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Processo nº 744/2011
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Fevereiro de 2012

ASSUNTO:
- Modificabilidade da decisão de facto
- Citação
- Artº 187º do CPCM

SUMÁRIO:
- Nos termos do nº 1 do artº 599º e do nº 1 do artº 629º ambos do CPCM, este Tribunal de recurso pode alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância quando:
i. Foi cumprido o ónus de impugnação específica da decisão de facto;
ii. Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 599º, a decisão com base neles proferida;
iii. Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; e
iv. Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
- A citação, ainda que seja efectuada em pessoa diversa do citando, produz os seus efeitos, tanto processuais como substantivos, desde a data da assinatura do aviso de recepção.
- A advertência ou comunicação exigida pelo artº 187º do CPCM não é mais do que uma formalidade complementar com vista a informar ao citado a data e o modo por que a citação se considera realizada, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada.
O Relator,

Ho Wai Neng








Processo nº 744/2011
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Fevereiro de 2012
Recorrentes: A e B (Réus)
Recorrido: C (Autor)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 18/05/2011, decidiu-se:
- julgar parcialmente procedente a acção ordinária intentada pelo Autor C contra os Réus, e condenar os Réus a pagar ao Autor a quanita de HKD$2.300.000,000, convertível em MOP$2.372.450,00.
- julgar improcedente a reconvenção deduzida pelos Réus, alsolvendo o Autor do pedido reconvencional.
Dessa decisão vêm recorrer os Réus, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. Os ora recorrentes vem impugnar a decisão de facto constante da douta decisão recorrida, designadamente as respostas negativas respeitantes aos quesitos 21º, 23º, 27º e 28º da base instrutória, invocando, a propósito, que o Tribunal a quo não valorou os depoimentos prestados em sede de julgamento das testemunhas arroladas por aqueles em conjugação com os documentos de fls. 41 a 72 dos autos, elementos probatórios esses que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida no sentido da mesma matéria dever ser considerada provada.
2. O presente recurso tem assim por objecto a reapreciação da prova gravada no que concerne ao depoimento daquelas testemunhas - únicas testemunhas que se debruçaram sobre a matéria em causa - e, bem assim, a reapreciação dos referidos documentos, tendo em vista impugnar a decisão de facto acima elencada.
3. Aliás, o TJB poderia ter decidido dessa forma socorrendo-se aoregime previsto nos artigos 342 ° e 344° do Cód. Civil em que se permite que o juiz, com base nas presunções judiciais ou hominis, simples ou de exercício, a partir de um facto conhecido (base da presunção), poder concluir presuntivamente pela existência de um facto desconhecido (facto presumido), servindo-se para o efeito dos seus conhecimentos e das regras da experiência da vida, nos juízos correntes de probabilidade, e dos princípios da lógica, desde que, se esteja perante um caso em que é admissível a prova testemunhal (art.os 387° e 388° do Cód. Civil), tal como sucede no caso presente.
4. A recorrente imputa assim a existência de erro de decisão no tocante às respostas dadas aos quesitos 21°, 23°, 27° e 28° porquanto os elementos de prova acima mencionados constantes do processo deveriam ter implicado uma realidade diferente da que resulta das respostas que foi dada à mesma matéria pelo tribunal recorrido, sendo certo que essas provas não são minimamente infirmadas por outros elementos probatórios constantes dos autos.
5. É que, não obstante o princípio da livre apreciação das provas, a naálise daqueles elementos de prova, em estrito respeito do critério de objectividade e das regras da experiência comum, impôem a alteração da matéria de facto a que chegou o tribunal Colectivc da 1ª instância, em particular a referente aos quesitos 21°, 23°, 27º e 28º nos termos supra propostos.
6. Por conseguinte, a alteração da matéria de facto deverá no caso presente ter lugar porquanto, como se viu, existem elementoE dos autos que a determinam muito claramente, não se limitando esses meios de prova a sugerir respostas diferentes das que foram dadas pelo Tribunal Colectivo mas, antes, determinando de forma clara e evidente uma modificação da decisão de facto nos termos pretendidos pelos ora recorrentes, sem deixar qualquer dúvida ou interpretação alternativa.
7. Em suma, as provas acima assinaladas são claras e evidentes ao ponto de determinarem respostas diferentes das que foram dada aos quesitos em causa, conduzindo à conclusão que a convicçã do Tribunal de 1.ª instância relativamente aos quesitos em questão assentou em erro flagrante e que a decisão de facto não pode subsistir.
8. Mostrando-se provada a matéria constante dos quesitos 21º, 23º, 27º e 28º, é processual e substancialmente admissível o pedido reconvencional formulado pelos recorrentes de que seja o recorrido condenado a pagar aos primeiros a importância de RMB2,291,437.77, equivalente a MOP$2,656,922,09, acrescido dos juros de mora calculados desde a data da notificação do recorrido quanto à contestação apresentada pelos recorrentes até integral pagamento.
9. E que, consequentemente, seja a excepção da compensação julgada procedente e, por via disso, serem os recorrentes absolvidos do pedido e o recorrido, por sua vez, ser condenado a pagar aos primeiros a diferença entre o valor do (contra) crédito dos recorrentes para com o recorrido e o valor do crédito do recorrido para com aqueles,
10. Decorre do artigo 838º do Código Civil que há compensação quando um devedor que seja credor do seu próprio credor se libera da dívida à custa do seu crédito, tratando-se, no fundo, de um meio de o devedor se livrar da sua obrigação, por extinção simultânea do crédito equivalente de que disponha sobre o seu credor.
11. No caso presente, verificam-se todos os requisitos necessários para operar a compensação pretendida pelos recorrentes (v., artigos 838º, nºs 1 e 2, 839°, n° 1 e 842°, nºs 1 e 2, todos do Código Civil) tomando em conta que:
* os titulares dos créditos e dos débitos recíprocos em causa são precisamente os recorrentes (na qualidade de devedores compensantes) e o recorrido (na qualidade de credor compensado);
* o crédito dos recorrentes, autores da compensação, é judicialmente exigível;
* as prestações são fungíveis e homogéneas visto que o que estão em causa são créditos pecuniários;
* não existe qualquer exclusão, por lei, da compensação pretendida; e, por fim,
* a declaração da compensação ao recorrido foi feita pelos recorrentes a coberto da contestação apresentada nestes autos.
12. Conclui-se assim que a reconvenção deduzida deverá proceder tomando em conta que o contracrédi to reclamado pelos recorrentes excede o montante do crédito peticionado pelo recorrido, assistindo assim aos recorrentes o direito de receber a diferença entre um e outro crédito.
13. Por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá ainda que a sentença posta ora em crise encerra um lapso que importa corrigir ao ter condenado os recorrentes em juros de mora, à taxa legal, contabilizados a partir de 12/06/2009 até integral e efectivo pagamento, com base no pressuposto errado de que foi naquela data que os mesmos foram citados para a presente acção judicial.
14. Termos em que se requer a V. Exas. se dignem ordenar que os referidos juros de mora sej am contabilizados a partir das datas (17/06/2009 e 22/06/2009) em que efectivamente os recorrentes foram citados.
Pedindo no final que seja revogada a decisão recorrida e substituída por outra que absolva os Réus do pedido do Autor e julgue procedente o pedido reconvencional.
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O Autor respondeu à motivação do recurso dos ora recorrentes, nos termos constantes a fls. 207 a 210 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso ora interposto.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Fica assente a seguinte factualidade pela 1ª Instância:
1. No dia 30 de Dezembro de 2002, os RR. celebraram a escritura de compra e venda para aquisição da fracção autónoma BMR/C, identificada na certidão do doc. 5 junto com a petição inicial. (A)
2. O A. emitiu um cheque a favor dos RR., sacado sobre a conta da sua empresa em nome individual, “XXX Trading Company” (XXX貿易行), no valor de HKD$2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil dólares de Hong Kong). (B)
3. O cheque foi depositado, nesse mesmo dia, na conta dos RR. em dólares de Hong Kong, no “Luso International Banking Ltd.”, com o n.º 10621-203705-5. (C)
4. Enquanto casado com a irmã dos RR., o A. sempre manteve com os RR., uma óptima relação familiar. (1º)
5. Os RR., no ano de 2002, solicitaram ao A. um empréstimo de HKD$2.300.000,00 (dois milhões e trezentos mil dólares de Hong Kong), com a finalidade de adquirirem um imóvel na R.A.E.M. e assim aqui fixarem residência temporária ao abrigo das disposições legais então vigentes. (2º)
6. Tal empréstimo concretizou-se em 18 de Novembro de 2002. (3º)
7. No dia 20 de Novembro de 2002, os RR. solicitaram por escrito, no Banco Luso Internacional Banking Ltd, a emissão de um cheque visado (cashier order), no valor de HKD$2.256.000,00 (dois milhões, duzentos e cinquenta e seis mil dólares de Hong Kong), o qual foi emitido, nessa mesma data, em nome de Sociedade de Importação e Exportação XXX, limitada (XXX洋行有限公司). (4º)
8. Na posse de tal cheque, os RR., também nesse mesmo dia, assinaram com a Sociedade de Importação e Exportação XXX, limitada (XXX洋行有限公司) um contrato-promessa de compra e venda de uma fracção autónoma, para comércio, designada por “BMR/C”, do prédio urbano denominado “Polytex Garden” – Lote “O”. (5º)
9. Os honorários do notário privado onde a escritura foi outorgada, no valor de MOP$3.000,00 (três mil patacas) foram pagos em nome dos RR. (6º)
10. O A. liquidou o imposto de selo de tal transmissão, no valor de MOP$73.197,00 (setenta e três mil cento e noventa e sete patacas), tendo para o efeito sido emitido um cheque sacado sobre a sua conta no “Luso International Banking Ltd.”. (7º)
11. Ficou, então, acordado entre o A. e os RR. que, face ao relacionamento familiar, o empréstimo em causa não venceria juros. (8º)
12. Os RR. permitiram que o A. ficasse na posse da fracção. (9º)
13. Entretanto, o divórcio entre o A. e a irmã dos RR., Ieong Lai Son, motivou um completo corte de relações entre o A. e os RR. (11º)
14. Foi pedido aos RR. para assinar uma procuração a favor do A. (12º)
15. Os RR. recusam-se a restituir ao A. a quantia mutuada. (13º)
16. O A., entretanto, mantém-se na posse da fracção referida, onde, aliás, tem centrada a sua actividade comercial. (14º)
17. Face ao não pagamento da quantia mutuada, o A. recorreu às instâncias judiciais. (15º)
18. Em 13 de Agosto de 2003, o A. assinou um contrato-promessa de compra e venda através do qual o mesmo prometeu comprar a fracção autónoma designada por C1702 do 17º andar 02號房, do prédio denominado XX苑 – XX閣, sito na Cidade de Zhuhai, XX路XX號. (18º)
19. De acordo com o referido contrato, o A. obrigou-se a pagar ao vendedor:
a o sinal no montante de RMB20.000,00, no momento da celebração do contrato-promessa;
b uma parte do preço, no montante de RMB387.411,00, até 28 de Agosto de 2003;
c o remanescente do preço, no montante de RMB901.000,00, no prazo a convencionar entre as partes. (19º)
20. Em cumprimento da promessa em causa, o A. celebrou, em 22 de Setembro de 2003, o contrato definitivo de compra e venda do imóvel. (20º)
21. Em 12 de Setembro de 2003, a filha do A. D celebrou um contrato de compra e venda através do qual comprou a fracção autónoma designada por C2202, do prédio denominado XX苑 – XX閣, sito na Cidade de Zhuhai, XX路XX號. (25º)
22. O preço do imóvel no montante de RMB$1.341.318,00 foi em 19 de Julho de 2004, pago ao vendedor 珠海巿XX發展有限公司, por conta da D. (26º)
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III – Fundamentos
Os Réus vêm impugnar a decisão da matéria de facto quanto aos quesitos 21º, 23º, 26º, 27º e 28º da Base Instrutória, que, no seu entender, os mesmos devem ser dados como provados.
Quid iuris?
Os quesitos em causa prendem-se em apurar se os Réus pagaram, por conta do Autor, numa quantia total de RMB2.291.437,77, para aquisição de duas fracções autónomas na cidade de Zhuhai.
Os Réus, para sustentar a sua posição, indicaram os seguintes meios probatórios:
- os depoimentos das testemunhas D, E, F G; e
- os documentos juntos à contestação.
O tribunal a quo julgou por não provada a matéria fáctica alegada pelos RR. por entender que:
“No que respeita à alegada compensação de dívidas suscitadas pelos RR., nenhuma prova permita chegar tal conclusão. De facto, apenas foi dito pelas testemunhas dos RR. que os preços das fracções da China foram pagos pelos últimos, mas nenhum documento nos autos permita vingar a tese dos RR., pelo contrário, os comprovativos de pagamento dos preços das fracções da China foram apenas emitidos a favor do A. e da sua filha”.
Nos termos do nº 1 do artº 599º e do nº 1 do artº 629º ambos do CPCM, este Tribunal de recurso pode alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância quando:
v. Foi cumprido o ónus de impugnação específica da decisão de facto;
vi. Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 599º, a decisão com base neles proferida;
vii. Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; e
viii. Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
Ouvida a gravação do depoimento das testemunhas indicadas e analisados os documentos em causa, não se nos afigura que esses meios probatórios sejam suficientes para destruir a livre convicção do tribunal a quo.
Como é sabido, a prova testemunhal não é uma prova de força probatória plena, daí que está sujeita à livre apreciação do julgador.
No caso em apreço, o que está em causa é uma quantia superior a dois milhões de RMB, sendo certo ainda que a nota mais elevada de RMB é apenas de $100,00.
E segundo as regras de experiência comum, não é habitual alguém aguardar grande quantidade de numerário em mão (mais de vinte mil notas de cem para o caso).
Ora, os Réus não lograram juntar aos autos qualquer prova documental da movimentação das quantias que alegaram ter pago em nome do Autor.
Vamos agora para a análise dos documentos juntos com a contestação.
Contrariamente o que alegam os Réus., não foi o 1º Réu, A quem assinou o contrato promessa de compra e venda da fracção autónoma “C1702”, mas sim um indivíduo cuja assinatura é ilegível que assinou na parte do promitente comprador (fls. 41 dos autos).
É certo que do referido contrato chegou a constar o 1º Réu como promitente comprador, só que o seu nome foi trancado e substituído pelo nome do Autor C. O mesmo aconteceu com o recibo do pagamento do sinal (fls. 53 dos autos).
Também é certo que se acrescentou no aludido contrato promessa o seguinte conteúdo:
“2003年9月22日付款方式改為一次性付款,折扣為9.8%*9.8%,折合總價:1275397,折合單價:6317.60,2003年9月22日付清全部房款。”
em português, salvo melhor tradução:
“Em 22/09/2003, altera-se a forma de pagamento para um único pagamento mediante o desconto de 1.2%*1.2%. O preço global depois do novo desconto é de $1.275.397,00, correspondente a $6.317,60/m2. Foi pago integralmente o preço em 22/09/2003”.
Não obstante o 1º Réu ter posto a sua assinatura e impressão digital debaixo destas frases e chegar a ser figurado como promitente comprador, tais factos não fazem prova directa e firme que foram ele e o 2º Réu que pagaram o preço desta fracção, pois das frases em causa não resulta de forma inequívoca este sentido.
Em relação à outra fracção autónoma, não consta dos autos qualquer prova documental a favor dos Réus.
Por outro lado, a própria versão da defesa dos Réus é pouco convincente.
Veja-se:
Defenderam em primeiro lugar que em Novembro de 2002 o Autor lhes doou a quantia de HKD$2.300.000,00 e pagou os honorários do notário privado e o imposto de selo pela aquisição do imóvel a título meramente gratuito, sem no entanto alegarem os motivos da doação e do pagamento gratuito.
Depois, alegaram que eram credores do Autor no valor de $2.291.437,77 RMB, com juros vencidos à data da contestação no valor MOP$990.449,00, resultante do pagamento do preço das fracções acima expostas, cujo reembolso ficou acordado que seria efectuado no prazo de um ano. Em consequência, reclamaram, a título de pedido reconvencioal, o pagamento das quantias em causa, com juros de mora vencidos e vincendos até ao integral pagamento.
Por fim e a título subsidiário, requereram a devida compensação caso se entenda existir o crédito do Autor.
Partindo do pressuposto da existência de créditos e dívidas mútuas, não se compreende por que razão os Réus não compensaram desde logo aquando do pagamento do preço das fracções autónomas e acordaram ainda por cima com o Autor para este reembolsar um ano depois.
Se só existir o crédito dos Réus conforme foi alegado pelos mesmos, também não se percebe a razão pela qual estes nunca reagiram judicialmente contra o Autor para o reaver desde o seu vencimento (no ano de 2004) e somente em sede da presente acção (interposta pelo Autor em 2009) é que formularam o pedido reconvencional para o efeito.
Repare-se, este “pedido reconvencional” (reaver pura e simplesmente o alegado crédito) nem é legalmente admissível nos termos do nº 2 do artº 218º do CPCM.
Ora, em face das dúvidas suscitadas, é razoável e correcto que o tribunal a quo exija provas mais firmes para comprovar a versão dos Réus, não bastando somente a prova testemunhal.
Pelo exposto, se conclui que a decisão da matéria de facto recorrida não merece qualquer censura ou reparação, pois não foi detectada que a mesma foi feita com violação das regras legais da prova ou da experiência da vida comum.
Improcede assim a impugnação da decisão da matéria de facto.
Com a inalteração da matéria de facto fixada, a decisão recorrida não merece de qualquer censura ou reparação, visto que ficaram provados os factos constitutivos do direito de crédito alegado pelo Autor e não provados os factos constitutivos da reconvenção dos RR..
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Impugnaram os Réus também o início da contagem dos juros de mora fixado na sentença recorrida por entender existir erro na data citação, que deve ser o dia 22/06/2009 e não 12/06/2009, na medida em que a citação do 2º Réu B foi feita em pessoa diversa, pelo que ele só deve ser considerado como citado com a advertência a que se alude o artº 187º do CPCM.
Não lhes assiste a razão.
Em primeiro lugar, cumpre dizer que os avisos de recepção das cartas de citação dos Réus ambos foram assinados em 12/06/2009 e não em 17/06/2009 como foi alegado pelos Réus na motivação do presente recurso; o dia 17/06/2009 é a data da remessa dos aviso de recepção ao tribunal a quo e não a data da assinatura dos mesmos (fls. 32 e 33).
Nos termos do nº 4 do artº 180º do CPCM, prevê que “Nos casos expressamente previstos na lei, é equiparada à citação pessoal a efectuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve conhecimento”.
Por sua vez, o nº 2 do artº 182º do mesmo Código dispõe que “No caso de citação de pessoa singular, a carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de recepção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando”.
Por fim, estabelece o artº 187º do mesmo Código que “Sempre que a citação se mostre efectuada em pessoa diversa do citando nos termos do nº 2 do artigo 182º e do nº 2 do artigo anterior, ou tenha consistido na afixação da nota de citação nos termos do nº 3 do artigo anterior, é ainda enviada carta registada ao citado, comunicando-lhe a data e o modo por que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada” (o mais carregado e sublinhado são nossos).
Pelo teor das normas acima transcrito, facilmente se conclui que a citação, ainda que seja efectuada em pessoa diversa do citando, produz os seus efeitos, tanto processuais como substantivos, desde a data da assinatura do aviso de recepção.
A advertência ou comunicação exigida pelo artº 187º do CPCM não é mais do que uma formalidade complementar com vista a informar ao citado (repare-se, o legislador utiliza a palavra “citado” em vez de “citando”) a data e o modo por que a citação se considera realizada, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada.
Não se trata duma nova citação, mas sim uma mera comunicação suplementar destinada a confirmar a citação já realizada.
No mesmo sentido e a título do direito comparado, veja-se o Ac. da Relação de Porto, de 08/11/2004, referenciado no CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, ABÍLIO NETO, 21ª EDIÇÃO ACTUALIZADA, pág. 380, anotação nº 4 do artº 241º.
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Tudo ponderado, restam decidir.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
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Custas do recurso pelos Recorrentes.
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Notifique e registe.
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RAEM, aos 23 de Fevereiro de 2012.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong



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