Processo nº 99/2012
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 01 de Março de 2012
ASSUNTO:
- Duração máxima da incapacidade temporária
- Artº 49º, nº 1 do DL nº 40/95/M
- Cura clínica
SUMÁRIO:
- O nº 1 do artº 49º do DL nº 40/95/M não fixa o limite temporal máximo para efeitos do cálculo do quantum indemnizatório da incapacidade temporária, já que o legislador limita-se a estabelecer uma presunção juris tantum da incapacidade permanente se a temporária persistir superior a 24 meses.
- Se, decorrido o período de 24 meses, persistir a incapacidade por não verificação da cura clínica, essa incapacidade ainda continua a ser tida por temporária, não se extinguindo consequentemente o direito à indemnização por incapacidade temporária.
- Nos termos do artº 12º do DL nº 40/95/M, considera-se que há cura clínica quando as lesões ou a doença desapareceram totalmente ou se apresentam como insusceptível de modificação com adequada terapêutica.
O Relator,
Ho Wai Neng
Processo nº 99/2012
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 01 de Março de 2012
Recorrente: Companhia de Seguros C, S.A. (Ré)
Recorrido: B (Autor)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
Por sentença de 17/11/2011, decidiu-se condenar a Ré a pagar ao Autor as seguintes quantias:
- MOP$324.000,00, a título de incapacidade permanente com o coeficiente de 20%;
- MOP$291.300,00, a título de incapacidade temporária, correspondentes a 971 dias.
Como a Ré já liquidou a quantia de MOP$156.600,00, ficando por pagar apenas o montante de MOP$458.700,00 por pagar.
Dessa decisão vem recorrer a Ré, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
a) O nº 1 do artigo 49° do decreto-Lei nº 40/95/M, de 14 de Agosto, prevê a conversão automática do período de Incapacidade Temporária (IT) que exceder os 24 meses em Incapacidade Permanente (IP)
b) O direito de indemnização por IT nasce com o acidente de trabalho e cessa com o momento da cura clínica.
c) A cura clínica tem-se por verificada logo após o decurso do período de 24 meses, a menos que resulte provado ser anterior.
d) A razão de ser do comando legal supra referido é proporcionar ao sinistrado tratamento adequado e atempado.
e) Ora, é a interpretação daquele normativo propugnada pela recorrente que se coaduna com os valores assim coroados pelo legislador, enquanto que a interpretação veiculada na douta sentença recorrida antes colide com esses mesmos valores.
f) O nº 1 do art.49° do DL 40/95/M, de 14/8, corresponde ao antigo nº 1 do art.37 do DL nº 78/85/M, de 10/8, diploma este que antecedeu o primeiro e que por ele foi revogado.
g) O n° 3 do mesmo art. 37° previa expressamente que em caso da conversão a que aludia o nº 1, o montante indemnizatório a título de IT que já houvesse sido liquidado pela entidade civilmente responsável seria deduzido do montante indemnizatório arbitrado a título de incapacidade permanente.
h) Tal previsão não consta da redacção em vigor porque o legislador considerou desnecessária uma previsão expressa, atento o seu carácter tão óbvio quanto pacífico na doutrina e jurisprudência sobre o tema.
i) Um entendimento diverso dá origem a uma sobreposição de indemnizações despoletando uma situação de enriquecimento sem causa a favor do sinistrado, com o correlativo empobrecimento da entidade civilmente responsável.
j) O montante indemnizatório que diz respeito a uma determinada IP depende apenas da sua gravidade, traduzindo-se num determinado coeficient previsto na tabela de Incapacidades, anexa ao DL 40/95/M, de 14/8.
k) Já o montante a arbitrar a título de IT depende não só do grau de incapacidade, mas também do período de tempo durante o qual aquela se regista.
l) Embora por vias diversas, o legislador estabeleceu limites máximos para ambas realidades
m) Para a indemnização derivada de IP o legislador optou por limites quantitativos de uma forma exacta, susceptíveis de actualização.
n) Para a indemnização decorrente de ITA, o legislador optou, exactamente, por limites traduzidos numa moldura temporal, criando o mecanismo previsto no nº 1 do art.49° do DL 40/95/M, de 14/8, ou seja, por estabelecer um período máximo concreto de 24 meses quanto á duração da IT.
o) A parte da decisão que constitui objecto do presente recurso, viola aquele mesmo comando legal.
p) De igual forma, a douta sentença deu como provado que o Autor sofreu uma incapacidade Absoluta Temporária para o Trabalho de 17 de Outubro de 2008 a 14 de Junho de 2011.
q) Ora, nos termos do n° 5 da Ordem Executiva nº 41/2008 "O salário do dia em que ocorrer o acidente de trabalho está a cargo do empregador".
r) Também aqui, deveria ter sido reflectida esta realidade e nestes termos o início da incapacidade temporária absoluta deveria operar, não no dia 17 de Outubro de 2008 (data do sinistro), mas antes, dia 18 de Outubro de 2008.
s) Pelo que, se deveria ter operado o desconto deste dia trabalho uma vez que o mesmo corre por conta da entidade patronal.
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O Autor respondeu à motivação do recurso da Ré nos termos constantes a fls. 459 e 460 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso..
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Ficaram provados os seguintes factos:
1. 2008年10月17日上午約11 時30分,在......地盤第…座…牆…樓內工作時,發生了工作意外而引致法醫報告所形容之侵害(第340頁及第346頁,在此視為全部轉錄)。意外時日薪為澳門幣肆佰伍拾圓(MOP450)。
2. 涉及本次事故的工程是由......澳門股份有限公司分判給......澳門有限公司,......再分判給......裝飾工程,......建築(澳門)有限公司則為該地盤之建築持牌人,而傷者是由......裝飾工程公司直接聘請的。
3. 已將本意外所引致的負擔的責任轉移至C保險有限公司。
4. C保險有限公司接受此為一宗工作意外,認同意外與損害間存有因果關係。
5. 上述保險公司已向傷者支付了澳門幣93,397元及澳門幣3,331元作為醫藥費開支,工人至今收取了保險公司支付的432天傷假工資賠償,即澳門幣129,600元以及澳門幣27,000元作90天傷假工資賠償。
6. 鑑定人作出會診報告(第428頁在此視為全部轉錄)評定傷者的長期部分無能力為20%,暫時絕對無能力由2008年10月17日至2011年6月14日。
Factos provados ao abrigo do disposto do artº do 5º do CPCM:
- Em 07/01/2011, o médico do Hospital Kiang Wu da RAEM atestou que o Autor sofre uma incapacidade permanente com o coeficiente de 20% (fls. 344 dos autos).
- Em 13/01/2011, o médico legal também atribuiu o mesmo coeficiente de incapacidade.
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III – Fundamentos
Na opinião da Ré, por força do nº 1 do artº 49º do DL nº 40/95/M, “decorridos 24 meses sobre a data do acidente, a indemnização por incapacidade temporária dá lugar à indemnização por incapacidade permanente, não se podendo sobrepor ambas as compensações”.
Ou seja, o nº 1 do citado preceito legal fixa o limite temporal máximo para efeitos do cálculo do quantum indemnizatório da incapacidade temporária.
Para sustentar a sua tese, citou a Ré a jurisprudência (Ac. do STJ de 29/11/2006, documento nº SJ00611290023084) e a doutrina portuguesa (Carlos Alegre, anotação do artº 42º do Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho).
Quid iuris?
A questão suscitada já não é novidade para este Tribunal de recurso, pois já se pronunciou no âmbito do Proc. nº 691/2010, de 14/04/2011.
Com a devida vénia e a propósito de situação igual à que ora nos ocupa, transcreve-se a jurisprudência citada:
“Ora, a única questão levantada pela recorrente prende-se com a interpretação do artº 49º/1 do D.L. nº 40/95/M de 14AGO.
Diz o artº 49º/1 do D.L. nº 40/95/M de 14AGO que “a incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma”.
Para a recorrente, por força dessa norma, o nosso legislador pretende estabelecer um limite traduzido numa moldura temporal para a indemnização decorrente da incapacidade temporária, ou seja, estabelecer um período máximo concreto de 24 meses quanto à duração da incapacidade temporária.
Assim, na óptica da recorrente, ao atribuir a parte da indemnização, por causa da incapacidade temporária absoluta, que excede o período de 24 meses, a qual corresponde a 49 dias, quantificáveis em MOP$14.700,00, a sentença ora recorrida viola o artº 49º/1 do citado diploma.
Para sustentar a sua posição, a recorrente citou a jurisprudência portuguesa que preconiza a conversão automática da incapacidade temporária em incapacidade permanente, decorrido que seja o período fixado na lei.
No entanto, por razões que passemos a expor, não é de acolher a tese da recorrente essencialmente apoiada na jurisprudência portuguesa.
Antes de mais, há que reconhecer que a jurisprudência portuguesa nunca constitui jurisprudência obrigatória para os tribunais de Macau, apesar de poder ser citada a título de referência à doutrina em direito comparado com efeitos meramente persuasivos.
Por outro lado, no presente caso, há que frisar que a jurisprudência portuguesa citada pela recorrente funda-se no regime legal existente na lei portuguesa que, na matéria de acidente de trabalho, se apresente diferente do regime vigente na REAM, pelo menos nos seguintes aspectos:
1. Na matéria da conversão da incapacidade temporária em permanente, a lei portuguesa estabelece que “a incapacidade temporária converte-se em permanente decorridos 18 meses consecutivos, devendo o perito médico do tribunal reavaliar o respectivo grau de incapacidade” (cf. o artº 42/1 do D.L.nº 143/99 ), ao passo que a lei vigente na RAEM reza que “a incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma” (cf. o artº 49º/2 do D.L. nº 40/95/M) (sub.nosso); e
2. Quanto às prestações em dinheiro como indemnização pela incapacidade permanente, a lei portuguesa estabelece, em relação aos sinistrados com incapacidade permanente absoluta ou incapacidade permanente parcial igual ou superior a 30%, uma pensão anual e vitalícia, e em relação aos sinistrados com incapacidade permanente parcial inferior a 30%, um capital de remição de uma pensão anual e vitalícia e que o direito às prestações, em ambas as modalidades, vence-se no dia seguinte ao da alta médica (cf. o artº 17º da Lei nº 100/97, que o referido decreto visa regulamentar), ao passo que face à lei vigente na RAEM, na matéria de prestações em dinheiro por incapacidade permanente, quer absoluta quer parcial, é estabelecido o pagamento de um só capital em dinheiro ao sinistrado, calculado de acordo com o grau de incapacidade de que o sinistrado fica definitivamente afectado após a cura clínica e a idade do sinistrado no momento da ocorrência do acidente, e não a idade no momento da alta clínica ou no momento em que se converte a incapacidade temporária em permanente (cf. o artº 47º/1-c) e d), 3-a) do D.L. nº 40/95/M);
Pondo a parte a questão da natureza da presunção, juris tantum ou juris et de jure, estabelecida no artº 49º/1 da lei de Macau e confrontando as modalidades de prestações em dinheiro por incapacidade permanente e as formas dos cálculos da indemnizações, especialmente as partes por nós sublinhhadas, previstas em ambas as leis, verifica-se que face à lei vigente na RAEM, a data da conversão da incapacidade temporária em permanente em nada influi na quantificação do capital de prestação em dinheiro, pois nos termos do disposto no artº 47º/1-c) e d) e 3-a) do D.L. nº 40/95/M, o tal capital é fixado de acordo com o grau de incapacidade permanente e a idade do sinistrado no momento da ocorrência do acidente.
Vistas as coisas sob outro prisma, em face da lei da RAEM, o direito do sinistrado à indemnização por perda permanente da capacidade surge com a ocorrência do acidente e vem a fixar-se no momento em que tiver sido convertida em permanente a incapacidade após a cura clínica, momento esse que, cedo ou tarde, em nada influi no cálculo do quantum da indemnização, ao contrário do que sucede no regime estabelecido na lei portuguesa, onde o quantum das prestações em dinheiro, por incapacidade permanente, quer na modalidde da pensão anual e vitalícia quer na do capital de remição da pensão, varia sempre de acordo com o momento, mais cedo ou mais tarde, em que se verifica a conversão da incapacidade temporária em permanente, pois só com a conversão se vencem as pensões ou o capital de remição das pensões (cf. o artº 17º/4 da Lei nº 100/97).
Assim, cai por terra toda a argumentação da tese da recorrente, nos termos da qual a atribuição ao sinistrado da indemnização por incapacidade temporária na parte que excede o período de 24 meses dá origem a uma sobreposição de indemnização – incapacidade temporária absoluta e incapacidade permanente parcial, o que, na sua óptica, equacionaria uma potencial situação de enriquecimento sem causa a favor do sinistrado, com o correlativo empobrecimento da entidade responsável (vide os parág. 40 e 41 das alegações e os pontos 7 a 11 das conclusões do recurso), uma vez que face à lei vigente na RAEM, o cálculo do quantum das prestações em dinheiro por incapacidade permanente não fica condicionado pelo momento da conversão ou cura clínica, mas sim pelo grau da incapacidade apurado no momento da conversão ou da cura clínica.
É verdade que a indemnização por incapacidade permanente só se paga após a cura clínica e a conversão da incapacidade em permanente.
Mas é assim não porque a indemnização por incapacidade permanente é “sucessora” ou “substituta” da indemnização por incapacidade temporária, mas sim pura e simplesmente pela circunstância de somente vir a tornar-se possível a liquidação do quantum da indemnização por incapacidade permanente após a conversão e a subsequente fixação do grau da incapacidade permanente.
Assim sendo, dadas as diferenças existentes no correspectivo regime em ambas as leis, parece que não faz muito sentido debruçar-nos mais sobre os argumentos deduzidos pela recorrente nas suas alegações do recurso que, como vimos, são apoiados essencialmente na jurisprudência portuguesa tecida sobre o direito positivado não totalmente idêntico ao estabelecido na lei vigente na RAEM.
Passemos então a apurar qual é o verdadeiro sentido do artº 49º/1 do nosso Decreto-Lei nº 40/95/M.
Diz a tal norma que “a incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma”.
Diversamente do que sucede com o artigo intitulado com a mesma epígrafe “conversão de incapacidade temporária em permanente” na lei portuguesa (artº 42º/1 do D.L.nº 143/99), onde se estabelece que a incapacidade temporária converte-se em permanente, a lei de Macau limita-se a instituir uma presunção legal de conversão.
Assim, é defensável que face à lei portuguesa a conversão será automática relativamente à natureza da incapacidade (de temporária passa a ser permanente), pois ao empregar a expressão “converte-se”, parece que o legislador português não quis deixar para o intérprete qualquer margem de liberdade para a não considerar como uma conversão ope legis com o simples decurso de 18 meses, mesmo não se verifique ainda a cura clínica.
Já não é bem assim na lei de Macau.
Pois ai está claramente estabelecida uma presunção legal, tal como a própria redacção “presume-se” indica.
Coloca-se então a questão de saber qual a natureza da presunção estabelecida no artº 49º/1 do D.L.nº 40/95/M, isto é, se juris et de jure, se juris tantum.
O Código Civil define no seu artº 342º as presunções como as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.”.
Desenvolvendo-se essa definição legal, a presunção é uma operação lógica, feita pela lei ou pelo julgador que, de acordo com o vínculo de causalidade que liga uns com os outros acontecimentos, naturais ou humanos, deduz de um facto já conhecido a existência de um outro facto que não é conhecido.
Quando essa operação lógica é feita pela própria lei, estamos perante uma presunção legal.
Quando feita pelo tribunal, estamos perante uma presunção judicial, que é mais vulgarmente, embora não muito correctamente, conhecido em alguns sistemas por “prova indirecta”, pois para nós não se trata de um meio de prova propriamente dito, mas sim um processo lógico que proporciona indirectamnte o que se pretende provar.
No que diz respeito às presunções legais, temos as chamadas presunções juris et de jure, ou absoluta, quando a lei diz expressamente não admitir prova em contrário (cf. artº 343º/2, in fine, do Código Civil), e as denominadas presunções juris tantum, ou relativas, quando podem ser afastadas pela prova em contrário (cf. artº 343º/2, primeira parte, do Código Civil).
A propósito das presunções legais, o artº 343º/2 do Código Civil prescreve que “as presunções legais podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei proibir”.
Desse preceituado decorre que as presunções juris tantum constituem a regra, ao passo que as presunções juris et de jure a excepção.
Dito de outro modo, na falta da referência expressa da lei que se pretende proibir a produção de provas em contrário, estamos perante uma presunção juris tantum, ilidível mediante prova em contrário.
Aqui chegámos, munidos já dessas considerações doutrinárias, genéricas e abstractas, já estamos em condições para proceder à correcta interpretação do artº 49º/1 do D.L. nº 40/95/M para o esclareciemento da concreta questão que nos é colocada pela recorrente.
O artº 49º do D.L. nº 40/95/M preceitua:
(Conversão de incapacidade temporária em permanente)
1. A incapacidade temporária por um período superior a vinte e quatro meses presume-se como permanente, devendo o médico assistente fixar o respectivo coeficiente, de acordo com a tabela de incapacidades anexa ao presente diploma.
2. O coeficiente de incapacidade fica sujeito a homologação do tribunal, o qual pode prorrogar até mais doze meses o prazo previsto no número anterior, no caso de não estarem a ser prestados ao sinistrado os tratamentos clínicos e de recuperação necessários.
Da leitura do texto desse artigo o seu todo, não nos parece legítimo afirmar que a lei está a estabelecer no nº 1 uma presunção juris et de jure, pois ai não se vê nenhuma referência à proibição da produção das provas em contrário.
Nem do preceituado no seu nº 2 pode ser extraído qualquer indício dessa referência, pois o nº 2 limita-se a estabelecer a prorrogabilidade do período de tempo que funciona, na operação da presunção, como um facto conhecido a partir do qual se faz a ilação para afirmar a conversão da incapacidade.
In casu, perante a prova pericial produzida a fls.144, ficou assente que o sinistrado sofreu da incapacidade temporária absoluta durante o período compreendido entre 15JAN2007 e 03MAR2009, totalizando-se em 779 dias, é de afastar a presunção legal estabelecida no artº 49º/1 do Decreto-Lei nº 40/95/M, nos termos do qual se presume a conversão da incapacidade temporária em permanente decorridos que sejam os vinte e quatro meses.
Ou seja, durante o período de tempo que excede os vinte e quatro meses, que correspondente a quarenta e nove dias, em que continuava a ser afectado de incapacidade temporária, o sinistrado ora recorrido não deixa de merecer o direito às prestações em dinheiro por incapacidade temporária correspondente a esse período de tempo, por força do disposto no artº 52º/1.
Assim, bem andou o Tribunal a quo ao decidir que são devidas as indemnizações por incapacidade temporária absoluta, durante todo o período compreendido entre 15JAN2007 e 03MAR2009, no qual o Autor estava afectado da incapacidade temporária absoluta.
Sumariando e concluindo, se, decorrido o período de 24 meses a que se refere o artº 49º/1 do Decreto-Lei nº 40/95/M, persistir a incapacidade por não verificação da cura clínica, essa incapacidade ainda continua a ser tida por temporária, não se extinguindo consequentemente o direito à indemnização por incapacidade temporária.”
É a jurisprudência bem fundamentada que aponta a boa solução do caso com a qual concordamos na sua íntegra e cujo conteúdo aqui, respeitosamente, fazemos nosso.
Verificado que o nº 1 do artº 49º do DL nº 40/95/M não fixa o limite temporal máximo para efeitos do cálculo do quantum indemnizatório da incapacidade temporária, cumpre agora verificar quando é que ocorreu a cura clínica do Autor.
Os peritos consideraram que a incapacidade temporária absoluta do Autor permaneceu até à data da realização da peritagem médica (14/06/2011), a partir da qual dá lugar a incapacidade permanente com o coeficiente de 20%.
Salvo o devido respeito e sem pôr em causa a idoneidade técnica dos senhores peritos, não nos parece correcto afirmar, face aos factos provados e ao disposto do artº 12º do DL nº 40/95/M, que a incapacidade permanente do Autor só ocorreu a partir da data da realização da peritagem médica.
Nos termos do artº 12º do citado diploma legal, considera-se que há cura clínica quando as lesões ou a doença desapareceram totalmente ou se apresentam como insusceptível de modificação com adequada terapêutica, que é o caso.
Veja-se:
Ficaram provados que já em 07/01/2011, o médico do Hospital Kiang Wu atestou que o Autor sofria uma incapacidade permanente com o coeficiente de 20%, coeficiente este que foi confirmado pelo médio legal em 13/01/2011.
Repare-se, entre o período de 07/01/2011 a 14/06/2011, o Autor sempre mantém o mesmo coeficiente de incapacidade permanente, ou seja, o seu estado clínico de incapacidade nada modificou, preenchendo assim a previsão da parte final do citado artº 12º do conceito jurídico da cura clínica.
Nesta conformidade, deve-se considerar que a cura clínica do Autor ocorreu no dia 07/01/2011, cessando no mesmo dia a sua incapacidade temporária absoluta, dando lugar a incapacidade permanente.
Pelo exposto, se conclui que a incapacidade temporária absoluta do Autor durou apenas 813 dias (17/10/2008 a 07/01/2011), e não 971 dias fixados na sentença recorrida, o que corresponde a uma indemnização no valor de: MOP$450*813*2/3=MOP$243.900,00.
Como o Autor já recebeu a quantia de MOP$156.600,00, ficando portanto apenas por receber o montante de MOP$87.300,00.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
- conceder provimento parcial do recurso interposto, revogando a sentença recorrida na parte que diz respeito à condenação da incapacidade temporária absoluta;
- condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia ainda em dívida de MOP$87.300,00, a título de incapacidade temporária absoluta;
- manter a sentença recorrida na parte restante.
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Custas pelas partes em ambas as instâncias na proporção do seu decaímento.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 01 de Março de 2012.
Ho Wai Neng (Relator)
José Cândido de Pinho (Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong (Segundo Juiz-Adjunto)
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99/2012