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Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau



Recurso n.° 31 / 2005

Recorrente: Presidente da Comissão de Revisão A do Imposto Complementar de Rendimentos
Recorrido: A






1. Relatório
   O Presidente da Comissão de Revisão A do Imposto Complementar de Rendimentos interpôs recurso com fundamento em oposição de acórdãos perante o Tribunal de Segunda Instância.
   Por despacho do relator daquele Tribunal, foi o recurso rejeitado liminarmente por considerar faltar o pressuposto de oposição de acórdãos.
   Reclamado o despacho do relator para a conferência, o Tribunal de Segunda Instância, por seu acórdão de 14 de Julho de 2005 proferido no processo n.° 298/2004-A, julgou improcedente a reclamação, mantendo o despacho reclamado.
   Novamente inconformado, vem agora recorrer para este Tribunal de Última Instância, formulando as seguintes conclusões das alegações:
   “1. O acórdão ora recorrido, tendo indeferido a interposição do recurso apresentado em 27 de Janeiro de 2005, fundamentado no facto da não existência da oposição entre os acórdão, não se fundamenta no estatuído nos art.ºs 162.º e 163.º do CPAC.
   2. Estas normas especialmente prevêem os fundamentos de rejeição do recurso com fundamento em oposição de acórdãos, cujos pressupostos se encontram especificados na al. b) do art.º 161.º do CPAC, norma ao abrigo da qual o recorrente apresentou o recurso.
   3. O indeferimento liminar do recurso apenas pode ter por fundamento a falta dos pressupostos referidos no art.º 163.º do CPAC e no art.º 594.º do CPC.
   4. A competência para decidir da existência, ou não, da oposição entre acórdãos invocada pelo recorrente encontra-se cometida ao relator do Tribunal de Última Instância por expressa determinação da lei, conforme o estabelecido no n.º 1 do art.º 166.º do CPAC.
   5. A cominação efectuada no despacho do M. Juiz Relator do Tribunal de Segunda Instância, fundamento do acórdão da conferência do Tribunal de Segunda Instância ora recorrido, não encontra fundamento na lei, nomeadamente no disposto nos art.ºs 161.º, n.º 1, al. b), 162.º, 163.º e 166.º, n.º 1 e 2 do CPAC e o art.º 44.º, n.º 2, al. 1) da LBOJ.”
   Pedindo o provimento do recurso e a anulação do acórdão recorrido, com a consequente admissão do recurso com fundamento em oposição de acórdãos.
   
   O recorrido não apresentou alegações apesar de ter sido notificado para o efeito.
   
   No parecer o Ministério Público junto deste Tribunal entende que é mais lógico atribuir a tarefa da apreciação do pressuposto de oposição de decisões no recurso com fundamento em oposição de acórdãos ao relator do Tribunal de Última Instância, dotado de competência para uniformizar a jurisprudência, competência que resulta clara do art.º 166.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, pois se trata de uma apreciação “substancial” sobre a existência ou não da oposição de acórdãos, não deve caber à competência do relator do Tribunal de Segunda Instância e da respectiva conferência no caso de reclamação.
   Caso não for assim entendido, sustenta que não se verifica a oposição dos acórdãos em causa, na concordância com as judiciosas considerações e razões aduzidas no acórdão ora recorrido, devendo julgar findo o presente recurso nos termos do art.º 166.º, n.º 1 do referido Código.
   
   
   Foram apostos vistos pelos juízes-adjuntos.
   
   
   
   2. Fundamentos
   Pugnando pela admissão do recurso com fundamento em oposição de acórdãos, o recorrente alega que não devia ser o relator do Tribunal de Segunda Instância a decidir sobre a existência da invocada oposição de decisões, mas sim pelo relator do Tribunal de Última Instância nos termos do art.º 166.º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC).
   No entanto, o recorrente nunca suscitou a questão na reclamação para a conferência do Tribunal de Segunda Instância ao impugnar o despacho do relator deste Tribunal, constituindo assim uma questão nova. Uma vez que o recurso visa apenas apreciar a decisão recorrida e não decidir questões novas, tal questão ora suscitada não pode ser conhecida no presente recurso.
   
   O recorrente pretende fundamentalmente, com o presente recurso, que seja admitido o recurso com fundamento em oposição de acórdãos pelo mesmo interposto, considerando nomeadamente que se encontra preenchido o pressuposto, para além dos outros, de oposição de decisões, cuja verificação foi negada pelo acórdão ora recorrido.
   Entende que existem decisões divergentes e contrárias, relativas às condições de admissibilidade do recurso da sentença do Tribunal Administrativo, nos dois acórdãos do Tribunal de Segunda Instância, um de 13 de Janeiro de 2005 proferido no processo n.º 298/2004, como acórdão recorrido, e outro de 11 de Março de 2004 no processo n.º 212/2003, como acórdão fundamento. Alega que no acórdão fundamento decidiu implicitamente pela verificação das condições de admissibilidade do recurso da sentença do Tribunal Administrativo e no acórdão recorrido foi decidido o não conhecimento do recurso por não se verificarem as condições de admissibilidade da sentença do Tribunal Administrativo.
   
   Para a interposição do recurso com fundamento em oposição de acórdãos é necessário verificar certos pressupostos específicos previstos no art.° 161.° do CPAC. Dispõe assim o seu n.° 1:
   “1. Excepto quando a solução neles perfilhada esteja de acordo com jurisprudência obrigatória, há lugar a recurso com fundamento em oposição de acórdãos:
   a) Do Tribunal de Última Instância, proferidos em primeiro ou segundo graus de jurisdição, que, relativamente à mesma questão fundamental de direito e na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica, perfilhem solução oposta à de acórdão do mesmo Tribunal;
   b) Do Tribunal de Segunda Instância, proferidos em segundo grau de jurisdição que, na hipótese prevista na alínea anterior, perfilhem solução oposta à de acórdão desse mesmo Tribunal ou do Tribunal de Última Instância.”
   
   A oposição de soluções dos acórdãos sobre a mesma questão fundamental de direito constitui um dos pressupostos do referido recurso.
   A questão apontada pelo recorrente reside na admissibilidade do recurso jurisdicional, relacionada com a alçada do tribunal, da sentença do Tribunal Administrativo que apreciou o acto tributário impugnado.
   Assim, o acórdão proferido no processo n.º 298/2004 tem por origem o recurso contencioso contra a deliberação da Comissão de Revisão A do Imposto Complementar de Rendimentos sobre a fixação da matéria colectável. O Tribunal de Segunda Instância entende, neste acórdão, que o valor da respectiva causa corresponde à utilidade económica imediata do pedido que consiste no valor de imposto, 4659 patacas. Por este valor ser inferior à alçada do Tribunal Administrativo, que segundo o art.º 18.º, n.º 3 da Lei n.º 9/1999 é fixada em 15000 patacas, decidiu não conhecer o recurso jurisdicional por irrecorribilidade da sentença em razão do valor.
   Por seu lado, o acórdão do processo n.º 212/2003 foi proferido no recurso jurisdicional interposto também contra a sentença do Tribunal Administrativo em que foi apreciada igualmente uma deliberação da Comissão de Revisão do Imposto Complementar de Rendimentos de fixação do rendimento colectável. O montante do imposto em causa era de 5458 patacas. Neste acórdão, o Tribunal de Segunda Instância entrou logo no conhecimento da questão de fundo e concluiu pela improcedência do recurso jurisdicional, sem tecer nenhuma consideração sobre a admissibilidade do recurso.
   O próprio recorrente afirma nas suas alegações que a questão de admissibilidade do recurso jurisdicional foi resolvida explicitamente no acórdão recorrido e implicitamente no acórdão fundamento, e neste último foram naturalmente verificadas as condições de admissibilidade do recurso, tendo havido decisão no sentido de elas estarem verificadas, apesar de essa decisão estar implícita no acórdão proferido sobre o mérito da causa.
   Entendemos que, como um dos pressupostos do recurso com fundamento em oposição de acórdãos, a solução oposta deve ser expressa, não basta uma oposição ou diversidade implícita ou pressuposta.1
   É necessário, portanto, verificar uma “manifestação explícita de julgamento contraditório da mesma questão.”2
   Não basta uma oposição tácita de resoluções, em termos de aceitação tácita da doutrina contrária à enunciada noutra, exige antes que seja estabelecida uma doutrina, e por forma expressa, em sentido contrário ao fixado na outra.
   Perante uma decisão suposta ou implícita do acórdão, até nem é possível conhecer os seus fundamentos, o que inviabiliza a ponderação das eventuais opções diferentes do julgador a fim de escolher entre estas a posição mais adequada a prevalecer na fixação de jurisprudência.
   
   Para além da interrogação sobre a verificação do pressuposto de mesma questão fundamental de direito, pois no acórdão recorrido foi apreciada a admissibilidade do recurso jurisdicional e no de fundamento os vícios imputados ao acto impugnado, no presente caso não existe a oposição de soluções constantes dos dois acórdãos acima referidos, precisamente porque no acórdão recorrido não foi apreciada em lado algum e por forma expressa a admissibilidade do respectivo recurso, mesmo que esta constitua lógica e legalmente pressuposto do seu conhecimento.
   
   
   
   3. Decisão
   Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso.
   Sem custas por o recorrente estar legalmente isento.


   Aos 4 de Abril de 2006.


           Juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
A Magistrado do Ministério Público presente na conferência:
Vitor Manuel Carvalho Coelho
1 Ver Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2ª ed., LEX, Lisboa, 1994, p. 290.
2 Ver Manuel Leal-Henriques e Manuel Simas-Santos, Código de Processo Penal de Macau, Macau, 1997, p. 857.
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Processo n.° 31 / 2005 8