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Processo nº 842/2011 Data: 12.01.2012
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Liberdade condicional.




SUMÁRIO

A liberdade condicional é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social.
O relator,

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José Maria Dias Azedo


Processo nº 842/2011
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A (XXX), com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no artº 56º do C.P.M.; (cfr., fls. 117 a 123 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).

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Em resposta, pugna o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 128 a 129-v).

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação do recurso (fls. 118 a 123 dos autos), O recorrente assacou à douta decisão recorrida só o vício de violação de lei, argumentando que ele satisfazia a todos os pressupostos consagrados no art.56° do CPM.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do nosso Exmo. Colega na Resposta (fls.128 a 129 verso dos autos), e nada temos, de relevante, a acrescentar-lhes.
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No dia de hoje, constitui jurisprudência firme que a concessão da liberdade condicional depende do preenchimento cumulativo de todos os pressupostos, quer objectivos quer subjectivos, consignados no art.56° do CPM, bastando a não verificação de qualquer um para se negar o pedido da liberdade condicional (a título meramente exemplificativo, vide. Acórdão do TSI no Processo n.°195/2003).
Importa recordar que a liberdade condicional não é uma medida de clemência ou de recompensa por mera boa conduta prisional, e serve na política do C.P.M. um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o recluso possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. (Acórdão do TSI no Processo n.o50/2002)
Daí decorre que se, não obstante um comportamento prisional adequado, pelo passado do recluso e perspectivas de reintegração se não se formula um juízo de prognose favorável a uma regeneração e se teme pelas razões de prevenção geral. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°225/2010)
Ainda se inculca reiteradamente que cada situação deve ser observada em concreto e caso a caso, num circunstancialismo de modo, tempo e lugar próprios, analisando de forma crítica a personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo se vai reinserir na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo ainda constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°225/2010 e n.°404/2011)
Envolvendo conceitos indeterminados de prognose, as alíneas a) e b) do n.°l do referido art.56° dota aos julgadores certa margem de livre apreciação na interpretação e na valorização, pelo que a convicção de não verificação dos pressupostos subjectivos só poderia ser neutralizado se houvesse uma exemplar e excelente evolução activa da personalidade do recluso durante a execução da prisão, e não um mero comportamento passivo cumpridor das regras básicas de conduta prisional. (Acórdãos do TSI nos Processos n.° 9/2002)
No caso sub judice, ajuizando todos os dados, a Mesma. Juiz a quo entendeu doutamente (cfr., fls. 99 a 100 verso, designadamente fls. 99 verso a 100 dos autos): 然而,考慮到其自17歲起接觸毒品直至25歲入獄仍未戒除,且因賺取快錢而販毒,顯示其過去長期意志力薄弱、處於犯罪邊緣、守法意識亦偏低,法庭對l其能否在一旦獲得自由將能克己守法,不在受毒品及金錢引誘,以負責任方式面對家庭及社會,不再犯罪,存有疑慮。
鑒於刑罰的目的是一方面......,另一方面對犯罪行為作出阻嚇作用、預防犯罪。就本案具體情節而言,服刑人為得到金錢利益而販毒,總、所周知,毒品對人的禍害極大,販毒行為損害吸毒者的身心健康,亦引發他人人身及財產損害的嚴重犯罪行為及社會問題,因此,立法者對販毒行為予以嚴厲處罰。為確保社會普遍要求的公義得以伸張,維護社會秩序及法律的有效性,服刑人的服刑期間必須適宜;否則,將會與社會大眾的期望相違背,從而令人對守法的必要性產生疑間,不利於阻嚇及預防犯罪。
Apesar de se militarem, nos autos, umas circunstâncias favoráveis ao recorrente, na esteia das jurisprudências supra citadas, aderimos à posição da Mema. Juiz a quo, no sentido de ele ainda não reunir, por ora, os pressupostos previstos nas alíneas a) e b) do n.°1 do art.56° do CPM.
Pois, as regras da experiência comum revelam reiteradamente que é difícil de abandonar o vício de tráfico e consumo de droga; e como bem observou a Mema. Juiz a quo, mostram-se duvidosas a capacidade de reintegrar-se na sociedade de modo auto-responsável e auto-controlo.
O que se dá a prever, a jusante, que não se verifica, na presente altura, o pressuposto consagrado naquela alínea a), pelo que a concessão da liberdade condicional periga a prevenção especial.
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Por todo o exposto, pugnamos pela improcedência do recurso em apreço”; (cfr., fls. 136 a 137-v).

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Corridos os vistos legais dos Mmºs Juízes-Adjuntos, e nada obstando, vieram os autos à conferência.

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):

– por Acórdão do T.J.B. de 16.11.2009, foi, A, ora recorrente, condenado na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão pela prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”;
– o mesmo recorrente deu entrada no E.P.C. em 03.11.2008, e em 02.08.2011, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 02.05.2013;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá viver com a sua família em Macau, possuindo perspectivas de emprego numa sociedade de fomento predial.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Vejamos.

— Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:

   “1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
   
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.

3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
   
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).

“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 03.11.2008, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.

Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.

Na verdade, e na esteira do decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 20.01.2011, Proc. nº 30/2011, de 27.01.2011, Proc. nº 25/2011 e o de 03.03.2011, Proc. n.° 116/2011).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Cremos que de sentido negativo deve ser a resposta, mostrando-se-nos de subscrever, na íntegra, o teor do douto Parecer do Ilustre Procurador Adjunto, que aqui, por uma questão de economia processual, se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

De facto, (e independentemente do demais), atento o tipo de crime pelo ora recorrente cometido, o de “tráfico de estupefacientes”, importa pois acautelar a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico; (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).

Assim, em face das expostas considerações, e verificados não estando os pressupostos do art. 56°, n.° 1 do C.P.M., há que confirmar a decisão recorrida.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCs.

Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$900.00.

Macau, aos 12 de Janeiro de 2012
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa

Proc. 842/2011 Pág. 12

Proc. 842/2011 Pág. 11