Processo nº 10/2012 Data: 09.02.2012
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “desobediência (qualificada)”.
Pena de prisão de curta duração.
SUMÁRIO
1. Devem-se evitar penas de prisão de curta duração.
2. Porém, censura não merece a pena de 3 meses de prisão aplicada pela prática de 1 crime de “desobediência qualificada” se o arguido, em período anterior não superior a 1 ano, tinha cometido outros dois crimes pelos quais foi condenado em pena de prisão suspensa na sua execução.
O relator,
______________________
José Maria Dias Azedo
Processo nº 10/2012
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. Por sentença em 01.12.2011 proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. decidiu-se condenar A (A), com os sinais dos autos como autor de 1 crime de “desobediência qualificada”, p. e p. pelo art. 92°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, (Lei do Trânsito Rodoviário), e art. 312°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 3 meses de prisão; (cfr., fls. 36 a 36-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
*
Inconformado, o arguido recorreu para, em síntese, afirmar que a dita pena viola o estatuído no art. 40° e 65° do C.P.M.; (cfr., fls. 41 a 45).
*
Respondendo e considerando o recurso manifestamente improcedente, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela sua rejeição; (cfr., fls. 47 a 49).
*
Admitido o recurso, e remetidos os autos a este T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação (fls. 41 a 45 dos autos), o recorrente solicitou a suspensão da execução da pena imposta - a de 3 meses de prisão efectiva, invocando a severidade em demasia dessa pena e a consequente violação de lei traduzida em infringir o disposto nos arts. 40° e 65° do CPM.
Antes de mais, subscrevemos as judiciosas explanações do nosso Exmo. Colega na Resposta (fls. 47 a 49 dos autos) e, no fundo, nada temos, de relevante, a acrescentar-lhes.
*
Em harmonia com os arts.92° n.°1 da Lei n.° 3/2007 ex vi 312° n.°1 do CPM, a moldura penal do crime de desobediência qualificada pelo qual o recorrente foi condenado na douta sentença recorrida é de prisão até 2 anos ou de multa até 240 dias.
Nestes termos, e face aos antecedentes criminais, não se vislumbra a severidade em demasia assacada à pena concretamente aplicada pelo Memo. Juiz a quo, pelo contrário, a qual mostra proporcional às finalidades de prevenção geral e especial.
O próprio art.48° n.°1 do CPM evidencia que a suspensão da pena de prisão depende do preenchimento cumulativo de dois pressupostos: o formal e objectivo traduz em a pena aplicada não ser superior a 3 anos, e o material consubstancia-se na conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Em conformidade com este segmento legal, tal conclusão tem de basear-se em prévias apreciação e valorização, de índole prudente e prognóstico, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da sua conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Importa reter que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (Acórdãos do TSI nos Processos n.° 242/2002, n.° 190/2004 e n.° 192/2004)
Neste caso, os antecedentes criminais da recorrente revela que lhe foram já concedidas várias suspensões da execução das penas, vendo todas afinal frustradas. Ou seja, nenhuma das suspensões logrou o efeito reeducativo e pedagógico.
Tudo isto toma nitidamente previsível que não é adequada para a realização das finalidades da punição a suspensão da execução da pena aplicada na sentença em causa. Daí decorre que o pedido da suspensão de execução fica desprovido de qualquer razão.
Por todo o exposto, pugnamos pela improcedência do presente recurso na sua totalidade”; (cfr., fls. 58 a 59).
*
Cumpre dicidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados os factos enumerados na sentença recorrida, a fls. 35 a 35-v, que não foram impugnados nem se mostram de alterar e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Vem o arguido recorrer da sentença que o condenou pela prática como autor de 1 crime de “desobediência qualificada”, p. e p. pelo art. 92°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, (Lei do Trânsito Rodoviário), e art. 312°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 3 meses de prisão.
E, (apenas) inconformado com a pena que lhe foi decretada, invoca a violação dos art.°s 40° e 65° do C.P.M..
Ora, como em sede de exame preliminar se deixou consignado, é o presente recurso manifestamente improcedente, impondo-se assim a sua rejeição; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).
Vejamos.
O crime pelo recorrente cometido é punido com a pena de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias; (cfr., art. 312°, n.° 2 do C.P.M.).
Por sua vez, e quanto aos “fins das penas” estatui o art. 40° do C.P.M. que:
“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.
E, o também invocado art. 65° que:
“1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3. Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da determinação da pena”.
Em sede da questão da determinação da medida da pena, e atento o estatuído no art. 65° do C.P.M., já teve este T.S.I. oportunidade de afirmar que com o aí preceituado consagrou o legislador de Macau a “Teoria da margem da liberdade” , segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 29.09.2011, Proc. n° 483/2011).
Dos presentes autos resulta que:
- por sentença datada de 06.01.2011, proferida nos autos de processo sumário CR3-11-0002-PSM, foi o arguido condenado pela prática de 1 crime de “condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 2 da Lei n.° 3/2007, na pena de 3 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano; (cfr., fls. 7 a 10);
- por Acórdão de 15.02.2011, foi o mesmo arguido condenado como autor de 1 crime de “homicídio por negligência (grosseira)”, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos e 6 meses, e na suspensão da validade da sua licença de condução por 1 ano; (cfr., fls. 14 a 19).
E, perante isto, evidente nos parece que nenhuma censura merece a decisão recorrida.
De facto, tendo presente o passado criminal do ora recorrente, com duas condenações anteriores, cremos que bem andou o Tribunal a quo ao optar pela pena privativa da liberdade (em detrimento da pena de multa – art. 64°), o mesmo sucedendo com a não substituição ou suspensão da sua execução, (cfr., art. 44° e 48° do C.P.M.).
É verdade que a medida da pena, aplicada – 3 meses de prisão – (abstractamente falando), não constitui obstáculo à sua substituição por multa ou suspensão na sua execução.
Todavia, não nos parece que verificados estejam os “pressupostos materiais” para que nestes termos se viesse a decidir.
Os mencionados antecedentes criminais do ora recorrente, e com eles, a personalidade que revela possuir, (atente-se que as três condenações ocorreram no espaço de 1 ano), inviabilizam, totalmente, uma alteração ou redução da pena fixada.
Com efeito, o ora recorrente insiste em adoptar condutas delinquentes, não obstante os sucessivos “avisos” que lhe foram feitos assim como as várias “oportunidades” que lhe foram concedidas.
Assim, atentas as necessidades de prevenção criminal, excessiva não é a dita pena, e, nesta conformidade, manifesta sendo a improcedência do recurso, há que decidir pela sua rejeição.
É também verdade que se devem evitar penas de prisão de curta duração.
Porém, atentos os antecedentes criminais do ora recorrente, e a personalidade pelo mesmo demonstrada, outra solução cremos não haver.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).
Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.000,00.
Macau, aos 9 de Fevereiro de 2012
(Relator)
José Maria Dias Azedo
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng
(Segunda Juiz-Adjunta)
Tam Hio Wa
Proc. 10/2012 Pág. 14
Proc. 10/2012 Pág. 1