Acórdão do Tribunal de Última Instância
da Região Administrativa Especial de Macau
Reclamação para conferência (recurso civil)
N.º 11 / 2010
Reclamante : A
Reclamado: B
A veio recorrer do acórdão do Tribunal de Segunda Instância proferido em 26 de Novembro de 2009.
Apesar de ser admitido o recurso pelo relator do Tribunal de Segunda Instância, foi suscitada a questão da sua admissibilidade.
Convidadas as partes a pronunciar sobre a questão, o relator do Tribunal de Última Instância proferiu o seguinte despacho:
“Em relação ao recurso interposto pelo réu A do acórdão do Tribunal de Segunda Instância, foi suscitada a questão de irrecorribilidade por o valor da causa indicado pela autora, MOP$200.002,00, ser inferior à alçada do Tribunal de Segunda Instância, nos termos dos art.ºs 638.º, n.º 1 e 583.º, n.º 1 do CPC.
Notificadas as partes para pronunciar sobre a questão, veio o recorrente alegar que o valor indicado pela autora é nulo, sem qualquer efeito jurídico, por violação do art.° 254.° do CPC, que devia ser de MOP$1.000.001,00. Em consequência, o recurso devia ser admitido.
A recorrida voltou a sustentar a irrecorribilidade por causa do valor inferior à alçada do Tribunal de Segunda Instância.
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É certo que no art.° 254.° do CPC estabelece que para os interesses imateriais o valor é equivalente à alçada do Tribunal de Segunda Instância e mais uma patacas, ou seja, de MOP$1.000.001,00. E a autora indicou o valor de causa na petição inicial apenas em MOP$200.002,00.
Por outro lado, segundo o n.° 1 do art.° 256.° do mesmo Código, o réu pode impugnar o valor da causa indicado por autor.
No entanto, o réu não impugnou o valor em tempo devido.
Assim, nos termos do n.° 4 do referido artigo, considera que o réu aceitou o valor atribuído à causa pela autora.
Não sendo usado o poder pelo juiz consagrado no art.° 257.°, n.° 1 do CPC, o valor da causa considera-se definitivamente fixado depois de proferida a sentença em primeira instância (n.° 3 do mesmo artigo).
Logo, o valor da presente causa foi fixado definitivamente em MOP$200.002,00.
Por ser inferior à alçada do Tribunal de Segunda Instância, é irrecorrível o acórdão desse Tribunal de 26 de Novembro de 2009.
Em consequência, não admito o recurso interposto pelo réu.
Custas pelo recorrente.”
Vem agora o recorrente reclamar deste despacho e continua a alegar que o valor da presente causa deve ser indicado obrigatoriamente segundo o comando do art.º 254.º do Código de Processo Civil (CPC), sem qualquer disponibilidade do interessado. E a fixação do valor do processo tem carácter de interesse público. Mesmo que não fosse corrigido oficiosamente o valor ora fixado, o presente caso é recorrível para o Tribunal de Última Instância por se tratar de acção relacionada com interesses imateriais.
Pedindo que o valor do processo seja corrigido oficiosamente para MOP$1.000.001,00 e admitido o presente recurso.
A recorrida entende que a reclamação deve ser julgada improcedente.
É evidente que a recorrida, autora da acção, indicou um valor inferior ao determinado pelo art.º 254.º do CPC.
Mas também é certo que a lei estabelece meio de impugnação do valor indiciado por autor (art.º 256.º do CPC) e o momento em que tal valor é considerado fixado definitivamente (art.º 257.º do CPC).
Por outro lado, mesmo que a inobservância do art.º 254.º do CPC possa constituir uma nulidade, o prazo para arguição já expirou há muito (art.º 151.º, n.º 1 do CPC), pois o recorrente, ora reclamante, devia ter conhecimento do valor da causa indicado pela autora pelo menos a partir da citação.
Assim, o valor da causa considerado já definitivamente fixado não pode agora voltar a ser posto em causa.
Com a manutenção deste valor da causa, o recurso é naturalmente inadmissível por força dos citados art.ºs 638.º, n.º 1 e 583.º, n.º 1 do CPC. Não tem qualquer relevância nem suporte legal a natureza da acção de interesses imateriais para efeitos de admissibilidade de recurso.
É de manter, portanto, o despacho reclamado.
Face ao exposto, acordam em indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante.
Aos 15 de Junho de 2010
Os juízes:Chu Kin
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
Sam Hou Fai
Processo n.º 11 / 2010 4