打印全文
Processo n.º 426/2011
(Recurso cível e laboral)

Data : 19/Janeiro/2012

ASSUNTOS:
    - Execução sustada; renovação da execução
    - Reclamação de créditos; renovação da execução extinta


SUMÁRIO:
    No caso de extinção de uma dada execução por pagamento da dívida exequenda, o credor reclamante que tenha uma execução sustada em virtude de penhora ocorrida naquela execução onde foi reclamar os seus créditos, tem a faculdade de requerer aí a renovação da execução ou suscitar o prosseguimento da execução por si instaurada e entretanto sustada.
O Relator,
  

(João Gil de Oliveira)

Processo n.º 426/2011
(Recurso Civil e Laboral)
Data: 19/Janeiro/2012

Recorrente (exequente):
     A Limited

Objecto do Recurso:
Despacho que indeferiu o prosseguimento da instância
     e a venda judicial do bem penhorado
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    “A LIMITED”, melhor identificado nos autos, tendo intentado execução que foi sustada por se verificar que uma dada fracção havia sido anteriormente penhorada noutra execução intentada por outro banco, o B, pretendendo fazer prosseguir a sua execução com venda do bem penhorado, face ao pagamento voluntário da quantia exequenda no processo do B, onde reclamou o seu crédito, e sendo-lhe indeferido tal pedido, por a Mma jJuiz ter considerado que a satisfação do seu crédito devia prosseguir no processo onde apresentou a reclamação de créditos, dessa decisão vem interpor recurso, alegando, em síntese conclusiva:
    1. Por requerimento apresentado em 17 de Janeiro de 1011, veio o ora Recorrente, requerer a prossecução da Execuçao instaurada em 7 de Maio de 2008 contra as Executadas “Ag6encia Comercial de Desenvolvimento C Internacional Limitada” e “D”, que se encontrava suspensa, uma vez que já não se verificavam os requisitos que ditavam a sua suspensão ao abrigo do artigo 764º nº 1 do CPC;
    2. Consequentemente, requereu também que se procedesse à venda judicial da Fracção D6 por meio de propostas em carta fechada e bem assim ao agendamento de uma data para a realização da mesma.
    3. Por despacho de fls. 206 e 207, veio o Tribunal indeferir o requerimento do ora Recorrente, por entender que a venda requerida só podia ser efectuada na execução que corria termos sob o nº CV2-08-045-CEO, instaurada pelo B na qual o ora Recorrente tinha ido reclamar um crédito de MOP$226.380,00, e respectivos acréscimos.
    4. Veio ainda o Tribunal referir que o facto de o Exequente B ter requerido a extinção da instância nessa execução, por já ter sido pago da quantia exequenda, não obstava à prossecução da execução por parte do credor reclamante, ora Recorrente, ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 814º CPC.
    5. Acrescentou igualmente que, a ser deferido o requerimento apresentado pelo ora Recorrente, estar-se-ia a proceder simultaneamente à realização da mesma diligência sobre o mesmo bem, em dois processos distintos, uma vez que o ora Recorrente já havia requerido a prossecução da execução instaurada pelo B/Reclamação.
    6. É do referido despacho de indeferimento, com o qual o Recorrente não se conforma que vem interposto o presente recurso para o Venerando Tribunal de Segunda Instância de Macau nos termos que se passam a expor:
    7. O artigo 814º nº 2, é claro ao conceder ao Credor Reclamante a faculdade de prosseguir com a execução, após a extinção da mesma.
    8. Nesta conformidade, e tratando-se de uma faculdade, não pode nunca o teor do referido artigo ser interpretando como constituindo uma obrigação impondo ao Credor Reclamante que proceda ao abrigo do mesmo.
    9. Pelo que, e já não se verificando os requisitos do art. 764º nº 1 CPC que ditavam a suspensão dos presentes autos, tinha o ora Recorrente toda a legitimidade para requerer a prossecução dos mesmos, nos termos em que o fez.
    10. Pelo exposto, não pode aceitar-se a justificação dada pelo Tribunal a quo para indeferir o pedido do Recorrente, quando afirma que este só poderia requerer a prossecução da Execução instaurada pelo B/Reclamação.
    11. Estando provada a legitimidade do ora Recorrente para efectuar o requerimento de 17 de Janeiro de 2011, é importante também explicitar os motivos que o levaram a fazê-lo.
    12. A prossecução da execução instaurada pelo B/Reclamação, teria como efeito a venda judicial da Fracção D6, é certo;
    13. No entanto, é de sobremaneira importante salientar que essa venda de per se apenas permitia ao ora Recorrente obter o pagamento da quantia de MOP$226.380,00, e respectivos acréscimos, por ser esse o montante garantido pela hipoteca sobre a Fracção D6, que lhe permitiu ir reclamar o seu crédito na Execução instaurada pelo B.
    14. Considerando que o remanescente do produto da venda da Fracção D6 encontra-se penhorado nos presentes autos, após receber o montante de MOP$226.380,00 e respectivos acréscimos, na execução instaurada pelo B/Reclamação, teria ainda o ora Recorrente de requerer a prossecução dos presentes autos, de modo a vir obter esse remanescente.
    15. Tal solução afigura-se, evidentemente mais morosa e mais dispendiosa do que a simples prossecução dos mesmos, nos termos requeridos em 27 de Janeiro de 2011.
    16. Acresce ainda que, seguindo-se o entendimento propugnado pelo Tribunal na execução instaurada pelo B/Reclamação, o momento oportuno para o Credor Reclamante fazer uso da faculdade que lhe é conferida pelo nº 2 do artigo 814º do CPC é após o proferimento da sentença de extinção da instância, e antes do trânsito em julgado da mesma, situação que ainda não se verificou, nem se antecipa que se verifique a breve trecho.
    17. Ao abrigo de tal solução, impõe-se ao Credor Reclamante que, ainda que disponha dos meios para satisfazer o seu crédito de forma mais célere e mais eficaz noutro processo, fique dependente da remessa da execução à conta, e do proferimento do despacho de extinção!
    18. Além de desrazoável e atentatório contra o bom senso, é sobretudo contrário ao basilar princípio da economia processual, fio de prumo de toda a regulamentação do Processo Civil, e penalizador da parte lesada, o Exequente / Credor Reclamante.
    19. É portanto notório que o fito do ora Recorrente sempre foi e é o de satisfazer o seu crédito, na medida do possível, e com a maior brevidade possível e nunca o de promover duas vendas simultâneas do mesmo bem.
    20. Note-se que, o requerimento da prossecução da presente execução só é apresentado pelo ora Recorrente em 17 de Janeiro de 2011, já depois de o Tribunal ter determinado que afinal, a prossecução da Execução instaurada pelo B/Reclamação só poderia prosseguir após o proferimento do despacho de extinção da instância.
    21. Foi ao aperceber-se de que a satisfação do seu crédito estava então adiada por tempo indeterminado, que o ora Recorrente veio requerer a prossecução dos presentes autos.
    22. Convém também salientar que nada na lei impede que a presente suspensão não pudesse cessar. Atente-se no disposto no artigo 226º CPC, nº 1 d) do CPC, o qual determina que cessa a suspensão quando findar o incidente, ou cessar a circunstância a que a lei atribui o efeito suspensivo.
    23. Tendo em conta que a Execução instaurada pelo B/Reclamação tinha sido sustada e ordenado o seu envio à conta, e bem assim, que o requerimento de prossecução da instância apresentado pelo ora Recorrente tinha sido indeferido pelo despacho de fls. 205, cessou a circunstância que determinava a suspensão da presente execução.
    24. E ainda que fosse verdade, que ora Recorrente estivesse a requerer a prossecução de duas execuções em simultâneo, a solução razoável seria a de que fosse declarada extinta, por inutilidade superveniente da lide, a execução instaurada pelo B/Reclamação e não, impossibilitar-se o ora Recorrente de prosseguir com a sua Execução.
    25. Foi por esse motivo, embora sem admitir a interpretação do despacho de que se recorre, que o Recorrente veio entretanto desistir em 31.03.2011 de exercer a faculdade que lhe é concedida pelo art. 814º nº 2 CPC na execução instaurada pelo B/Reclamação, para tornar clara a sua intenção de não requerer a prática do mesmo acto simultaneamente em dois processos diferentes.
    26. Cai por terra deste modo, a argumentação de que o ora Recorrente estaria a requerer a duplicação de diligências a incidir sobre um mesmo bem, vincando-se uma vez mais que o objectivo de todas as diligências requeridas pelo ora Recorrente é tão-só e apenas o de obter o mais brevemente possível a satisfação do seu crédito.
    
    Pede, a final, que o recurso seja julgado procedente, (i) prosseguindo-se com os presentes autos, uma vez que já não se encontram reunidos os requisitos previstos no artigo 764º nº 1 do CPC; e consequentemente (ii) seja ordenada a venda judicial da fracção autónoma D6 melhor identificada nos autos, por meio de propostas em carta fechada e bem assim o agendamento de uma data para a realização da mesma.
    Foram colhidos os vistos legais.
    
    III - É do seguinte teor o despacho recorrido:
    “Veio o exequente requerer o prossecução dos presentes autos em relação à fracção autónoma designada por "D6" do prédio registado no C.R.P. sob o n° 21911, a fls. 97 do Livro B106.
    Com efeito, nos autos foi ordenada a penhora sobre a fracção autónoma referida com registo de 19/05/2009.
    Porém, recaindo sobre o mesmo imóvel outra penhora com registo anterior no processo de execução na CV2-08-0045-CEO.
    Perante a dupla penhora sobre o mesmo imóvel, foi ordenada a suspensão dos presentes autos, por despacho de 01/07/2009, nos termos do art. 764° do C.P.C.M ..
    Acontece que no processo supra referido, a execução foi sustada e remetida à conta por pagamento extra-judicial da quantia exequenda.
    Face à sustação daquele processo de execução, entendendo o exequente que os pressupostos de que dependem a aplicação do normativo referido já deixam de subsistir, pedindo o prosseguimento da instância dos autos, procedendo à venda judicial do bem penhorado.
    Em primeiro lugar, não resta dúvida qualquer que se ocorreu os condicionalismos da aplicação do art. 764° do C.P.C., portanto, a execução em relação ao bem acima referido foi suspensa por despacho de 01/07/2009 e em consequência, o próprio exequente reclamou o seu crédito na referida execução nos termos legais.
    O que está em causa é face à eventual extinção do referido processo CV2-08-0045-CEO, é permitido ao exequente a prossecução dos presentes autos já suspensos sobre o imóvel penhorado.
    No nosso entendimento, não se afigura possível nem necessário o prosseguimento da execução sobre o mesmo bem. Senão, vejamos.
    Conforme o disposto do preceito acima aludido, suspende-se a execução quanto ao bem penhorado, o exequente tem direito reclamar o pagamento do seu crédito no processo em que a penhora seja mais antiga.
    Assim, não obstante a sustação de execução, o acto de efectivação do crédito reclamado pelo exequente não fica parado, pois, a lei permite-lhe a deduzir o seu crédito por meio de concurso de credores na execução cuja penhora seja mais antiga.
    Como se ensina o Alberto de Reis, "os credores que triunfaram no concurso vão ocupar no processo de execução uma posição paralela à do exequente; a sentença favorável investe-os na qualidade de co-exequentes, com os mesmos direitos fundamentais que o exequente originário."
    Nem a eventual extinção daquele processo de execução se justifica a prossecução da presente execução suspensa sobre o bem duplamente penhorado.
    Com efeito, dispõe o n.º 2 do art. 814° do C.P.C.M., que "o credor reclamante, cujo crédito seja exigível e tenha sido liminarmente admitido para ser pago pelo produto de bens penhorados que não chegaram entretanto a ser vendidos nem adjudicados, pode requerer, até ao trânsito em julgado da sentença que declare extinta a execução, o seu prosseguimento para efectiva verificação, graduação e pagamento do seu crédito”..
    Portanto, é sempre garantido o direito de obter o pagamento do seu crédito ao credor reclamante na execução em que correm os termos, mesmo que a instância executiva se extinguiu por qualquer causa.
    Assim, havendo procedimentos próprios para o caso invocado pelo exequente, não se vê razão ao exequente para, em vez de renovar da instância do processo referido, vir aí pedir o prossecução da presente execução suspensa.
    Aliás, com o conhecimento oficioso do Tribunal, o exequente já exerce esse direito de renovação da instância da execução, pedindo a proceder à venda do imóvel em causa nos autos CV2-08-0045-CEO, muito embora não haja uma decisão definitiva sobre o pedido, o que é verdade a lei nunca permite o sujeito processual praticar os mesmo actos simultaneamente nos dois processos diferentes.
    Daí se de mostra a falta de razão de ser do seu pedido de exequente.
    Nestes termos e sem demais considerações, indefiro o pedido do exequente.”
    
    IV - FUNDAMENTOS
    1. A questão que ora se coloca é relativamente simples na sua identificação:
    Importa saber se o exequente reclamante (A Bank) numa outra execução (instaurada pelo B), onde foi primeiramente penhorado o mesmo bem, pode pedir o prosseguimento da execução por si instaurada e entretanto sustada ou tem de prosseguir a satisfação do seu crédito na execução onde foi reclamante, em caso desta vir a ser extinta por pagamento do executado ao exequente nessa mesma execução.
    
    2. Atentemos na cronologia do encadeamento processual.
    - Por requerimento executivo de 7 de Maio de 2008, veio o ora recorrente, instaurar contra as executadas “Agência Comercial de Desenvolvimento C Internacional Limitada” e “D”, execução para o pagamento da quantia de MOP$49.641.606,47.
    
- Citadas as executadas, e uma vez que a executada “D”, havia constituído a seu favor uma hipoteca sobre a fracção autónoma designada por “D6” melhor identificada nos (doravante a “Fracção D6”), para garantia do pagamento de uma quantia até MOP$226.380,00 acrescida de juros entretanto vencidos e vincendos à taxa anual de 6% sujeita a flutuação, e acrescida de 3% a título de mora até à data do efectivo reembolso do capital, de despesas judiciais e extrajudiciais a contar no final do processo (MOP$226.380,00 e respectivos acréscimos), foi então convertida a referida hipoteca em penhora da fracção D6.

- Posteriormente verificou-se que sobre a fracção D6 impendia uma penhora anteriormente registada, a favor do B no âmbito da execução que corria termos sob o nº de processo CV2-08-045-CEO.

- Pelo que, nos termos do artigo 764º nº 1 do CPC, os presentes autos em que o ora recorrente A é exequente, foram suspensos quanto à fracção D6, e o ora recorrente foi reclamar o seu crédito garantido pela referida hipoteca na execução instaurada pelo B, por reclamação de créditos apresentada a 27 de Julho de 2009.

- Uma vez que o crédito reclamado, no valor de MOP$226.380,00 e respectivos acréscimos, embora admitido e graduado com prioridade em relação aos demais credores, apenas garantia um valor muito diminuto, quando comparado com a quantia exequenda nos presentes autos, foi nestes requerida pelo ora recorrente A e admitida pelo Tribunal a penhora do remanescente do saldo da venda da Fracção D6, que iria ser efectuada na execução instaurada pelo B/reclamação.

    - Sucede que, na execução instaurada pelo B / Reclamação o exequente B veio posteriormente declarar que havia sido pago pelo montante de que era credor, solicitando a sua consequente extinção, por inutilidade superveniente da mesma.

- Em face deste facto, e ao abrigo do disposto nº 2 do art. 814º do CPC, veio então o ora recorrente solicitar a prossecução da execução instaurada pelo B/Reclamação, e em consequência, a venda judicial da Fracção D6.
    
    - No seguimento deste requerimento, veio o Tribunal, por despacho de fls. 197, ordenar que se procedesse à venda da Fracção D6, e que se publicassem os respectivos anúncios.

- No entanto, a posteriori, o Tribunal voltou atrás com esta decisão, e por despacho proferido a fls. 205 em 19 de Novembro de 2010, anulou o despacho de fls. 197, e consequentemente, a venda da fracção, por entender que não era ainda o momento oportuno para o aí credor reclamante e ora recorrente prosseguir com a execução instaurada pelo B/Reclamação, tendo de aguardar pela prolação do despacho de extinção da instância.

- Perante este indeferimento que frustrou a possibilidade de prosseguir com a execução instaurada pelo B/Reclamação, o ora recorrente, com o intuito de lograr a satisfação dos seus créditos, veio então, por requerimento apresentado nos presentes autos em 17 de Janeiro de 2011 requerer: “(a) a prossecução dos presentes autos, por já não se encontrarem reunidos os requisitos previstos no artigo 764º nº 1 do CPC; e b) que fosse ordenada a venda judicial da Fracção Autónoma “D6” melhor identificada nos autos, por meio de propostas em carta fechada e bem assim o agendamento de uma data para a realização da mesma.”

- Sobre este requerimento recaiu o seguinte despacho de fls. 206 e 207, acima transcrito.

É deste despacho da Meritíssima Juiz a quo que ora se recorre.

3. Estão em causa, nuclearmente, os artigos 764º do CPC:

1. Pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, suspende-se quanto a estes a execução em que a penhora tenha sido posterior, podendo o exequente reclamar o respectivo crédito no processo em que a penhora seja mais antiga; se a penhora estiver sujeita a registo, é por este que a sua antiguidade se determina.
2. A reclamação é apresentada dentro do prazo facultado para a reclamação de créditos; se, porém, o reclamante não tiver sido citado pessoalmente nos termos do artigo 755º, pode apresentar a reclamação nos 15 dias posteriores à notificação do despacho de suspensão.
3. A reclamação suspende os efeitos da graduação dos créditos já fixada e, se for atendida, provoca nova sentença de graduação, na qual se inclui o crédito do reclamante.
4. Na execução suspensa, pode o exequente desistir da penhora relativa aos bens apreendidos no outro processo e nomear outros em sua substituição.
5. Se a suspensão for total, as custas da execução suspensa são graduadas a par do crédito que lhe deu origem, desde que o reclamante junte ao processo, até à liquidação final, certidão comprovativa do seu montante e de que a execução não prosseguiu noutros bens.

E o artigo 814º do CPC:
    
    1. A extinção da execução, quando o título tenha trato sucessivo, não obsta a que a acção executiva se renove no mesmo processo para pagamento de prestações que se vençam posteriormente.
2. Também o credor reclamante, cujo crédito seja exigível e tenha sido liminarmente admitido para ser pago pelo produto de bens penhorados que não chegaram entretanto a ser vendidos nem adjudicados, pode requerer, até ao trânsito em julgado da sentença que declare extinta a execução, o seu prosseguimento para efectiva verificação, graduação e pagamento do seu crédito.
3. O requerimento faz prosseguir a execução, mas somente quanto aos bens sobre que incida a garantia real invocada pelo requerente, que assume a posição de exequente.
4. Não se repetem as citações e aproveita-se tudo o que tiver sido processado relativamente aos bens em que prossegue a execução, mas os outros credores e o executado são notificados do requerimento.


    4. O Tribunal a quo indeferiu o pedido de prossecução dos presentes autos de execução, não ordenando a venda judicial da fracção autónoma D6, por meio de propostas em carta fechada e bem assim o agendamento de uma data para a realização da mesma, com o fundamento de que, apesar de já não se encontrarem reunidos os requisitos do artigo 764º nº 1 do CPC, o ora recorrente deveria prosseguir a sua execução na instaurada pelo B/ Reclamação, atento o disposto no artigo 814º nº 2, não podendo portanto prosseguir com a presente execução, sob pena de se duplicarem as diligências processuais pendentes sobre o mesmo bem.
Afirmando que, nos termos nº 2 do artigo 814º o único processo no qual pode ser requerida a prossecução da execução é na execução instaurada pelo B/Reclamação, conclui ainda que o crédito do ora recorrente em nada fica afectado se assim se proceder.

5. Face à letra da lei, desde logo se colhe que a denominada renovação da execução por extinção, nomeadamente por força do pagamento do executado, faculta aos credores o prosseguimento da execução para satisfação dos seus créditos.
Parece tratar-se de uma faculdade e não de uma imposição, vista a expressão utilizada “pode requerer”.
Daqui resultaria uma de duas: ou requer o prosseguimento da execução ou não; neste caso, ou não requer nada e o seu crédito não fica ali satisfeito ou vai executar o seu crédito noutra execução a intentar ou já anteriormente instaurada e entretanto sustada.
É isto que pretende o recorrente A.
Ora a Mma Juiz assim não entendeu e considerou que o reclamnte A tinha de satisfazer o seu crédito na execução entretanto extinta ou tendencialmente extinta face ao pagamento do executado ao B.

E aquilo que pareceria uma posição sem sentido, face à letra da lei, ancora-se numa argumentação que poderia propender no sentido de se sufragar essa decisão, qual seja a do aproveitamento dos actos processuais inerentes a duas execuções sobre o mesmo bem, evitando outras citações e outros procedimentos que se configurariam como uma duplicação do já feito.

Em todo o caso essa posição parece ser algo draconiana, impondo-se uma solução que a lei não prevê e nem sequer os autores que abordam a questão não a colocam neste termos.

5. A questão colocada na doutrina não é a do reclamante com execução própria sustada ter obrigatoriamente de prosseguir na execução extinta, tal como se decidiu, renovando-a, antes a de saber se os reclamantes a que alude o n.º 2 do artigo 814º do CPC incluem ou não os exequentes que tenham instaurado execução própria e esta tenha sido sustada ao abrigo do artigo 764º, n.º 1 do CPC. De uma forma mais clara, se o A pode renovar a execução do B ou se tem de reabrir a sua execução que se encontra sustada.

Na linha do 1º entendimento, Amâncio Ferreira,1 enquanto diz que há quem sustente que a faculdade de requerer o prosseguimento da execução não pode ser utilizada pelo credor que tenha reclamado o seu crédito com base numa segunda penhora (865º, n.º 5 do CPC português), acrescentando que ele deve requerer o levantamento da suspensão da execução onde se realizou a segunda penhora e procurar nela a satisfação do seu crédito, caso não tenha sido pago na execução em que reclamou.
Não pode perfilhar-se tal ponto de vista: por um lado, por a lei não estabelecer qualquer distinção, encontrando-se todos os credores em pé de igualdade, com possibilidade de o credor da segunda execução invocar, para impulsionar a primeira, a segunda penhora como garantia real (artigo 920º, n.º 2 e 3 do CPC português); por outro lado, uma razão de economia processual aconselha a que se aproveite um concurso de credores já aberto, senão concluído, em vez de se começar um outro na execução onde a penhora correu em segundo lugar.

Mas a esta posição contrapõem Teixeira de Sousa2 e Jacinto Bastos3, os quais, sem desenvolverem os argumentos, se pronunciam no sentido de que esta faculdade de requerer a continuação da execução não pode ser utilizada pelo credor que tenha reclamado o seu crédito com base numa segunda penhora, devendo requerer o levantamento da suspensão da execução onde se realizou a segunda penhora.
E adivinham-se os argumentos desta posição, se não no sentido de tornar obrigatória a reabertura do processo suspenso, pelo menos nessa possibilidade.

6. E esses argumentos são-nos fornecidos exactamente pelas razões aduzidas pelo ora recorrente, respondendo à nossa interrogação sobre qual o interesse do reclamante em querer reabrir o seu processo de execução e não acatar o ter de se sujeitar ao andamento do processo extinto ou tendencialmente extinto.

Alinhemo-los:

- Dado o processo ainda não estar extinto, o que só acontecerá com a prolação da respectiva sentença, que deve ser precedida de remessa à conta, elaboração desta, liquidação, pagamento de custas, se daí não se retira um argumento de celeridade - já que o seu processo (o do A) só poderá prosseguir após o levantamento da penhora no outro processo (o do B) - já poderá fazer relevar o da economia processual;

- Pois que o facto de o A prosseguir a sua execução no bem penhorado na execução do B, onde foi reclamante, tal não implica que a sua execução seja extinta, bem podendo ter de prosseguir noutros bens, donde, ainda aí, não se evidenciar uma evidente economia de meios;

- Ainda, a legitimação do exequente A em prosseguir com a sua execução onde a quantia exequenda é muito superior à reclamada no processo do B, mesmo sobre o bem em causa;

- Imaginando a hipótese de existirem outros credores reclamantes, sendo certo que estes nunca ficariam prejudicados na garantia do seu crédito face à venda do prédio em causa, quer pedissem a renovação da instância no processo do B, quer tivessem de reclamar na execução entretanto reaberta, o A pode ter todo o interesse em não prosseguir na acção reclamada, pois aí só podia fazer-se pagar pelo montante reclamado e não já pelo saldo do produto da venda não coberto pela hipoteca e dado à penhora na sua própria execução;

- Tendo o direito de optar por eventual sacrifício traduzido em menor garantia, se, a repetir-se a citação dos credores, outros viessem reclamar os mesmos ou outros créditos ou até por uma agravada morosidade do procedimento escolhido ou por uma solução que se não traduza em maior celeridade, pois que a sua execução só pode prosseguir, levantada a penhora no outro processo.

Tudo isto configura um acervo de razões que levam a considerar a previsão normativa como uma faculdade concedida ao reclamante, também ele exequente, no sentido de melhor aquilatar sobre o que mais lhe convém.

7. Não há razão nem a lei impõe que o exequente A viesse reclamar o seu crédito na execução do B. Trata-se ainda aí de uma faculdade, como expressamente afirma Lebre de Freitas.4 Nesse caso, não obstante o seu processo ter sido sustado, o que é que impediria este de prosseguir, finda a causa da sustação ou seja a extinção da execução onde se verificou a 1ª penhora? Como se mostra apodíptico este processo não deixaria necessariamente de prosseguir.

    8. Tudo, razões que nos levam a considerar que o recorrente pode optar pelo prosseguimento da penhora do bem em causa na sua execução, não havendo razões que impeçam o seu prosseguimento.

    Nesta conformidade, decidir-se-á no sentido do prosseguimento dos presentes autos de execução, desde que verificado o levantamento da penhora nos autos de execução CV2-08-0045-CEO, não se ordenando a venda nem sua modalidade, por tal não caber a este Tribunal, havendo que prevenir o não pagamento das custas por banda da executada na execução do B, devendo a execução prosseguir sobre o bem em causa no momento oportuno.

    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em conceder parcial provimento ao recurso, e, revogando a decisão recorrida, determina-se o prosseguimento normal da presente execução instaurada pelo recorrente, desde que verificado o levantamento da penhora sob a fracção em causa no processo em que foi exequente o B, CV2-08-0045-CEO, e onde a recorrente reclamou o seu crédito.
    Custas pela recorrente com a taxa mínima.
Macau, 19 de Janeiro de 2012,
_________________________
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Relator)

_________________________
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)


1 - Curso de Processo de Execução, 12ª ed., 2010, Almedina, 422
2 - Acção executiva Singular, Lex, 1998, 417
3 - - Notas ao CPC, IV, comentário ao art. 920º
4 - CPC Anotado, Coimbra Editora, Vol. 3º, 2003, 525
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------

426/2011 1/23