de tratamento de Água Residuais da Penísula de Macau, aberto por anúncia públicado no B.O. n° 13 I série, de 31 de Março de 2010 e prorrogado o prazo para entregar de propostas por aviso publicado no B.O. n° 20 ii série de 19 de Maio de 2010, ao consórcio formado pelas empresas B e outras.
Neste concurso, a requerente tinha sido excluída por acto do Chefe do Executivo da RAEM de 4 de Novembro de 2010, mas por acórdão de 12 de Outubro de 2011 proferido no Tribunal de Última Instância por virtude do recurso contencioso interposto do acto de exclusão, foi anulado o acto de exclusão.
Como se sabe, o mecanismo de suspensão da eficácia do acto administrativo tem a natureza e a estrutura do processo cautelar, tendo como requisitos a instrumentalidade (artigo 123º do CPAC), o fumus bonni juris, o periculum in mora, e, até certo posto, a proporcionalidade.1
Para que possa ser concedida a dita suspensão da eficácia terão de satisfazer-se, cumulativamente, o pressuposto do artigo 120º e os três requisitos gerais do nº 1 do artigo 121º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Dispõe o artigo 120º (Suspensão de eficácia de actos administrativos)
“A eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
a. Tenham conteúdo positivo;
b. Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
Artigo 121º (Legitimidade e requisitos)
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
Logo o pedido for apresentado em juízo, a entidade recorrida deve proceder a suspensão provisória da execução do acto, objecto do pedido de suspensão, nos termos do artigo 126° do CPAC.
Prevê este artigo 126º (Suspensão provisória) que:
“1. Recebida a citação ou notificação, o órgão administrativo não pode iniciar ou prosseguir a execução, devendo impedir, com urgência, que os serviços competentes ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução.
2. Excepto na hipótese prevista no n.º 2 do artigo 121.º, não é aplicável o disposto no número anterior quando o órgão administrativo reconheça, fundamentadamente e por escrito, no prazo de 3 dias, grave prejuízo para o interesse público na não imediata execução.
3. O reconhecimento previsto no número anterior é imediatamente comunicado ao tribunal.”
Porém, a título do interesse público, a entidade recorrida, opôs-se a suspensão provisória obrigatória”.
Vejamos então.
Está em causa uma adjudicação do concurso público de “Modernização, Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”, em consequência da qual a anterior concessionária já entregou à nova concessionária, uma das contra-interessada, B, para a gestão da estação de tratamento de águas residuais. Este tratamento de água residual é uma necessidade indispensável para a uma cidade, independente da sua dimensão, o que se torna óbvio que da suspensão provisória advêm, na palavra do douto parecer do Ministério Público, “a forçada paralisação da ETAR e os graves prejuízos decorrentes, tais como a poluição do meio aquático e do ar ambiental nas imediações intensivamente populacionais, e ainda sério perigo para a saúde pública”; “Não se deixa de ser previsível que à solução transitória em alternativa proposta pela requerente é inerente a enorme inconveniência, senão o grave perigo para o atempado tratamento das águas residuais – uma necessidade pública de carência diária”.
A procedência do fundamento da oposição não pode deixar de ser notório, sem necessidade de quaisquer delongas, o invocado iminente interesse público não anui qualquer solução experimental ou arriscada.
Por isso, é de julgado subsistente a oposição em apreço.
2. Da suspensão de eficácia do acto administrativo
Como se vê acima, para a suspensão da eficácia de um acto administrativo é da verificação de um pressuposto da existência do acto de conteúdo positivo, ou, quando se encontrar um acto negativo contendo no entanto vertente positivo e três requisitos, cumulativamente, nos termos dos artigos 120° e 121° do CPAC.
Sendo pressupostos e requisitos cumulativos, basta uma inverificação de um deles, não pode decretar a suspensão.
Como é logicamente perceptível, independentemente da consideração ser o acto suspendendo um negativo ou positivo, os fundamentos que servem para a procedência da oposição à suspensão provisória da execução do acto, serve manifestamente para a (in)verificação do segundo requisito da suspensão previsto no artigo 121° n° 1 al. b), sendo embora referencia das vertentes diferentes, pois, não se podem deixar de compaginar o mesmo conteúdo e alcance os invocados interesses públicos: a saúde pública e o ambiente.
E, por maioria da razão, não sendo subsistente a suspensão provisória, com curto prazo, não justifica, de forma alguma, a suspensão com relativamente longo prazo.
Pelo exposto, sem necessidade de mais fundamentos alongados , acordam neste Tribunal de Segunda Instância em indeferir a suspensão da eficácia do acto de adjudicação do contrato.
Custas pela requerente e a contra-interessada, E e outro, fixando-se a taxa de justiça, cada um, em 10 UC’s para a primeira e 6 UC’s para a segunda.
RAEM, aos 24 de Novembro de 2011
Choi Mou Pan
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
Presente
Victor Manuel Carvalho Coelho
1Acórdão do TSI do processo 30/ 00/ A.
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