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Processo n.º 19/2012 Data do acórdão: 2012-3-22 (Autos de recurso penal)
  Assuntos:
– rapto consumado
– extorsão tentada
– concurso efectivo
– art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do Código Penal
– acto de execução de extorsão
– art.o 21.o do Código Penal
– acto de constrangimento
– cláusula expressa de atenuação especial da pena
– renúncia à pretensão de resgate
– libertação da vítima do rapto
– art.o 156.o do Código Penal
– arrependimento sincero
– nova atenuação especial da pena
– art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do Código Penal
– princípio da proibição da dupla valoração
– art.o 66.o, n.o 3, do Código Penal
– agravação da pena do co-arguido
– justiça relativa na pena
S U M Á R I O
1. Pode haver concurso efectivo entre o crime consumado de rapto e o crime tentado de extorsão, porquanto no tipo legal fundamental de rapto do n.o 1 do art.o 154.o do vigente Código Penal (CP), não estão em questão algum ou alguns actos de execução do crime de extorsão em si (cfr. o conceito de tentativa no art.o 21.o do CP), traduzido no “constranger outra pessoa, por meio de ... ameaça com mal importante, a uma disposição patrimonial...”, mas sim “a intenção de submeter a vítima a extorsão”, ou “a intenção de obter resgate ou recompensa”, ou “a intenção de cometer crime contra a liberdade ou autodeterminação sexuais da vítima”, ou “a intenção de constranger a autoridade pública ou um terceiro a uma acção ou omissão, ou a suportar uma actividade”.
2. Portanto, diversamente do entendido pelo Tribunal a quo, o crime tentado de extorsão por que também vinham pronunciados os quatro arguidos do processo em co-autoria não deveria ficar absorvido no crime consumado de rapto do art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP.
3. Não obstante, há que manter a decisão de absolvição dos quatro arguidos desse crime tentado de extorsão, apenas porque da matéria de facto então provada em primeira instância, não se consegue retirar que já tenha sido iniciado qualquer acto concreto de constrangimento da mãe do ofendido raptado.
4. De facto, o acto de telefonar para a mãe do ofendido com intenção de constranger esta a pagar resgate, sem ter sido acompanhado de qualquer emissão de palavras tendentes a executar esse constrangimento, não pode ser considerado como um acto de execução do crime de extorsão.
5. Depois de ter decidido pela efectiva atenuação especial da pena do crime de rapto cometido pelos quatro arguidos em co-autoria, nos termos previstos no art.o 156.o do CP, não pode ter o Tribunal a quo decidido em proceder, a favor de um co-arguido, à nova atenuação especial da pena do rapto com fundamento na verificação do arrependimento sincero (a que se refere o art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do CP) por parte deste arguido.
6. Com efeito, a renúncia à pretensão de resgate e a libertação da vítima do rapto de que se fala na previsão da cláusula expressa de atenuação especial da pena do art.o 156.o do CP são nitidamente “actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente” postulados na alínea c) do n.o 2 do art.o 66.o do CP, e como tal – por força do princípio da proibição da dupla valoração plasmado no n.o 3 deste art.o 66.o – não é possível uma nova atenuação especial da pena abstracta do crime do rapto com base na consideração, materialmente, da dita mesma circunstância.
7. Os dois co-arguidos condenados ora recorrentes não podem pretender, no seu recurso, a agravação da pena aplicada pelo Tribunal a quo a um outro co-arguido, se bem que já possam pedir a redução da pena deles próprios com fundamento na justiça absoluta e na justiça relativa.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 19/2012
(Autos de recurso penal)
Arguidos recorrentes:
B (B) (1.o arguido)
C (C) (2.o arguido)
Arguidos não recorrentes:
F (F) (3.o arguido)
G (G) (4.o arguido)
Tribunal a quo: 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base
N.o do processo no Tribunal a quo: CR3-11-0070-PCC





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Em 9 de Novembro de 2011, foi proferido acórdão em primeira instância a fls. 809 a 822 do Processo Comum Colectivo n.° CR3-11-0070-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, no qual:
– o 1.o arguido B (B) ficou materialmente condenado como co-autor imediato de um crime consumado de rapto, p. e p. pelo art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do vigente Código Penal (CP), com circunstância de atenuação especial da pena prevista no art.o 156.o do CP, na pena de quatro anos de prisão, e como co-autor imediato de um crime consumado de detenção de armas proibidas, p. e p. pelo art.o 262.o, n.o 1, do CP, conjugado com o art.o 6.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento de Armas e Munições aprovado pelo Decreto-Lei n.o 77/99/M, de 8 de Novembro, na pena de dois anos e três meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de quatro anos e nove meses de prisão;
– o 2.o arguido C (C) ficou materialmente condenado como co-autor imediato de um crime consumado de rapto, p. e p. pelo art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP, com circunstância de atenuação especial da pena prevista no art.o 156.o do CP, na pena de três anos e nove meses de prisão, e como co-autor imediato de um crime consumado de detenção de armas proibidas, p. e p. pelo art.o 262.o, n.o 1, do CP, conjugado com o art.o 6.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.o 77/99/M, na pena de dois anos e três meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de quatro anos e seis meses de prisão;
– o 3.o arguido F (F) ficou materialmente condenado como co-autor imediato de um crime consumado de rapto, p. e p. pelo art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP, com circunstância de atenuação especial da pena prevista no art.o 156.o do CP, na pena de três anos e seis meses de prisão, e como co-autor imediato de um crime consumado de detenção de armas proibidas, p. e p. pelo art.o 262.o, n.o 1, do CP, conjugado com o art.o 6.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.o 77/99/M, na pena de dois anos e três meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de quatro anos e três meses de prisão;
– e o 4.o arguido G (G) ficou materialmente condenado como co-autor imediato de um crime consumado de rapto, p. e p. pelo art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP, com circunstâncias de atenuação especial da pena previstas no art.o 156.o e no art.o 66.o, n.os 1 e 2, alínea c), do CP, na pena de um ano e seis meses de prisão, e como co-autor imediato de um crime consumado de detenção de armas proibidas, p. e p. pelo art.o 262.o, n.o 1, do CP, conjugado com o art.o 6.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.o 77/99/M, com atenuação especial da pena prevista no art.o 66.o, n.os 1 e 2, alínea c), do CP, na pena de sete meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de um ano e nove meses de prisão efectiva,
– enquanto todos os quatro arguidos vinham inicialmente pronunciados como co-autores imediatos de um crime consumado de rapto, p. e p. pelo art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP, com circunstância de possível atenuação especial da pena prevista no art.o 156.o do CP, de um crime tentado de extorsão, p. e p. pelo art.o 215.o, n.o 2, alínea a), com referência à circunstância do art.o 198.o, n.o 2, alínea a), ambos do CP, de um crime consumado de roubo, p. e p. pelo art.o 204.o, n.o 2, alínea b), do CP, com referência à circunstância do art.o 198.o, n.o 1, alínea a), do CP, e de um crime consumado de detenção de armas proibidas, p. e p. pelo art.o 262.o, n.o 1, do CP, conjugado com o art.o 6.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.o 77/99/M, tendo entendido, pois, o Tribunal Colectivo autor desse acórdão que o crime tentado de extorsão se encontrava absorvido no crime consumado de rapto, e que não se verificava o crime de roubo pronunciado por não se ter provado sobretudo a apropriação, pelos quatro arguidos, dos bens do ofendido raptado.
Vieram recorrer somente s 1.o e 2.o arguidos para este Tribunal de Segunda Instância (TSI).
O 2.o arguido C, na sua motivação primeiramente apresentada a fls. 834 a 854 dos presentes autos correspondentes, alegou, na sua essência, como objecto concreto do recurso, que:
– da confissão dos factos pelo arguido G e do depoimento prestado pela mãe do ofendido na audiência de julgamento realizada em primeira instância, não se pode ter retirado – sob pena de erro, por contradição, na apreciação da prova, com violação do princípio da prova e do princípio de in dubio pro reo – qualquer prova sobre a intenção de pedir dinheiro em troca da liberdade do ofendido, pelo que ele, ora recorrente, não deve ter sido condenado pela prática de um crime de rapto, mas sim pelo cometimento de um crime de sequestro, p. e p. pelo art.o 152.o, n.o 1, do CP, com atenuação especial da respectiva pena à luz do art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do CP (porquanto “os arguidos se arrependeram do seu propósito e, livre e espontaneamente, devolveram à liberdade o ofendido”), sendo certo que em caso de haver co-arguidos, a confissão integral de um deles só pode ser tomada em consideração pelo tribunal se todos os restantes co-arguidos também confessarem integral e livremente;
– e independentemente disso, não se consegue comprender como pode ter sido tão especialmente atenuada a pena ao arguido G, e ao próprio 2.o arguido ora recorrente ter sido aplicada uma pena tão pesada, “usando como argumento o facto de que os factos praticados revelam especial perigosidade para a sociedade”.
Com o que pediu esse recorrente a revogação do acórdão recorrido na parte referente à sua condenação no crime de rapto, o qual, no seu entender, deveria ser convolado para o crime de sequestro, com aplicação, fosse como fosse, de uma pena justa a este respeito em termos de justiça relativa.
Ao passo que o 1.o arguido B, na sua motivação constante de fls. 874 a 888 dos autos, imputou, material e concretametne, ao Tribunal a quo a violação do art.o 356.o, n.o 1, do vigente Código de Processo Penal (CPP) (por falta de especificação de fundamentos da escolha e da medida da pena), e a violação do art.o 355.o, n.o 2, do CPP (devido à falta de fundamentação relativa à culpa dele e à questão de exigências de prevenção especial), para além de levantar também a existência de profunda injustiça relativa na medida da sua pena, quando comparada com a pena aplicada ao arguido G (defendendo que ele nunca pôde ser prejudicado a nível da medida da pena pelo facto de ter ficado silente na audiência de julgamento), e pediu, pois, a redução das suas penas parcelares, com consequente almejada redução da sua pena única a menos de três anos de prisão.
Aos recursos dos 2.o e 1.o arguidos, respondeu o Ministério Público a fls. 897 a 899 e 894 a 896 respectivamente, no sentido de improcedência da argumentação dos recorrentes.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer, levantando oficiosamente a questão de nova qualificação jurídico-penal dos factos como integrando também, e finalmente, a co-autoria imediata, pelos quatro arguidos, de um crime tentado de extorsão, e de um crime consumado de roubo, nos exactos termos inicialmente pronunciados, sem prejuízo do promovido reenvio do processo para novo julgamento no tocante a este crime, por o acórdão ora recorridio padecer do vício de erro notório na apreciação da prova.
Advertidos subsequentemente os quatro arguidos dessa opinião da Digna Procuradora-Adjunta no referente à eventualidade da nova qualificação jurídico-penal dos factos (não tendo os mesmos apresentado resposta escrita a isso), e feito em seguida o exame preliminar e corridos depois os vistos legais, procedeu-se à audiência em julgamento.
Cumpre, pois, decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Com pertinência à decisão dos recursos, atende-se aos seguintes elementos, coligidos do exame dos autos:
– na audiência de julgamento realizada em primeira instância, os três primeiros arguidos chamados B, C e F exerceram o direito de ficar silente quanto aos factos pronunciados, enquanto o 4.o arguido G confessou livre e integralmente e sem reservas os factos relativos aos crimes de rapto e de detenção de armas proibidas, tendo o Tribunal Colectivo a quo inquirido como testemunhas a mãe do ofendido, uma outra senhora, três senhores, três agentes investigadores da Polícia Judiciária, um amigo e colega de trabalho do 1.o arguido, um tio do 1.o arguido e a irmã do 4.o arguido, para além de ter examinado os elementos probatórios carreados aos autos (cfr. o teor da acta lavrada a fls. 805 a 808v);
– segundo a fundamentação fáctica do acórdão recorrido, escrita originalmente em chinês, ficou provado, na sua essência, o seguinte, com interesse para a decisão dos presentes autos recursórios:
– por volta de 2004, o 1.o arguido B conheceu o ofendido dos autos e sabia que era rica a família deste;
– depois, o 1.o arguido falou aos arguidos C, F e G do ambiente familiar rico do ofendido;
– por volta de Maio de 2010, o 1.o arguido sugeriu aos restantes três arguidos, com concordância destes três, que raptassem o ofendido, a fim de pedirem quatro milhões de patacas de resgate aos familiares deste;
– em 2 de Agosto de 2010, os quatro arguidos juntaram-se numa casa de pedra sita na Taipa (tomada de arrendamento pelo 2.o arguido em 24 de Julho de 2010), e decidiram dar começo à execução do plano;
– cerca das 18 horas desse dia, o 1.o arguido ordenou ao 2.o arguido para telefonar ao ofendido, para este alegar que era empregado de escritório de advogado e que o ofendido precisava de se deslocar ao escritório para assinar uns documentos sobre a herança do pai do próprio ofendido;
– depois de o 2.o arguido ter combinado telefonicamente com o ofendido no sentido de ir buscar com carro o ofendido na residência deste na Taipa, o 1.o arguido deixou os 2.o, 3.o e 4.o arguidos ir raptar o ofendido, enquanto ele próprio ficava dentro da casa de pedra a aguardar;
– o 4.o arguido conduziu um veículo automóvel (comprado em finais de Julho de 2010 pelo 3.o arguido pelo preço de oito mil e quinhentas patacas), levando os 2.o e 3.o arguidos para ir raptar o ofendido, e no meio do caminho, deixou o 3.o arguido sair primeiro do veículo, para evitar qualquer suspeita depois pelo ofendido;
– às 18 horas e 43 minutos desse dia, chegou o dito veículo no edifício de residência do ofendido, e telefonou o 2.o arguido ao ofendido, tendo este subido depois ao veículo conduzido pelo 4.o arguido;
– o 4.o arguido foi apanhar, em seguida, o 3.o arguido para este ficar outra vez no veículo;
– depois de subido o 3.o arguido ao veículo, este e o 2.o arguido, em conjugação de esforços, controlaram o ofendido, tendo posto neste um par de óculos de natação pintados a preto, atado com cordas plásticas as mãos do ofendido, e colocado um grande saco plástico para envolver o corpo do ofendido;
– cerca das 20 horas desse dia, os 2.o, 3.o e 4.o transportaram, de carro, o ofendido para a referida casa de pedra, juntando-se, assim, ao 1.o arguido;
– dentro dessa casa, um dos arguidos tirou os bens trazidos no corpo do ofendido, que incluíam, de entre outros, duas mil e quinhentas patacas em numerário, um telemóvel que custava quatro mil patacas, um relógio que custava setenta mil patacas, chaves, documentos de identificação e viagem e cartãos de crédito e de levantamento de dinheiro, etc.;
– depois, os quatro arguidos fecharam o ofendido numa gaiola metálica (comprada em finais de Julho de 2010 no Interior da China pelos 1.o, 2.o e 3.o arguidos);
– cerca da zero hora do dia 3 de Agosto, o 2.o arguido telefonou para a mãe do ofendido, com o propósito de constranger esta a pagar dinheiro de resgate;
– no meio desse telefonema, o 2.o arguido soube que a mãe do ofendido não estava em Macau, e assim teve a preocupação de impossibilidade de obtenção do dinheiro de resgate, pelo que não chegou a colocar, à mãe do ofendido, o pedido de pagamento de resgate;
– preocupados com a impossibilidade de obtenção do resgate, os quatro arguidos decidiram libertar o ofendido;
– cerca de uma hora e 25 minutos do dia 3 de Agosto, o 4.o arguido conduziu o referido veículo, levando consigo o ofendido, o 2.o arguido e o 3.o arguido. Depois, num local em Coloane, os 2.o e 3.o arguidos levaram o ofendido para sair do veículo, e cortaram as cordas plásticas que atavam os pés do ofendido, e libertaram o ofendido;
– o ofendido participou depois o caso à Polícia;
– depois de capturado, o 3.o arguido relevou ao pessoal da Polícia Judiciária a prática dos factos acima referidos em conjunto com os outros três arguidos, e levou o pessoal da Polícia Judiciária para o sítio onde os arguidos abandonaram duas pistolas de descarga eléctrica, um pulverizador de líquido irritante e dois paus metálicos de extensão flexível (então arranjados pelos quatro arguidos e destinados ao rapto do ofendido);
– com base nas informações fornecidas pelo 3.o arguido, o pessoal da Polícia Judiciária conseguiu capturar depois os 1.o e 2.o arguidos;
– em 6 de Agosto, o 3.o arguido levou o pessoal da Polícia Judiciária para ir achar, num sítio na Taipa, parte dos objectos pertencentes ao ofendido então tirados pelos quatro arguidos (tais como duas chaves de carro, um conjunto de 11 chaves, um envólucro de telemóvel, os documentos de identificação e viagem do ofendido, e os cartãos de crédito e de levantamento de dinheiro do ofendido, etc.);
– em 6 de Agosto de 2010, o 4.o arguido tomou a iniciativa de se deslocar à Polícia Judiciária para colaborar na investigação, e reconheceu que praticou os actos acima referidos em conjunto com os outros três arguidos;
– os quatro arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, praticando deliberadamente os actos acima referidos por divisão de tarefas e em conjugação de esforços, e mediante acordo conjunto;
– os quatro arguidos sabiam bem que os actos acima referidos eram proibidos e puníveis pela lei;
– outrossim, o Tribunal a quo afirmou ter apurado também o seguinte no texto do acórdão recorrido:
– o 4.o arguido confessou integralmente e sem reservas a prática dos factos imputados, e declarou que estava sinceramente arrependido;
– de acordo com os certificados de registo criminal, os quatro arguidos não têm antecedentes criminais;
– o 1.o arguido declarou ser estudante universitário com 3.o ano universitário como habilitações literárias, sem rendimentos nem encargos familiares;
– o 2.o arguido declarou ser desempregado, sem rendimentos nem encargos familiares, com ensino secundário elementar como habilitações literárias;
– o 3.o arguido declarou ser empregado de venda de telemóveis, com cerca de vinte mil patacas de rendimento mensal, sem encargos familiares, e com 3.o ano do ensino secundário elementar como habilitações literárias;
– o 4.o arguido declarou ser desempregado, sem rendimentos certos nem encargos familiares, com 3.o ano do ensino secundário complementar;
– enquanto o Tribunal a quo já deu por inclusivamente não provado que o 2.o arguido tirou os bens trazidos no corpo do ofendido, como também não provado que os quatro arguidos se apropriaram do dinheiro, telemóvel e relógio pertencentes ao ofendido e por eles tirados;
– em jeito de fundamentação da sua livre convicção formada sobre os factos, o Tribunal a quo teceu o seguinte no seu aresto:
– < O 4.o arguido prestou declarações na audiência de julgamento, em sede da qual, de modo livre, autónomo e sem qualquer coacção, fez, de imediato, confissão integral e sem reservas, e declarou o seu sincero arrependimento.
O ofendido ... faltou à audiência de julgamento.
Na audiência de julgamento, os investigadores da Polícia Judiciária prestaram declarações na audiência de julgamento, tendo falado, de modo claro e objectivo, do decurso e resultado da investigação do caso.
Na audiência de julgamento, prestaram declarações outras testemunhas, que falaram, de modo claro e objectivo, dos factos por elas vistos.
As testemunhas da personalidade dos 1.o e 4.o arguidos depuseram na audiência de julgaemento sobre a personalidade dos dois arguidos.
O relatório social do 4.o arguido falou do ambiente do crescimento e da vida do arguido e das características da personalidade.
Após analisados objectiva e globalmente as declarações prestadas pelos quatro arguidos e diversas testemunhas na audiência de julgamento, conjugadas com os documentos, objectos apreendidos e outros elementos de prova, examinados na audiência de julgamento, o presente Tribunal Colectivo reconheceu os factos acima referidos.>> (Cfr. os últimos três parágrafos da página 15 e os cinco primeiros parágrafos da página 16 do texto do acórdão recorrido, inicialmente redigidos em chinês a fls. 816 a 816v, e ora traduzidos literalmente para português pelo ora relator);
– por outro lado, quanto à medida da pena, o Tribunal a quo fez constar o seguinte na página 18 do texto do seu aresto a fl. 817v, ora traduzido literalmente para português pelo relator:
– < [...]
No presente caso, é elevado o grau de ilicitude dos actos criminosos dos quatro arguidos, é alto o grau de dolo dos quatro arguidos na prática dos crimes, sendo direito o dolo, com grande impacto negativo para a tranquilidade da sociedade, com prejuízo relativamente grande à liberdade do ofendido, e sem dano para a vida e a saúde do corpo do ofendido, nem dano de montante elevado ao património do ofendido.
O 1.o arguido B colocou-se em posição preponderante no decurso da prática dos crimes.
O 3.o arguido F, depois de detido pela Polícia, prestou colaboração válida à investigação policial.
O 4.o arguido G arrependeu-se sinceramente.
De acordo com os princípios da medida da pena, e ponderadas ao mesmo tempo as circunstâncias acima referidas e as outras apuradas da medida da pena, este Tribunal Colectivo entende, como adequadas, aplicar aos arguidos as seguintes penas:
[...]>>.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
E por uma questão de método, é de conhecer primeiro da questão, levantada pelo 1.o arguido B, de violação, pelo Tribunal recorrido, do disposto no art.o 355.o, n.o 2, do CPP.
Atentos os elementos acima coligidos na parte II do presente acórdão de recurso, é nítida a sem razão deste recorrente, sem mais indagação por ociosa.
E agora do vício de erro na apreciação da prova ou contradição da prova imputado pelo 2.o arguido C à decisão condenatória recorrida no referente à intenção dos arguidos em pedir resgate:
Sobre isto, e após examinados crítica e globalmente todos os elementos probatórios constantes dos autos e referidos na fundamentação probatória do acórdão recorrido, entende o presente Tribunal ad quem que não é patente que o resultado do julgamento da matéria de facto a que chegou esse Tribunal no tocante à investigação da intenção dos quatro arguidos em pedir resgate tenha violado alguma regra da experiência da vida humana em normalidade de situações, ou alguma norma atinente à prova legal, ou quaisquer legis artis vigentes na tarefa jurisdicional de julgamento da matéria de facto, sendo, pois, razoável a convicção formada pelo Tribunal recorrido no sentido de dar por provada tal intenção, pelo que o 2.o arguido não pode aproveitar a presente sede de recurso ordinário do acórdão da Primeira Instância para pretender sindicar gratuitamente, ao arrepio do princípio plasmado no art.o 114.o do CPP, a livre apreciação da prova então feita por esse Tribunal, sendo, por outro lado, certo que dos elementos coligidos na parte II do presente acórdão de recurso, não resulta que o Tribunal a quo tenha formado tal convicção na parte respeitante aos três primeiros arguidos então silentes na audiência de julgamento, a partir da confissão dos factos pelo 4.o arguido, pois, ao invés, tudo indica que a convicção em causa se fundou na análise crítica e em global de todo o tipo de prova produzida no processo.
Ficando intacta assim a já prova positiva da intenção dos arguidos de obter resgate, cai por terra a tese, defendida pelo 2.o arguido recorrente, de convolação do crime consumado do rapto para o crime de sequestro.
Cabe decidir agora da questão de injustiça relativa na medida da pena, levantada simultaneamente pelos 1.o e 2.o arguidos – sendo de considerar, para já, improcedente a questão de falta de fundamentação da medida da pena, posta conexamente pelo 1.o arguido na sua motivação de recurso, visto que através dos elementos acima coligidos na parte II do presente aresto, se vê claramente que o Tribunal a quo já especificou os seus fundamentos para a medida da pena.
Mas antes disso, cumpre tratar da questão, de conhecimento oficioso, de alteração da qualificação jurídico-penal dos factos, suscitada no parecer da Digna Procuradora-Adjunta.
Desde já, e em termos de tese jurídica falando, realiza o presente Tribunal que pode haver concurso efectivo entre o crime consumado de rapto e o crime tentado de extorsão, porquanto no tipo legal fundamental de rapto do n.o 1 do art.o 154.o do CP, não estão propriamente em questão algum ou alguns actos de execução do crime de extorsão em si (cfr. a definição do conceito de tentativa no art.o 21.o do CP), traduzido no “constranger outra pessoa, por meio de ... ameaça com mal importante, a uma disposição patrimonial...”, mas sim “a intenção de submeter a vítima a extorsão”, ou “a intenção de obter resgate ou recompensa”, ou “a intenção de cometer crime contra a liberdade ou autodeterminação sexuais da vítima”, ou “a intenção de constranger a autoridade pública ou um terceiro a uma acção ou omissão, ou a suportar uma actividade”.
Portanto, diversamente do entendido pelo Tribunal a quo, o crime tentado de extorsão por que também vinham pronunciados os quatro arguidos em co-autoria não deveria ficar absorvido no crime consumado de rapto do art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP.
Não obstante, há que manter, ainda na mesma, a decisão de absolvição dos quatro arguidos desse crime tentado de extorsão, apenas porque da matéria de facto então provada em primeira instância, não se consegue retirar que já tenha sido iniciado qualquer acto concreto de constrangimento da mãe do ofendido raptado, sendo líquido que o acto de telefonar para a mãe do ofendido com intenção de constranger esta a pagar resgate, sem ter sido acompanhado de qualquer emissão de palavras tendentes a executar esse constrangimento, não pode ser considerado como um acto de execução do crime de extorsão.
E no tangente ao crime de roubo por que vinham pronunciados também os quatro arguidos em co-autoria, já não pode ser mantida a decisão absolutória tomada no acórdão da Primeira Instância, porquanto sendo de conhecimento oficioso qualquer dos três grandes vícios elencados no n.o 2 do art.o 400.o do CPP, este Tribunal ad quem, em face do conteúdo da fundamentação fáctica do acórdão recorrido, detecta como patente a existência de contradição insanável da fundamentação e de erro notório na apreciação da prova relativamente ao julgamento da matéria de facto então feito pelo Tribunal a quo a propósito desse crime.
É que desde logo, segundo a matéria de facto dada por provada pelo Tribunal a quo, um dos arguidos, dentro da casa de pedra, tirou os bens trazidos no corpo do ofendido, o qual, na altura, já tinha as suas mãos atadas por cordas plásticas; depois, foram achados num sítio da Taipa alguns objectos pertencentes ao ofendido e então tirados pelos quatro arguidos.
Assim, se foi um dos arguidos quem tirou os bens do ofendido, este facto provado já é logicamente incompatível com o facto provado de alguns dos objectos pertencentes ao ofendido terem sido tirados pelos quatro arguidos.
E se foram os quatro arguidos quem tiraram parte dos objectos pertencentes ao ofendido, isto, por sua vez, já contradiz logicamente com a não comprovação do facto de ter o 2.o arguido tirado os bens trazidos no corpo do ofendido.
Outrossim, independentemente dessas contradições, como o Tribunal a quo já deu por provado que os quatro arguidos raptaram o ofendido com intenção de pedir resgate, que um dos arguidos tirou, aquando do acto de rapto, os bens trazidos no corpo do ofendido (que na altura, já tinha as suas mãos atadas por cordas plásticas), que todos os quatro arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, praticando deliberadamente os actos referidos (no próprio elenco de factos provados, nele se incluindo também tal facto de um dos arguidos ter tirado os bens trazidos no corpo do ofendido) por divisão de tarefas e em conjugação de esforços, e que os quatro arguidos sabiam bem que os actos em causa eram proibidos e puníveis pela lei, então era muito desrazoável, por contrária às regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, a decisão desse Tribunal no sentido de não dar por provada a apropriação, pelos quatro arguidos, do dinheiro, telemóvel e relógio pertencentes ao ofendido. De facto, se a pretensão que subjaz à prática do rapto é para pedir resgate, é mais que natural que o acto de tirar nomeadamente um telemóvel, duas mil e quinhentas patacas em numerário e um relógio trazidos na altura no corpo do ofendido raptado tem por intenção a apropriação desses bens pertencentes ao ofendido. Daí que há erro notório na apreciação da prova sobre os factos integradores do crime de roubo, cujo tipo fundamental, previsto no art.o 204.o, n.o 1, do CP, reza que “Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, .., coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, ..., ou pondo-a na impossibilidade de resistir...” (com sublinhado agora posto).
Termos em que há que determinar, nos termos do art.o 418.o, n.os 1 e 3, do CPP, o reenvio do processo para novo julgamento no Tribunal Judicial de Base, de todos os factos inicialmente descritos no despacho de pronúncia que digam respeito ao crime de roubo consumado aí imputado aos quatro arguidos em co-autoria.
Chega agora o momento de apreciar a problemática da medida da pena.
Do teor das respectivas motivações, resulta que o 2.o arguido não está satisfeito com a pena do crime do rapto, enquanto o 1.o arguido pede inclusivamente a redução das suas duas penas parcelares e da pena única.
Estando os quatro arguidos do subjacente processo condenados em co-autoria nos crimes consumados de rapto e de detenção de armas proibidas, passa-se a aquilatar, nos termos ditados pelo art.o 392.o, n.o 1, do CPP, da justeza de toda a decisão feita pelo Tribunal a quo aquando da medida da correspondente pena aos quatro arguidos, mormente na perspectiva da justiça relativa.
E antes do mais, observa-se que depois de ter decidido pela efectiva atenuação especial da pena do crime de rapto (cometido pelos quatro arguidos em co-autoria) nos termos previstos no art.o 156.o do CP, não pode ter o Tribunal a quo decidido em proceder, a favor do 4.o arguido, à nova atenuação especial da pena do rapto com fundamento na verificação do arrependimento sincero (a que se refere o art.o 66.o, n.o 2, alínea c), do CP) por parte deste arguido.
Com efeito, a renúncia à pretensão de resgate e a libertação da vítima do rapto de que se fala na previsão da cláusula expressa de atenuação especial da pena do art.o 156.o do CP são nitidamente “actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente” postulados na alínea c) do n.o 2 do art.o 66.o do CP, e como tal – por força do princípio da proibição da dupla valoração plasmado no n.o 3 deste art.o 66.o – não é possível uma nova atenuação especial da pena abstracta do crime do rapto com base na consideração, materialmente, da dita mesma circunstância.
O crime consumado de rapto do art.o 154.o, n.o 1, alínea c), do CP, praticado pelos quatro arguidos em co-autoria, por efeito da já decidida, no acórdão recorrido, atenuação especial da pena expressamente prevista no art.o 156.o do CP, passa a ser punível com pena de sete meses e seis dias a seis anos e oito meses de prisão (e não com pena de prisão até dez anos, como constou, por lapso, do penúltimo parágrafo da página 16 do texto do acórdão recorrido, a fl. 816v).
E o crime consumado de detenção de armas proibidas por que os quatro arguidos vinham condenados em co-autoria é punível, nos termos previstos no n.o 1 do art.o 262.o do CP, com pena de dois a oito anos de prisão, sendo, entretanto, de manter o juízo de valor já tomado no acórdão recorrido no concernente à atenuação especial da pena (abstracta) deste crime a respeito do 4.o arguido ao abrigo do art.o 66.o, n.os 1 e 2, alínea c), do CP (uma vez que o Ministério Público não interpôs recurso do acórdão em questão para pedir a revogação desse juízo de valor, por um lado, e, por outro, os 1.o e 2.o co-arguidos não podem pretender a agravação da pena do 4.o arguido, se bem que estes dois recorrentes já possam pedir a redução da pena deles próprios com fundamento na justiça absoluta e na justiça relativa), com o que este crime passa a ser punível, em relação ao 4.o arguido, com pena de um mês a cinco anos e quatro meses de prisão.
Considerando maxime que todos os quatro arguidos não têm antecedentes criminais, que são elevadas as exigências da prevenção geral dos crimes de rapto e de detenção de armas proibidas, que foi o 1.o arguido quem sugeriu aos outros três arguidos a ideia de raptar o ofendido, que os 1.o e 2.o arguidos não chegaram a confessar os factos na audiência, que o 3.o arguido, embora tenha ficado silente quanto aos factos imputados, prestou colaboração com a Polícia Judiciária na investigação do caso, e que o 4.o arguido se entregou voluntariamente à Polícia Judiciária para investigação, entende este Tribunal ad quem dever aplicar, aos padrões da medida concreta da pena vertidos nos art.os 40.o, n.os 1 e 2, 65.o, n.os 1 e 2, e 71.o, n.os 1 e 2, do CP:
– ao 1.o arguido, a pena de quatro anos de prisão pelo crime de rapto, e a pena de dois anos e três meses de prisão pelo crime de detenção de armas proibidas (pelo que é de manter tal e qual as duas penas parcelares já impostas a este arguido no acórdão recorrido);
– ao 2.o arguido, a pena de três anos e nove meses de prisão pelo crime de rapto, e a pena de dois anos e três meses de prisão pelo crime de detenção de armas proibidas (mantendo-se, pois, as duas penas parcelares já achadas no aresto recorrido a este arguido);
– ao 3.o arguido, a pena de três anos e seis meses de prisão pelo crime de rapto, e a pena de dois anos e três meses de prisão pelo crime de detenção de armas proibidas (ficando, assim, também intocadas as duas penas parcelares já aplicadas no acórdão recorrido a este arguido);
– ao 4.o arguido, a pena de três anos e seis meses de prisão pelo crime de rapto e a pena de sete meses de prisão pelo crime de detenção de armas proibidas, pese embora a necessidade de essa pena nova do crime de rapto ser reduzida à pena de um ano e seis meses de prisão então achada no acórdão recorrido para este arguido (dado que tal como já se disse acima, os dois arguidos recorrentes não podem pretender a agravação da pena de outrem, por um lado, e, por outro, o Ministério Público não chegou a interpor recurso para pedir a agravação da pena do 4.o arguido ora não recorrente – cfr. o princípio da proibição da reforma para pior gizado no art.o 399.o, n.o 1, do CPP).
Por fim, por decorrência lógica da acima referida solução de reenvio parcial do processo, já não se torna mister, na presente lide recursória, decidir da questão de medida da pena única dos quatro arguidos, tarefa essa que terá que ser feita pelo Tribunal Judicial de Base em função do resultado do novo julgamento a fazer a propósito do crime de roubo inicialmente pronunciado aos quatro arguidos em co-autoria.
Em suma, improcede o pedido formulado pelo 2.o arguido no recurso, ao passo que naufraga também, desde já, a pretensão posta pelo 1.o arguido no seu recurso, com natural excepção da parte referente à sua pena única final, a qual não deixará de ser abordada no novo julgamento a fazer pelo Tribunal Judicial de Base.
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em:
– determinar, oficiosamente, o reenvio do objecto do processo para novo julgamento na parte relativa ao crime de roubo então pronunciado aos quatro co-arguidos B, C, F e G;
– negar provimento ao pedido formulado pelo 2.o arguido C no seu recurso;
– julgar improcedente a pretensão tecida pelo 1.o arguido B no seu recurso, com excepção da última questão aí posta, referente à medida da sua pena única resultante da prática dos crimes de rapto e de detenção de armas proibidas;
– não conhecer desta última questão do recurso do 1.o arguido, por estar prejudicada pela decisão de reenvio parcial do processo;
– e, não obstante, alterar, por ora, a decisão final feita no acórdão recorrido relativamente ao 4.o arguido G nos seguintes termos: a propósito do crime consumado de rapto cometido pelo 4.o arguido, este delito passa a ser punido, nos termos exclusivamente dos art.os 154.o, n.o 1, c), e 156.o do vigente Código Penal, com pena de três anos e seis meses de prisão, pena essa que, porém, fica reduzida, por causa do princípio da proibição da reforma para pior, a um ano e seis meses de prisão por que ele já vinha condenado no aresto recorrido.
Custas do recurso do 2.o arguido a cargo deste, com seis UC de taxa de justiça.
Custas do recurso do 1.o arguido na parte que ora decaiu a cargo dele mesmo, com quatro UC de taxa de justiça correspondente.
Fixam em trezentas patacas os honorários do Exm.o Advogado que foi nomeado como Defensor Oficioso do 4.o arguido na audiência de julgamento neste Tribunal de Segunda Instância, a suportar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Notifique a própria pessoa dos quatro arguidos da presente decisão.
E comunique a decisão ao ofendido e ao Processo n.o PLC 205-11-2-A do 2.o Juízo de Instrução Criminal.
Macau, 22 de Março de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator) (com a declaração de que ficou vencido na decisão de reenvio parcial do processo, por opinar que como o Ministério Público não chegou a interpor recurso ordinário do acórdão da Primeira Instância para imputar os vícios de contradição insanável da fundamentação e de erro notório na apreciação da prova sobre o crime de roubo inicialmente também pronunciado aos quatro co-arguidos, finalmente absolvidos desse crime em primeira instância, o presente Tribunal ad quem não pode conhecer, oficiosamente, dos correspondentes vícios das alíneas b) e c) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP respeitante a esse delito, conforme a seguinte posição jurídica designadamente vertida no acórdão de 18 de Julho de 2002, do Processo n.o 125/2002, do Tribunal de Segunda Instância, da pena do mesmo relator: os três vícios previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, possibilitadores da reapreciação pelo tribunal ad quem da matéria de facto julgada pelo tribunal a quo, não são de conhecimento oficioso mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito, porquanto a clara redacção do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, conjugada com o disposto nos art.os 402.º, n.os 1 e 3, e 415.º, n.º 1, do CPP, e o seu confronto com o art.º 393.º, n.os 1 e 2, do CPP, apontam no sentido de os vícios em causa só poderem justificar o reenvio do processo (art.º 418.º, n.º 1, do CPP) quando sejam invocados “como fundamentos do recurso”, e isso estará em sintonia com a mens legislatoris, enquanto se atribui aos sujeitos processuais, como recorrentes, uma inequívoca co-responsabilidade no bom e rápido êxito final da causa, nomeadamente consentindo-se-lhes a limitação do recurso nos amplos termos do art.o 393.º do CPP e impondo-se-lhes apertadas regras na motivação, que, além do mais, terá de enunciar especificamente os fundamentos do recurso e formular conclusões de acordo com o art.o 402.º, n.os 1 e 2, do CPP, sendo, pois, certo que se o arguido se conformou com a decisão a quo feita no tocante à matéria de facto, e não recorreu dela mesmo que em relação à qual se pudesse detectar eventualmente qualquer dos vícios do n.º 2 do art.º 400.º do CPP, mas tão-só recorreu da parte da decisão condenatória referente à medida da pena, não faz nenhum sentido conhecer oficiosamente dos eventuais vícios do n.º 2 do art.º 400.º contra a “vontade” do arguido, já que este, se entendesse haver esses vícios, bastaria argui-los na motivação do recurso a caber do veredicto final do tribunal a quo).
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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