Processo nº 184/2010
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 12 de Janeiro de 2012
ASSUNTO:
- Omissão da pronúncia
- Modificabilidade da decisão de facto
SUMÁRIO:
- Não há omissão da pronúncia quando a decisão que julgou improcedentes os pedidos reconvencionais, não obstante ser sintética, é suficientemente clara no seu texto para dar a conhecer o discurso justificativo da decisão tomada como tem capacidade para esclarecer as razões determinantes.
- Nos termos do nº 1 do artº 599º e do nº 1 do artº 629º do CPCM, este Tribunal de recurso pode alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância quando:
i. Foi cumprido o ónus de impugnação específica da decisão de facto;
ii. Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 599º, a decisão com base neles proferida;
iii. Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; e
iv. Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
O Relator,
Ho Wai Neng
Processo nº 184/2010
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 12 de Janeiro de 2012
Recorrentes: A e B (Autores)
C e D (2º e 3ª Réus)
Recorridos: A e B (Autores)
C e D (2º e 3ª Réus)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
Por Sentença de 16/07/2009, decidiu-se:
- condenar os Réus a reconstruir a parede que separa as fracções autónomas “TR/C” e “UR/C”, no prazo máximo de 30 dias;
- condenar os Réus a desocupar da fracção autónoma “UR/C” e restutuir a mesma aos Autores;
- condenar os Réus C e D a pagar aos Autores a quantia no valor de MOP$3,000.00 por cada mês.
- julgar-se improcedentes os pedidos reconvencionais dos Réus C e D.
Dessa decisão vêm recorrer os Autores, A e B, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
a) Os Recorrentes alegaram que "A ocupação ilícita da fracção acarreta prejuízos aos ora Autores na ordem de MOP5.000,00 (cinco mil patacas) mensais, na medida em que este é o valor mínimo de mercado que se obteria esta fosse dada de arrendamento, tendo em consideração a sua área e sua localização."
b) O facto aqui articulado foi levado à Base Instrutória com a seguinte redacção: " O valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo em consideração a sua área de localização era de MOP5.000,00?"
c) Ao abrigo do n.º 2 do artigo 556.° do Código de Processo Civil, o Tribunal Colectivo respondeu aquele quesito da seguinte forma: "PROVADO que o valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo em consideração a sua localização era de MOP3.000,00."
d) Para fundamentar a resposta ao quesito n.º 6 o Tribunal Colectivo referiu que "A convicção do Tribunal baseou-se [...] no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência, que depuseram com isenção e imparcialidade sobre os quesitos constantes da acta, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais e que tinham conhecimento pessoal, o que permitiu formar uma síntese quanto à veracidade dos apontados factos."
e) Se foi com base nos depoimentos isentos e imparciais prestados por E e F a resposta ao quesito n.º 6 deveria ter sido outra que não aquela que foi dada pelo distinto Colectivo.
f) É da decisão de responder ao quesito n.º 6 da forma a que acima se aludiu que, ao abrigo do disposto no artigo 599.° do Código de Processo Civil. agora se recorre.
g) Lê-se no artigo 556.°, n.º 2 do Código de Processo Civil, que "a decisão proferida declara quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
h) No caso sub judice, o Tribunal a quo fundamentou as suas respostas no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência, que depuseram com isenção e imparcialidade sobre os quesitos constantes da acta (...)", sendo certo que, como já acima se fez referência, sobre a matéria constante do quesito 6.º da Base Instrutória, foram ouvidas apenas as testemunhas E e F.
i) A testemunha E, relativamente à questão que ora nos prende, disse o seguinte:
• "Em 2007, a renda rondaria as 4000 a 5000 patacas por mês. "
• "A renda foi mais alta em 2006 e 2007"
• "Agora [hoje em dia] a renda é de MOP3500,00, m MOP4000,00. "
j) E a testemunha F, questionado sobre os mesmos factos, respondeu da seguinte forma:
• "Naquela altura [2007] o valor de mercado situava-se entre as 4500 e 4800 patacas. "
• "Estimei aqueles valores porque, na altura, em 2007, na minha opinião, o mercado ainda estava bem alto."
• "sim, [actualmente] com redução de 10%, mas só que estou-me a referir que só naquela zona, só naquela zona, não houve uma redução tão brusca, só 10%".
k) Ora, dos trechos dos depoimentos que agora se transcreveram, resulta claro que o valor de mercado do imóvel não foi constante, antes variável. Daí que, o digníssimo Colectivo, ao basear-se no depoimento prestado por estas duas testemunhas para formar a sua convicção e obter "uma síntese quanto à veracidade dos apontados factos" deveria ter atendido a este facto, ou seja, o valor da indemnização a ser fixado tendo por base as rendas que os Autores poderiam ter cobrado e não cobraram por a fracção se encontrar ocupada indevidamente, nunca deveria cingir-se ao montante de MOP3.000,00 por cada mês.
l) Isto porque, ao fazê-lo, o digníssimo Colectivo não teve em consideração que, pelo menos, durante o ano de 2006, 2007 e princípios do ano de 2008, o mercado esteve em franca expansão e a renda de uma fracção comercial naquela zona rondava as 4.500,00/5.000,00 patacas por mês, facto que para além de resultar claramente do depoimento das testemunhas é amplamente conhecido dos residentes de Macau.
m) Mais, 3.000,00 patacas por mês foi um número que nem sequer foi trazido à colação por nenhuma das testemunhas, relativamente a qualquer dos anos em causa, ou seja, entre os anos de 2005 e 2009.
n) Assim, tendo o Tribunal a quo baseado a sua resposta ao quesito 6.º unicamente naqueles depoimentos, provado está que a indemnização a atribuir aos ora Recorrentes nunca poderia ter por base o montante de MOP3.000,00, devendo sempre ser fixado em montante superior a MOP4.000,00 relativamente aos anos de 2006, 2007 e na primeira metade de 2008, e em MOP3.500 a partir daquela data.
o) O Tribunal de Segunda Instância pode alterar a decisão do Tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto dentro dos limites previstos no n.º 1, do artigo 629.º do Código de Processo Civil que contempla as seguintes situações: a) se do processo constarem todos os elementos que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 599.°, a decisão com base neles proferida; b) se os elementos fornecidos pelo processo impuserem uma resposta diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas.
p) Pelo que se requer a V. Ex.as se dignem reapreciar a prova em que assenta a parte agora impugnada, tendo em atenção as alegações dos Recorrentes e, salvo melhor opinião, reescrever a resposta ao quesito em conformidade.
Pedindo no final que seja revogada a sentença nesta parte e substituída por outra que condene os Réus ao pagamento de uma quantia superior a MOP$3.000,00 a título de indemnização.
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Por sua vez, os Réus, C e D também recorreram da decisão final, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. A decisão a quo está ferida das nulidades previstas nas als. c) e d) do n.º 1 do art.º 571.º do Código Civil, padecendo nomeadamente de manifesta omissão de pronúncia, com uma brevíssima referência feita à improcedência dos pedidos reconvencionais dos ora recorrentes (a fls. 388v.), a qual não é de molde a considerar-se suficiente pronúncia sobre a questão. Com efeito,
2. Com a respectiva contestação-reconvenção, os Réus juntaram cópia da decisão anteriormente proferida nos autos que correram termos no então Tribunal de Competência Genérica sob o n.° 32/94. Nessa sentença ficou categoricamente demonstrado que quem detinha a posse do imóvel em questão eram, e sempre tinham sido, os actuais Réus.
3. Este facto foi reafirmado nos presentes autos, e é o sentido a retirar das respostas aos quesitos 16.° e 17.° da base instrutória e o que transparece como sendo o sentido subjacente ao pensamento da decisão a quo, pese embora as conclusões a que a mesma chega (cfr. nomeadamente a fIs. 388).
4. E nestes termos, independentemente da questão de se tratar ou não de posse titulada, a posse dos Réus é, como sempre foi, de boa fé, por óbvia e evidente não aplicação da presunção prevista no n.º 2 in fine do art.° 1184.° do Código Civil (a contrario), pelo que, atento o tempo transcorrido, devem reconhecer-se os Réus como proprietários, por aquisição originária por usucapião, da fracção autónoma em litígio, nos termos e ao abrigo do disposto nos art?s. 1212. ° e 1221.°, 1.ª parte, do Código Civil.
Pedindo no final que seja revogada a sentença recorrida e substituída por outra que os declare como proprietários da fracção autónoma objecto do presente litígio, por usucapião.
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Os Autores responderam à motivação do recurso dos 2º e 3º Réus, nos termos constantes a fls. 448 a 459 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos:
Ficaram provados os seguintes factos na 1ª Instância:
1. Na conservatória do Registo Predial de Macau relativamente à fracção autónoma "UR/C" do rés-do-chão "U", para comércio com sobreloja, com entrada pelo nº 450 do prédio denominado "Bloco V", com os nºs XX da Rua XX e nºs XX da Rua XX, ali descrito sob o nº 21978-V, a fls. 44 do Livro Bl12 está inscrito a favor da Autora mulher, A, sob a inscrição nº 101193G, a aquisição do direito resultante da concessão por arrendamento incluindo a propriedade de construção (alínea a) da Especificação).
2. O primeiro Réu é o proprietário da fracção autónoma "TR/C" do rés-do-chão "T", para comércio, com sobreloja, com entrada pelo nº 448 do prédio denominado "Bloco V", com os nºs XX da Rua XX e n°s XX da Rua XX, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n° 21978-V, a fls. 44 do Livro B 112 e aí inscrito a seu favor sob a inscrição n° 114882G a qual comprou aos 2° e 3ª Réus, por escritura pública de compra e venda outorgada no 1° Cartório Notarial, em 27 de Junho de 2005, e lavrada a fls. 96, do Livro 495D (alínea b) da Especificação).
3. Em 1/02/1989 entre Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, E e sucursal em Macau do Banco XX foi celebrado o contrato de promessa de compra e venda referente à fracção referida em a) o qual consta de fls. 180 e 181 e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea c) da Especificação).
4. Por escritura pública de 26.10.1994 E declarou comprar à Sociedade de Turismo e Diversões de Macau a fracção referida em a) e esta vender, constituindo o primeiro sobre a referida fracção hipoteca a favor do Banco XX tudo nos termos do documento de fls. 182 a 191, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alinea d) da Especificação) .
5. Por escritura pública de 03.05.1995 E constituiu hipoteca sobre a fracção referida em a) a favor do Banco XX SARL nos termos do documento de fls. 192 a 200, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea e) da Especificação) .
6. Pela apresentação nº 98 de 03.11.1997, inscrição nº 34268, na Conservatória do Registo Predial, relativamente à fracção identificada na alinea a) foi inscrita a favor do Banco XX, SARL a aquisição do direito resultante da concessão por arrendamento incluindo a propriedade de construção por arrematação - cfr. fls. 21 - (alínea ee) da Especificação).
7. Por escritura pública outorgada em 25 de Janeiro de 2005, os Autores adquiriram a fracção autónoma "UR/C" ao Banco XX, S.A., pelo montante de MOP$206,300.00 tudo conforme consta de fls. 214 a 216 e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea f) da Especificação).
8. A parede que separa as fracções referidas em a) e b) foi demolida (alínea g) da Especificação).
9. Com o consentimento dos 2° e 3ª Réus, foi demolida a parede que separava as fracções referidas em a) e b) dos Factos Assentes (resposta ao quesito 1º).
10. Os 2° e 3ª Réus passaram assim a utilizar a fracção autónoma referida em a) como se esta fosse parte integrante da fracção b) (resposta ao quesito 2º).
11. Os 2° e 3ª Réus, apesar da venda efectuada ao 1° Réu continuaram a residir nas fracções referidas em a) e b) com o 1º Réu, sem que nenhum deles tenha procedido à construção da parede (resposta ao quesito 3º).
12. O 1° Réu sabia que a fracção referida em a) não era parte integrante da fracção referida em b) (resposta ao quesito 4º).
13. Em 27 de Fevereiro de 2006, os Autores requereram, sem sucesso, a notificação judicial avulsa do 1° Réu, para desocupar e reconstruir a parede de separação das fracções, facto este que pelo menos a 3ª Ré teve conhecimento (resposta ao quesito 5º).
14. O valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo em consideração a sua área localização era de MOP$3,000.00 (resposta ao quesito 6º).
15. Os Autores sabiam que a fracção referida em a) na data que os mesmos afirmaram ter "adquirido", era já ocupada pelos 2º e 3ª Réus (resposta ao quesito 7º).
16. Ali funcionou o respectivo estabelecimento comercial (resposta ao quesito 13º).
17. Tanto a fracção "U" como a fracção "T" foram utilizadas pelos 2º e 3ª Réus (resposta ao quesito 16º).
18. A sobreloja, quer da fracção referida em a) quer da referida em b) dos Factos Assentes foram utilizadas, exclusivamente, pelos 2º e 3ª Réus que aí instalaram a sua residência (resposta ao quesito 17º).
19. O que se manteve até à presente data (resposta ao quesito 18º).
20. Provado o que consta dos documentos de fls. 201 a 209 (resposta ao quesito 19°).
21. Os Réus tiveram conhecimento que a fracção identificada em a) havia sido penhorada e que ía ser vendida em hasta pública (resposta ao quesito 20°).
22. Os funcionários do Banco XX e a fiel depositária nomeada foram ao local comunicar aos Réus que deviam desocupar o imóvel imediatamente (resposta ao quesito 21°).
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III – Fundamentos
Do recurso dos 2º e 3ª Réus:
Para os 2º e 3ª Réus, a decisão recorrida “está ferida das nulidades previstas nas als. c) e d) do n.º1 do art.º 571.º do Código Civil, padecendo nomeadamente de manifesta omissão de pronúncia, com uma brevíssima referência feita à improcedência dos pedidos reconvencionais dos ora recorrentes (a fls. 388v.), a qual não é de molde a considerar-se suficiente pronúncia sobre a questão”.
Não lhes assiste qualquer razão.
Veja-se, não obstante ser sintética, a decisão que julgou improcedentes os pedidos reconvencionais dos referidos Réus é suficientemente clara no seu texto para dar a conhecer o discurso justificativo da decisão tomada como tem capacidade para esclarecer as razões determinantes. Dela resulta que foram julgados improcedentes os pedidos reconvencionais por não haver nenhum facto provado que seja capaz de conduzir à usucapião, além de ter dado por provado a ocupação ílicita dos 2º e 3ª Réus e consequentemente condenado os mesmos Réus à restituição do imóvel em causa e indemnizar os Autores.
Não há, portanto, a alegada nulidade por omissão de pronúncia, pelo que o recurso dos 2º e 3ª Réus não deixa de ser improcedente.
II. Do recurso dos Autores:
Os Autores vêm impugnar a decisão da matéria de facto, mais concretamente a resposta ao quesito 6º da Base Instrutória, e o quantum indemnizatório.
O quesito 6º tem a seguinte redacção:
“O valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo sem consideração a sua área de localização era de MOP$5.000,00?”
O tribunal a quo considerou provado que “O valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo sem consideração a sua área de localização era de MOP$3.000,00”.
Em cumprimento do disposto do nº 2 do artº 599º do CPCM, os Autores indicaram as seguintes passagens da gravação:
a) A testemunha E:
(localização do depoimento da testemunha no CD [003] [00:00 – 09:01])
[04:18 a 04:27] “Em 2007, a renda rondaria as 4000 a 5000 patacas por mês.”
[05:27 a 05:35] “está localizada numa zona habitacional, junta a zona de Areia Preta”
[05:45 a 05:55] “a loja em frente está localizada a Escola XX”
[06:09 a 06:19] “para já, a loja está localizada em frente uma paragem de autocarro”
[06:22 a 06:30] (e, termos de avaçoação) “são indícios que se agente avaliam para o valor da renda da casa”
[07:45 a 07:58] “a renda foi mais alta em 2006 e 2007”
[08:02 a 08:10] “Agora [hoje em dia] a renda é de MOP3500,00, máximo MOP4000,00.”
[8:15 a 8:58] “Em 2007, naquele bairro, não consegues arrendar um apratamento por 2500 patacas e uma loja vale mais ou menos o dobro da renda de um apartamento [residencial]. Portanto, em 2007 se uma pessoa quer arrendar no mesmo prédio uma fracção, tem que gastar duas mil e tal patacas só para arrendar um apartamento e agora para uma loja – fracção comercial – ponderamos mais ou menos o dobro do valor da renda de um apartamento.”
b) A testemunha F:
(Localização do depoimento da testemunha no CD [008 a 015])
[008] [00:00 a 00:32] “Naquela altura [2007] o valor de mercado situava-se entre as 4500 e 4800 patacas”
[010] [00:00 a 01:03] “Estimei aqueles valores porque, na altura, em 2007, na minha opinião, o mercado ainda estava bem alto.”
[011] [00:00 a 00:52] “de forma em geral, houve uma redução, na minha opinião profissional, julgo que houve uma redução de 10%”
[012] [00:00 a 00:57] “sim, com reducção de 10%, mas só que estou-me a referir que só naquela zona, só naquela zona, não houve uma redução tão brusca, só 10%.”
Ora, tendo em conta os depoimentos acima transcritos das duas únicas testemunhas que foram inquiridas sobre aquela matéria de facto e inexistindo nos autos outros elementos sobre a mesma matéria, entendem os Autores que está provado que o valor mínimo da renda da fracção autónoma em causa é superior a MOP$4.000,00 nos anos de 2006, 2007 e na primeira metade de 2008 e é MOP$3.500,00 a partir desta última data.
Quid iuris?
Nos termos do nº 1 do artº 599º e do nº 1 do artº 629º do CPCM, este Tribunal de recurso pode alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância quando:
v. Foi cumprido o ónus de impugnação específica da decisão de facto;
vi. Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 599º, a decisão com base neles proferida;
vii. Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; e
viii. Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
No caso em apreço, procedida à audição da gravação do depoimento das testemunhas em causa, cremos que os Autores têm razão.
De facto, o montante de MOP$3.000,00 por mês é um valor que não foi trazido à colação por nenhuma das testemunhas ou por outros elementos probatórios existentes nos autos, pelo que não pode ser dado como assente.
Nesta conformidade e após a análise crítica do depoimento das duas testemunhas em causa, entendemos que o quesito 6º deve ser provado pela forma seguinte:
“O valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo sem consideração a sua área de localização era de MOP$4.000,00/mês nos anos de 2005, 2006, 2007 e primeiro semestre de 2008, e MOP$3.500/mês a partir desta última data”.
Face à supra modificação de facto, torna-se inevitável a revogação da condenação do pagamento da indemnização por parte dos 2º e 3ª Réus, passando a condenar os mesmos a pagar nos seguintes termos:
- MOP$4.000/mês, entre o período 25/01/2005 a 30/06/2008.
- MOP$3.500/mês, a partir de 01/07/2008 até à efectiva entrega da fracção autónoma; e
- Juros de mora calculados nos termos legais.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
- negar provimento ao recurso dos 2º e 3ª Réus;
- dar por provado o quesito 6º da Base Instrutória pela forma seguinte:
“O valor mínimo de mercado que se obteria se a fracção referida em a) fosse dada de arrendamento, tendo sem consideração a sua área de localização era de MOP$4.000,00/mês nos anos de 2005, 2006, 2007 e primeiro semestre de 2008, e MOP$3.500/mês a partir desta última data.”
e
- conceder provimento ao recurso dos Autores, revogando a sentença recorrida na parte da condenação do pagamento da indemnização por parte dos 2º e 3ª Réus, passando a condenar os mesmos Réus a pagar aos Autores, a título de indemnização, nos termos acima consignados.
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Custas pelos 2º e 3ª Réus em ambas as instâncias.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 12 de Janeiro de 2012.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
1
184/2010