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Processo n.º 854/2011 Data do acórdão: 2012-1-12
(Autos de recurso penal)
  Assuntos:
  – julgamento de factos
– art.o 114.o do Código de Processo Penal
– intenção de apropriação de bens alheios
  – art.o 204.o, n.o 1, do Código Penal
S U M Á R I O
1. Não sendo o resultado concreto do julgamento da matéria de facto a que chegou o tribunal recorrido manifestamente desrazoável à luz das regras da experiência da vida humana em normalidade de situações ou violadora de quaisquer legis artis ou normas de prova legal, não pode vir o arguido recorrente pretender fazer sindicar, ao arrepio do art.o 114.o do Código de Processo Penal, a livre convicção do mesmo tribunal.
2. É, pois, de rejeitar o recurso da decisão condenatória impugnada, por ser evidente a verificação da intenção, por parte do recorrente, de apropriação dos telemóveis dos ofendidos, para efeitos de cabal incriminação penal previstos no art.o 204.o, n.o 1, do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 854/2011
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 437 a 443 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR3-11-0107-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou como autor material de quatro crimes consumados de roubo, p. e p. pelo art.o 204.o, n.o 1, do Código Penal vigente (CP), na pena de um ano e seis meses de prisão por cada, e, em cúmulo jurídico, na pena única de um ano e nove meses de prisão efectiva, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, para rogar a sua absolvição desses quatro crimes, por entender ter o Tribunal a quo violado o respectivo tipo legal de crime no plano subjectivo, ao ter decidido em condená-lo nos termos constantes do acórdão respectivo, enquanto ele próprio, no momento de constranger os quatro ofendidos a entregar os quatro telemóveis dos autos, não tinha intenção de se apropriar desses bens (cfr. a motivação do recurso de fls. 452 a 455 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 459 a 461), no sentido materialmente de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu o Digno Procurador-Adjunto parecer (a fls. 472 a 472v), pugnando pela rejeição do recurso.
Feito subsequentemente o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado em conferência por manifestamente improcedente) e corridos os vistos legais, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
No tocante aos quatro crimes de roubo em causa, o Tribunal Colectivo recorrido deu por provada a seguinte factualidade, na sua essência:
– em Junho de 2010, o 1.o arguido A (ora recorrente) e o 2.o arguido (não recorrente) tornaram-se amigos;
– em 18 de Outubro de 2010, cerca das 19:30, os dois arguidos foram a um jardim em Macau, tendo encontrado, na altura, quatro amigos do 2.o arguido a conversarem;
– o arguido, de repente, ordenou esses quatro amigos do 2.o arguido a entregarem os seus telemóveis, ameaçando que se não entregassem os telemóveis ou participassem depois o caso à polícia, iria ele a arranjar indivíduos tailandeses para os agredir. Após ouvidas essas palavras, os quatro amigos do 2.o arguido sentiram medo, e entregaram os seus telemóveis ao 1.o arguido, e o 2.o arguido disse a esses quatro que se responsabilizava em lhes devolver posteriormente os telemóveis, e saiu do local em conjunto com o 1.o arguido;
– depois, os dois arguidos levaram os quatro telemóveis a uma casa de penhor perto de um casino em Macau, e obtiveram HKD2.800,00 em numerário, tendo o 1.o arguido entregue HKD40,00 ao 2.o arguido e apropriou-se como seu de todo o restante montante;
– o 1.o arguido soube que os telemóveis não eram da sua pertença, constrangeram os quatro ofendidos a entregarem os telemóveis e levou consigo os mesmos telemóveis, com a intenção de se apropriar dos mesmos;
– o 1.o arguido agiu livre, consciente e voluntariamente, sabendo bem que a sua conduta não era permitida pela lei e como tal era punível.
Por outro lado, o mesmo Colectivo recorrido deu inclusivamente como não provado que os HKD40,00 entregues pelo 1.o arguido ao 2.o arguido foram recompensa deste.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
No tocante à unicamente assacada inverificação da intenção de apropriação de bens alheios no momento de constrangimento dos quatro ofendidos a entregar os seus telemóveis, mostra-se patente que essa tese do recorrente não tem alicerce na matéria fáctica dada por provada no acórdão impugnado (e já acima referida na parte II do presente acórdão de recurso).
E não sendo de considerar que o resultado concreto do julgamento da matéria de facto a que chegou o Tribunal Colectivo recorrido seja manifestamente desrazoável à luz das regras da experiência da vida humana em normalidade de situações ou violadora de quaisquer legis artis ou normas de prova legal, não pode vir o 1.o arguido pretender materialmente fazer sindicar, ao arrepio do art.o 114.o do CPP, a livre convicção do mesmo Colégio de Juízes.
Naufraga, assim claramente, o recurso, por ser evidente a verificação da intenção, por parte do 1.o arguido, de apropriação dos ditos quatro telemóveis, para efeitos de cabal incriminação penal previstos no art.o 204.o, n.o 1, do CP.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso.
Custas pelo arguido recorrente, com duas UC de taxa de justiça e três UC de sanção pecuniária, e mil patacas de honorários a favor da sua Exm.a Defensora Oficiosa, a adiantar, por ora, pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 12 de Janeiro de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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